Ausência de hierarquia entre advogados e magistrados à luz do art. 6º da Lei 8.906/94

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10/10/2015 às 11:25
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O presente trabalho tem como tema central a relação entre Advogados e Magistrados, especialmente a ausência de hierarquia expressa no artigo 6º da Lei Federal nº 8.906 de 1994, que prevê que não há hierarquia nem subordinação entre Advogados, Magistrados.

1. INTRODUÇÃO

O presente trabalho tem como tema central a relação entre Advogados e Magistrados, especialmente a ausência de hierarquia expressa no artigo 6º da Lei Federal nº 8.906 de 1994, que prevê que não há hierarquia nem subordinação entre Advogados, Magistrados e membros do Ministério Público, devendo todos tratar-se com consideração e respeito recíprocos, neste contexto, num primeiro momento busca-se trazer algumas noções preliminares sobre o assunto, tais como conceitos, análise doutrinária e histórica sobre o tema.

Em seguida, propõe-se um breve estudo legislativo acerca dos dispositivos relacionados a tema, abordando um possível conflito de normas, dando-se especial enfoque ao dever de urbanidade que representa o instrumento necessário da manutenção da Ausência de Hierarquia prevista no principal instrumento disciplinador da conduta do Advogado. Faz-se também um levantamento jurisprudencial de forma a mostrar como o Poder Judiciário e a Comissão de Defesa das Prerrogativas do Advogado da Ordem dos Advogados do Brasil – Seccional Piauí tem se posicionado em relação à violação de prerrogativas no Estado do Piauí.

O tema merece destaque e estudo, especialmente no tocante ao desrespeito à ausência de hierarquia, considerando a posição histórica que os Advogados sempre assumiram na batalha para limitar os excessos do poder estatal, nos últimos anos vimos crescer o que podemos chamar de judicialização da vida social, o judiciário decidindo sobre tudo, tornando-se tão onipresente e onipotente que fazem de seus membros verdadeiros deuses, o Juiz passou a ter “superpoderes”. De modo sintético, podemos dizer que as demasiadas regalias conferidas aos membros do judiciário, fazem com que os seus membros passem a sentirem-se muito importantes e a praticar excessos, daí o natural embate com a Advocacia.

A cultura brasileira, nos últimos anos, elevou a Magistratura à tamanha grandeza, que o Juiz não se considera um servidor público, se acha acima da lei e se coloca num pedestal, agindo com arrogância e prepotência com os Advogados e com os cidadãos que o procuram, a anedota “juízes pensam que são Deus e Desembargadores tem certeza”, mostra claramente o mal que atinge a Magistratura.

Urge ultrapassar esse entendimento, pois o Juiz não é mais o dono do processo, não cabe a ele exclusivamente a interpretação da lei, no direito contemporâneo o Advogado tem participação crucial na prestação jurisdicional, ele o primeiro estudioso da lei no caso concreto, o Juiz exerce função balizadora, não detentora da razão, segundo o principio da inércia, deve se ater aos pedidos das partes.

Considerando tal posição conferida à Magistratura, na prática o que observamos é uma desvalorização da Advocacia, segundo relatório da Comissão de Defesa das Prerrogativas do Advogado da Seccional Piauiense da Ordem dos Advogados do Brasil, no ano de 2013 um terço de todas as denuncias recebidas foram oriundas de abusos de Magistrados, esses dado demonstra a realidade do cotidiano dos Advogados.

Esses abusos são cotidianos, infelizmente o reverencioso tratamento dado aos maus Magistrados, em detrimento da independência e insubordinação conferida à classe advocatícia, corresponde a abdicar a virtude mais festejada da Advocacia, a coragem de exigir e lutar pela Justiça, o que contribui mais ainda para o desrespeito à norma federal que confere paridade e ausência de hierarquia.

A fim de esclarecer e evoluir na temática proposta será abordada a problemática da impunidade, bem como a insuficiência das instituições que preparam os novos bacharéis, para atingir nossos objetivos pretende-se trazer a lume um modelo alternativo de solução do tema, especialmente quanto à adoção de medidas repressivas bem como da conscientização do valor da matéria apresentada.


