A estabilidade provisória da gestante e sua percepção no atual Direito do Trabalho brasileiro

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14/12/2015 às 12:10
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O presente trabalho visa à análise da estabilidade da trabalhadora gestante frente ao contrato de emprego em razão de gravidez, graças à previsão constitucional conferida às mulheres nesta situação.

1             INTRODUÇÃO

            Um contrato de emprego possui duas partes em polos opostos, o empregado e o empregador, vinculados enquanto a relação jurídica que os envolve seja vantajosa para ambos, podendo ser resilido, via de regra, a qualquer tempo, sem maiores e mais complexas justificativas, inclusive pelo empregado, pois a este é garantida a liberdade de trabalho e, por isso, a liberdade também de não trabalhar.       O empregador, a seu turno, está investido do direito potestativo de demitir seus empregados, ao menos aqueles que não tenham adquirido estabilidade, seja ela definitiva ou provisória[1].

            O sistema normativo ou pactos privados firmados mediante negociação coletiva de entidade representativa de categoria profissional podem limitar o exercício do direito de pôr termo ao contrato de emprego, especialmente por parte do empregador, em razão da proteção conferida a situações específicas, direitos ou valores quando confrontados com o direito de o empregador dispensar, imotivadamente, seu empregado.

            Dentre elas, a Constituição Federal de 1988 instituiu a estabilidade à empregada gestante, de natureza provisória, em dispositivo constante do Ato das Disposições Constitucionais Transitórias (ADCT), em seu art. 10, II, b, em razão do qual a empregada gestante não pode ser demitida sem justa causa por um período determinado, posterior ao parto[2].

            Percebe-se que a Justiça Trabalhista brasileira, em especial manifestação por parte do Tribunal Superior do Trabalho vem formando entendimento acerca do assunto desde o final do século XX e início do século XXI, com a edição de enunciado sumular a respeito, tendo, mais recentemente, em 2012, ampliado a proteção conferida às mulheres gestantes quando da vigência de seu contrato de trabalho, com consequências práticas diretas, que por vezes, chegam a distorcer o instituto.

            A presente pesquisa visa, utilizando-se a análise da legislação pátria acerca do tema e dos entendimentos jurisprudenciais firmados, principalmente, em razão da pouca atualização doutrinária acerca do tema relativo à estabilidade gestante, a analisar os condicionantes da existência da modalidade estabilitária posta em discussão, com todas as suas nuances, através do estabelecimento de reflexões sobre a aplicação hodierna do instituto e suas consequências nas relações empregatícias da atualidade.

 

2 DOS TIPOS DE ESTABILIDADE PROVISÓRIA TRABALHISTAS

            As estabilidades existentes no direito brasileiro, hodiernamente, se resumem às de natureza provisória, tendo as estabilidades definitivas perdido força, desde o fim da possibilidade de aquisição da estabilidade decenal, aos optantes pelo regime do Fundo de Garantia por Tempo de Serviço (FGTS).[3]

            Muito embora essa tendência da inocorrência de situações em que se verifique a possibilidade de estabilidade permanente, nada obsta que o contrato individual, o regulamento de empresa ou mesmo normas coletivas de trabalho assegurem este tipo de estabilidade.[4]

            Noutro pórtico, a estabilidade provisória, aquela permitida em razão de situações excepcionais, especialmente quando o empregado põe-se, volitivamente ou por fatos alheios à sua vontade, em situação de franco conflito de interesses com seu empregador, pode ser, como a estabilidade definitiva, convencionada, ou instituída em lei, que será primeiro analisada.

 

            2.1. Estabilidades normativas heterônomas

            Embora comumente sejam denominadas de estabilidades legais[5], preferimos nos valer de conceito próprio, conforme definido. Isso porque, como será demonstrado no seguir desse trabalho, não é somente a lei que pode instituir as estabilidades provisórias, mas sim qualquer norma produzida pelo Estado, daí por que se falar em estabilidades normativas.

