Superlotação carcerária x pena alternativa

10/10/2015 às 15:02
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O presente artigo versa sobre as dificuldades de infraestrutura, condições humanas e superlotação do sistema carcerário nacional.

  

RESUMO

O presente artigo versa sobre as dificuldades de infraestrutura, condições humanas e superlotação do sistema carcerário nacional, sendo de outorga do Direito Penal Nacional e tendo por objetivo conciliar os problemas do sistema de cárcere convencional com a necessidade de abordagem mais a fundo das penas alternativas previstas na lei brasileira. As penas alternativas divididas entre suas modalidades de prestação de serviços à comunidade, em que o indivíduo presta serviço em troca de absolvição de seu delito, sem ser obrigado e sem interferir na sua rotina profissional, destinando seu tempo, habilidades e engajamento a ações benéficas a sociedade que o mesmo lesou; pena pecuniária, que incube o réu de ressarcir a vítima ou dependente, na ausência da vítima, ou entidade pré determinada como forma de cumprir sua pena, sendo respeitada as condições financeiras e econômicas do mesmo; Limitação de fim de semana, em que o indivíduo deve se apresentar a local determinado por cinco horas durante sábados e domingos e receber treinamentos, palestras e outras atividades que visem ressocializá-lo na sociedade; interdição temporária de direito, que implica sobre ato ilícito sobre a função exercida ou sobre seu direito de dirigir; Perdas de Bens e Valores em decorrência de enriquecimento ilícito decorrente de atividade fraudulenta e criminal em favor ao fundo penitenciário estadual, e na sua falta o nacional e; multa substitutiva, que substituí a pena por quantia pecuniária em favor da União. Desse modo, o estudo está dividido em 3 capítulos, sendo o primeiro a apresentação do histórico do sistema carcerário nacional, o segundo a realidade em números do sistema e por fim as penas alternativas previstas em lei no Brasil. 

Palavras-chave: Direito Penal. Sistema Carcerário Nacional. Penas Alternativas.

 INTRODUÇÃO

Tido como problema no mundo todo, o Sistema Prisional leva muitos juristas a levantarem questões em busca de soluções para os mais variados problemas ligados ao cárcere e restrição da liberdade individual. Celas lotadas, crimes contra os direitos humanos, más condições de higiene e problemas de infraestrutura são alguns dos problemas enfrentados por governos e sociedades na maioria dos países.

No Brasil a realidade é ainda mais problemática, enfrentando índices elevados de superlotação em todos os estados da união, acarretando em cerca de 50% o déficit de vagas no sistema carcerário nacional, o que postula o país como uma potência mundial nesse sórdido aspecto. E essa realidade poderia se tornar ainda mais caótica se os crimes com penas domiciliares fossem revertidos em prisões comuns.

Esse estudo tem como intuito apresentar números do Conselho Nacional de Justiça quanto a superlotação das prisões de todo pais, apresentando tabelas que comprovem a necessidade eminente de utilização e desenvolvimento das penas alternativas no país como meio de desafogar o falido sistema carcerário.

Tal abordagem se faz necessária pois reitera o alerta quanto ao assunto e coloca em foco uma discussão até então pouco abordada que é a utilização das penas alternativas como meio de punir um indivíduo por um crime sem necessariamente restringir em totalidade sua liberdade.

O estudo está dividido em três partes que visam traçar uma linha entre as mesmas, partindo do histórico do sistema carcerário nacional, suas mudanças, evolução das leis de tratamento de presos e inserção do Brasil em discussões mundiais; a realidade do sistema carcerário nacional com base nos números do Conselho Nacional de Justiça e sendo criando parâmetros de comparação entre Estados e Regiões e; apresentação dos tipos de penas alternativas e as condições de encaminhamento das mesmas com base em seus respectivos artigos do Código Penal Brasileiro.

2 HISTÓRICO DO CENÁRIO CARCERARIO E DO SISTEMA PRISIONAL BRASILEIRO

Em síntese, apresenta-se o direito penitenciário como um conjunto de normas jurídicas, previamente estabelecidas, que disciplinam o tratamento dos sentenciados em decorrência de ato infracional cometido. No que tange ao conceito de prisão, a mesma se evidencia como a concepção distinta de que a pena se estabelece como a retribuição do mal do ato criminal por outro mal, diante de, por exemplo, a privação a liberdade. Embora repleta de contradições e debates indissolúveis, a prisão figura como um mal necessário, no pensamento contemporâneo. (FERREIRA, 1997; BITTENCOURT, 1993)

No Brasil, o cenário carcerário apresenta doutrina reversa à inclusão ou ressocialização dos encarcerados, sendo comum e aculturado em nosso cotidiano a existência de tratamento desumano, degradante e de cunhado formador de agravamento criminal. Contraste deveras lúcido da política pública voltado ao respeito da dignidade da pessoa humana, como enraizado nos valores do SPB (Sistema Penal Brasileiro). (XAVIER, 2010)

O enraizamento histórico da punição decorrente de ato divergente, infracional ou incomum, abstrai-se de nossa herança histórica, mediante conflitos e punições concebidas como forma de coibição de repetição do ato causador. Na Idade Média, surgem os primeiros relatos da pena de prisão decorrente de ato infracional, tendo sua origem evidenciada em mosteiros da época, em época não precisa, em torno do século V. Seu surgimento visava coibir desvios de condutas entre monges e clérigos, baseando-se nos preceitos impostos. A prisão servia como momento de reflexão, meditação, para que assim, pudessem se arrepender da falha, e centrando-se ao caminho novamente (FERREIRA, 2013)

Ferreira (2013, p.60) ainda explica que “Dentre os anos de 1728 a 1686 a.C., vigorou em Babilônia o Código de Hammurabi, a famosa pena de Talião “olho por olho, dente por dente, pé por pé”. Nesse molde, considerava-se que, dever-se-ia punir o indivíduo com o mesmo ato deferido, logo, se lhe fossem arrancado um olho, a pena seria ter um olho arrancado.

Mas é no fim do século XVIII que surgem os primeiros protótipos do que viriam a ser as cadeias que temos hoje. Foi John Howard, xerife do condado de Bedfordshire. Ao assumir e conhecer a prisão de seu condado, Howard decide conhecer e estudar as demais prisões da Inglaterra. Em 1777 lança sua obra pioneira no assunto e norteadora até hoje: “The State of Prisons in England and Wales” (tradução livre: O Estado das Prisões na Inglaterra e Gales). Em sua obra, retrata e exerce forte crítica sobre o amontoamento de más condições imperantes em todas as cadeias do pais, propondo significativas mudanças, dentre elas a criação de estabelecimento com fim especifico para retenção do prisioneiro, mudando a dimensão do ato prisional, antes tido como temporário até o castigo e agora como punição em si.

A raiz do modelo penitenciário que se vê hoje surgiu na Europa, entre o século XIII e XIV, baseado no molde da sociedade disciplinar, instaurada após a instalação do Estado-Nação, fato ocorrido pós-revoluções americana e francesas, substituindo o até então vigente regime de soberania do Estado absolutista, e focou-se indubitavelmente na relação criminoso-delito e as causas teóricas da relação. As prisões, a época, serviam como campo de concentração e estudo, visando vigiar, punir e principalmente registrar, de forma continua e regrada o indivíduo e sua conduta diante de aspectos pré- estabelecidos, como limite de espaço e controle de tempo. Para a objetivação do propósito, havia a necessidade de um projeto arquitetônico condizente com o objetivo do “experimento”, e o mesmo fico a cabo do renomado empirista e jurista inglês, Jeremy Benthan. (FOUCAULT, 2001)

Façamos uma breve revisão do funcionamento arquitetônico do panopticon. Ele consiste num amplo terreno com uma torre no centro e, em sua periferia, uma construção dividida em níveis e celas. Em cada cela, duas janelas que permitem a vigilância das celas. As celas são como ‘pequenos teatros’, onde cada ator está sozinho, perfeitamente individualizado e constantemente visível. O detento, deste modo, torna-se visível ao supervisor, porem apenas a este, ele é privado de qualquer contato com as celas contíguas. Ele é ‘objeto de uma informação, jamais sujeito numa comunicação’... Foucault ressalta que isto se dava através da indução do detento a um estado de objetividade, de permanente visibilidade. O detento não pode ver se o guarda está ou não na torre, portanto, deve se comportar como se a vigilância fosse constante, infinita e absoluta. A perfeição arquitetônica é tal que, mesmo que o guarda não esteja presente, o aparelho de poder continua a funcionar. (apud DREYFUS & RABINOW, 1995, p. 207).

