Introdução
O Contrato de Arrendamento Mercantil, também conhecido popularmente como “leasing”, é uma modalidade muito utilizada atualmente, gerando diversas repercussões à ordem financeira daqueles que optam por celebram contratos dessa natureza.
Em nossa história recente, as diversas alterações nos quadros políticos e econômicos que marcaram nossa nação foram determinantes em relação à instabilidade da moeda nacional, trazendo para esse contrato particular diversas desvantagens, configurando claramente abusos econômicos, sendo observadas inclusive em sede de análise do Código de Defesa do Consumidor.
O contrato de “leasing” envolve, em sua estrutura, diversos outros institutos contratuais, assim, a análise de sua natureza jurídica tem se mostrado divergente, apresentado diversas distorções em sua base natural, de tal forma que, por vezes, seu conteúdo é tão distorcido a ponto de descaracterizar sua estrutura original.
Das peculiaridades que cercam essa modalidade contratual decorrem diversas implicações, tais como as ações revisionais, que por muitas vezes encontram amparo legal no Código de Defesa do Consumidor e têm por objetivo limitar qualquer tipo de abuso ou o desnivelamento excessivo entre as partes contratantes.
Assim, para que haja uma análise adequada acerca da plausibilidade em se distribuir uma ação revisional de um contrato de “leasing”, ou para que se faça qualquer ponderação sobre o tema, imperioso analisar tal modalidade contratual e avaliar as variáveis que compõem tal instituto. Dessa forma, o presente trabalho tem a intenção de abordar a natureza jurídica do contrato de arrendamento mercantil e estudar de forma analítica e comparativa as diversas modalidades contratuais que se assemelham e que, por vezes, integram o contrato de arrendamento mercantil.
Formação Histórica
O contrato de arrendamento mercantil ou “leasing” não é uma inovação moderna, haja vista que desde a antiguidade observam-se atividades que se assemelham a essa espécie contratual. Na Grécia antiga, por centenas de anos, o governo ateniense pactuou com os particulares acordos nesses moldes. Para que houvesse a exploração das minas de propriedade do Estado, Atenas cobrava determinada quantia de dinheiro dos interessados, como garantia da exploração e, ainda, uma renda anual era fixada de acordo com o percentual de lucro obtido. Ademais, facultavam-se aos arrendatários duas opções: ou vendia-se o minério obtido ou subarrendava-se o direito à exploração.
Em que pesem as inspirações antigas, os contratos de “leasing”, nos moldes atuais, surgiram na década de 50, nos Estados Unidos. Segundo Arnaldo RIZZARDO, em referência à José Wilson NOGUEIRA DE QUEIROZ o arrendamento mercantil se desenvolveu por quatro fatores: “a) restrição e inacessibilidade do mercado de capitais e prazo médio; b) fiscalização demasiadamente severa com taxas de lucro substancial; c) economia em franca prosperidade com taxas de lucro substancial; d) empresas compelidas a uma renovação rápida de seus equipamentos, em face do célere progresso científico”.
Essas peculiaridades, atreladas ao crescimento econômico e tecnológico em que vivia os Estados Unidos, foram determinantes para acentuar o desenvolvimento do “leasing”. Segundo Arnaldo WALD, “os motivos do sucesso do “leasing” nos Estados Unidos foram a ausência no país de um mercado de capitais para crédito a médio prazo, uma tributação muito severa no tocante às depreciações, uma economia geralmente próspera com altas porcentagens de lucro e a existência de empresas obrigadas a uma renovação contínua e rápida dos seus equipamentos diante do progresso tecnológico”.
Dessa maneira, o rígido ordenamento jurídico estadunidense atrelado a forte e contínua depreciação observada, fez com que o instituto do “leasing” funcionasse como uma alternativa, pois, atuava como uma espécie de operador de crédito a médio prazo.
Após ganhar corpo por todo o território norteamericano, o “leasing” passou a ganhar novos interessados. Expandindo-se pela Europa, na França, tal modalidade foi instituída em 1963, devido principalmente a escassez de recursos financeiros concedidos pelas instituições bancárias e pela impossibilidade de aplicação de investimentos.