            Heterônomas, porque as estabilidades convencionais, que também serão alvo de tópico próprio, possuem natureza normativa, sendo, entretanto, fruto da vontade das partes ali representadas, por meio de instrumentos coletivos de trabalho, ou mesmo individuais, expressos e cláusulas do próprio contrato de trabalho individual, enquanto que as legais heterônomas são impostas pela ordem jurídica vigente, atingindo, indiscriminadamente, todo e qualquer empregado que se enquadre nas condições determinadas pelo ato que a instituiu.

            Trataremos, sucinta e exemplificativamente de algumas delas antes de adentrarmos na análise daquela que é o objeto do presente estudo, a estabilidade gestante.

 

            2.1.1. Estabilidade do CIPEIRO

   O art. 7º, I, da Constituição Federal de 1988 determina que, via de regra, os trabalhadores detém a proteção legal à despedida arbitrária ou sem justa causa, por meio de lei complementar que fixará indenização quando de sua ocorrência; [6]

            Nesta senda, o art. 10, II, a, do Ato das Disposições Constitucionais Transitórias destaca que os empregados que sejam eleitos para o desempenho de funções junto ao órgão denominado de CIPA – Comissão Interna de Prevenção de Acidentes, os denominados cipeiros, em razão de sua necessária posição ativa dentro da empresa, buscando proteção à saúde e segurança do trabalhador, gozarão de especial estabilidade de seu contrato de trabalho. [7]

            Em relação aos dispositivos apresentados, alguns comentários tornam-se importantes para a ampla compreensão da modalidade de estabilidade provisória apresentada.

            Há que se timbrar que para compor a Comissão Interna de Prevenção de Acidentes no âmbito de uma empresa, há a eleição de membros, votados pelos empregados e a indicação de membros pelo empregador, sendo agraciados pela estabilidade provisória somente os primeiros, escolhidos pelos empregados, em razão de expressa determinação da Consolidação das Leis do Trabalho[8].

            Prevê-se também, na Consolidação das Leis do Trabalho, que cada membro da CIPA terá um suplente, como se pode verificar pela dicção do art. 164 da CLT.[9]

            Muito se discutiu, durante certo tempo na doutrina, acerca da extensão da estabilidade ao suplente do titular da CIPA, bem como sobre a suposta contradição verificada entre a vedação à despedida arbitrária constante no ADCT da Constituição de 1988 e o art. 165 da CLT que abre margem para a despedida de empregado Cipeiro nos casos de aplicação de medida disciplinar, motivos técnicos, econômicos ou financeiros, tendo o Tribunal Superior do Trabalho pacificado a matéria com a edição do enunciado sumular de nº 339[10].

            Pelo que se percebe, o TST permitiu, a partir da consolidação de entendimentos firmada no enunciado sumular acima informado, que, de fato, não é a estabilidade do Cipeiro dotada da definitividade que muitos doutrinadores tentaram lhe impor, mas pode sim, ser elidida pelos casos excepcionais já mencionados, devendo existir em razão do funcionamento da empresa e não em razão de suposto direito adquirido do empregado[11].

 

            2.1.2 Estabilidade do Dirigente Sindical

            Os Sindicatos dos empregados precisam de um representante obreiro em sua direção para que este possa coordenar a busca pelas bandeiras levantadas pela categoria empregada, seja em face de um empregador específico, seja em face do sindicato patronal da categoria, entendimento este extraído do art. 543 da CLT[12].

            Nesta senda, o §3º do mesmo dispositivo mencionado determina a vedação à dispensa do empregado que seja sindicalizado ou associado e que exerça cargo de direção ou representação da entidade sindical ou associação profissional, desde o registro de sua candidatura até um ano após o término do mandato, inclusive na condição de suplente[13].