2. NOÇÕES FUNDAMENTAIS

A constituição Federal de 1988 prevê em seu artigo 5º, que todos são iguais perante a lei, neste sentido necessário perpassar pelas explanações de Rousseau1 (1985, p. 48.) sobre a igualdade, nestes termos:

Concebo, na espécie humana, duas espécies de desigualdade: uma a que chamo de natural ou física, por ser estabelecida pela natureza, e que consiste na diferença das idades, da saúde, das forças do corpo e das qualidades do espírito ou da alma; a outra, a que se pode chamar desigualdade moral ou política, por depender de uma espécie de convenção e ser estabelecida, ou pelo menos autorizada, pelo consentimento dos homens. Esta consiste nos diferentes privilégios que alguns usufruem em prejuízo dos outros, como serem mais ricos, mais reverenciados e mais poderosos do que eles, ou mesmo em se fazerem obedecer por eles.

Tal princípio aliado ao art. 6º da lei 8906/94, que prevê a ausência de subordinação e hierarquia entre Advogados e Magistrados, observa-se que o legislador garantiu a independência do Causídico na relação jurisdicional, considerando que Juízes, são autoridades detentoras do poder de polícia, podendo julgar com eficácia cogente, já os Advogados são representantes das partes, por isso mesmo é que há regras de convivência, e estas devem ser respeitadas.

2.1. HISTÓRIA DA ADVOCACIA

A Advocacia é uma das mais antigas profissões da história da humanidade. Sendo considerada muitas vezes polêmica pela própria liberdade em antinomia com o livre arbítrio. Tendo como primeiros Advogados existentes conhecidos pela história, Moisés, no Êxodo da Bíblia Sagrada, quando assumiu a liderança da defesa de seu povo.

No Brasil, explica Paulo Lôbo2 (2002, p. 3) que:

Os historiadores da nossa profissão costumam apresentar como primeiro Advogado, no Brasil, Duarte Peres, o bacharel de Cananéia, degredado deixado em Cananéia no ano de 1501. Durante a Colônia, o quadro geral do foro brasileiro era desolador: Magistratura ignorante e corrompida de um lado e de outro, rabulice analfabeta e trapaceira.

A Advocacia Brasileira no período colonial era de certa forma livre, contudo o advento das Ordenações Filipinas no Brasil trouxe uma Advocacia mais regrada, tornando este conhecimento restrito à Corte, era necessário cursar oito anos de direito na Universidade de Coimbra, escolhendo áreas de direito civil ou canônico, ou as duas. Essa dificuldade se dava ao deslocamento até Portugal. Com o Alvará régio de 24 de julho de 1713, os que não fossem da Corte poderiam, desde que pessoa idônea, tirando Provisão, exercer a profissão, Em 11 de agosto de 1827, quando foram criados os cursos jurídicos em Olinda e São Paulo. No ano de 1843 foi criado o Instituto dos Advogados do Brasil3.

Em 1851, o projeto do Estatuto com a criação da Ordem dos Advogados foi aprovado pelo Senado, mas detido em seguida na Câmara dos Deputados. De 1852 a 1853, a questão voltou a ser discutida, permanecendo, entretanto, sem solução. Em 1857 é apresentado discurso frente ao Ministro da Justiça; em 1865, o Instituto representa ao Governo. Em suas reuniões, o Instituto dos Advogados Brasileiros continuava a discutir o projeto de lei de criação do que seria a Ordem dos Advogados do Império, que nunca viria a existir, apesar de mais tentativas em 1866 e 1880. Esta última propunha a criação do Instituto da Ordem dos Advogados e dizia que as profissões de Advogado e solicitador constituíam múnus público que só poderia ser exercido por cidadãos brasileiros e trataria das incompatibilidades, impedimentos e regime de inscrição. Ainda declarava que seriam membros do instituto todos que nos respectivos distritos exercessem legal e efetivamente a Advocacia, contudo o projeto não teve prosseguimento.

