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O princípio da polícia judiciária natural nos crimes militares dolosos contra a vida de civil

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02/11/2015 às 11:23

Resumo:


  • A Lei 9.299/96 alterou o Código Penal Militar e o Código de Processo Penal Militar, estabelecendo a competência do Tribunal do Júri para julgar crimes dolosos contra a vida cometidos por militares contra civis, mas manteve a investigação desses crimes sob a atribuição da Polícia Judiciária Militar.

  • O princípio da Polícia Judiciária Natural assegura que a investigação de ilícitos penais deve ser conduzida pela instituição policial com atribuição constitucional e legal para tal, evitando duplicidade investigativa e garantindo direitos como o juiz natural e o devido processo legal.

  • A interpretação da Lei 9.299/96 deve considerar a vontade do legislador e o processo legislativo que resultou na norma, indicando que a intenção não foi retirar a natureza militar do crime doloso contra a vida de civil, nem a competência da Polícia Judiciária Militar para investigá-lo.

Resumo criado por JUSTICIA, o assistente de inteligência artificial do Jus.

CONSIDERAÇÕES FINAIS.

O princípio da Polícia Judiciária Natural assegura ao cidadão o direito de ser investigado pela instituição policial que possui atribuição constitucional e legal para apurar o ilícito penal. De igual forma, proíbe a duplicidade na investigação criminal. O texto constitucional (art.144) fixa as atribuições das instituições policiais na atividade de investigação criminal. Dessa forma, elas devem obrigatoriamente observar os limites de suas respectivas atribuições estabelecidas na norma constitucional.

O princípio da Polícia Judiciária Natural encontra supedâneo no princípio da legalidade, da segurança jurídica, do devido processo legal, bem como no princípio da dignidade da pessoa humana. Em relação aos crimes militares, notadamente os crimes militares dolosos contra a vida de civil,  a Polícia Judiciária Natural é a Polícia Judiciária Militar por força de norma constitucional constante no art. 144, § 4º, in fine, combinado como o art. 8º, alínea “a”, da Lei Processual Penal Militar.

Por fim, é importante destacar que as atribuições e competências estabelecidas pela Constituição Federal e pelas Leis Penal e Processual Penal Militar à Justiça Militar, ao Ministério Público Castrense e à Polícia Judiciária Militar, lhes determinam um duplo dever: cumpri-las fielmente e velar para que as mesmas não sejam usurpadas por outros órgãos ou instituições[37]. Devemos ter em mente que o acanhamento institucional abre portas para a usurpação e esta legitima a irrelevância social, que leva à extinção.


Notas

[1] Art. 125 [...] § 4º - Compete à Justiça Militar estadual processar e julgar os militares dos Estados, nos crimes militares definidos em lei e as ações judiciais contra atos disciplinares militares, ressalvada a competência do júri quando a vítima for civil, cabendo ao tribunal competente decidir sobre a perda do posto e da patente dos oficiais e da graduação das praças. (g.n.)

[2] Competência jurisdicional, segundo NESTOR TÁVORA e ROSMAR ANTONNI, é o poder-dever, pertinente ao Estado-Juiz de aplicar o direito ao caso concreto. Curso de Direito Processual Penal. 3 ed. Salvador: Jus Podium, 2009, p. 193.

[3] Ninguém será processado nem sentenciado senão pela autoridade competente.

[4] DE PLÁCIDO E SILVA estabelece atribuição como sendo a competência conferida à pessoa, investida na função de cargo público, dentro da qual, criada a sua alçada, passa a exercer suas atividades. Vocabulário Jurídico. 18 ed. Rio de Janeiro: Forense, 2001, p. 99.

[5] JOSÉ AFONSO DA SILVA. Curso de Direito Constitucional Positivo. 18 ed. São Paulo: Malheiros, 2000, p. 96.

[6] JOSÉ AFONSO DA SILVA. Ob. cit. p. 192.

[7] JOSÉ AFONSO DA SILVA ensina que a dignidade da pessoa humana é um valor supremo que atrai o conteúdo de todos os direitos fundamentais do homem. Ob. cit. p. 109.