Para Ferreira (2013) e Di Santis & Engbruch (2012), os sistemas penitenciários são divididos evolutivamente em Pensilvânico, Auburniano e Progressivo. No primeiro, datado de 1681, a pena de morte era a imposição diante dos crimes de homicídio, castigos físicos e trabalhos forçados. Sobre a influencia direta das idéias iluministas, os encarcerados passam a ter tratamento distinto, sendo sujeitos a regime de abstinência e orações. O regime Arbuniano, nomenclatura proveniente da prisão de Arburn, nos Estados Unidos, estado da Pensilvânia, em 1816, em que há a primeira política de separação de detentos em decorrência da gravidade dos delitos praticados, isolando os praticantes de crimes mais graves durante o período noturno dos demais presos. Já o sistema progressivo surge no fim do século XIX, em Norfolk, Austrália.  Nesse molde, com forte influencia sobre a forma penal contemporânea, o preso era recompensado diante de objetivos instituídos pelo sistema prisional. Boa conduta e prestação de serviço eram engajados em um cálculo que, concomitante a gravidade do delito reduzia a pena e aproximava o individuo cada vez mais de sua liberdade. O sistema mais tarde é levado a Europa, passando pela Inglaterra e fincando raízes na vizinha Irlanda, ficando conhecido até hoje como Sistema Progressista Irlandês.

Pedroso (1997) e Salla (2006) informam que no Brasil, a primeira menção sobre regime prisional aparece no livro V, das famosas Ordenações das Filipinas, ainda no período colonial. A pena era aplicada a crimes de alcoviteira, a quem ferisse outrem por arma de fogo, duelos, invasão de propriedade, resistência a ordens expedidas pela justiça, falsificação de documentos e contrabando de pedras e metais preciosos. Já em 1850, conforme mencionado em 1769 na Carta Régia, e mediante anseio da sociedade é concebida a primeira casa de correção, com sede na cidade do Rio de Janeiro, onde seriam impostas as penas aos autores de delitos contra a lei, conforme mencionado supra. Em 1824 começam a surgir expressas criticas dos legisladores sobre as condições subumanas que se apresentavam as casas de correções, sendo tratado o assunto na Constituição de 1824, por meio do artigo 179, discorrendo sobre as condições de higiene, segurança a ambiente das prisões.

Grandiosa foi à inspiração internacional das penitenciarias no Brasil, reunindo estilos diferentes, baseando-se principalmente no Sistema de Auburn aliado ao estilo arquitetônico de Jeremy Bentham, exposto nesse estudo na visão de Foucault. Era inerente que a decisão fosse tomada de forma consciente e rápida, pois em 1952 já se instalaria no Brasil a segunda Casa de Correção, situada na cidade de São Paulo. (SALLA, 2006; DI SANTIS & ENGBRUCH, 2012)

Embora distinto da realidade violenta e cercada de caos das demais cadeias do território nacional, as Casas de Correção do Rio de Janeiro e de São Paulo começam a aparentar problemas estruturais, principalmente pela não distinção do tipo de pena do preso. Nelas, havia presos condenados ao trabalho, prisão simples, presos correcionais (sem sentença deferida) como também abrigava mendigos, desordeiros, índios, africanos livres e menores. Mesmo que o sistema instaurado comece a ter um panorama positivo in loco, não auferia gradativa mudança no sistema como um todo. É a partir de 1870 que duras criticas recaem sobre o sistema prisional, denominado com regime de escravidão, conciliando a visão do sistema Auburn e a concepção da época, como evidenciado no trecho seguinte:

 “O modelo Auburniano tributa suas esperanças de regeneração no trabalho fora da cela, duro e sob silêncio. [...] Há uma concepção aqui de que o crime é o avesso do mundo do trabalho. É pensado como a conseqüência de um alheamento do indivíduo das virtudes que o trabalho proporciona. Ócio e vícios de toda sorte o predispõem ao crime. Para os defensores do modelo Auburn a regeneração, assim, é menos a conseqüência de uma conversão da alma que brota da meditação [Sistema da Filadélfia] e mais o resultado de um condicionamento do corpo promovido pelo trabalho na prisão”. (SALLA, 2006, p.49)

Tal cenário se estende até 1830, quando surge o Código Criminal do Império. O código, baseado nas ideias liberais que elucidaram as leis penais europeias e norte-americanas trazem consigo ideais de justiça e equidade. As leis, então, sofrem sua primeira grande mudança no século XIX, decorrente da abolição da escravatura e principalmente em virtude da proclamação da república. O código penal da república, datado de 1890, prevê grande distinção entre os delitos e as diferentes modalidades de prisões que o indivíduo seria submetido. Dentre as modalidades, destaca-se a prisão celular, a reclusão, a prisão com trabalho forçado, e a disciplinar. Vale o adendo informar que cada modalidade de pena era instituída em estabelecimento penal especifico. (ASSIS, 2007; COSTA, 2011; BELEM, 2011; DI SANTIS & ENGBRUCH, 2012)

O país confirma sua influência direta das doutrinas praticadas nos Estados Unidos e Europa Ocidental, criando uma síntese reflexiva no torno da tríade crime, criminoso e o próprio sistema carcerário, objetivando planos futuros audaciosos por partes dos juristas e operadores do novo Direito Penal no Brasil. Dessa forma, o Código Penal instaurado por definitivo em 1890, trás mudanças significativas e, ainda que houvesse fortes defensores da instauração do sistema da Filadélfia, termina por apresentar novo molde, baseado no sistema irlandês, famoso por conciliar ideologias conjuntas do da Filadélfia e do de Auburn (que vigorava até então). (DI SANTIS & ENGBRUCH, 2012)

Como “audacioso” fora a recepção do novo código penal por parte dos juristas, mídia e políticos da época, tamanha a sua autenticidade e pioneirismo, como um artigo (o artigo 49) que limitava em 30 anos as penas do código,  como também abolindo a pena de morte e as penas perpetuas no Brasil, ato vigorante até os dias de hoje. Também dava por fim ao açoite e as galés, prevendo quatro tipos de prisão: (i) prisão celular, a maioria dos crimes previstos no novo código tinha esse tipo de punição; (ii) reclusão em “fortalezas, praças de guerra ou estabelecimentos militares” para crimes políticos ou contra a República; (iii) prisão com o trabalho, cumpridas quase sempre em institutos prisionais agrícola e; (iv) prisão disciplinar, destinada aos menores de 21 anos, com instruções e medidas especiais. (DI SANTIS & ENGBRUCH, 2012)

Ainda sobre o enfoque de Di Santis & Engbruch (2012, p. 12-13) fica evidenciado como o Sistema Progressivo Irlandes estava elucidado no novo manual prisional brasileiro:

 “Art. 45. A pena de prisão cellular será cumprida em estabelecimento especial com isolamento cellular e trabalho obrigatorio, observadas as seguintes regras:

a) si não exceder de um anno, com isolamento cellular pela quinta parte de sua duração;

b) si exceder desse prazo, por um periodo igual a 4ª parte da duração da pena e que não poderá exceder de dous annos; e nos periodos sucessivos, com trabalho em commum, segregação nocturna e silencio durante o dia.

Art. 50. O condemnado a prisão cellular por tempo excedente de seis annos e que houver cumprido metade da pena, mostrando bom comportamento, poderá ser transferido para alguma penitenciaria agricola, afim de ahi cumprir o restante da pena.

§ 1º Si não perseverar no bom comportamento, a concessão será revogada e voltará a cumprir a pena no estabelecimento de onde sahiu

§ 2º Si perseverar no bom comportamento, de modo a fazer presumir emenda, poderá obter livramento condicional, comtanto que o restante da pena a cumprir não exceda de dous annos”.

Todavia, embora os preceitos estivessem plenamente estabelecidos, era de comum acordo que o grande agravante para o pleno funcionamento do sistema prisional era a escassez percebida dos estabelecimentos de cumprimento de penas. Salla (2006, p. 178) salienta a gravidade e nocividade deste aspecto para o sistema prisional com as palavras do próprio legislador, figurada no código de 1890, mas já percebida há tempos, mesmo no antigo código de 1830, conforme elucidado no artigo 409:

 “Art. 409. Emquanto não entrar em inteira execução o systema penitenciario, a pena de prisão cellular será cumprida como a de prisão com trabalho nos estabelecimentos penitenciarios existentes, segundo o regimen actual; e nos logares em que os não houver, será convertida em prisão simples, com augmento da sexta parte do tempo.