Com a República, houve tentativas em 1904, em 1911 e, em 1915, apenas em 1930 seria criada a Ordem dos Advogados do Brasil pelo artigo 17 do Decreto 19.408. Em 14 de dezembro de 1931, pelo Decreto 20.784, o Governo Provisório aprovou o Regulamento. Em 13 de março de 1933, era aprovado o Regimento Interno e no dia 25 de julho de 1934 foi aprovado, para viger a partir de 15 de novembro do mesmo ano, o Código de Ética da Ordem. Em 1988, com a promulgação da Carta Magna brasileira, a Advocacia foi considerada função essencial da justiça, art. 133, Constituição Federal4.

No Piauí, em 1935, ocorreu a formatura da 1º Turma do Curso de Direito no Piauí, integrada por dezesseis alunos5. Vale ressaltar, ainda, que, antes da edição do Estatuto da Ordem dos Advogados do Brasil pela Lei 8.906/94, vigente na atualidade, existiu a Lei 4.215, de 27 de abril de 1963. A partir de 1935, com a demonstração crescente de tendência ditatorial do Governo Vargas, com prisões arbitrárias fundadas na Lei de Segurança Nacional, a OAB inicia sua ativa participação política na defesa das liberdades e da democracia, que seria sua marca registrada até os tempos atuais.

A Lei 4.215, de 27 de abril de 1963, anterior Estatuto da Advocacia, trazia em seus artigos 68 e 69, proteção ao Advogado, vejamos:

Art. 68. No seu ministério privado o Advogado presta serviço público, constituindo, com os juízes e membros do Ministério Público, elemento indispensável à administração da Justiça.

Art. 69. Entre os juízes de qualquer instância e os Advogados não há hierarquia nem subordinação, devendo-se todos consideração e respeito recíprocos.

Observemos que àquela época já era necessário a proteção do Causídico ante a Magistratura, a lei supra já assegurava, ao Advogado, direitos elementares ao exercício da profissão,

2.2. DA AUSÊNCIA DE HIERARQUIA

A ausência de hierarquia deve ser tratada como prerrogativa primeira do cidadão, que busca do Estado uma resposta jurisdicional justa ao seu direito, e o faz através de Advogado, importante frisar que os cidadãos é que são os detentores de prerrogativas, os Advogados, no exercício de seu mister, utilizam-se de tais direitos a eles outorgados. Nas palavras de Paulo Lobo (2007, p. 53):

Se, no passado, prerrogativa podia ser confundida como privilégio, na atualidade, prerrogativa profissional significa direito exclusivo e indispensável ao exercício de determinada profissão no interesse social. Em certa medida é direito-dever e, no caso da Advocacia, configura condições legais de exercício de seu múnus público.

A norma em comento exalta o Advogado, para que, em sua função de defender e pleitear, não precise se dobrar perante o todo poderoso Juiz. Não haver hierarquia significa que Advogado e Juiz estão no mesmo nível. Devem respeitar-se mutuamente, sem superioridade. O furor dos ânimos ou o choque de posições dos envolvidos numa demanda são decorrências naturais ou inevitáveis do confronto, enquanto que o dever do Advogado é ser parcial, o do Juiz, ser imparcial, ou seja, se o Advogado sofrer inibição na sua atuação funcional, cerceada estará também a própria Justiça.

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A Magistratura e a Advocacia têm indispensável interligação, considerando que o desrespeito a algum, de alguma forma o outro será atingido, por isso o tema da Urbanidade está disciplinado tanto no Código de ética do Advogado, quanto na Lei orgânica da Magistratura, o que será demonstrado à frente.

Vejamos a postura de alguns doutrinadores sobre o Juiz6, na visão de Moacir Amaral Santos, o Juiz, portanto, sob a tradicional perspectiva nacional, seria detentor de soberania, apto a exercer os “escopos metajurídicos da jurisdição”. Para Gabriel de Rezende Filho, “É a figura central do processo”, Chiovenda assevera “É a coluna vertebral da relação processual”; É o sujeito mais eminente da relação processual segundo Manzini, Frederico Marques. Distingue-se das partes - diz Carnelutti - não só porque lhe são atribuídos poderes, mas, especialmente, pela sua posição superior às mesmas.

