A interpretação das imunidades tributárias e a jurisprudência do SupremoTribunal Federal

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Estão sujeitas as normas tributárias, em especial as que constituem normas de imunidade, a princípios e/ou regras de interpretação distintas das normas jurídicas comuns? Entenda a jurisprudência do Supremo Tribunal Federal.

A interpretação das normas tributárias

A interpretação das normas tributárias é realizada levando-se em conta que tais normas são normas jurídicas tanto quanto outras. Logo, as normas tributárias comportam os mesmos (tradicionais) critérios hermenêuticos, não cabendo, interpretações econômicas ou semelhantes, cujos vetores desbordem dos princípios de hermenêutica jurídica, conforme arrima Ataliba (2009, p. 39).

Ressalte-se, por oportuno, que como relata Moraes (1998, p. 129), o próprio ordenamento, de antemão, disciplina regras legais para a interpretação das normas jurídicas, como se pode constatar na Lei de Introdução ao Código Civil e, também, no Código Tributário Nacional.

Todavia, resta “evidente que a indicação do método interpretativo não é tarefa do legislador. Este não pode impor à posterioridade tal orientação, não sendo aconselhável nem política, nem científica e nem racionalmente. A fixação de regras de hermenêutica impede sua evolução.” (MORAES, 1998, p. 129)

Passemos, portanto, à tarefa de expor, brevemente, as espécies de interpretação tradicionais, para subsidiar, ao final, o estudo da interpretação das imunidades genéricas levada a cabo, atualmente, pelo Supremo Tribunal Federal, no exercício da jurisdição constitucional.

Critérios hermenêuticos tradicionais

Diz-se critérios tradicionais, tendo-se em vista que, hodiernamente, já se figura a existência de outros princípios ou modos hermenêuticos, principalmente no âmbito da (nova) hermenêutica constitucional, tais como o princípio da máxima efetividade das normas, do efeito integrador, da unidade da constituição, da concordância prática, dentre outros.

Quanto ao meio  


Literal ou gramatical

É aquele modo de interpretação que reside no culto do enunciado legal, prestigiando-se, portando, a letra da lei.

O método de interpretação gramatical, também conhecido debaixo das designações de interpretação filosófica, literal ou léxica, supõe uma análise ou averiguação do teor da lei. Está volvida sobretudo para significado literal das palavras, que se examinam isoladamente ou no contexto da frase, mediante o emprego de meios gramaticais e etimológicos. (BONAVIDES, 2009, pp. 400-401)

Sistemático

A interpretação sistemática diz respeito à necessidade de, o exegeta, para conseguir lograr o real conteúdo da norma legal, analisa-la dentro no contexto legal que foi editada. Ou seja, a fim de se interpretar um artigo de uma dada lei, mister se faz o conhecimento de outras disposições pertinentes ao sistema daquela dada lei.

A interpretação começa naturalmente onde se concebe a norma como parte de um sistema – a ordem jurídica, que compõe um todo ou unidade objetiva, única a emprestar-lhe o verdadeiro sentido, impossível de obter-se se a considerássemos insulada, individualizada, fora, portanto, do contexto das leis e das conexões lógicas do sistema. (BONAVIDES, 1999, p. 405)

Histórico

Para se chegar ao conteúdo da norma legal, também, pode-se valer o intérprete de um recorte histórico-crítico de todos aqueles fatos que enredaram a edição da lei. Todos aqueles fatos e circunstâncias sociais, que motivaram a iniciativa de transformar em lei determinado anseio social, sem os quais a norma, possivelmente, não existiria.