§ 1º A pena de prisão simples em que for convertida a de prisão cellular poderá ser cumprida fóra do logar do crime, ou do domicilio do condemnado, si nelle não existirem casas de prisão commodas e seguras, devendo o juiz designar na sentença o logar onde a pena terá de ser cumprida”.

O cenário era de verdadeiro caos. Em 1906 havia déficit de vagas de 90,3% no Estado de São Paulo, muito embora em virtude de uma brecha na lei, que previa uma enorme quantidade de crimes condenados a prisão celular, mesmo que o número de estabelecimentos para esse fim fosse escasso, levando os detentos a cumprir penas em condição distintas as previstas no código penal, diante de tamanha disparidade. O grande fato agravador do ocorrido nas cadeias da capital era o fato dos presos do interior, em virtude das cadeias de suas cidades também se encontrarem lotadas, serem transferidos para cidade de São Paulo, o que levou a dois fatos marcantes na história prisional brasileira: a deterioração dos ambientes destinados aos presos e ação drástica do chefe da polícia paulistana, João Baptista de Mello Peixoto em emitir circular advertindo e clamando para que os juízes priorizassem a transferência de presos para comarcas vizinhas ao invés da comarca da capital, em 1895. (SALLA, 2006)

Mesmo após o retrocesso da Carta Magma de 1937 que previa o restabelecimento da pena de morte no país, em 1940 é promulgado o decreto-lei nº 2.848, de 7 de dezembro, pondo por fim novamente a pena de morte e vindo a se tornar o atual código penal brasileiro. Dentre os avanços, aponta-se a moderação do poder punitivo por parte do Estado. Todavia, a deterioração das estruturas e o descaso do poder público pelas instituições é apontado como fato causador da superlotação das prisões e principalmente do desrespeito aos direitos e dignidade humana, não fazendo da prisão um meio de ressocialização do detento perante a sociedade, gerando o senso comum de fábrica de criminosos. (ASSIS, 2007)

Sendo parte integrante da realidade do século XIX no sistema carcerário, a superlotação atinge seu ápice, fazendo com que o código de 1980 trouxesse drástica mudança em seu conceito, e exercendo mudança de reparo significativa ao transferir presos de bom comportamento e com penas próximas do término para presídios agrícolas. (THOMPSON, 2002)

A retirada do direito de ir e vir do ser humano, como forma pura de punição, foi tema do surgimento de estabelecimentos destinados a abrigar elementos que apresentassem evidente risco a sociedade. Dessa maneira, idealizado no sistema progressista irlandês, foram criadas penas que incentivassem o detento a melhorar sua conduta, personalidade e ações, recompensando seus méritos com abrandamento das penas, sendo considerado avanço primordial para efetiva recuperação dos infratores. Para o Estado, ficou cabo de criar outras instituições e estruturar as já existentes, criando um maior número de vagas carcerárias, amenizando o déficit existente, terminando com a condição subumana em que viviam, não possibilitando uma ocupação o detento ou oferecendo a ele uma perspectiva de melhora. (OLIVEIRA, 1997)

Muito embora a idéia de privação de liberdade seja antiga, a ciência penitenciaria é relativamente jovem nas chamadas ciências jurídicas, e teve sua fundamentação teórica embasada nos estudos com enfoque nos organogramas prisionais, regimes de disciplina, direitos e deveres do encarcerado, do tipo de pena, das regras internas, como também da arquitetura do estabelecimento. Sua firmação no cenário mundial veio no Congresso Penal e Penitenciário Internacional, realizado em Praga, capital da República Tcheca, em 1930. Seus preceitos baseavam-se na individualização da pena, regras básicas de bem-estar e tratamento do preso, como um programa individualizado, e único até então, de tratamento do preso, não considerando para isso sua cor, credo, etnia ou idioma. Cuidados com higiene e a presença de um médico residente, inexistência de tortura ou punições severas, assim como o fim dupla punição pelo mesmo ato (bis in idem) foram fatos marcantes dessa nova ciência instaurada. (TEIXEIRA, 2008)

Para o bom entendimento desse estudo, se faz necessário ressaltar dois pontos cruciais: Direito penitenciário e a Penalogia. Enquanto o primeiro se perfaz a partir de um compendio de normas que visam nortear o tratamento pelo qual serão submetidos os sentenciados, basicamente elencar e regrar de modo comum a todos, submetidos a julgamento perante a justiça, o segundo é uma ciência essencialmente comportamental, que estudo o fenômeno social com o objetivo de tratar, sanar, modificar de forma positiva o encarcerado, a fim de propiciar resultados benéficos a sociedade e ao indivíduo. Dentre o enfoque da penalogia está o estudo da personalidade a individualização do problema ocorrido. É uma ciência baseada na causa-explicação, e tem enfoque em estudar e elencar medidas alternativas para a prisão, medidas de segurança, medidas socioeducativas e a organização penitenciaria como um todo. (TEIXEIRA, 2008; OLIVEIRA, 1997)

Com o crescimento continuo da criminalidade, o Estado, enquanto ente cuidador da sociedade se vê pressionado a dar uma resposta a sociedade, coibindo que o crime se repita, aplicando ao indivíduo a conduta típica, ou seja, a prisão. Desse modo, o Estado prende, o preso vai para um presídio e as vagas que já não existiam, vão se amontoando, chegando ao ponto principal de enfoque desse estudo: A superlotação carcerária. Desse modo, o capitulo a seguir apresenta em números a situação contemporânea da massa carcerária brasileira, visando evidenciar o problema tão comum pela comunidade e carente de soluções por parte do Estado.

3 AVALIALAÇÃO DA SUPERLOTAÇÃO CARCERARIA BRASILEIRA CONTEMPORÃNEA SEGUNDO O CONSELHO NACIONAL DE JUSTIÇA (CNJ)

Para melhor esclarecimento, faz se necessário apresentar o senso comum que a sociedade atribui aos condenados por um crime, sendo intrínseca a população, e diluído ao corpo jurídico e político, o ato de condenar a todo custo, do modo que a sentença “condenar por condenar” (FOUCAULT, 2002, p. 251) seja de certa forma mecânico aos juízes, mesmo sabendo do limitado número de vagas no sistema prisional. Decorrente disso, Thompson (2002, p. 21) salienta:

O uso generalizado da privação da liberdade humana como forma precípua de sanção criminal deu lugar ao estabelecimento de grande número de comunidades, nas quais convivem de dezenas a milhares de pessoas, Esta coexistência grupal, como é obvio, teria de dar origem a um sistema social. Não se subordinaria este, porém, à ordem decretada pelas autoridades criadoras dos homens, diante dos problemas postos pelo ambiente particular em que se viram envolvidos.

Já sobre a questão da superlotação no sistema carcerário, o problema não pode ser questionado de forma única, pois ele gera outras vertentes diretas sobre a população carcerária, como doenças, rebeliões, motins, mortes, atividades insalubres e falta de higiene. Evidente do conjunto ideológico presente entre quem julga e quem clama, Fernandes (2000, p. 163-164) esclarece:

A capacidade real de uma prisão é difícil de ser objetivamente estimada e como resultado disso, é fácil de ser manipulada. Mas não resta dúvida que quase todos os estabelecimento prisionais brasileiros estão superlotados. Como todos os administradores prisionais sabem, prisões superlotadas são extremamente perigosas: aumentam as tensões elevando a violência entre os presos, tentativas de fuga e ataque aos guardas. Não é surpresa que uma parcela significativa dos incidentes de rebeliões, greves de fome e outras formas de protestos nos estabelecimentos prisionais do país sejam diretamente atribuídas a superlotação.

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E embora facilmente identificado, torna-se previamente taxado ao fracasso resolver esse problema aumentando corpo funcional responsável, como terapeutas e guardas, tampouco capacitá-los. A única forma de recuperar o estabelecimento parte de mudanças sociais, políticas e econômicas, dando pleno acoito a situação de nossas instalações carcerárias. (THOMPSON, 2002)

Como fonte de embasamento do capitulo será usado o relatório do Conselho Nacional de Justiça (CNJ), datado de junho de 2014, intitulado como “Novo diagnóstico de pessoas presas no Brasil”. O texto a seguir além de apresentar a situação alarmante do nosso sistema carcerário contará com gráficos e tabelas que visam apresentar a realidade brasileira e compará-la com a situação de alguns países de vários continentes. Vale ressaltar que analise não leva em consideração o percentual de presos provisórios ou não, sendo analisada somente a situação atual do estudo e os presos do momento do mesmo, apresentando o número total de presos e as relações de necessidades de vagas com as existentes, em todos os estados da União.