Na Inglaterra o arrendamento mercantil já era desenvolvido em relação aos acordos de locação e compra de bens, nos negócios previstos diretamente entre o corpo industrial, especificamente em relação à indústria de costura e vagões para locomotivas. Os acordos possibilitavam a locação dos bens e a posterior faculdade de compra desses. Na década de 60, com o aumento das demandas de investimento, as instituições financeiras ganharam mercado, conquistando espaço e colaborando para o grande desenvolvimento do instituto. Em consequência, o “leasing” foi regulamentado em 1965.
Em que pese o fato de a primeira regulamentação sobre o assunto ter se dado no Brasil apenas em 1974, pela Lei 6.099, acredita-se que, embora restem incertezas sobre a data exata, nos grandes centros comerciais, como Rio de Janeiro e São Paulo, as primeiras operações tenham se iniciado na década de 60. A primeira companhia de “leasing” fundada no Brasil foi a “Rent e Maq” em 1967, e, mesmo antes da sistematização legal do instituto era fundada a Associação Brasileira de Empresas de “leasing” a ABEL, que tinha por objetivo a regulamentação pelo instituto e a luta pelos interesses de seus associados.
Com a normatização do instituto surgiram posteriormente diversas regulamentações a fim de aperfeiçoarem a modalidade contratual, editaram-se leis e resoluções nesse sentido. Em 1982 o país chegou ao auge da utilização dessas operações, culminando, em 1984, na ampliação das operações, admitindo-se desde então a extensão do “leasing” para as pessoas físicas, para investimentos nos setores agropecuários, agroindustriais e demais atividades rurais, além das firmas individuais, trabalhadores autônomos e profissionais liberais.
Atualmente, devido principalmente a evolução constante e acelerada de equipamentos e tecnologia, os contratos mercantis encontram-se em franca expansão e, por consequência, merecem nossa atenção e estudos acerca desse peculiar instituto.
Conceito
Arnaldo RIZZARDO nos ensina que o contrato de “leasing”, originário dos Estados Unidos, é composto do sufixo ing, que significa continuidade (gerúndio), e o verbo to lease é traduzido como alugar, arrendar.
O conceito trazido pela Resolução 980∕84 define o “leasing” como sendo um negócio jurídico realizado entre uma instituição financeira e seu cliente, na intenção de oferecer recursos para aquisição de bens, sem que o arrendatário tenha que dispor de capital.
Ainda, consta do ordenamento jurídico, pela definição legal trazida pelo artigo 1˚ da Lei 6.099∕74 “considera-se arrendamento mercantil a operação jurídica realizada entre pessoas jurídicas, que tenham por objeto o arrendamento de bens adquiridos a terceiros pela arrendadora, para fins de uso próprio da arrendatária e não atendam as especificações desta”; no mesmo sentido define o artigo 1˚ da Lei 7.132∕83: “considera-se arrendamento mercantil, para os efeitos dessa Lei, o negócio jurídico realizado entre pessoa jurídica, na qualidade de arrendatária, e que tenha por objeto o arrendamento de bens adquiridos pela arrendadora, segundo as especificações da arrendatária e para uso próprio desta”.
Na prática, o desenvolvimento do instituto se inicia quando a instituição financeira, denominada arrendante, adquire o bem indicado pelo arrendatário, dando-lhe o direito de locação de um bem, por período determinado e com opção de compra deste ao fim do contrato. Esse é o modelo básico, denominado “leasing financeiro”.
Outras são as modalidades previstas, tal como ocorre no “lease-back”, onde a instituição financeira adquire o bem do próprio arrendatário, que passa alugar o bem com as mesmas opções do contrato de “leasing” financeiro. Nessa hipótese, a propriedade do bem, que anteriormente era do arrendatário, passa agora a ser do arrendante e este o dá em locação ao primeiro. Nessa modalidade, observa-se a possibilidade de se obter capital sem a necessidade de se desfazer do bem.
Outra espécie é o denominado “leasing operacional”, nesta o arrendante é o próprio fabricante do bem, tal como ocorria na Inglaterra, quando dos primórdios desse instituto nesse país, atualmente essa forma não possui grande aplicação comercial. Dentre essas modalidades, as mais comumente observadas são o “leasing financeiro” e o “lease-back” que, por serem mais relevantes, terão uma atenção especial no presente trabalho.