            Também a Constituição Federal de 1988 trouxe em sua redação a implementação desta estabilidade apresentada. Em seu art. 8º, VIII, determina a vedação à dispensa do empregado sindicalizado a partir do registro da candidatura a cargo de direção ou representação sindical e, uma vez eleito, ainda que suplente, permanece estável até um ano após o final do mandato, salvo se cometer falta grave nos termos da lei[14].

            A doutrina define a presente estabilidade como “a mais importante estabilidade temporária referida pela Constituição”, em razão de garantir o livre exercício da expressão sindical de forma imune a cerceamentos por parte da parte hipersuficiente da relação jus laboral, o empregador[15].

 

            2.1.3 Acidente de trabalho

            Modalidade de estabilidade conferida tão somente em legislação federal (art. 118, Lei 8.213/91 – Regime Geral de Previdência Social), não prevista na Carta Magna, a estabilidade do empregado acidentado se estende pelo prazo mínimo de 12 (doze) meses após a cessação da percepção de auxílio doença acidentário, independentemente da percepção de auxílio acidente.

            Durante muito tempo se discutiu acerca da constitucionalidade do dispositivo acima mencionado, tendo o TST, produzido, em 1997, enunciado sumular de nº 378, reforçado em 2001, com a inserção do inciso II e em 2012, com a inserção o inciso III, que determinou que o empregado submetido a contrato de trabalho por tempo determinado goza da garantia provisória de emprego decorrente de acidente de trabalho[16].   

            2.1.4 Gestante

            O art. 10, II, "b", do Ato das Disposições Constitucionais Transitórias da Constituição Federal de 1988, de forma bastante objetiva, assevera que “fica vedada a dispensa arbitrária ou sem justa causa da empregada gestante, desde a confirmação da gravidez até cinco meses após o parto”.

            Clara é a redação constitucional acerca da conhecida estabilidade provisória da empregada gestante, que não pode ter seu contrato de emprego rescindido da confirmação da gravidez até 5 (cinco) meses após o parto, salvo se por justa causa ou por pedido de demissão.

            Talvez a mais polêmica das estabilidades provisórias, e também por ser objeto do presente estudo, deixaremos a análise mais aprofundada desta modalidade estabilitária para capítulo próprio.

 

            2.2 Estabilidades convencionais

            Superada a breve explanação acerca das estabilidades classificadas como normativas heterônomas, havemos que frisar que há outra modalidade de estabilidades, as convencionais. Estabelecidas pelas partes envolvidas na relação jus laboral.

            O direito do trabalho é um ramo jurídico que permite a composição de normas no âmbito privado, valendo com força de lei, tais como os acordos e convenções coletivas e os acordos individuais, eis que seu reconhecimento tem alçada constitucional[17].

            Nesta senda, especificamente as convenções coletivas, verdadeiras “leis” produzidas entre os sindicatos patronal e empregado de uma categoria podem estabelecer espécies estabilitárias além das previstas na legislação (lato sensu) pátria. Algumas convenções coletivas Brasil à fora prevêem, enquadradas nessas categoria, estabilidades como à concedida ao funcionário em vias de preencher os requisitos para aposentadoria, ao funcionário recém egresso de férias, após greve legal, dentre outras modalidades de livre criação.

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3 A ESTABILIDADE GESTANTE E SUA PREVISAO CONSTITUCIONAL

            O Ato das Disposições Constitucionais Transitórias da Constituição da República Federativa do Brasil, promulgada em 1988, traz, expressamente, em seu art. 10, II, b[18], a previsão da estabilidade conferida à gestante desde o momento da concepção do feto até cinco meses após a ocorrência do parto. Trata-se da estabilidade da empregada no ciclo gravídico-puerperal[19]. Nesse sentido, em decorrência desta estabilidade, ficam os empregadores impedidos de despedir, arbitrariamente ou sem justa causa, as empregadas que estejam grávidas.