[8] No princípio da legalidade porque é o principio basilar do Estado Democrático de Direito, devendo todos e, principalmente, os agentes públicos observá-lo fielmente.

[9] É uma questão de segurança jurídica, a garantia de que ele será investigado pela polícia judiciária que possui a atribuição constitucional e legal para tanto. Daí se extrai que a Constituição Federal assegura ao cidadão o direito de ser investigado pela polícia judiciária que possui a atribuição constitucional e legal para investigar o ilícito.

[10] No princípio do devido processo legal porque esse princípio alcança também a fase pré-processual no sentido de que os incidentes processuais, que por ventura venham a ocorrer durante a investigação, sejam analisados pelo juiz natural.

[11] Enfoque Constitucional da Decisão de Pronúncia. Processo Penal e Garantias Constitucionais. MARCO ANTÔNIO MARQUES DA SILVA (coord.). São Paulo: Quarter Latin, 2006, p. 510.

[12] Processo Penal. 11 ed. São Paulo: Atlas, 2001, p. 77.

[13] Citado por RONALDO JOÃO ROTH. A Competência Constitucional da Justiça Militar Estadual e o Arquivamento do IPM no Homicídio Doloso Praticado por Militar contra Civil. Revista Justitia. São Paulo, 67 (201). Janeiro a dezembro de 2010, p. 20-21. Disponível em: http://www.revistajustitia.com.br/revistas/c36944.pdf. Acessado em 13/08/14.

[14] Citado por RONALDO JOÃO ROTH. O principio constitucional do Juiz Natural, a Justiça Militar estadual, a Policia Judiciária Militar e a Lei 9.299/96. Revista de Estudos & Informações nº 29, nov/2010. Belo Horizonte: Justiça Militar de Minas Gerais, p. 41. Disponível em: http://www.tjm.mg.gov.br/images/stories/Revista/rei_29_web.pdf. Acessado em 12/09/14.

[15] A Competência Constitucional da Justiça Militar Estadual e o Arquivamento do IPM ....Ob. cit. p. 14.

[16] Citado por ÁLVARO LAZZARINI. A constituição Federal de 1988 e as infrações penais militares. Disponível em: http://www2.senado.leg.br/bdsf/bitstream/handle/id/175816/000451496.pdf?sequence=1. Acessado em 21/11/2014.

[17] Citado por EMERSON GHIRARDELLI COELHO. Polícia Judiciária e Estado Democrático de Direito. Disponível em: http://jus.com.br/artigos/25353/policia-judiciaria-e-estado-democratico-de-direito. Acessado em 03/11/14.

[18] Disponível em: http://www.stf.jus.br/arquivo/informativo/documento/informativo66.htm. Acessado em 15/11/14.

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[19] Entendemos que o inquérito policial instaurado por autoridade incompetente é nulo ab initio.

[20] Nesse aspecto, a lição de EMERSON GHIRARDELLI COELHO. Ob. cit.

[21] Essa é a lição de EUGÊNIO PACELLI. Curso de Processo Penal. 11 ed. Rio de Janeiro: Lumen juris, 2009, p. 44.

[22] HC 44.197/MT. Disponível em http://www.jusbrasil.com.br/diarios/60440132/stj-17-10-2013-pg-4613. Idem no STJ no RHC 50.054/SP. Acessado em 11/10/14.

[23] JÚLIO FABBRINI MIRABETE. Código de processo penal interpretado. 8 ed. São Paulo: Atlas, 2001, p. 85.

[24] Ob. cit.

[25] Dessa forma, nota-se que as investidas da Polícia Civil no sentido de apurar a prática de crimes militares é prática comum anterior à celeuma doutrinária e jurisprudencial advinda após a edição da lei 9.299/96.

[26] Adoção de HC por parte do indiciado, Representação criminal por abuso de autoridade contra o Delegado de Polícia etc. Diante da violação dos direitos fundamentais e prerrogativas dos policiais militares é importante que o Comandante-Geral represente o fato junto ao Secretário de Segurança Pública e ao Ministério Publico etc. JOSÉ WILSON GOMES DE ASSIS. Considerações jurídicas acerca do crime militar doloso contra a vida de civil e seu reflexo na atividade policial militar. Disponível em: http://www.jusmilitaris.com.br/novo/uploads/docs/crimesdolososcontraavida.pdf. Acessado em 13/08/14.