A seu turno, a doutrina também apresenta definições acerca do contrato de arrendamento mercantil. Arnaldo RIZZARDO identifica o conceito no Direito universal, como sendo este um contrato de natureza econômica e financeira, pelo qual uma empresa cede em locação a outrem um bem móvel ou imóvel, mediante o pagamento de determinado preço.
Segundo Arnaldo WALD trata-se de um contrato pelo qual uma empresa, desejando utilizar determinado equipamento, ou certo imóvel, consegue que uma instituição financeira adquira o referido bem, alugando-o ao interessado por prazo certo, admitindo-se que, determinado prazo locativo, o locatário possa optar entre a devolução do bem, a renovação da locação ou a compra pelo preço residual fixado no momento inicial do contrato.
Ainda, de forma didática, Carlos Alberto DI AGUSTINI define: “o “leasing” pode ainda ser definido, de maneira mais prática, como um contrato através do qual a empresa de “leasing” confere à empresa arrendatária o direito de usar um bem por determinado período de tempo, mediante o pagamento de prestações, sendo regido por cláusulas e tratamento legal específico”.
Da Natureza Jurídica
A questão central abordada neste texto se refere à natureza jurídica do contrato de “leasing”, já que não há em nosso ordenamento definição legal que conceitue ou trace considerações precisas sobre o tema. Devido a tal imprecisão, a doutrina aborda o tema de forma de forma veemente e, embora haja divergências, a maior parte dos autores entendem que o arrendamento mercantil seria definido como um contrato atípico que reune elementos de outras modalidades contratuais, tais como a locação, o financiamento e a compra e venda. Por outro lado, diversos autores, mesmo que minoritariamente, entendem que o contrato de “leasing” seria classificado como complexo, e outros tantos ainda, como contrato misto.
Segundo Aramy DORNELLES DA LUZ:
“O contrato de "leasing" é em linhas gerais, um negócio jurídico de financiamento, que toma a forma de uma locação de bens móveis ou imóveis, onde o locador atribui ao locatário direito de opção entre renovar a locação, devolver o bem ou comprá-lo, pagando então apenas o valor residual nele previsto, findo o prazo contratual”.
No mesmo sentido, nos ensina o mestre Orlando GOMES, a modalidade contratual do “leasing” não trata da locação e sim da uma figura bem próxima a locação, cujas regras se lhe aplicam se não há próprias. Da relação locativa distingue-se fundamentalmente, entretanto, pela causa; no conteúdo, apresenta, porém, muitas semelhanças.
A seu turno, Jorge Pereira ANDRADE, em seu livro, coleciona o posicionamento de diversos autores pátrios: na análise de Fran MARTINS, o arrendamento mercantil tem natureza complexa, compreendendo um alocação, uma promessa de compra unilateral de venda (em virtude de dar o arrendador opção de aquisição do bem pelo arrendatário) e às vezes um mandato, quando é o próprio arrendatário quem trata com o vendedor na escolha do bem.
Para Waldirio BULGARELLI “a empresa 'leasing', no 'leasing' financeiro trata-se de operação normal decorrente de seu objeto de atividade, ou seja, a prática de arrendamento com tríplice opção. (...) Conclui que, estruturalmente, a sequência das obrigações decorrentes do contrato de 'leasing' caracteriza-o muito mais como misto do que como complexo.(...)”
Por fim, Philomeno Joaquim DA COSTA, nos ensina que: “O 'leasing' é um contrato complexo e não um contrato coligado onde as figuras jurídicas que concorrem para sua formação têm uma causa comum, afunilando-se para um fim determinado”.
Dessa maneira, visto que a doutrina não é pacífica acerca do assunto e analisando as diversas modalidades contratuais que compõe o arrendamento mercantil, passamos a analisá-las, bem como às classificações feitas aos contratos de “leasing”.
Da classificação do contrato de “leasing”
Contrato misto ou complexo
Conforme anteriormente exposto, os contratos de arrendamento mercantil são compostos de diversos elementos, que associados, dão origem ao contrato de “leasing”. A falta de determinação quanto a natureza jurídica do instituto gera incertezas acerca da das regras a serem aplicadas a este.