            Segundo Amauri Mascaro Nascimento, a intervenção do Estado em defesa da mulher apresenta tanto fundamentos fisiológicos, dada a constituição física diferenciada da mulher, quanto por fundamentos sociais, que exigem a proteção da família, em especial, da maternidade[20].

            Durante alguns anos, doutrina e jurisprudência se debruçaram sobre o texto constitucional, interpretando-o de diversas formas, quanto ao início do período estabilitário, quanto à necessidade de informação ao empregador a respeito da ocorrência da gravidez para a efetivação do direito posto, o que gerou certa controvérsia, pacificada, enfim, com a edição do enunciado sumular 244 do Tribunal Superior do Trabalho[21].

            3.1. A definição do momento do início da estabilidade gestante

            Em razão da dicção do dispositivo constitucional que prevê a estabilidade em razão do estado gravídico a partir da confirmação da gravidez, sem explicar ou regulamentar que momento seria este, surgiu a controvérsia neste sentido, com posições contrárias afirmando, ora que a confirmação da gravidez se daria com o exame clinico de sangue confirmatório do estado gravídico, devendo a estabilidade ser contada desde aquela data, ora afirmando que o exame seria utilizado apenas com o fito de atribuir caráter de segurança ao estado gravídico, mas que a dita confirmação prevista na Carta Magna faria com que a data do exame clínico retroagisse à provável data da concepção (fecundação do espermatozóide no óvulo), posição que se consolidou como dominante[22].

            Ainda surgiu uma corrente que entendia ser necessária a informação ao empregador acerca do estado gravídico, haja vista a ocorrência de situações em que a própria obreira descobria o seu estado gravídico somente após a extinção do vinculo laboral, o que conferia elevado grau de incerteza jurídica às demissões ocorridas em face de mulheres.

            Entretanto, de modo categórico a sumula 244 editada pelo TST traduziu a desnecessidade de sapiência por parte do empregador acerca do estado gravídico da empregada, encerrando a querela.

 

 

            3.2. Finalidade da Proteção

            Pela discussão que se formou no âmbito acadêmico, bem como judicial, pôde-se perceber que a finalidade da norma posta em comento no ADCT, já em 1988, buscou tutelar muito mais o direito do nascituro do que o direito da mãe, o que não afasta o direito que esta tem à estabilidade, em decorrência dos impactos físicos e psíquicos que sofre em razão da gestação. A licença tem como fato gerador, não apenas o nascimento do filho, mas também a gestação. Afinal, esta gera transtornos físicos naturais e até mesmo psíquicos à mulher.[23] [24]

            Esse vem sendo o entendimento do Tribunal Superior do Trabalho[25], que correntemente entende que a mãe sequer pode abrir mão da estabilidade em sua inteireza, devendo ou ser reintegrada, em caso de rescisão do contrato de trabalho sem justa causa, ou ser indenizada pelo período correspondente à estabilidade.

            A conseqüência prática dessa percepção é a única forma de a gestante dispensar as benesses decorrentes da estabilidade que lhe é conferida em razão de seu estado é por meio do pedido de demissão, vez que ao direito não seria possível obrigar a mãe a permanecer no emprego contra sua vontade.

            Percebe-se ao analisar a situação da necessária manutenção da gestante em seu posto de trabalho que há um conflito aparente entre dois princípios de direto, a saber, o que aduz acerca da autonomia patronal e entre a proteção à vida e ao desenvolvimento saudável do feto.

            Vê-se que a balança pendeu para a proteção à vida e ao desenvolvimento saudável do feto, haja vista a primazia do principio da dignidade da pessoa humana, constitucionalizado no art. 3º, I, da Carta da República, e que vem sendo compreendido como princípio vetor de todos os outros, o que justifica sua relevância.

            Há que se verificar, contudo, e esse levante chegou aos Tribunais pátrios, se o direito a estabilidade permanece mesmo em casos em que haja o nascimento sem vida do feto.