Neste sentido, observamos que a figura do Juiz, quase sempre é associada à superioridade, assim, merece ser superado esse entendimento posto que os servidores públicos que exercem a Magistratura merecem o tratamento condigno com a profissão, porém não são mais os donos do processo, o Juiz todo poderoso não devia existir numa sociedade democrática, tampouco ser endeusado.

Observa-se na conduta do legislador, na criação do art. 6º, a clara intenção de equilíbrio entre esses agentes essenciais à justiça. Assim, observa-se que a atuação do Advogado no processo chega a ser mais complexa que a do Juiz, considerando que o Magistrado pode compor seu convencimento, livremente, o Advogado, ao revés, deve adaptar seu convencimento ao interesse do seu constituinte.

Aliás, a democracia só se satisfaz em um sistema de freios e contrapesos, de um lado o Estado representado pelo Juiz, de outro o povo que outorga o Advogado, dando a este o caráter de indispensável à administração da justiça.

2.2.1. Hierarquia

Hierarquia segundo o dicionário Aurélio7 (2015), significa uma ordem de subordinação dos poderes eclesiásticos, civis e militares, ou seja é uma ordem de elementos de acordo com o seu valor. Trata-se da gradação de pessoas, animais ou objetos em função de critérios de classe, tipologia, categoria ou outro tópico que permita desenvolver um sistema de classificação. O conceito tende a ser associado ao poder, que é a faculdade para fazer algo ou o domínio para mandar.

A ausência hierarquia, por conseguinte, tratada no Estatuto da OAB, constitui uma prerrogativa de tratamento, posto que a independência do Advogado é condição necessária para o perfeito funcionamento da prestação jurisdicional.

A Advocacia, só se pode exercer com irrestrita liberdade e respeito, onde haja um Estado Democrático de Direito. Exemplo disto é que nos regimes autoritários ou de exceção, os Advogados são sempre alvo de perseguições.

2.2.2. Dever de urbanidade

Rui Barbosa8 escreveu que "se entre amigos se não deve discrepar nunca do respeito, condição da estima, entre adversários nunca se deve deslizar da urbanidade, freio aos desmedimentos das paixões". O parágrafo único do artigo 6º da Lei em comento prevê: "As autoridades, os servidores públicos e os serventuários da Justiça devem dispensar ao Advogado, no exercício da profissão, tratamento compatível com a dignidade e condições adequadas a seu desempenho". Tratamento compatível com a dignidade nada mais é senão a urbanidade, que é que o contraponto da violência, na definição de Houaiss (2015), é o conjunto de formalidades e procedimentos que demonstram boas maneiras e respeito entre os cidadãos, isto porque por detrás da toga e da beca, Magistrado e Advogado também são cidadãos.

A Urbanidade termo muito utilizado no meio jurídico, contudo, pouco colocado em prática nos corredores, nas audiências e especialmente nos gabinetes, prova disto são os inúmeros processos em Corregedorias exatamente fundamentados na falta de urbanidade de Magistrados e servidores para com os Advogados.

O Código de Ética e Disciplina aborda o tema nos artigos 44 e 45 vejamos:

Art. 44: Deve o Advogado tratar o público, os colegas, as autoridades e os funcionários do Juízo com respeito, discrição e independência, exigindo igual tratamento e zelando pelas prerrogativas a que tem direito.

Art. 45: Impõe-se ao Advogado lhaneza, emprego de linguagem escorreita e polida, esmero e disciplina na execução dos serviços.

Da mesma forma a Lei Orgânica da Magistratura prevê no seu art. 35. que são deveres do Magistrado:

IV - tratar com urbanidade as partes, os membros do Ministério Público, os Advogados, as testemunhas, os funcionários e auxiliares da Justiça, e atender aos que o procurarem, a qualquer momento, quando se trate de providência que reclame e possibilite solução de urgência.

Infelizmente não é o que se observa no cotidiano judiciário. O renomado Calamandrei9 leciona "Juiz que falta ao respeito devido ao Advogado, ignora que beca e toga obedecem à lei dos líquidos em vasos comunicantes: não se pode baixar o nível de um, sem baixar igualmente o nível do outro".

