Artigo Destaque dos editores

Estrangeiro solicitante de asilo e refúgio no Brasil e a vedação de retirada compulsória do país

Exibindo página 2 de 2
17/07/2016 às 10:42
Leia nesta página:

4. CONCLUSÃO

Analisados os institutos jurídicos do asilo e refúgio na legislação brasileira, que alberga com status supralegal legislação internacional de direitos humanos, podemos concluir que os estrangeiros que se apresentem às autoridades de imigração brasileiras e solicitem asilo ou refúgio estão impedidos de serem retirados compulsoriamente do país, enquanto não julgado definitivamente o pedido de asilo ou refúgio pela instância decisória.

O tratamento da legislação vigente e, consequentemente, das autoridades brasileiras no tratamento do estrangeiro que deseja ingressar no Brasil ou com entrada ou estada irregular no país, ou que exerça atividade vedada, ou seja indesejável ao país, pode não estar consistente com a Constituição Federal, lei maior do país, e com compromissos internacionais de direitos humanos assumidos pelo Brasil, que integram a ordem jurídica nacional com status supralegal ou constitucional e protegem a condição de asilado ou refugiado no país, mesmo que o estrangeiro esteja na condição de espera de uma decisão administrativa sobre asilo ou refúgio.

Aos estrangeiros solicitantes de asilo ou refúgio deve ser permitido o ingresso e garantida a estada regular no Brasil, até que seja julgado o pedido pela instância administrativa decisória.

Ratificamos Xavier, no sentido de fazer “coro à literatura que costuma afirmar que é tênue a separação entre a condição do migrante e a do refugiado” (XAVIER, 2012, p. 41). Os institutos do refúgio e asilo devem ser analisados como normas de proteção ao ser humano, independentemente de sua nacionalidade, permissivos de regular ingresso no Brasil e, consequentemente, impeditivos de aplicação imediata de retiradas compulsórias de estrangeiros do Brasil.

As normas internacionais de Direitos Humanos vigentes no Brasil são determinantes para a aplicação da lei, decreto e regulamentos que especificam a práxis jurisdicional das retiradas compulsórias de estrangeiros do Brasil. A aplicação das normas em um Estado Democrático de Direito como o Brasil, que tem a dignidade da pessoa humana como fundamento da República, deve ter sempre como fito o resguardo dos direitos do homem, seja ele brasileiro ou estrangeiro.

É necessária a efetiva implementação da mudança de paradigma no trato normativo do estrangeiro no Brasil, de um viés de segurança nacional da lei e decreto da década de 1980 para um viés de direitos humanos inscritos na Constituição Federal de 1988 e compromissos de direitos humanos assumidos pelo Brasil.

O encaminhamento para julgamento, da solicitação de asilo pelo Ministro da Justiça e da solicitação de refúgio pelo Comitê Nacional para Refugiados, deve ser respeitado pelas autoridades de imigração, que são competentes tão somente para receber e formalizar as solicitações dos estrangeiros interessados por asilo ou refúgio, seja em pontos de imigração ou em prédios públicos das autoridades de imigração.

As autoridades de imigração brasileiras, servidores da Polícia Federal do Brasil, não podem adentrar no mérito dos pedidos quando da solicitação pelos estrangeiros. Portanto, até que julgado o mérito do pedido pela autoridade competente, com possibilidade de recursos administrativos e judiciais previstos na legislação, os institutos do asilo e do refúgio impedem as retiradas compulsórias dos estrangeiros, permitindo o regular ingresso e a estada do estrangeiro solicitante de asilo e refúgio no Brasil.


REFERÊNCIAS

ACCIOLYI, Hidelbrando et al. Manual de direito internacional público. São Paulo: Saraiva, 1996.

BRASIL. Anteprojeto de lei de migrações e promoção dos direitos dos migrantes no Brasil. Ministério da Justiça. Disponível em: <https:// oestrangeirodotorg.files.wordpress.com /2014/08/anteprojeto_v-final-1-libre.pdf>. Acesso em: 13 dez. 2014.

______. Constituição (1988). Constituição da república federativa do Brasil. Disponível em: <https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/Constituicao/principal.htm>. Acesso em: 13 nov. 2012.

______. Decreto n.º 678, de 6 de novembro de 1992. Disponível em: <https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/decreto/D0678.htm>. Acesso em: 25 mai. 2014.

______. Decreto nº 840, de 22 de junho de 1993. Disponível em: <https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/decreto/D0840.htm>. Acesso em: 08 dez. 2014.

______. Decreto 1.570, de 13 de abril de 1937. Disponível em: <https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/decreto/1930-1949/D1570.htm>. Acesso em: 29 nov. 2014.

______. Decreto nº 6.949, de 25 de agosto de 2009. Promulga a Convenção Internacional sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência e seu Protocolo Facultativo, assinados em Nova York, em 30 de março de 2007. Disponível em: <https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2007-2010/2009/decreto/d6949.htm>. Acesso em: 11 fev. 2015.