Por um de seus elementos – o histórico – o método traça toda a história da proposição legislativa, desce no tempo a investigar a ambiência em que se originou a lei, procura enfim encontrar o legislador histórico, como diz Burckhardt, a saber, as pessoas que realmente participaram na elaboração da lei, trazendo à luz os intervenientes fatores políticos, econômicos e sociais, configurativos da occasio legis. (BONAVIDES, 1999, p. 406)

Teleológico

Trata-se de um dos critérios de interpretação mais valorizados, uma vez que, nele se tenta perscrutar a lógica da norma legal, isto é, a finalidade a qual busca atingir o preceito jurídico. O conteúdo da norma, residiria, peremptoriamente, no seu intento.

A interpretação lógica é aquela que, sobre examinar a lei em conexidade com as demais leis, investiga-lhe também as condições e os fundamentos de sua origem e elaboração, de modo a determinar a ratio ou mens do legislador. Busca portanto reconstruir o pensamento ou intenção de quem legislou, de modo a alcançar depois a precisa vontade da lei. (BONAVIDES, 1999, p. 402)

Quanto ao resultado:

Declarativa

Da interpretação empregada, resultou que a norma legal perfez-se semelhante ao seu sentido gramatical, sem qualquer reparo.

Ocorre a interpretação declarativa quando na reconstrução do pensamento pelo intérprete coincide a interpretação gramatical com a interpretação lógica, isto é, a letra da lei corresponde ao sentido que lhe é atribuído pela razão (“cum in verbis nulla ambiguitas est, non debet admitti quaestio”). (BONAVIDES, 1999, pp.404-405)

Extensiva

A interpretação extensiva é buscada toda vez que alguma norma legal, ou melhor dizendo, seu texto normativo disse menos do que queria. Em decorrência disto, alarga-se seu âmbito de incidência, que perpassa ao descrito no seu texto.

Dá-se a interpretação extensiva (“lex minus scripsit quam voluit”) quando a lei abrange mais casos que aqueles que ela taxativamente contempla, isto é, teor da lei é objeto de alargamento e retificação, até coincidir com a vontade que o legislador quis exprimir. (BONAVIDES, 1999, p. 405)

Restritiva

Por sua vez, a interpretação restritiva é aquela de que se mune o exegeta no afã de dar o verdadeiro sentido à determinada norma que disse mais do que queria. O interprete, “apara as arestas” da norma, de modo que sua incidência é reduzida em comparação ao que foi enunciado na sua descrição legal.

Finalmente, temos a interpretação restritiva (“lex plus scripsit quam voluit”), verificada na hipótese contrária, ou seja, quando se restringe o alcance da normam de modo que a lei diz mais do que pretendeu o legislador. (BONAVIDES, 1999, p. 405)

A jurisprudência do Supremo Tribunal Federal quanto às imunidades tributárias

Em face do até aqui exposto, afirme-se que, em virtude da compostura própria das imunidades tributárias – e principalmente das genéricas –, os critérios hermenêuticos a serem utilizados, devem ser diferentes do de outras normas jurídico-tributárias, tais quais normas de isenção e de incidência tributária propriamente dita.

Aqui, nas imunidades genéricas, e, ante o fenômeno aventado da interpolação normativa, a interpretação a ser empreendida deve assegurar, não só a eficácia normativa da imunidade mesma, mas, além disso, a vida jurídica daqueles valores ou princípios constitucionais protegidos por ela.

Daí que, o Supremo Tribunal Federal, no exercício da jurisdição constitucional dos direitos e valores fundamentais, vem, atualmente, conferindo primazia às imunidades tributárias genéricas, dando-lhes, para além dos limites de seu texto normativo, elástico alcance, a fim de proteger situações não compreendidas positivamente na sua descrição legal primária.

A hermenêutica das imunidades e isenções

Desvendada a real natureza jurídica das imunidades e isenções tributárias, pode-se, a partir de então, examinar a interpretação jurídica própria a cada respectiva norma.

Em primeiro lugar, é de se enfatizar que, a imunidade é limitação à competência tributária impositiva, daí o porquê de necessariamente estar prevista no texto constitucional. Demais disso, e em razão disso, revela, indiscutivelmente, uma verdadeira escolha política do poder constituinte originário – o povo.