A maior rede prisional do Brasil se encontra no Estado de São Paulo. São mais de 114 mil vagas em todo estado, totalizando 32% de todas as vagas em penitenciarias do Brasil. Todavia, o estado ainda conta com o maior déficit de vagas da União, com 90.448 presos a mais do que a capacidade carcerária presente. A situação sofre extremo agravante se contabilizados os presos em prisão domiciliar, que totalizam 92.150 pessoas. Com esse aumento ao número de presos a população carcerária paulista alcança o total de 297.096 pessoas, levando o déficit de vagas para 182.598. No cenário contabilizando pessoas presas em presídios e em prisão domiciliar, São Paulo possui mais presos que África do Sul, Alemanha e Argentina, juntos. São Paulo também possui mais encarcerados que todo o México, no cálculo incluso dos presos domiciliares, país com quase 120 milhões de habitantes.

Em contrapartida, o estado com menor massa carcerária é Roraima (RR). O estado conta com 1.676 presos em seus presídios, e somados seus 99 presos em regime domiciliar, totaliza 1.775 detentos, aproximadamente 0,25 % de toda massa carcerária nacional. Embora o número pequeno seja facilitador para administração do sistema prisional estadual, Roraima conta com um déficit de 557 vagas absolutas, e 458 se não inclusos os presos em prisão domiciliar ao cálculo.

E tratando-se da região norte, da qual pertence o estado de Roraima, a TABELA 1, exposta a seguir apresenta dados relativos a população carcerária da maior região territorial do Brasil e os respectivos déficits de vagas encontrados nos sete estados pertencentes a ela.

REGIÃO NORTE

População Carcerária e Déficit de Vagas

ESTADO

Nº PRESOS

VAGAS

DÉFICIT

%

ACRE

4320

2487

1833

42%

AMAPÁ

2523

1609

914

36%

AMAZONAS

5276

1661

3615

69%

PARÁ

12172

8434

3738

31%

RONDÔNIA

7674

4981

2693

35%

RORAIMA

1676

1218

458

27%

TOCANTINS

2805

1927

878

31%

TOTAL

36446

22317

14129

39%

TABELA 1 – População Carcerária e Déficit de Vagas da Região Norte

FONTE: Conselho Nacional de Justiça – CNJ (2014), adaptada

A tabela apresenta um número total de 36.446 presos atendidos pelas penitenciarias da região norte, um total de 6,42% da massa carcerária nacional (567.655 presos). Embora representando pequena fatia do total de presos no Brasil, mesmo com o extenso território, a região norte apresenta três dados interessantes para o estudo. Primeiro que possui similaridades entre os estados pertencentes a região quanto a porcentagem de déficit de vagas, ficando em torno, salva a exceção, na casa dos trinta por cento. O outro dado é justamente a exceção: O estado do Amazonas possui sérios problemas quanto às vagas no estado, totalizando 69% de déficit, demonstrando situação de superlotação severa nas penitenciarias do estado amazonense. Por fim, o terceiro dado a ser salientado é o número de presos no estado do Pará, totalmente destoante dos outros estados da região e que totaliza 1/3 de toda a população carcerária da região norte do Brasil.

A situação sofreria agravamento ainda mais significativo se nesse cálculo fossem contabilizados os presos cumprindo regime domiciliar, que segundo Nogueira (1999, p. 183) para condenados a penas menores que quatro anos ou que já cumpriram 1/6 da pena; para os que obterem trabalho; aos que se sujeitam ao regime de disciplina e condições impostas pelo juiz, além de quesitos subjuntivos como não reincidência de crime doloso punido com privação da liberdade, ausência de periculosidade e compatibilidade do condenado com o regime aberto. Com essa nova modalidade de presos inclusa ao cálculo, a tabela 2 apresenta os novos números para região norte, abaixo.

REGIÃO NORTE

População Carcerária + Prisão Domiciliar e Déficit de Vagas

ESTADO

Nº PRESOS

VAGAS

DÉFICIT

%

ACRE

4518

2487

2031

45%

AMAPÁ

4185

1609

2576

62%

AMAZONAS

5717

1661

4056

71%

PARÁ

13179

8434

4745

36%

RONDÔNIA

9921

4981

4940

50%

RORAIMA

1775

1218

557

31%

TOCANTINS

3915

1927

1988

51%

TOTAL

43210

22317

20893

48%

TABELA 2 – População Carcerária + Prisão Domiciliar e Déficit de Vagas da Região Norte.

FONTE: CONSELHO NACIONAL DE JUSTIÇA – CNJ (2014), adaptada

Nesse cenário, seriam 6.764 presos a mais para agravar a situação de superlotação carcerária na região norte. O Amapá, com aumento relativo de 26%, seria o estado mais afetado da região, caso os presos em domicilio fossem inseridos no sistema prisional convencional. Tocantins com 20% a mais e Rondônia com 15% seriam outros dois estados que teriam suas situações bastante agravadas em decorrência dessa hipotética, migração do tipo de pena.

Já na região nordeste, região do Brasil com maior número de estados federativos, totalizando nove, o número de presos soma mais que o dobro da região norte, em um montante de 92.373 encarcerados. Enquanto Alagoas possui um número de somente 2531 presos, significando 2,74% no total da região (o menor número de presos do Nordeste) e 0,45% no total do montante nacional; o estado de Pernambuco apresenta um número 12 vezes maior que o estado vizinho, com 30.149 presos, auferindo ao estado a porcentagem de 32,64% na região e 5,31% do total nacional. Todavia, um dado ainda mais alarmante sobre Pernambuco é sua gigantesca situação de superlotação nos presídios do estado, com um déficit total de 21.193 vagas, 70% dos presos totais nos presídios e cadeias do estado nordestino. Para se ter ideia da dimensão do problema enfrentado pelos pernambucanos, todos os demais estados da região apresentam um déficit de vagas de 16.045, que significa 5.148 vagas a menos do que o estado supracitado. As demais informações quanto ao número de presos nas instituições prisionais do Nordeste se encontram na tabela 3, a seguir.

REGIÃO NORDESTE

População Carcerária e Déficit de Vagas

ESTADO

Nº PRESOS

VAGAS

DÉFICIT

%

ALAGOAS

2531

1813

718

28%

BAHIA

13913

10712

3201

23%

CEARÁ

15447

11015

4432

29%

MARANHÃO

6315

5501

814

13%

PARAIBA

9270

5892

3378

36%

PERNAMBUCO

30149

8956

21193

70%

PIAUÍ

3240

2780

460

14%

RIO GDE. NORTE

6842

5625

1217

18%

SERGIPE

4666

2841

1825

39%

TOTAL

92373

55135

37238

40%

TABELA 3 – População Carcerária e Déficit de Vagas da Região Nordeste

FONTE: Conselho Nacional de Justiça – CNJ (2014), adaptada

Embora com uma população carcerária bem maior que a região norte, a região nordeste apresenta quase que similar a da região comparada, com um percentual de 40%. Nota-se também que estados como o Maranhão (13%), Piauí (14%) e Rio Grande do Norte (18%) apresentam números baixos de déficits de vagas prisionais, tendo o número geral da região a mesma dimensão da região norte devido aos números preocupantes de superlotação apresentados pelo estado do Ceará. E ainda citando o Piauí, o estado apresenta o menor número de necessidade de vagas da região, com somente 460 vagas, e o segundo menor do Brasil, ficando atrás somente de Roraima, que tem um déficit de 458 vagas. No entanto, se for contabilizado o número de presos somados aos presos que cumprem prisão domiciliar, esse novo cálculo propiciaria ao estado do Piauí o posto de estado brasileiro com maior necessidade de abertura de vagas para sanar as questões de seu sistema prisional.

Na realidade com inclusão dos presos que cumprem regime de domicilio, chama atenção à situação da Paraíba, que em toda sua extensão possui apenas oito presos vivendo sob pena domiciliar, contrastando com a situação do Sergipe, que possui 3.646 presos nessa situação, que alargaria os problemas de superlotação do estado em 27%. Mais dados sobre esse cenário são apresentados na tabela 4.