            A conclusão a que se chegou desde o início da década atual, pelos Tribunais Regionais, os mais diversos, é a de que deve ser conferido o direito à estabilidade gestante mesmo em casos de natimorto, em razão dos já mencionados efeitos físicos e psicológicos pelos quais passa a gestante durante o período de gravidez.[26]

            O Tribunal Superior do Trabalho, contudo, tem percebido a questão sobre uma ótica diversa, aplicando o art. 395[27] da CLT para afastar o direito à estabilidade, em razão da analogia feita por meio dele com o caso de aborto prematuro[28].

            Vê-se, entretanto, que ao aplicar o dispositivo, o TST entende que a grávida manteve o direito à estabilidade durante o estado gravídico, tendo o perdido somente quanto do parto do natimorto. O nascimento do feto sem vida não prejudica a estabilidade já gozada, gera apenas efeitos ex nunc quanto à sua cessação.

            Apesar de o TST já ter firmado entendimento no sentido acima epigrafado, como não há nenhuma norma mais cogente ou vinculativa que determine a cessação da estabilidade do período gravídico-puerperal quando da ocorrência de feto natimorto, ainda podem-se ver julgados de Tribunais Regionais que conferem o direito à estabilidade gestante mesmo em situações como esta.[29]

                       

4. O entendimento do TST a respeito da estabilidade gestante. A súmula 244 e sua redação atual. INTERPRETAÇÃO DO ENUNCIADO. CONSEQUENCIAS

            Acerca da estabilidade conferida à empregada gestante, o Tribunal Superior do Trabalho editou enunciado sumular de número 244 que aborda os aspectos relativos à estabilidade gestante, pacificando, de modo conclusivo, algumas controvérsias havidas no seio jurídico sobre o tema.

            Deve-se, entretanto, discutir o conteúdo do enunciado sumular momentos diferentes, acompanhando-se sua paulatina alteração de redação e inclusão-reconhecimento de novas garantias à empregada gestante.

            A redação original do enunciado sumular, antes mesmo da promulgação da Constituição Federal de 1988, já se preocupava com a proteção conferida ao contrato de trabalho que envolvesse a empregada gestante. Naquele momento, o TST somente reconhecia às empregadas gestantes, a possibilidade de percepção de indenização, no caso de dispensa arbitrária enquanto estivessem grávidas, correspondente ao período respectivo e demais reflexos[30].

            Em meados do ano 2000, data de nova publicação do enunciado com algumas alterações, o TST tornou pacífica a desnecessidade de conhecimento do estado gravídico por parte do empregador para que fosse possível a concessão da estabilidade à empregada grávida. Um dos leading cases tomados para modificação da redação do enunciado sumular foi o acórdão da lavra do ministro Francisco Fausto de Medeiros no Recurso Ordinário em Agravo Regimental 400356-75.1997.5.02.5555, publicado no DJ em 12.05.2000/J-11.04.2000.[31] Assim, a garantia de emprego e a licença-maternidade independem de comunicação ao empregador. A gravidez, sempre que constatada, é bastante para atribuir à gestante todos os direitos[32].

            Já no ano de 2003, houve a pacificação em relação ao período relativo ao qual a reintegração, caso a demissão já tivesse sido levada a cabo, poderia ocorrer. O TST entendeu que a reintegração da empregada já demitida somente poderia acontecer caso o período definido na Constituição como sendo de estabilidade ainda não tivesse transcorrido em sua inteireza. Uma vez impossível a reintegração, o período estabilitário deveria ser indenizado. Desse modo, acresceu-se ao enunciado sumular 244 o inciso II, que dispôs que a garantia de emprego à gestante só autoriza a reintegração se esta se der durante o período de estabilidade. Do contrário, a garantia restringe-se aos salários e demais direitos correspondentes ao período de estabilidade.