Sob certo aspecto, a índole da imunidade é essencialmente política, o que – como pondera Amílcar Falcão – impõe ao intérprete a necessidade de fazer os imprescindíveis confrontos e as necessárias conotações de ordem teleológica, toda vez que concretamente tiver que dedicar-se à sua exegese. (BORGES, 1980, p. 185)

Em pólo diametralmente oposto, está a isenção que, segundo Borges (1980, p. 107), qualificando-a como instrumento jurídico de exoneração do ônus tributário, “é tida indiscrepantamente pela doutrina como regra de direito excepcional, porque subtrai bens ou pessoas ao princípio da generalidade da tributação.”

E assim, prossegue o autor afirmando que, “A norma que isenta, estabelecendo um regime tributário especial para uma certa classe de casos e pessoas, constitui uma exceção à regra da generalidade da tributação.” (BORGES, 1980, p. 107)

Posto isto, agregue-se, por conseguinte que, a imunidade não pode ser interpretada à semelhança da isenção, cuja norma, como visto, tem nítido jaez excepcional. Revela (a isenção) clara exceção ao princípio geral da tributação, o que, dessarte, é de se aplicar a máxima de que não se pode dar interpretação ampliativa a norma de caráter excepcional.

Portanto, à imunidade não se opõe tal óbice interpretativo.

4) A imunidade tributária não pode ser tida como um privilégio, um favor ou um benefício fiscal – A imunidade tributária, vedando às pessoas jurídicas de direito público (União, Estados, Distrito Federal e Municípios) que instituam impostos sobre certas pessoas, coisas ou bens, não pode ser tida como um privilégio, um favor ou benefício fiscal. Em primeiro lugar é de se destacar que a Constituição, leis das leis, norma ápice do ordenamento jurídico, preservadora do regime democrático, não pode ser mero instrumento para conceder benefícios, favores ou privilégios a quem quer que seja, nem mesmo para as pessoas políticas de direito público. Por outro lado, a vedação constitucional é feita tendo em vista o interesse público e a preservação, proteção e estímulo de valores básicos do Estado. Seria inconcebível que a imunidade tributária tivesse cunho de benefícios ou de favores pessoais. Já ressaltou o professor Ives Gandra da Silva Martins, com razão absoluta, que a imunidade tributária: “... resguarda o equilíbrio federativo, a liberdade de associação do livro pensamento, a política, a religiosa, a de expressão, a expansão da cultura, o desenvolvimento econômico etc., e assim, não se deve considerar a imunidade como um benefício individual, um favor fiscal, uma renúncia à competência tributária ou um privilégio, mas sim uma forma de resguardar valores da comunidade e do indivíduo”. (MORAES, 1980, p. 117)

Essa ilação resta bem encarecida pelas acotações de Borges (1980, p. 185), para que, “A imunidade, diversamente do que ocorre com a isenção, não se caracteriza como regra excepcional frente ao princípio da generalidade do tributo.”

A imunidade tributária e, principalmente, a imunidade genérica (art. 150, inciso VI, CF/88), comporta todos os possíveis meios de hermenêutica. Desse modo, ressalte-se, é próprio que se averigúe a sua finalidade (interpretação teleológica), os fatos históricos que lhe ensejaram a existência (interpretação histórica), bem como se afigura possível se lhe dê alcance extensivo (interpretação extensiva).1 Na isenção, pelo contrário, limita-se o exegeta a dar-lhe o sentido que seu texto propõe, valendo-se tão-somente de uma interpretação gramatical, por não se poder ampliar norma de viés excepcional, norma de direito estrito, portanto.