A jurisprudência, assim como a doutrina, tem se mostrado plural em relação a análise do contrato de “leasing”, como demostra-se:
“O 'leasing' financeiro é um contrato complexo, que, não sendo mera locação, assemelha-se à compra e venda com reserva de domínio, ou mesmo ao contrato com cláusulas de alienação fiduciária. Isto leva à aplicação analógica da legislação pertinente a estes institutos”. (2ª Câmara do Primeiro Tribunal de Alçada Civil de São paulo, 7.2.90, RT, 653:117)
“O 'leasing' é contrato complexo, consistindo fundamentalmente num arrendamento mercantil com promessa de venda do bem após o término do prazo contratual, servindo então as prestações, como pagamento antecipado da maior parte do preço”. (4ª Turma do Superior Tribunal de Justiça, 23.3.93, Revista do STJ, 50:217, e Repertório IOB de Jurisprudência, 3:8657).
Acompanhando o posicionamento jurisprudencial anotado, Arnaldo RIZZARDO defende que o instituto mereceu, por conseguinte, tratamento legal, sendo suas operações típicas, e constituindo um contrato complexo pela combinação de dois ou mais elementos próprios, ou subcontratos, que vêm a formar uma unidade nova, pela sua fusão, na criação de um relacionamento mais complexo e extenso do que resultaria da união de vontades através dos elementos integrantes.
O contrato de "leasing", apesar de trazer aspectos de outros contratos típicos, como já citado acima, é um contrato autônomo, que segundo Orlando GOMES, resulta da combinação de elementos de diferentes contratos, formando nova espécie contratual não esquematizada na lei.
Assim, observa-se que essa corrente defende que o arrendamento mercantil é um contrato misto, haja vista que compõe-se de elementos diversos, advindos de outras modalidades contratuais. A ausência de algum desses elementos importados, descaracterizaria o contrato de “leasing”, frustrando o resultado para o qual foi criado.
Contrato de Adesão
O elemento principal que caracteriza os contratos de adesão, referem-se a forma como esses são formados. Nessa modalidade contratual, a elaboração das cláusulas contratuais ficam adstritas a apenas uma das partes contratantes, ou seja, uma parte redige o contrato enquanto a outra apenas adere o pactuado em sua plenitude, sem que haja, por consequência a discussão acerca das cláusulas.
Não há dúvidas que os contratos de arrendamento mercantil são em regra de adesão. Na prática percebemos que os contratos bancários são feitos em escala, possuindo cláusulas contratuais uniformes e aplicados sem qualquer alteração para quem quiser contratar os serviços oferecidos por tais instituições.
Observa acertadamente Orlando GOMES que a interpretação de cláusulas de um contrato de adesão necessita ser feita com muito cuidado, vez que não houve participação bilateral em sua formação, e isso pode causar dúvidas ao aderente, que teve boa-fé e as aceitou em bloco, desconhecendo o conteúdo pragmático das cláusulas.
Por ser um contrato de adesão, em que uma das partes ficou desprivilegiada em relação a formação do contrato, a doutrina e a jurisprudência tem entendido que em caso de dúvidas em relação a alguma disposição contratual, a interpretação deve ser feita em favor do adquirente, haja vista que foi a parte que redigiu o contrato que se equivocou no momento de sua elaboração.
Nessa levada, Silvio RODRIGUES desvenda algumas regras hermenêuticas relevantes para o desenvolvimento de uma interpretação contratual justa. A primeira delas, já citada acima, determina que em caso de dúvidas, a interpretação deverá ser feita em favor de quem aderiu ao contrato; as cláusulas devem ser diferenciadas entre principais e acessórias para determinar a força vinculante daquelas que chamaram a atenção do aderente, e finalmente, deve-se dar maior valia às cláusulas escritas, que tendem a revogar o conteúdo das impressas.
Nos ensina ainda Roberto AMARANTE que é imperioso lembrar que a maioria dos contratos bancários constituem-se em pactos de adesão, não havendo possibilidade de uma ampla discussão das cláusulas no momento da contratação, restando ao mutuário apenas a possibilidade de aderir ao que já está previamente estabelecido pelo conglomerado econômico.
Por fim, o nobre professor Nelson NERY JUNIOR, explica que os contratos de adesão são a concretização das cláusulas contratuais gerais, que enquanto não aceitas pelo aderente são abstratas e estáticas, e, portanto, não se configuram ainda como contrato. As cláusulas gerais de contratação tornar-se-ão contrato de adesão, dinâmicas, portanto, se e quando forem aceitas pelo aderente.