REGIÃO NORDESTE

População Carcerária + Prisão Domiciliar e Déficit de Vagas

ESTADO

Nº PRESOS

VAGAS

DÉFICIT

%

ALAGOAS

3011

1813

1198

40%

BAHIA

14397

10712

3685

26%

CEARÁ

16294

11015

5279

32%

MARANHÃO

8541

5501

3040

36%

PARAIBA

9278

5892

3386

36%

PERNAMBUCO

30324

8956

21368

70%

PIAUÍ

3270

2780

490

15%

RIO GDE. NORTE

6973

5625

1348

19%

SERGIPE

8312

2841

5471

66%

TOTAL

100400

55135

45265

45%

TABELA 4 - População Carcerária + Prisão Domiciliar e Déficit de Vagas da Região Nordeste.

FONTE: CONSELHO NACIONAL DE JUSTIÇA – CNJ (2014), adaptada

Nessa perspectiva de avaliação, o estado nordestino passaria dos 100.000 presos, mas seu número de déficit total representaria 45%, três pontos percentuais a menos que a região norte nesse mesmo molde. Fato preocupante ao governo maranhense seria que o estado passaria de uma necessidade exemplar de 13% para preocupantes 36%, tudo graças aos 2.226 presos vivendo em regime domiciliar.

Prosseguindo o planejamento desse estudo, a região Centro-Oeste conta com três estados mais o Distrito Federal e possui população carcerária de 49.093 presos. Assim como a região norte e nordeste, apresenta um déficit de vagas semelhante, com 41% ou 20.114 vagas necessárias para que seja sanado o problema de superlotação nos presídios e cadeias da região. A situação mais preocupante se encontra na sede da capital brasileira, com o número de vagas significando somente cerca 50% da necessidade total do Distrito Federal. São 6.571 presos a mais do que a capacidade atual de 6.629 vagas. O estado com menor número de presos é o Mato Grosso, com 10.231 e também o menor número de vagas em déficit, com 3689, no entanto é o Estado de Goiás que apresenta o menor déficit percentual da região, com 31%. Os demais números são apresentados na tabela 5.

REGIÃO CENTRO-OESTE E DF

População Carcerária e Déficit de Vagas

ESTADO

Nº PRESOS

VAGAS

DÉFICIT

%

GOIÁS

12059

8361

3698

31%

MATO GROSSO

10321

6632

3689

36%

MATO G. DO SUL

13513

7357

6156

46%

DISTRITO FEDERAL

13200

6629

6571

50%

TOTAL

49093

28979

20114

41%

TABELA 5 – População Carcerária e Déficit de Vagas da Região Centro-Oeste e Dist. Federal

Fonte: Conselho Nacional de Justiça – CNJ (2014), adaptada

Embora possuindo apenas três estados e o distrito federal, a região supracitada possui população carcerária maior, com 12.647 presos a mais que a região norte. O total de presos representa 8,65% do total de presos em todo pais.

Se considerados os presos em domicilio, a situação do Distrito Federal se agravaria ainda mais, com aumento percentual de 16%, o que significa 6.277 presos, que se fossem levados a prisão comum, criariam ainda mais problemas de superlotação nos presídios da capital federal e cidades satélites. Demais dados referentes a essa situação são apresentados na tabela 6.

REGIÃO CENTRO-OESTE E DF

População Carcerária + Prisão Domiciliar e Déficit de Vagas

ESTADO

Nº PRESOS

VAGAS

DÉFICIT

%

GOIÁS

13117

8361

4756

37%

MATO GROSSO

11388

6632

4756

42%

MATO G. DO SUL

14288

7357

6931

49%

DISTRITO FEDERAL

19477

6629

12848

66%

TOTAL

58330

28979

29291

50%

TABELA 6 – População Carcerária + Prisão Domiciliar e Déficit de Vagas da Região Centro-Oeste e Distrito Federal

FONTE: Conselho Nacional de Justiça – CNJ (2014), adaptada

Nessa situação, a região Centro-Oeste e o Distrito Federal apresentariam maior percentual de déficit de vagas do que as regiões Norte e Nordeste, implicando numa necessidade de 50% sobre as vagas existentes. Seriam, então, necessárias 29.291 vagas a serem somadas as 28.979 já existentes para que o problema de superlotação fosse estabilizado na região. Fato curioso e fruto de coincidência é de que os estados de Goiás e Mato Grosso teriam o mesmo número de vagas em déficit, num total de 4.756 cada um.

A região Sul é a que possui menos estados no país e também apresenta o menor déficit percentual de vagas, com necessidade de 26% sobre o número de presos nos estados do Paraná, Rio Grande do Sul e Santa Catarina. Os dados da referida região são apresentados na tabela 7, abaixo.

REGIÃO SUL

População Carcerária e Déficit de Vagas

ESTADO

Nº PRESOS

VAGAS

DÉFICIT

%

PARANÁ

32438

23680

8758

27%

RIO GDE. SUL

27336

21063

6273

23%

SANTA CATARINA

16366

11589

4777

29%

TOTAL

76140

56332

19808

26%

TABELA 7 – População Carcerária e Déficit de Vagas na Região Sul

FONTE: Conselho Nacional de Justiça – CNJ (2014), adaptada

Com 76.140 presos em seus presídios, a região sul é a 3ª maior massa carcerária do país, representando 13,41% de todos os encarcerados do Brasil. Entretanto, seu déficit de vagas é mais próximo de estável no pais, e é menor, por exemplo, do que o déficit de Pernambuco. Mas a situação se agrava bastante se os presos em regime domiciliar fossem inclusos no cálculo, como demonstrado na tabela 8.

REGIÃO SUL

População Carcerária + Prisão Domiciliar e Déficit de Vagas

ESTADO

Nº PRESOS

VAGAS

DÉFICIT

%

PARANÁ

33785

23680

10105

30%

RIO GDE. SUL

30513

21063

9450

31%

SANTA CATARINA

30838

11589

19249

62%

TOTAL

95136

56332

38804

41%

TABELA 8 – População Carcerária + Prisão Domiciliar e Déficit de Vagas na Região Sul

FONTE: Conselho Nacional de Justiça – CNJ (2014), adaptada

Nessa perspectiva, a crise de superlotação se agravaria para 41% do total de presos. Tudo isso se deve aos 18.996 presos em domicilio da região. Grande parte desse número se deve a Santa Catarina, estado que possui 14.472 presos nessa situação, ficando atrás somente do Estado de São Paulo nessa estatística.

Por fim apresenta-se a região possuidora da maior massa carcerária do Brasil, a região Sudeste. Embora detentora do 2º menor déficit percentual entre as regiões do Brasil, o grande empecilho do Sudeste trata-se do imenso número de presos da região e a necessidade enorme e crescente de vagas para o mesmo. São 314.603 presos na região, 55,42% de todos os presos do país e uma necessidade de 122.101 vagas para que os problemas sejam sanados, número maior do que a necessidade de todas as outras regiões juntas. Os dados sobre a população carcerária e o déficit de vagas são apresentados na tabela 9.

REGIÃO SUDESTE

População Carcerária e Déficit de Vagas

ESTADO

Nº PRESOS

VAGAS

DÉFICIT

%

ESPÍRITO SANTO

15548

12869

2679

17%

MINAS GERAIS

57498

36098

21400

37%

RIO DE JANEIRO

36611

29037

7574

21%

SÃO PAULO

204946

114498

90448

44%

TOTAL

314603

192502

122101

39%

TABELA 9 – População Carcerária e Déficit de Vagas na Região Sudeste

FONTE: Conselho Nacional de Justiça – CNJ (2014), adaptada

O Estado do Espírito Santo destoa da realidade da região sudeste, possuindo o terceiro menor déficit percentual do Brasil, com necessidade de 17% do número de vagas para por fim na questão de lotação em seus presídios. Comparado ao total da região, representa menos de cinco por cento (4,96%) e apenas 2,74% do montante nacional de presos.

Bem diferente da situação do Espírito Santo é a de Minas Gerais. Os mineiros possuem a 2ª maior massa carcerária do Brasil, num total de 57.548 presos, que equivalem a 16,35% do total de presos da região Sudeste e 12,06% no aglomerado nacional. Seu déficit de 37% ou 21400 vagas é o segundo maior do Brasil.