[27] Projeto de Lei 2.801/92. Câmara dos Deputados. Disponível em: http://www.camara.gov.br/proposicoesWeb/fichadetramitacao?idProposicao=206879. Acessado em 15/10/14.

[28] Relator da Comissão de Defesa Nacional, a qual opinou pela aprovação do Substitutivo do Senado ao Projeto de Lei nº 2.801 – C/92. Autos da ADI nº 4164, p. 350. Disponível em: http://www.stf.jus.br/portal/peticaoInicial/verPeticaoInicial.asp?base=ADIN&s1=4164&processo=4164. Acessado em 12/09/14.

[29] Autos da ADI nº 4164, p. 118. Ibidem.

[30] Nesse aspecto, é oportuno destacar que no final de 1992, foi apensada ao Projeto de Lei 2.801/92, a proposta dos Deputados Federais HÉLIO BICUDO e CUNHA BUENO, Projeto de Lei 3.321/92.

[31] Essa proposta foi encaminhada pela Presidência da República através da Mensagem nº 779/96. Disponível em: http://www.camara.gov.br/proposicoesWeb/prop_mostrarintegra;jsessionid=144990189FB8E58CCA6E45C861D8D4A4.node2?codteor=1131889&filename=Avulso+-PL+2314/1996. Acessado em 01/11/14.

[32] Nesse sentido, destacamos o posicionamento do STF ao julgar o RE 260.404/MG, cujo Relator foi o Min. Moreira Alves, em decisão unânime, declarou a constitucionalidade do parágrafo único do art. 9º, do CPM, todavia, entendendo que implicitamente a  lei 9.299/96 excluiu os crimes dolosos contra a vida praticados contra civil do rol dos crimes militares. Disponível em: http://www.stf.jus.br/arquivo/informativo/documento/informativo221.htm. Acessado em 15/10/14.

[33] Acerca da interpretação da lei nos fala CELSO ANTÔNIO BANDEIRA DE MELLO citando AFONSO QUEIRÓ: “o fim da lei é o mesmo que seu espírito e o espírito da lei faz parte da mesma”. Curso de Direito Administrativo. 2 ed. São Paulo: Malheiros Editores, 2007,  p. 103.

[34] A Competência Constitucional da Justiça Militar Estadual e o Arquivamento do IPM .... Ob. cit. p. 35.

[35] Da natureza militar dos crimes dolosos contra a vida de civil praticados por militar e da competência do arquivamento do respectivo IPM. Coletânea de Estudos de Direito Militar e Jurisprudência. Tribunal de Justiça Militar do Estado de São Paulo. Orlando Eduardo Geraldi (Coordenação Geral). São Paulo: Imprensa Oficial, 2012, p. 296-297.

[36] Autos da ADI 4164, p. 66. Ibidem

[37] CELSO ANTÔNIO BANDEIRA DE MELLO Citando OSWALDO ARANHA BANDEIRA DE MELLO, assevera que os órgãos da Administração Pública, através de seus agentes, enquanto titulares das respectivas competências, têm direito ao exercício delas e dever jurídico de expressarem-nas e fazê-las valer, inclusive contra intromissão indevida de outros órgãos. Ob. cit. p. 136.

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Sobre o autor
José Wilson Gomes de Assis

Capitão da Polícia Militar do Piauí. Exercendo atualmente a função de superintendente do sistema prisional do Piauí. Bacharel em ciências de Defesa Social pelo Instituto de Ensino de Segurança do Pará - IESP. Bacharel em Direito e Especialista em Gestão de Segurança Pública pela Universidade Estadual do Piauí - UESPI.

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

ASSIS, José Wilson Gomes. O princípio da polícia judiciária natural nos crimes militares dolosos contra a vida de civil. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 20, n. 4506, 2 nov. 2015. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/44134. Acesso em: 22 dez. 2024.

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