            No ano de 2012, a seu turno, houve significativa alteração na redação do enunciado sumular 244 do TST, que revelou a real preocupação do judiciário com o nascituro e a garantia do emprego para as mulheres gestantes admitidas através de contrato por tempo determinado, eis que reconheceu, expressamente, a possibilidade de concessão de estabilidade mesmo à empregada admitida por meio de contrato de duração determinada, em caso de gravidez, conforme se pode perceber pela modificação da redação do inciso III do enunciado sumular 244 do Tribunal[33].

            Os precedentes que foram utilizados para embasar a dita alteração são expressos em fixar este entendimento e em manifestar o alargamento do espectro garantidor da estabilidade conferida à empregada gestante, outrora desamparada pela estabilidade quando se tratasse de contrato de duração determinada[34], numa perspectiva cada vez mais direcionada à implementação do megaprincípio constitucional da proteção da dignidade humana.

            Talvez uma das questões mais polêmicas acerca do direito à estabilidade é a que lhe aplica conferindo à empregada gestante a garantia de seu exercício, levando-se em consideração o período de projeção do aviso prévio, para fins de fixação de termo inicial da estabilidade, em caso de este ser concedido na forma indenizada. Este entendimento, apesar de não constar de modo expresso na dicção do enunciado sumular 244 em sua redação atual[35], é reiteradamente manifesto nos julgados prolatados pelo TST[36], que utilizam como fundamento que, a teor do art. 487, §1º[37], da CLT, o período correspondente ao aviso prévio indenizado se projeta no contrato de trabalho, integrando-o como efetivo tempo de serviço. Aliás, a dicção da O.J. n.º 82 da SDI-1[38] do TST estabelece que o aviso prévio indenizado se projeta no contrato de trabalho inclusive para fins de registro da data da saída na CTPS do empregado.

            Ocorre que esse posicionamento tem gerado ampla discussão doutrinária, especialmente após a publicação da Lei 12.506/2011, que dispõe sobre o aviso prévio, vez que em razão da proporcionalidade atribuída ao instituto, em razão do tempo de serviço prestado, a empregada poderia ter 90 (noventa) dias após a comunicação da dispensa para engravidar, de modo a vir tornar nulo o ato da dispensa, ensejando sua reintegração.[39]

            Destaque-se que o próprio TST possui decisões que corroboram o entendimento de que não seria possível o reconhecimento da estabilidade gravídica quando da concepção ocorrida durante o período do aviso prévio projetado[40], compondo a minoria do Tribunal.

            Essa controvérsia é mantida, ainda, mesmo após a edição da Lei 12.812 de 2013 que acresceu à Consolidação das Leis do Trabalho o art. 391-A[41], que afirmou, categoricamente, que a confirmação do estado de gravidez advindo no curso do contrato de trabalho, mesmo que durante o aviso prévio trabalhado ou indenizado, garante à empregada gestante a estabilidade provisória prevista no Ato das Disposições Constitucionais Provisórias da CF 88.

            A manutenção da controvérsia justifica-se no fato de que o novel dispositivo não esclareceu, ainda, acerca do momento da concepção do feto, continuando ainda a utilizar a expressão confirmação da gravidez, cabendo, desse modo, a dúvida se é necessário o exame confirmatório da gravidez ter ocorrido durante o período mencionado na lei, ou se a concepção, em si, é que pode ocorrer durante este lapso temporal.

            De fato, entender-se como possível concessão de estabilidade quando da concepção havida durante o período projetado do aviso prévio indenizado é tornar de imensurável incerteza jurídica o ato de demissão de uma mulher, em razão da possibilidade de utilização de má-fé, inclusive, por parte desta, que poderia gerar o filho mesmo após ter sido comunicada da demissão, vez que gozaria de no mínimo, mais 30 (trinta) dias para tanto, numa manifesta distorção do instituto jurídico que visa a tutelar à proteção à maternidade e ao digno desenvolvimento do nascituro.