O Estado do Rio de Janeiro, 3ª maior população carcerária do Brasil, com 36.611 possui posição de certa forma confortável quanto ao déficit de vagas, com percentual em 21%, sendo necessárias 7.574 novas vagas para que fossem resolvidas a questão da superlotação.

Como enunciado no início do capitulo, São Paulo é o maior centro carcerário do Brasil, da América Latina e um dos maiores do mundo. Sozinha, a população carcerária do estado é maior do que as dos estados das outras quatro regiões do país juntos. É em números absolutos um destoante da realidade do país. Possui mais presos, mais vagas e mais déficit do que os três outros estados da região sudeste somados.

Outro dado relevante ao tema do capitulo se faz quando acrescentamos a tabela da região Sudeste o montante de presos em prisão domiciliar, como apresentado abaixo na tabela 10.

REGIÃO SUDESTE

População Carcerária + Prisão Domiciliar e Déficit de Vagas

ESTADO

Nº PRESOS

VAGAS

DÉFICIT

%

ESPITO SANTO

15575

12869

2706

17%

MINAS GERAIS

68452

36098

32354

47%

RIO DE JANEIRO

37453

29037

8416

22%

SÃO PAULO

297096

114498

182598

61%

TOTAL

418576

192502

226074

54%

TABELA 10 – População Carcerária + Prisão Domiciliar e Déficit de Vagas na Região Sudeste

FONTE: Conselho Nacional de Justiça – CNJ (2014), adaptada

Seriam mais de 114 mil presos a mais nas cadeias da região sudeste impulsionado mais uma vez pelo Estado de São Paulo, que possui 92.150 pessoas sob esse regime, maior numero do país, maior até do que todos os presos de países como Argentina e Alemanha. Destaque-se na região Sudeste que Rio de Janeiro e Espírito Santo possuem muitos poucos casos de pessoas presas em domicilio, não alterando significativamente seu déficit de vagas em situação hipotética de alojamento em cárcere convencional.

Em linhas gerais, a superlotação do sistema prisional brasileiro possui um excedente em cerca de 37% do número de presos, situação que sofre agravamento principalmente nas capitais dos Estados. O maior déficit em pontos percentuais pertence a região centro-oeste e o Distrito Federal enquanto o menor percentual fica com a região Sul do Brasil. Os demais dados são apresentados na tabela 11.

BRASIL

População Carcerária e Déficit de Vagas

REGIÕES

Nº PRESOS

VAGAS

DÉFICIT

%

NORTE

36446

22317

14129

39%

NORDESTE

92373

55135

37238

40%

CENTRO-OESTE/ DF

49093

28979

20114

41%

SUL

76140

56332

19808

26%

SUDESTE

313603

192502

121101

39%

TOTAL

567655

355265

212390

37%

TABELA 11 – População Carcerária e Déficit de Vagas no Brasil

FONTE: Conselho Nacional de Justiça – CNJ (2014), adaptada

Como mostrado no gráfico, à região sudeste é preponderante na distribuição carcerária do país, responde sozinha por 55,24% de todos os presos do Brasil, 54,18% de todas as vagas e 57% da necessidade de vagas de todo o país. Totalizando 567.655 mil presos em seu sistema, o Brasil ocupa o 4º lugar mundial, atrás somente de Estados Unidos, China e Rússia, como apresentado na figura 1.

FIGURA 1 – Ranking dos 10 Países com Maior População Prisional

FONTE: Conselho Nacional de Justiça – CNJ (2014)

Sendo assim, o Brasil se posta em primeiro lugar na América latina, primeiro lugar no hemisfério sul, segundo maior das Américas e do Ocidente todo.

Em um cenário hipotético com a inserção dos presos em domicilio na rede carcerária tradicional, ficaria praticamente insustentável administrar tamanha a superlotação que agregaria ao sistema. O alarmante número de 567.655 pessoas presas passaria para 715.592, o que significaria que para cada vaga disponível no Brasil, aproximadamente duas pessoas a ocupassem. As informações estão agrupadas na tabela 12.

BRASIL

População Carcerária + Prisão Domiciliar e Déficit de Vagas

REGIÕES

Nº PRESOS

VAGAS

DÉFICIT

%

NORTE

43210

22317

20893

48%

NORDESTE

100400

55135

45265

45%

CENTRO-OESTE/ DF

58270

28979

29291

50%

SUL

95136

56332

38804

41%

SUDESTE

418576

192502

226074

54%

TOTAL

715592

355265

360327

50%

TABELA 12 – População Carcerária + Prisão Domiciliar e Déficit de Vagas no Brasil

FONTE: Conselho Nacional de Justiça – CNJ (2014), adaptada

Todo esse estudo do relatório do Conselho Nacional de Justiça serve como motivador ao surgimento de novas formas de penas no Brasil, que visem não só reduzir os problemas estruturais e populacionais brasileiros, quanto serem efetivas medidas socioeducativas, sendo responsáveis direto na ressocialização do detento, possibilitando que o mesmo não reincida a delitos após o cumprimento da pena. Tais possibilidades de penas e medidas serão expostas no capitulo 3 desse estudo.

3 PENAS ALTERNATIVAS NO SISTEMA PRISIONAL BRASILEIRO

A sociedade brasileira encontrava-se em estado de inquietação diante da violência que assolava o pais na década de 80 e mostrava profundo descontentamento com o tipo de cárcere no país e principalmente pelo seu caráter de formação marginal e não de ressocialização do indivíduo que se esperava após o cumprimento da pena. No mundo todo, no âmbito jurídico, começam a ser estudadas novas formas de penas a fim de oferecer alternativas para penas que não resultem somente em encarceramento, mas outras formas punitivas principalmente para crimes com baixa gravidade, no intuito principal de reinserir o indivíduo infrator na sociedade o mais recuperado possível. (JESUS, 2001; SNJ, 2002; MIRABETE, 2001; CAPEZ, 2011; SANTOS & COPABIANO, 20014)

Nesse sentido, países da Europa e Canadá foram pioneiros em busca de alternativas para as penas em seus domínios. Tido como maior avanço do século, a ONU (Organização das Nações Unidas) aprova, em 1955, um protocolo chamado “Regras Mínimas Para o Tratamento dos Presos”, demonstrando profunda apreensão com o caráter segregatício que as penas apresentavam, visando torna-las mais educativas e humanas. (JESUS, 2001; SNJ, 2002; MIRABETE, 2001; CAPEZ, 2011; SANTOS & COPABIANO, 20014)

Em 1990 são instituídas as famosas “Regras de Tóquio”, da qual o Brasil se torna signatário. Trata-se do maior instrumento mundial no que tange a instituição de regras mínimas para penas não privativas ou semirestritivas de liberdade. As penas restritivas mantem o condenado em liberdade, porém restringe direitos civis que o mesmo possui. Penas como prestação de serviços a comunidade (PSC) passam a ser oferecidas como substituição a prisão para casos com baixo potencial ofensivo a sociedade. Esse tipo de pena passa a ser oferecido também em substituição de processo penal, em que o indivíduo aceita a pena substitutiva encerrando-se assim o tramite do processo penal. As normas do processo penal estão dispostas no artigo 44 do código penal Brasileiro:

Art. 44. As penas restritivas de direitos são autônomas e substituem as privativas de liberdade, quando:

I – aplicada pena privativa de liberdade não superior a quatro anos e o crime não for cometido com violência ou grave ameaça à pessoa ou, qualquer que seja a pena aplicada, se o crime for culposo;

II – O réu não for reincidente em crime doloso;

III – a culpabilidade, os antecedentes, a conduta social e a personalidade do condenado, bem como os motivos e as circunstâncias indicarem que essa substituição seja suficiente.