2.2.3. Violação de Prerrogativas

Para o fiel desempenho do seu “múnus” ao Advogado cabe, a prerrogativa, que lhe é dada por força e autoridade da lei, de velar pela intangibilidade dos direitos daquele que o constituiu. Importante citar as palavras do Presidente da Comissão de Defesa das Prerrogativas da OAB/PI, Antônio Sarmento de Araújo Costa, verdadeiro mestre e combatente eficaz na defesa das Prerrogativas, “O Advogado que mitiga suas prerrogativas não é merecedor delas...”, assim as prerrogativas profissionais são direitos indisponíveis, não podendo o Advogado recusá-las, tampouco, reduzi-las, ora, se o Código de Ética (lei 8.906/94), expressa claramente tais direitos e deveres, tratando-se de norma Federal de exigência “erga omnes”, porque estes não são respeitados? Adiante tentaremos responder tal questionamento.

Marco histórico, as palavras do Ministro Celso de Mello10 em decisão monocrática, julgamento em 14/02/2006 no HC 88.015-MC/DF DJ de 21/02/20006, vejamos:

O Advogado - ao cumprir o dever de prestar assistência técnica àquele que o constituiu, dispensando-lhe orientação jurídica perante qualquer órgão do Estado - converte, a sua atividade profissional, quando exercida com independência e sem indevidas restrições, em prática inestimável de liberdade. Qualquer que seja o espaço institucional de sua atuação (Poder Legislativo, Poder Executivo ou Poder Judiciário), ao Advogado incumbe neutralizar os abusos, fazer cessar o arbítrio, exigir respeito ao ordenamento jurídico e velar pela integridade das garantias jurídicas - legais ou constitucionais - outorgadas àquele que lhe confiou a proteção de sua liberdade e de seus direitos, dentre os quais avultam, por sua inquestionável importância, a prerrogativa contra a auto-incriminação e o direito de não ser tratado, pelas autoridades públicas, como se culpado fosse, observando-se, desse modo, as diretrizes, previamente referidas, consagradas na jurisprudência do Supremo Tribunal Federal.

Todo Advogado deve ser um aferrado defensor das prerrogativas, pois, as violações tendem a crescer à medida que são toleradas, inconscientemente o Advogado, que baixa a cabeça diante do abuso, contribui para o seu desrespeito.

Uma das medidas repressivas às violações de prerrogativas é a proposta que criminaliza a conduta que viole atos, manifestações, direitos ou prerrogativas dos Advogados. O texto altera o Código Penal (Decreto-Lei 2.848/40) e passa a punir esse tipo de conduta com pena de detenção de três meses a um ano, e multa. As mudanças estão no Projeto de Lei 7508/14.

Conquanto os direitos dos profissionais estejam presentes no Estatuto da Advocacia, Lei 8.906 de 1994, não há punição regulamentada para coibir os transgressores que abusam do poder ou violam tais prerrogativas. O abuso de poder e as violações das prerrogativas profissionais são claras, recorrentes e flagrantes, muitos são os casos que ferem de morte o princípio da ausência de hierarquia entre Magistrados e Advogados, alguns merecem atenção e esclarecimentos, tanto para Magistrados quanto para os Advogados desavisados.

Desde a edição da lei 11.382/06, que alterou o artigo 365, inciso IV do Código de Processo Civil, o Advogado possui fé publica, necessitando apenas, declarar, seja em petição inicial ou intercorrente, que tais cópias são verdadeiras, tendo presunção de que tal afirmativa é verdadeira, contudo, muitos Magistrados ainda permanecem solicitando certidões de autenticidade dos documentos trazidos pelos Advogados, sendo tal comportamento flagrantemente ilegal.

Desrespeito também se observa em audiência, quando o Juiz manda o Advogado calar a boca ilegalmente, exacerbando do seu poder, em diversos Fóruns, portarias são baixadas, proibindo o Advogado de ter vista do processo sem procuração ou adentrar em sede de secretaria. Frise-se que, a postura do Magistrado em relação ao causídico, reflete no comportamento dos serventuários da justiça, que passam a tratá-los desrespeitosamente. Seria o Magistrado um desconhecedor da lei 8906/94? Trata-se de clara demonstração de autoritarismo.