______. Decreto n.º 86.715, de 10 de dezembro de 1981. Disponível em: <https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/decreto/Antigos/D86715.htm>. Acesso em: 13 nov. 2012.

______. Decreto nº 61.078/67, de 26 de julho de 1967. Disponível em: <https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/decreto/D61078.htm>. Acesso em: 13 nov. 2014.

______. Informe sobre a Legislação Migratória e a Realidade dos Imigrantes. São Paulo, 2011.

______. Jurisprudência da Corte Interamericana de Direitos Humanos / Secretaria Nacional de Justiça, Comissão de Anistia, Corte Interamericana de Direitos Humanos. Tradução da Corte Interamericana de Direitos Humanos. Brasília: Ministério da Justiça, 2014b. Disponível em: <https://www.sdh.gov.br/assuntos/atuacao-internacional/sentencas-da-corte-interamericana/pdf/7-migracao-refugio-e-apatridas>. Acesso em: 14 dez. 2014b.

______. Lei n.º 6.815, de 19 de agosto de 1980. (Define a situação jurídica do estrangeiro no Brasil, cria o Conselho Nacional de Imigração). Disponível em: <https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/L6815.htm>. Acesso em: 13 nov. 2012.

______. Lei nº 9.474/1997. Define mecanismos para a implementação do Estatuto dos Refugiados e determina outras providências. Disponível em: <https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/Leis/L9474.htm>. Acesso em: 29 nov. 2014.

______. OIM – Organização Internacional para as Migrações. Relatório Geral dos Eventos de I Nível do Projeto Organização Internacional para as Migrações. Departamento de Estrangeiros do Ministério da Justiça, 2013a.

BRITO, Fausto. A politização das migrações internacionais: Direitos humanos e soberania nacional. Revista Brasileira de Estudos de Populacao, January, v. 30, n. 1, p.77-97, 2013.

CASELLA, Paulo Borta et al. Manual de direito internacional público. São Paulo: Saraiva, 1996.

CIDH - CORTE INTERAMERICANA DE DIREITOS HUMANOS. OPINIÓN CONSULTIVA OC-18/03 DE 17 DE SEPTIEMBRE DE 2003, SOLICITADA POR LOS ESTADOS UNIDOS MEXICANOS. Disponível em: <https://www.corteidh.or.cr/docs/opiniones/seriea_18_esp.pdf> Acesso em: 28 maio 2014.

______; CASO “LA ÚLTIMA TENTACIÓN DE CRISTO” (OLMEDO BUSTOS Y OTROS VS. CHILE). SENTENCIA DE 5 DE FEBRERO DE 2001. Disponível em: <https://www.cidh.oas.org/relatoria/showDocument.asp?DocumentID=10>. Acesso em: 14 dez. 2014.

______. OPINIÓN CONSULTIVA OC-04/84 DEL 19 DE ENERO DE 1984, PROPUESTA DE MODIFICACIÓN A LA CONSTITUCIÓN POLÍTICA DE COSTA RICA RELACIONADA CON LA NATURALIZACIÓN. Disponível em: <https://www.corteidh.or.cr/docs/opiniones/seriea_04_esp.pdf>. Acesso em: 08 dez. 2014.

DOLINGER, Jacob. Direito Internacional privado: (parte geral). 10ª Ed. Rio de Janeiro: Forense, 2011.

MENDES, Gilmar Ferreira et. al. Curso de Direito Constitucional. São Paulo. Saraiva, 2007.

MOREIRA, Felipe Kern. Seria a ´cordialidade oficial brasileira´, a diplomacia do ´homem cordial´?. In: Revista Conjunção Austral, v. 4, nº 18, UFRGS, 2013. Disponível em: <https://seer.ufrgs.br/index.php/ConjunturaAustral/article/view/40866/25975>. Acesso em: 15 dez. 2014.

ONU – Organização das Nações Unidas. Alto Comissariado das Nações Unidas - ACNUR. Refúgio no Brasil. Uma análise estatística (2010-2013). ACNUR Brasil, 2014.

______. Declaração Universal dos Direitos Humanos. Adotada e proclamada pela resolução 217 A (III) da Assembléia Geral das Nações Unidas em 10 de dezembro de 1948. Disponível em: <https://unesdoc.unesco.org/images/0013/001394/139423por.pdf>. Acesso em: 08 dez. 2014.

Fique sempre informado com o Jus! Receba gratuitamente as atualizações jurídicas em sua caixa de entrada. Inscreva-se agora e não perca as novidades diárias essenciais!
Os boletins são gratuitos. Não enviamos spam. Privacidade Publique seus artigos

______. Declaração Final e Plano de Ação. Conferência Mundial sobre os Direitos Humanos. Viena. 1993.

______. Draft articles on the expulsion of aliens, 2014b. Disponível em: <https://legal.un.org/ilc/texts/instruments/english/draft%20articles/9_12_2014.pdf>. Acesso em: 14 dez. 2014.