Assim, não é qualquer pessoa que pode ser beneficiada com uma alternativa penal. Para que seja aplicada uma pena ou medida alternativa há a necessidade de combinação dos citados pressupostos legais. Em geral, podemos dizer que para os chamados “crimes de menor potencial ofensivo” há uma maior possibilidade de aplicação de uma pena ou medida alternativa. Porém, o tipo de delito é apenas um dos fatores que determina a substituição. É necessário que todos os requisitos estejam presentes simultaneamente. Esses requisitos mostram a preocupação da lei em não permitir que haja improcedências na aplicação desse tipo de penalidade. Sendo assim, o indivíduo para ser encaminhado para uma alternativa ao sistema penal convencional deve ser mediante o cumprimento dos pressupostos legais supracitados no artigo 44. Em linhas gerais, as penas alternativas são comumente oferecidas para crimes que apresentem baixo, ou irrisório, potencial ofensivo a sociedade. (JESUS, 2001; MIRABETE, 2001; CAPEZ, 2011; SANTOS & COPABIANO, 20014)

3.1 Prestação de Serviços à Comunidade (PSC)

Tida como a principal pena alternativa em vigor no Brasil nos dias de hoje, a prestação de Serviços à Comunidade (PSC) tem por fundamento retornar o dano causado pelo condenado em ações destinadas a sociedade, sendo de proveito comum, inserindo o indivíduo no âmbito social de forma digna e com ação que atinja todo o coletivo ou parte dele, evitando danos causados por penas privativas de liberdade, mesmo que de curta duração. (JESUS, 2001; SNJ, 2002;  MIRABETE, 2001; CAPEZ, 2011; SANTOS & COPABIANO, 20014)

Todavia há de se distinguir a comparação com obrigação de trabalho, ou trabalho forçado, como é plenamente vedado em nossa constituição. Diferem e muito das penas antigas que o condenado era perpetuado em cumprir trabalhos físicos exaustivos e penosos, totalmente a par do cunho humanitário de nosso Direito Penal contemporâneo. Na concepção da PSC, o indivíduo é levado a atividades condizentes com suas aptidões físicas e técnicas, traçando similaridades com as atividades já praticadas e não interferindo na vida profissional do mesmo.  (JESUS, 2001; MIRABETE, 2001; CAPEZ, 2011; SANTOS & COPABIANO, 20014)

Por conceito, a pena visa restringir certo tempo do condenado para que o mesmo possa praticar atividades benéficas a sociedade, trazendo benefícios mútuos, onde escolas, orfanatos e outras instituições congêneres possam receber serviços de reparos, manutenção e infraestrutura e; o indivíduo se insere no meio social, identificando suas capacidades e a importância de seus atos para desenvolvimento da comunidade. (CAPEZ, 2011)

Ao ser encaminhado a uma instituição, para cumprir sua pena, o condenado deve passar por todo um processo de adaptação, de preparo e de treinamento, para que possa cumprir a função a ele imposta pelo Estado. A prestação de serviços à comunidade consiste na atribuição de tarefas gratuitas, isto é, sem remuneração, a ser cumprida em entidades assistenciais, hospitais, escolas, orfanatos etc. Elas serão impostas levando-se em consideração a aptidão do condenado e cumpridas em dias e horários que não prejudiquem a jornada normal de trabalho do prestador de serviço. Bitencourt (2006, 614) salienta sobre a irregularidade de certos estabelecimentos em receber o réu:

Afastaram-se liminarmente as entidades privadas que visam lucros, de forma a impedir a exploração de mão-de-obra gratuita e o consequente sem a devida contraprestação. Em definitivo, tratam-se de trabalhos que não poderiam ser prestados de forma remunerada em razão da escassez de recursos econômicos das entidades referidas. O indivíduo que for sentenciado a prestar serviço pode ser processado e condenado posteriormente à sentença corrente. O encaminhamento pode ser em virtude de acordo com o promotor de justiça, denominando esse acordo como transação penal. Tal medida só poderá ser apresentada a réu primário, de natureza idônea, com pena máxima não maior que dois anos de prisão e que não tenha desfrutado do benefício nos últimos cinco anos. É cabível a fixação de prestação de serviço como condição imposta pelo juiz, no caso da suspensão condicional do processo. (JESUS, 2001; MIRABETE, 2001; CAPEZ, 2011; SANTOS & COPABIANO, 20014)

O infrator encaminhado para prestar serviços comunitários, no sistema da Lei 9.099/1995 que trata dos Juizados Especiais Criminais, não foi condenado e, portanto, não deverá ser tratado como réu ou sentenciado, pois não sofreu condenação definitiva. Em síntese, a prestação de serviços comunitários é medida punitiva fixada pela Justiça, dotada de caráter educativo e socialmente útil, imposta ao acusado envolvido com crimes menos graves em substituição à pena privativa de liberdade ou é aplicada mediante acordo celebrado entre o infrator e seu advogado, mediante proposta do Promotor de Justiça feita durante audiência judicial, também nos casos da prática de crimes punidos com pena leve. (APMP, 2011, p. 1)

Nas Comarcas onde não existir uma instituição própria para encaminhamento, fiscalização, preparo e execução da medida, compete ao juiz das execuções designarem em qual entidade o sentenciado deverá executar as suas tarefas, como expõe o art. 149 da LEP, o que se tem demonstrado não ser uma das tarefas mais fáceis, principalmente nos pequenos municípios. De outra banda, o artigo 150 do mesmo texto indica que a entidade beneficiada com a prestação de serviços encaminhará mensalmente, ao mesmo juiz das execuções, relatório circunstanciado das atividades do condenado, bem como, a qualquer momento, comunicação sobre ausência ou falta disciplinar. (JESUS, 2001; MIRABETE, 2001; CAPEZ, 2011; SANTOS & COPABIANO, 20014)

Cumpre anotar que o disposto na Lei 7.210/84 foi tacitamente revogado pela lei 9.714/98 (lei posterior revoga tacitamente a anterior no que for com ela incompatível). Antes do advento da lei ora aplicada, dispunha a LEP que a duração do trabalho seria de oito (oito) horas semanais. Atualmente, o apenado cumpre uma hora de trabalho para cada dia de condenação, fixadas de modo a não prejudicar a jornada normal de trabalho, posto que o contrário seria um contra-senso e provocaria injustiça social, uma vez que, por questão de razoabilidade e proporcionalidade, pouco adiantaria o sentenciado trabalhar de maneira gratuita em detrimento de um trabalho remunerado, cujo salário seria necessário para o sustento próprio e de sua família. Ademais, permite a lei que esta prestação seja cumprida em período inferior à cominação da pena privativa de liberdade, desde que a pena substituída seja superior a um ano, e que a prestação não seja efetuada em tempo inferior à metade da pena privativa de liberdade fixada, conforme reza o art. 46 § 4º, C.P. (TEOTONIO, 2014, p.13-14)

O indivíduo em cumprimento de ação de prestação de serviços à comunidade poderá ter sua pena convertida e uma privativa de liberdade quando (SNJ, 2002):

a) não for encontrado por estar em lugar incerto e não sabido ou desatender à intimação por edital;

b) não comparecer, injustificadamente, à entidade ou programa em que deve prestar serviço;

c) recusar-se, injustificadamente, a prestar o serviço que lhe for imposto;

d) praticar falta grave;

e) sofrer condenação por outro crime à pena privativa de liberdade cuja execução não tenha sido suspensa.

3.2 Pena pecuniária (PP)

Entende-se por pena pecuniária o pagamento de prestação em dinheiro (pecúnia) ou montante equivalente entre 1 (um) e 360 (trezentos e sessenta) salários mínimos vigentes a vítima do crime, dependente da vítima ou entidade pública/privada com cunho social. (JESUS, 2001; MIRABETE, 2001; CAPEZ, 2011; SANTOS & COPABIANO, 20014)

A pena pecuniária trata-se de medida alternativa substitutiva a reclusão para delitos de baixo risco a sociedade, em que o indivíduo cumpre em liberdade retornando por meio de pena financeira seu ato ilícito para com a vítima e/ou sociedade. Pode-se aplicar mediante condenação após tramite do processo ou como alternativa de arquivamento do processo na denominada transação penal. Caso o condenado mediante processo seja culpado por crime de violência ou apresente antecedentes criminais desabonadores, não será concebido a alternativa pecuniária. (JESUS, 2001; MIRABETE, 2001; CAPEZ, 2011; SANTOS & COPABIANO, 20014)

Orienta-se que a prestação pecuniária seja conivente com a situação financeira do réu e a magnitude dos danos causados. É importante distinguir a PP da indenização civil, todavia a primeira citada possa ser o princípio de reparação da seguinte. O motivo de adequação mínima a possibilidade financeira do réu justifica-se pois se o valor for a quem das capacidades financeira do mesmo, acabaria levando a interrupção do pagamento e em reclusão do cidadão, gerando insucesso da medida alternativa de pena. É importante diferenciar a medida de prestação pecuniária da medida de multa, pois enquanto a primeira é destinada a vítima ou dependente e em último caso a instituição sem fins lucrativos, a segunda é destinada a Estados e União. (JESUS, 2001; MIRABETE, 2001; CAPEZ, 2011; SANTOS & COPABIANO, 20014)