Assim, pelo exposto, devido a caracterização do arrendamento mercantil como sendo uma modalidade de contrato de adesão, o Judiciário tem feito uma análise criteriosa nos contratos de “leasing”, amenizando a soberania das cláusulas em desfavor do aderente, sempre a luz da Constituição e do Código de Defesa do Consumidor.
Locação
O contrato de locação visivelmente constitui o de “leasing”, embora este não seja a essência do arrendamento mercantil, inegável a correlação entre esses institutos. A locação pode ser observada na composição do contrato, pois, a propriedade do bem pertence ao arrendante, tendo o arrendatário tão somente a posse do bem, mediante o pagamento de determinada renda pactuada.
A doutrina é pacífica em identificar a locação como sendo um dos elementos que compõe o “leasing”, porém, importante se faz salientar que não é toda renda auferida como contraprestação nesse tipo de contrato refere-se exclusivamente no que tange a locação. Nas contraprestações, por muitas vezes, estão inclusas nas parcelas os juros, a depreciação e os lucros das instituições, estes encargos, por óbvio fogem da natureza locatícia do negócio.
Dessa forma podemos falar que o contrato de locação inspira o “leasing”, mas esse não pode ser considerado locação em sua essência, já que apresenta peculiaridades próprias e totalmente distintas daquela modalidade contratual. Em análise a determinados financiamentos imobiliários, Arnaldo RIZZARDO os análise como sendo modalidades de “leasing”, e nos esclarece que este é, em suma, uma figura em exame uma alternativa de financiamento para aquisição de qualquer tipo de veículo, máquina ou equipamento de fabricação nacional ou estrangeira, novo ou usado, incluindo também, financiamento de imóveis.
Ainda, diz o referido autor ser de conhecimento amplo que no "leasing" financeiro e no "lease back", as prestações não se equiparam a simples aluguéis. Mais que isso, significa a própria satisfação do preço do bem, tanto que, no final, para dar-se a transferência de propriedade a favor do usuário, basta exercer o direito à opção e depositar a quantia residual prevista, que é insignificante em comparação do preço real do material locado.
Observadas tais considerações, resta evidente que tais contratos de financiamentos analisados apresentam em suas parcelas mais do que uma simples contraprestação de aluguel. Soma-se ao valor cobrado encargos diversos, típicos da atividade de financiamento, para tanto, não podemos analisar, nessa hipótese, o contrato de “leasing” como sendo uma mera locação, mas sim como uma locação com caráter de financiamento, ou seja, cobra-se a parcela do aluguel atrelada a amortização no valor do bem.
Compra e venda
A consumação da compra e venda nos contratos de “leasing” se dá mediante o pagamento das parcelas avençadas no contrato, pois, como anteriormente salientado, a cada contraprestação ocorre a amortização no valor do bem, dessa forma, as parcelas pagas integram, em parte, o pagamento do valor final do bem, tal como fosse uma modalidade de compra e venda a prazo.
Diz-se que a compra e venda é a prazo quando o valor é pago em prestações, em parcelas e a propriedade somente se transfere ao comprador em momento posterior ao pagamento da última dessas contraprestações. Dessa maneira ocorre nos contratos de “leasing”, onde o valor residual garantido é fixado em quantia ínfima, ao fim do prazo estipulado no contrato, em resumo, ao quitar-se as contraprestações a instituição arrendante confere a opção ao arrendatário em ficar com o bem mediante o pagamento do valor residual deste.
Se aceita essa prerrogativa e o arrendatário paga um pequeno valor remanescente para adquirir o bem, no momento do pagamento da última parcela consuma-se de forma definitiva a compra e venda implícita no contrato de arrendamento mercantil, passando o bem para a propriedade do arrendatário. Porém, se o contratante não quiser exercer sua faculdade e optar pela devolução do bem, perderá os valores já pagos a título de contraprestações, sofrendo este inegável prejuízo.
Uma vez que a propriedade somente é transferida, com a intenção do arrendatário, em momento posterior ao pagamento da última parcela prevista no contrato, podemos falar que nessa hipótese o “leasing” se assemelha a figura da venda a prazo com reserva de domínio.