2.2.4. Dados da Comissão de Defesa das Prerrogativas do Advogado da OAB/PI.

Segundo relatório da Comissão de Defesa das Prerrogativas do Advogado da Seccional Piauiense da Ordem dos Advogados do Brasil, no ano de 2013 um terço de todas as denuncias recebidas foram oriundas de abusos de Magistrados, esses dado demonstra a realidade do cotidiano dos Advogados.

Segundo o site da OAB - Seccional São Paulo no ano de 2014, um levantamento realizado mostra que, em média, no Estado que concentra 50% dos profissionais em atuação no Brasil, são abertos 1.200 de processos de violação por ano. Nos últimos três anos, a seccional paulista da Ordem expediu mais de 7.000 ofícios a autoridades e órgãos públicos acusados de violar as prerrogativas, foram registrados 230 pedidos de desagravo e 112 foram concedidos.

No Piauí a Comissão de Defesa das Prerrogativas do Advogado (CDPA) é órgão permanente do Conselho Seccional, responsável por dar cumprimento à missão institucional prevista no artigo 44, II, do Estatuto da Advocacia e da OAB (Lei 8.906/94), que confere à Ordem dos Advogados do Brasil, dentre outras finalidades, a de promover, com exclusividade, a representação e defesa dos Advogados em todo o país.

Segundo a Cartilha de Prerrogativas da OAB/PI (2014) são formas de defesa das Prerrogativas dos Advogados, a Representação Disciplinar, que é Processo administrativo instaurado perante o órgão (em regra, Corregedoria) com competência para fiscalizar e manter a disciplina do agente público que tenha violado qualquer prerrogativa da Advocacia. Tem efeitos pedagógicos em meio a outros agentes públicos. E em casos flagrantes, é formulado pedido de afastamento preventivo do agente público transgressor dos direitos dos Advogados.

A Representação Criminal, considerando que o abuso de autoridade é tipificado como infração penal (Lei 4.898/65, art. 6º), a OAB, nesses casos tem demandado o Ministério Público a fim de que seja promovida a persecução penal em face do agente violador das prerrogativas da Advocacia, sem prejuízo de outras tipificações por força de eventual concurso de crimes. O Pedido de Providências, que é todo e qualquer processo administrativo instaurado pela OAB com a finalidade de suspender e/ou anular ato que venha a desrespeitar as prerrogativas dos Advogados. A Assistência, que é modalidade de intervenção em inquéritos ou processos (sejam criminais, administrativos e/ou cíveis lato sensu) nos quais os inscritos na OAB tenham sido indiciados, acusados ou ofendidos no exercício da Advocacia.

Também muito utilizado o Acompanhamento Preventivo, posto à disposição do Advogado que manifeste fundado receio de sofrer violação em suas prerrogativas profissionais. O Desagravo Público, este é encaminhado ao Conselho Seccional, que promove a sessão solene de desagravo em favor do Advogado ofendido em razão do exercício profissional ou de cargo ou função de órgão da OAB, dentre outras como diligencia, expedição de ofícios e Reuniões com autoridades.

Abaixo gráfico elaborado pela Comissão de Defesa das Prerrogativas do Advogado, Seccional Piauí:

Observemos que a falta de urbanidade e o acesso à secretaria e carga de processo somam 39% das denuncias de violações, dado que demonstra o cotidiano da Advocacia, e estas modalidades de violações estão mais ligadas à Magistratura, pois os servidores que destratam ou impedem o acesso dos Advogados quase sempre agem com a conivência do Magistrado responsável pela vara.

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Sobre a autora
Islanny Oliveira

Advogada<br>Atuante nas áreas de DIREITO DO CONSUMIDOR, TRABALHISTAS, ELEITORAL, PREVIDENCIÁRIO, FAMÍLIA, CAUSAS CÍVEIS.

Informações sobre o texto

Este texto foi publicado diretamente pelos autores. Sua divulgação não depende de prévia aprovação pelo conselho editorial do site. Quando selecionados, os textos são divulgados na Revista Jus Navigandi

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