3.3 Limitação de Fim de Semana (LFS)

Instituída mediante CP - Decreto Lei nº 2.848 de 07 de dezembro de 1940:

Art. 48 - A limitação de fim de semana consiste na obrigação de permanecer, aos sábados e domingos, por 5 (cinco) horas diárias, em casa de albergado ou outro estabelecimento adequado. (Redação dada pela Lei nº 7.209, de 11.7.1984)

Parágrafo único - Durante a permanência poderão ser ministrados ao condenado cursos e palestras ou atribuídas atividades educativas. (Redação dada pela Lei nº 7.209, de 11.7.1984)

Resume-se em permanência do indivíduo em estabelecimento ou casa de custódia por cinco horas diárias aos sábados e domingos. E embora haja similaridades com as penas privativas de liberdade, a LFS não acarreta em danos psicológicos ao réu em decorrência do cárcere e nem em perda de contato rotineiro com a família, amigos e meio social que o cerca.  É imprescindível ressaltar que tal pena carece de conteúdo programático didatizado para que ofereça êxito em sua resolução. Isso depende de infraestrutura adequada e metodologia corrente para propiciar reeducação e volta-lo a ser inserido no meio social. (JESUS, 2001; MIRABETE, 2001; CAPEZ, 2011; SANTOS & COPABIANO, 20014)

3.4 Interdição Temporária de Direito

Redação dada no artigo 47 do Código Penal:

Art. 47 - As penas de interdição temporária de direitos são:

I - proibição do exercício de cargo, função ou atividade pública, bem como de mandato eletivo; 

II - proibição do exercício de profissão, atividade ou ofício que dependam de habilitação especial, de licença ou autorização do poder público;

III - suspensão de autorização ou de habilitação para dirigir veículo. 

IV - proibição de freqüentar determinados lugares.
             V - proibição de inscrever-se em concurso, avaliação ou exame públicos.

Os dois primeiros incisos são temporários e em decorrência de ato ilícito no exercício da profissão, cargo ou atividade, atribuindo aspecto punitivo em decorrência circunstanciada mediante correlação de ato ilícito – atividade exercida. Coloca-se de modo expresso o que a doutrina exige como condição de cominação dessas penas, o direito restringido deve ter vinculação direta com o dever funcional violado. A punição se baseia ao não cumprimento dos deveres elencados no artigo 56 do código penal.

Art. 56 - As penas de interdição, previstas nos incisos I e II do art. 47 deste Código, aplicam-se para todo o crime cometido no exercício de profissão, atividade, ofício, cargo ou função, sempre que houver violação dos deveres que lhes são inerentes.

O inciso terceiro relaciona-se com crimes culposos de trânsito e que difiram da autonomia do Código de Trânsito Brasileiro (CTB) e são destinados a delitos culposos. Pode esse inciso ser destinado a veículos automotores, de tração animal ou força humana. (JESUS, 2001)

Já o quarto e último inciso relaciona-se com a proibição de frequentar certos lugares dispostos em juízo e que possam acarretar em danos a conduta do condenado, como boates, estádios, bares e etc. Em caso de desobediência, ou seja, frequentar os lugares outrora proibidos, o mesmo terá sua pena convertida em restritiva de liberdade, conforme artigo 181 da lei 7210/84.

Art. 181. A pena restritiva de direitos será convertida em privativa de liberdade nas hipóteses e na forma do artigo 45 e seus incisos do Código Penal.

§ 1º A pena de prestação de serviços à comunidade será convertida quando o condenado:

a) não for encontrado por estar em lugar incerto e não sabido, ou desatender a intimação por edital;

b) não comparecer, injustificadamente, à entidade ou programa em que deva prestar serviço;

c) recusar-se, injustificadamente, a prestar o serviço que lhe foi imposto;

d) praticar falta grave;

e) sofrer condenação por outro crime à pena privativa de liberdade, cuja execução não tenha sido suspensa.

3.5 Perdas de Bens e Valores

A perda de bens e valores está prevista no § 3º do artigo 45, do CP em que sua redação diz que “A perda de bens e valores pertencentes aos condenados dar-se-á, ressalvada a legislação especial, em favor do Fundo Penitenciário Nacional, e seu valor terá como teto - o que for maior - o montante do prejuízo causado ou do provento obtido pelo agente ou por terceiro, em consequência da prática do crime. ” Salvo legislação especial, a perda de bens e valores pertencentes aos condenados ocorrerá em benefício do Fundo Penitenciário Nacional, e seu valor terá como teto – o que for maior – o montante do prejuízo causado ou da vantagem recebida pelo agente ou por terceiro, em consequência da prática da conduta típica. Um caso exemplificativo de perda de bens e valores é onde há previsão de expropriação de glebas destinadas a cultivo de drogas, que devem ser revertidas no assentamento de colonos, para cultivo de produtos alimentícios, ou destinados a entidades sociais. (JESUS, 2001; MIRABETE, 2001; CAPEZ, 2011; SANTOS & COPABIANO, 20014)

É importante salientar que a perca de valor em favor da União é ato secundário pois taxa crimes resultantes da fabricação, uso, porte ou detenção constituída de ato ilícito, em que o amontoamento de bens e valor sejam mediantes atividade criminosa.

3.6 Multa Substitutiva

Disposto no artigo 44 em seu inciso segundo o código penal diz que “Na condenação igual ou inferior a um ano, a substituição pode ser feita por multa ou por uma pena restritiva de direitos; se superior a um ano, a pena privativa de liberdade pode ser substituída por uma pena restritiva de direitos e multa ou por duas restritivas de direitos” A multa deve ser fixada entre 10 (dez) e 360 (trezentos e sessenta) dias-multa tendo seu valor entre 30ª (trigésima) parte e 5 (cinco) vezes o valor do salário mínimo vigente, sendo sempre correlacionada a condição econômica do sentenciado. O montante constituído será repassado ao Fundo Penitenciário Estadual ou, na inexistência do primeiro, ao Fundo Penitenciário Nacional.  (JESUS, 2001; MIRABETE, 2001; CAPEZ, 2011; SANTOS & COPABIANO, 20014)

4 CONSIDERAÇÕES FINAIS

Diante das condições expostas do Sistema Penal Brasileiro e seus problemas crônicos com raiz histórica, medidas devem ser tomadas para melhorias nas condições humanas dos presos e em seus tratamentos, na infraestrutura dos estabelecimentos prisionais do país que carecem de imediata reforma e principalmente de medidas que visem alternativas ao sistema comum de cárcere, que enche presídios de todos os cantos do país agravando um problema já herdado de outras gerações. Tal problema oriundo de um fato social em meio a comunidade só pode ser resolvido de uma conjuntura formada entre governo e sociedade, sob a custódia do Estado Democrático de Direito.

O eminente aumento da população carcerária traz a tona novamente a discussão do que se fazer para conter esse agravante e medidas socioeducativas e alternativas mais brandas, todavia com poder real de ressocialização são postuladas como válvulas de escape para o já sufocado sistema carcerário. É preciso afastar de nosso sistema a ideia de que o criminoso se perverte e se corrompe no sistema prisional, voltando pior a sociedade. Haja visto que os esforços jurídicos são inversamente contrários a essa ideologia de agravamento da conduta social do indivíduo.

Dessa maneira, crimes de menor potencial ofensivo devem ser combatidos com opções legais de penas, a fim de levar o indivíduo a responder pelos seus atos, todavia de uma forma mais branda e sem o trauma psicológico e social que possa vir a ter no cárcere comum, levando em conta seus antecedentes criminais, o preceito primário da norma incriminadora e o grau mínimo do seu delito.  

A intervenção da Justiça Criminal tem por objetivo prevenir o delito, promover a segregação punitiva do infrator, constituindo a última reação do Estado em face da criminalidade, pelo que hodiernamente é forçoso reconhecer a importância da aplicação de penas alternativas, com vista à reinserção do infrator na sociedade, sem se esquecer da reparação do dano causado à vítima, que merece, ao menos, uma satisfação do Estado – Juiz em decorrência da prática criminosa por ela sofrida.

Dessa maneira esse estudo cumpre seu objetivo de apresentar os problemas do sistema prisional e alternativas legais e válidas, de forma que possa servir de revisão de literatura para estudo posteriores e aprofundados sobre o tema que tem importância imensa no sistema jurídico mundial e em toda a sociedade.

REFERENCIAS BIBLIOGRÁFICAS

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