Orlando GOMES define a reserva de domínio como sendo o pacto adjeto ao contrato de compra e venda pelo qual o comprador só adquire a propriedade da coisa ao integralizar o pagamento do preço, não obstante investir-se em sua posse desde o momento da celebração do contrato. Porém, o mesmo autor afasta a hipótese de aplicação de venda a prazo com reserva de domínio, pois, na venda com reserva o concedente se obriga a transferir a propriedade do bem, depois de pagas as prestações, já no contrato de "leasing" não existe a obrigação e sim uma faculdade do arrendatário de optar pela compra no final do contrato.
Em que pese a flagrante semelhança com o instituto da venda com reserva de domínio, o arrendamento mercantil também não pode ser definido como tal. Semelhanças existem, porém o pacto adjeto da reserva de domínio não pode estar explícito em sua natureza jurídica. A compra e venda, embora presente no “leasing” somente se consuma pela opção de pagamento do valor residual garantido.
Financiamento
Por fim, outra figura frequente nos livros doutrinários é a analogia do “leasing” com o contrato de financiamento. O financiamento é o meio pelo qual a instituição financeira concede crédito a terceiros, com o fim de aquisição de bens, recebendo deste o crédito que lhe cedeu, mediante, é claro, o pagamento de encargos, tais como taxa de juros, a fim de justificar a atividade exercida pelas instituições financeiras. Nesse ponto o financiamento se aproxima do arrendamento mercantil, haja vista que no “leasing” também estão inseridas nas contraprestações encargos distintos do simples pagamento pela utilização do bem.
Embora as semelhanças sejam evidentes, Carlos Alberto DI AGUSTINI, distingue o financiamento e o “leasing”, nos alertando que no financiamento, o usuário (adquirente) adquire o bem com recursos provenientes de terceiros, passando a ter o direito de posse e uso do mesmo. E continua: Nesse caso, o bem é registrado no ativo permanente do adquirente e o financiamento gera uma passível exigível. Em determinados contratos, o adquirente pode alienar o bem como garantia da dívida contraída, pela figura jurídica denominada de "alienação fiduciária".
Como se percebe pela análise feita, o financiamento e o “leasing” são figuras próximas, porém no financiamento existe a transferência da propriedade, apesar da alienação, a seu turno, no contrato de “leasing” a transferência somente se efetiva o com exercício da faculdade em optar pela compra por parte do arrendatário.
Conclusão
O contrato de “leasing” teve sua origem primitiva nos tempos de nossa história antiga, tendo como berço o mundo grego. Posteriormente, na idade moderna, ganhou força pelo mundo na década de 50, tendo como marco inicial as operações norte americanas. No Brasil, a utilização no instituto se inicia na década de 60, sendo normatizado na década seguinte. Atualmente, é ampla a utilização desse modelo contratual pelo mundo, movimentando as instituições financeiras em busca desse lucrativo negócio jurídico.
Como já salientado, o arrendamento mercantil trata do negócio realizado entre uma instituição financeira e seu cliente, no intuito de oferecer recursos para a utilização de bens, sem a imperiosidade de sua aquisição. Embora normatizado, a natureza jurídica constante nesse instituto é complexa, não sendo pacífico na doutrina ou jurisprudência um conceito único que o defina.
Devido a relevância do tema, somado a pluralidade de conceitos que cercam a matéria, o presente trabalho teve o intuito de analisar as diferentes formas contratuais que compõe o contrato de “leasing” demostrando suas semelhanças e distinções, chegando por fim, a conclusão de que embora diversos institutos jurídicos façam parte da composição do arrendamento mercantil, esse não se confunde com nenhum deles, sendo, pois, uma modalidade contratual única, apresentando peculiaridades inerentes a sua constituição.
Em que pese tal análise, refletimos sobre a relevância dessa discussão, uma vez que em uma discussão prática sobre o assunto, imperioso se faz a aquisição de conhecimento específico sobre o tema a fim de se traçar uma linha de defesa dos interesses defendidos, independente da seara em que se discute. Por fim, cabe ressaltar que o presente trabalho não tem a intenção de esgotar a análise sobre o assunto, apenas foram levantadas teorias e considerações preliminares a fim de instigar o leitor a se aprofundar no estudo do tema.
Bibliografia
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