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Sob outro ângulo de análise do problema, uma corrente de interpretação das leis tributárias pretende extrair conseqüência prática importante da distinção entre imunidade e isenção, porque a primeira da distinção entre imunidade e isenção, porque a primeira comportaria todos os métodos de hermenêutica, enquanto a segunda, por constituir uma exceção ao princípio de que, havendo incidência, deve ser exigido o pagamento do tributo, deveria ser interpretada estrita ou restritivamente. Reivindica-se, também, para os dispositivos constitucionais que estabelecem regras de imunidade, um método interpretativo diverso do preconizado para leis de isenção, porque, enquanto a imunidade é um instrumento de governo, a isenção, favor fiscal, constitui simples renúncia ao poder de tributar. (BORGES, 1980, p. 114)

As imunidades genéricas, sobretudo elas, por apresentarem a característica de imunizarem certas situações em vista da proteção de princípios fundamentais caros à Constituição, devem ser interpretadas de acordo com sua teleologia, sua intenção, caso em que, sempre se afigurará de bom alvitre, estender o alcance para além do seu enunciado legal, quando este não for suficiente para dar a valia jurídica própria.

Neste sentido, por exemplo, Alves (1998, p. 274), para quem, a imunidade “deve ser sempre interpretada extensivamente. O que significa dizer, deve-se extrair da norma imunizadora tudo o que na mesma se contém. Em suma, deve-se atender a intenção do legislador constituinte em toda sua plenitude.

É descabido, portanto, interpretar-se as disposições de imunidades tributárias (genéricas) mediante critérios gramaticais ou restritivos de sua eficácia normativa. Isto porque, tais preceitos imunizantes são cometidos à missão de proteger postulados constitucionais outros de elevada magnitude, dentro do contexto jurídico-político da nossa República. De modo que, reduzir-lhes o alcance ou atrofiar a intenção para a qual foi instituída, é, de forma, oblíqua, violar ou revogar o princípio/valor constitucional que dentro dela há. É, portanto, negar vigência a um princípio ou direito fundamental, o que é explicitamente vedado na presente ordem constitucional.

À guisa de fecho, arremate-se com as lúcidas palavras de Akselrad (1998, p. 406), segundo quem: “na interpretação da norma imunizante deve-se dar prevalência à efetiva realização do princípio constitucional que justifica ou inspira a imunidade.

(Novas) Imunidades genéricas

Uma vez que às imunidades genéricas se pode dar interpretação teleológica e extensiva, pelas justificações teóricas supramencionadas, o Supremo Tribunal Federal tem lançado mão de tais vetores interpretativos a fim de que as referidas imunidades tributárias alcancem situações as quais estejam compreendidas no respectivo desiderato imunizante e no princípio constitucional que tais normas carregam.

Assim, à medida que as contendas tributárias a respeito do alcance de certas imunidades genéricas foram postas a julgamento na Suprema Corte, houve o surgimento, por assim dizer, de novas imunidades genéricas. Diz-se “novas” porque não previstas, primariamente, no texto constitucional do art. 150, inciso VI, da Constituição.

Figure-se, nesta senda, que o Supremo Tribunal Federal estendeu a imunidade recíproca (art. 150, VI, “a” e § 1º, CF/88) – textualmente limitada aos entes políticos e às autarquias e fundações públicas – às empresas públicas e sociedades de economia mista que prestem serviços públicos de prestação obrigatória e exclusiva do Estado:

EMENTA: CONSTITUCIONAL. TRIBUTÁRIO. EMPRESA BRASILEIRA DE CORREIOS E TELÉGRAFOS: IMUNIDADE TRIBUTÁRIA RECÍPROCA: C.F., art. 150, VI, a. EMPRESA PÚBLICA QUE EXERCE ATIVIDADE ECONÔMICA E EMPRESA PÚBLICA PRESTADORA DE SERVIÇO PÚBLICO: DISTINÇÃO. I. - As empresas públicas prestadoras de serviço público distinguem-se das que exercem atividade econômica. A Empresa Brasileira de Correios e Telégrafos é prestadora de serviço público de prestação obrigatória e exclusiva do Estado, motivo por que está abrangida pela imunidade tributária recíproca: C.F., art. 150, VI, a. II. - R.E. conhecido em parte e, nessa parte, provido.  (BRASIL, 2010a, p. 1)