PIOVESAN, Flávia. Direitos Humanos e o Direito Constitucional Internacional. 12ª Ed. Ed. Saraiva. 2011.

______. Código de direito internacional dos direitos humanos anotado. São Paulo: DPJ Editora. 2008.

POOLE, Hilary (org) et al. Direitos Humanos: referências essenciais. Trad. Fábio Larsson. São Paulo. EdUSP, Núcleo de Estudos da Violência. 2007.

PORTELA, Paulo. Direito Internacional Público e Privado. 2ª Ed. Podivm. Salvador. 2010.

RAMOS, André de Carvalho. Curso de Direitos Humanos. São Paulo. Saraiva, 2014.

______. Teoria geral dos direitos humanos na ordem internacional. 2ª Ed. São Paulo. Saraiva, 2012.

REIS, Rossana Rocha. Soberania, Direitos Humanos e Migrações Internacionais. Revista Brasileira de Ciências Sociais. Vol. 19. Nº 55, 2004. Disponível em: <https://www.scielo.br/pdf/rbcsoc/v19n55/a09v1955.pdf>. Acesso em: 21 fev. 2015.

______. A política do Brasil para as migrações internacionais. Contexto int. [online], v. 33, n. 1, pp. 47-69, 2011.

REZEK, José Francisco. Direito internacional público: curso elementar. 13. Ed. São Paulo. Saraiva. 2011.

SARLET, Ingo Wolfgang. Dignidade da Pessoa Humana e Direitos Fundamentais na Constituição Federal de 1988. Porto Alegre: Livraria do Advogado. 2012.

______. A eficácia dos direitos fundamentais: uma teoria geral dos direitos fundamentais na perspectiva constitucional. 10. ed. Porto Alegre: Livraria do advogado Editora, 2010.

______. Dimensões da Dignidade. Ensaios de Filosofia do Direito e Direito Constitucional. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2013.

SILVA, João Carlos Jarochinski. A europeização das políticas migratórias para extracomunitários. 2014. 199. f. Tese (Doutorado em Ciências Sociais) – Pontifica Universidade Católica de São Paulo, 2014. Disponível em: <https://www.sapientia.pucsp.br/tde_busca/arquivo.php?codArquivo=17714>. Acesso em: 08 jan. 2015.

SILVA, José Afonso da. Curso de Direito Constitucional Positivo. 32ª São Paulo. Malheiros. 2009.

VENTURA, Deisy. Política Migratória, uma dívida do Brasil. 2012. Disponível em: <https://www.univesp.ensinosuperior.sp.gov.br/preunivesp/4274/pol-tica-migrat-ria-uma-d-vida-do-brasil.html>. Acesso em: 21 jul. 2014.

XAVIER, Fernando César Costa. Migrações Internacionais na Amazônia Brasileira: impactos na política migratória e na política externa. 2012. 192. f. Tese (Doutorado em Relações Internacionais e Desenvolvimento Regional) - Programa de Pós-Graduação interinstitucional da Universidade de Brasília/FLACSO-Brasil/UFRR, Brasília, 2012.


Nota

1 https://www.justica.gov.br/seus-direitos/estrangeiros/conferencia-nacional-sobre-migracoes-e-refugi

Assuntos relacionados
Sobre o autor
Alan Robson Alexandrino Ramos

Doutor em Ciências Ambientais. Mestre em Sociedade e Fronteiras. Especialista em Segurança Pública e Cidadania, todos pela Universidade Federal de Roraima. Bacharel em Direito pela Universidade Federal do Ceará e Bacharel em Filosofia pela Unisul. Delegado de Polícia Federal.

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

RAMOS, Alan Robson Alexandrino. Estrangeiro solicitante de asilo e refúgio no Brasil e a vedação de retirada compulsória do país. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 21, n. 4764, 17 jul. 2016. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/43467. Acesso em: 22 dez. 2024.

Leia seus artigos favoritos sem distrações, em qualquer lugar e como quiser

Assine o JusPlus e tenha recursos exclusivos

  • Baixe arquivos PDF: imprima ou leia depois
  • Navegue sem anúncios: concentre-se mais
  • Esteja na frente: descubra novas ferramentas
Economize 17%
Logo JusPlus
JusPlus
de R$
29,50
por

R$ 2,95

No primeiro mês

Cobrança mensal, cancele quando quiser
Assinar
Já é assinante? Faça login
Publique seus artigos Compartilhe conhecimento e ganhe reconhecimento. É fácil e rápido!
Colabore
Publique seus artigos
Fique sempre informado! Seja o primeiro a receber nossas novidades exclusivas e recentes diretamente em sua caixa de entrada.
Publique seus artigos