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

5. CONCLUSÃO

                        De fato, por toda a análise feita, pode-se perceber que, paulatinamente, as relações trabalhistas que envolvem mulheres que engravidam são dotadas de uma especial proteção, tanto em razão da maior vulnerabilidade a que restam submetidas, quanto pela necessidade de tutelar o direito do nascituro, ainda na condição de feto, no ventre materno.

                        A consubstanciação do enunciado sumular de nº 244 do Tribunal Superior do Trabalho é a expressão dessa proteção mencionada. Entretanto, é mister que se proceda à sua prudente aplicação, em razão de que a conferencia da estabilidade à gestante de forma desmedida pode desnaturar o instituto, fazendo que com que empregadores não sintam segurança para contratar mulheres, por verem sua autonomia patronal assaz limitada, especialmente em razão da possibilidade de reconhecimento da estabilidade nos casos de projeção de aviso prévio indenizado.

                        Dessa forma, em que pese a respeitável posição majoritária do TST, entende-se que é salutar a ponderação da aplicação do instituto sob o risco de que ao invés de se garantia à mulher especial proteção, dificulte-se, ainda que por vias implícitas, seu acesso ao mercado de trabalho, em razão da natural maior dificuldade que os empregadores irão impor à sua contratação em razão da imposição constitucional de estabilidade que tangencia esse contrato na hipótese de uma eventual gravidez, ainda que iniciada após a demissão efetivada e comunicada.

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

REFERENCIAS

BARROS, Alice Monteiro de. A mulher e o direito do trabalho. São Paulo: LTr, 1995

 

BARROS, Alice Monteiro de. Curso de Direito do Trabalho. São Paulo: LTr, 2011.

 

BRASIL. Consolidação das Leis do Trabalho (CLT): Decreto Lei 5.452. Promulgado em 1º de maio de 1943. Disponível em < http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/decreto-lei/del5452.htm > Acesso em 20/02/2014.

 

BRASIL. Constituição (1988). Constituição da República Federativa do Brasil: promulgada em 5 de outubro de 1988. Disponível em <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/constituicaocompilado.htm> Acesso em 20/02/2014.

 

CARVALHO, Augusto Cesar Leite de. Direito do Trabalho. Aracaju: Evocati, 2011.

 

CASSAR, Vólia Bomfim, Direito do Trabalho, Editora Impetus, Niterói/RJ, 2007.

 

DELGADO, Mauricio Godinho. Curso de Direito do Trabalho. São Paulo: LTR, 2009.

 

FIGUEREDO, Evelin. A estabilidade provisória das empregadas gestantes nas relações de emprego. 2009. 79fls. Monografia (Graduação em Direito) – Universidade Federal de Santa Catarina, Curitiba.

 

TRIBUNAL SUPERIOR DO TRABALHO. Sumulas. Disponível em: <http://www3.tst.jus.br/jurisprudencia/Sumulas_com_indice/Sumulas_Ind_201_250.html#SUM-244> Acesso em 23/02/2014.

 

 

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Sobre o autor
Roberto Targino

Advogado. Formado pela Universidade Federal do Rio Grande do Norte em 2010. Pós Graduado em Direito do Trabalho e Processo do Trabalho pela UNIRN. Aprovado no Concurso para Advogado do BNB em 2010. Aprovado para o Concurso para Procurador do Estado do Rio Grande do Norte, em 2015.

Informações sobre o texto

Este texto foi publicado diretamente pelos autores. Sua divulgação não depende de prévia aprovação pelo conselho editorial do site. Quando selecionados, os textos são divulgados na Revista Jus Navigandi

Mais informações

Faz-se uma análise jurisprudencial e legal do instituto, com base em fundamentos doutrinários e ponderação principiológica, buscam-se demonstrar as principais características inerentes à condição estabilitária gestacional, bem como os reflexos jurídicos e práticos decorrentes da aplicação que vem sendo dada pelos Tribunais quando da sua ocorrência, inclusive por meio da análise minuciosa de enunciado sumular editado pelo TST.

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