EMENTA: AÇÃO CAUTELAR. EFEITO SUSPENSIVO A RECURSO EXTRAORDINÁRIO NÃO ADMITIDO PELO TRIBUNAL DE ORIGEM. AGRAVO DE INSTRUMENTO PENDENTE DE JULGAMENTO. MEDIDA CAUTELAR CONCEDIDA PARA SUSPENDER OS EFEITOS DO ACÓRDÃO RECORRIDO. 2. Em situações excepcionais, em que estão patentes a plausibilidade jurídica do pedido - decorrente do fato de a decisão recorrida contrariar jurisprudência ou súmula do Supremo Tribunal Federal - e o perigo de dano irreparável ou de difícil reparação a ser consubstanciado pela execução do acórdão recorrido, o Tribunal poderá deferir a medida cautelar ainda que o recurso extraordinário tenha sido objeto de juízo negativo de admissibilidade perante o Tribunal de origem e o agravo de instrumento contra essa decisão ainda esteja pendente de julgamento. 3. Hipótese que não constitui exceção à aplicação das Súmulas 634 e 635 do STF. 4. Suspensão dos efeitos do acórdão impugnado pelo recurso extraordinário, até que o agravo de instrumento seja julgado. 5. Ação cautelar deferida. Unânime. (BRASIL,  2010b, p. 1)

Outrossim, no que tange à imunidade dos templos de qualquer culto (art. 150, VI, "b", CF/88), a Suprema Corte já decidiu que o efeito imunizador “deve abranger não somente os prédios destinados ao culto, mas, também, o patrimônio, a renda e os serviços ‘relacionados com as finalidades essenciais das entidades nelas mencionadas". Daí que, o Tribunal deixou imune ao imposto sobre prédio territorial urbano (IPTU), imóvel alugado pertencente a ente religioso imune. (BRASIL, 2010c, p. 1)

Na mesma esteira, quanto à imunidade tributária dos partidos políticos, sindicatos de trabalhadores e entidades educacionais e assistenciais sem fins lucrativos, prevista no art. 150, VI, “c”, da Constituição Federal. Dentre outros, pode-se citar a imunidade conferida a escolas de ensino profissionalizante subvencionadas pelos serviços sociais autônomos.

EMENTA: - Recurso extraordinário. SENAC. Instituição de educação sem finalidade lucrativa. ITBI. Imunidade. - Falta de prequestionamento da questão relativa ao princípio constitucional da isonomia. - Esta Corte, por seu Plenário, ao julgar o RE 237.718, firmou o entendimento de que a imunidade tributária do patrimônio das instituições de assistência social (artigo 150, VI, "c", da Constituição) se aplica para afastar a incidência do IPTU sobre imóveis de propriedade dessas instituições, ainda quando alugados a terceiros, desde que os aluguéis sejam aplicados em suas finalidades institucionais. - Por identidade de razão, a mesma fundamentação em que se baseou esse precedente se aplica a instituições de educação, como a presente, sem fins lucrativos, para ver reconhecida, em seu favor, a imunidade relativamente ao ITBI referente à aquisição por ela de imóvel locado a terceiro, destinando-se os aluguéis a ser aplicados em suas finalidades institucionais. Recurso extraordinário não conhecido. (BRASIL, 2010d, p.1)

Por fim, registre-se que, a imunidade cultural (art. 150, VI, “d”, CF/88) também sofreu elastério pelo Supremo Tribunal Federal que estendeu o alcance normativo às apostilas.

IMUNIDADE - IMPOSTOS - LIVROS, JORNAIS, PERIÓDICOS E PAPEL DESTINADO À IMPRESSÃO - APOSTILAS. O preceito da alínea "d" do inciso VI do artigo 150 da Carta da República alcança as chamadas apostilas, veículo de transmissão de cultura simplificado. (BRASIL, 2010e, p. 1)

CONCLUSÃO

Do exposto, observa-se que a atual jurisprudência do Supremo Tribunal Federal é no sentido de dar interpretação teleológica e, via de consequência, extensiva às imunidades tributárias genéricas (art. 150, VI, CF/88).

Isto porque, como observado, as imunidades tributárias são verdadeiras normas de incompetência, limitações mesmas da competência impositiva de instituir tributos – competência tributária. E disto se distanciam ontologicamente das isenções que, são meras hipóteses legalmente qualificadas de não-incidência.

As isenções, portanto, incidem para outras normas não virem a incidir. As imunidades, como ficou demasiadamente assentado, por retirarem a competência tributária em si, não ensejam sequer a criação de hipóteses de incidência tributária.

A hodierna jurisprudência da Suprema Corte também se assenta na premissa teórica de constituírem as imunidades, verdadeiras escolhas políticas do poder constituinte originário, daí que, em princípio, quando da aplicação daquelas normas, fazer-se necessário o deslinde da vontade do constituinte, não se podendo limitar-se à letra fria de seu texto normativo.

Igualmente, verifica-se que, as imunidades tributárias genéricas (art. 150, VI, CF/88), para além de simplesmente excluírem a competência tributária, têm por supina função a proteção de princípios e valores de elevada magnitude constitucional. A exemplo, saliente-se que a imunidade recíproca (art. 150, VI, “a”, CF/88) nada mais faz senão defender o princípio federativo, bem assim a imunidade cultural (art. 150, VI, CF/88) que foi engendrada como um anteparo a qualquer forma de ameaça ou ofensa ao direito fundamental da liberdade de consciência e expressão.

Daí que, por revelarem essa índole, (fenômeno jurídico da interpolação normativa), servindo como um prolongamento mesmo de valores e princípios fundamentais, é de bom alvitre que se investigue profundamente a teleologia da norma imunizante aplicanda, estendendo o respectivo alcance a fatos ou situações que, sobre não figurarem explicitamente no enunciado normativo, estejam compreendidos na teleologia da imunidade e do princípio fundamental nela contido.

Óbvio se faz que, nos casos acima mencionados, como, por exemplo, da Empresa Brasileira de Correio e Telégrafos (Correios) e das apostilas, uma interpretação restrita à literalidade da norma, fulminaria sobremaneira o princípio político do federalismo e o direito fundamental da liberdade de expressão, respectivamente, valores que são, de inofuscável juridicidade.

Dessa forma, a jurisprudência do Supremo Tribunal Federal ora sob enfoque, simboliza mais do que o cotidiano exercício da jurisdição constitucional. Revela a tendente transição do constitucionalismo brasileiro ao pós-positivismo. Etapa marcante do constitucionalismo contemporâneo pós-guerra, no qual se deixa de lado qualquer apego ao normativismo exarcebado, dando-se, pelo contrário, incondicional primazia à concretização dos valores constitucionais.

1Não se pode, no entanto, na análise da norma da imunidade tributária, deixar de lado o fato de que índole da imunidade tributária (norma constitucional, norma de vedação ao poder de legislar sobre imposto, norma de estrutura, norma essencialmente política) impõe ao intérprete a necessidade de utilizar, quando necessário, todos os métodos, atendendo-se sempre à Constituição com exegese ampla (no sentido de que todos os métodos, inclusive o sistemático, o teológico etc. são admitidos). É o que recomendam as decisões judiciárias e a doutrina.” (MORAES, 1998, p. 133)

REFERÊNCIAS

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Sobre o autor
Márcio Carneiro de Mesquita Júnior

Advogado. Pós-graduando em Direito Processual pela Pontifícia Universidade Católica de Minas Gerais - PUC/MINAS.

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