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Afeto: o novo dogma do Direito da Família

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3. CONCLUSÃO

Com o advento do movimento individualista e da família contemporânea, a família deixou de ser um instituto apoiado em antigas regras morais influenciadas pelo sacrilégio, patrimônio, machismo e preconceito, e passou a ser norteado pelas relações de afeto existentes entre os companheiros, independente de gênero, e seus filhos, independente de sua origem, através de diversas formas de família.

Esta nova família originou novos princípios a serem conferidos pelo julgador ao proferir suas decisões, principalmente no que se refere à utilização do princípio da afetividade como principal fundamento, prova de que o afeto tornou-se o novo dogma no direito da família.

Como pôde ser observado através da jurisprudência, o princípio da afetividade, princípio implícito originado da interpretação doutrinária na Constituição Federal, conseguiu incluir em nosso ordenamento jurídico os laços de amor existente entre as pessoas como prova suficiente reconhecer a existência de famílias, o que acaba por reconhecer também que o Direito da Família constitui-se de sentimentos.


REFERÊNCIAS:

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DIAS, Maria Berenice. Manual de Direito das Famílias, 9ª ed. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2011.

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_______. Lei N° 6.515, de 26 de dezembro de 1977. Regula os casos de dissolução da sociedade conjugal e do casamento, seus efeitos e respectivos processos, e dá outras providências.

_______. Lei N° 6.697, de 10 de outubro de 1979. Institui o Código de Menores.

_______. CONSTITUIÇÃO DA REPÚBLICA FEDERATIVA DO BRASIL DE 1988.

_______. LEI N° 8.069, de 13 de julho de 1990. Institui o Estatuto da Criança e do Adolescente.

_______.LEI N.º 10.406, de 10 de janeiro de 2002. Institui o Código Civil.

_______. LEI N° 10.741, de 1 de outubro de 2003. Dispõe sobre o Estatuto do Idoso e dá outras providências.

FACHIN, Luiz Edson. Teoria crítica do direito civil. Rio de Janeiro: Renovar, 2003.

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TARTUCE, Flávio. Novos princípios do direito de família brasileiro. Jus Navigandi, Teresina, ano 10, n. 1.069, 5 jun. 2006.

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WALD, Arnoldo. O novo direito da família. São Paulo: Saraiva, 2002


Notas

[1]Art. 233. O marido é o chefe da sociedade conjugal. Compete-lhe: 

I- a representação legal da família; 

II - a administração dos bens comuns e dos particulares da mulher, que ao marido competir administrar em virtude do regime matrimonial adotado, ou de pacto antenupcial; 

III - o direito de fixar e mudar o domicílio da família; 

IV - o direito de autorizar a profissão da mulher e a sua residência fora do teto conjugal; 

V - prover a mantença da família, guardada a disposição do art. 277. 

[2]Art. 240. A mulher assume, pelo casamento, com os apelidos do marido, a condição de sua companheira, consorte e auxiliar nos encargos de família.

[3]Art. 359. O filho ilegítimo, reconhecido por um dos cônjuges, não poderá residir no lar conjugal sem o consentimento do outro.

[4] Art. 377. A adoção produzirá os seus efeitos ainda que sobrevenham filhos ao adotante, salvo se, pelo fato do nascimento, ficar provado que o filho estava concebido no momento da adoção. 

[5] Art. 227.

[...]

§ 6º Os filhos, havidos ou não da relação do casamento, ou por adoção, terão os mesmos direitos e qualificações, proibidas quaisquer designações discriminatórias relativas à filiação.

[6] Maria Berenice Dias. Manual de Direito da Família, p. 58.

[7] Como exemplo de princípio explícito, há o princípio da dignidade da pessoa humana no seguinte dispositivo constitucional:

Art. 1°. A República Federativa do Brasil, formada pela união indissolúvel dos Estados e Municípios e do Distrito federal constitui-se em Estado Democrático de Direito e tem como fundamento:

[...]

III – a dignidade da pessoa humana;

[8] Expressão que, na sua origem grega, se liga ao adjetivo feliz e denomina a doutrina que admite ser a felicidade individual ou coletiva o fundamento da conduta humana moral, isto é, que são moralmente boas as condutas que levam à felicidade.

[9] Art. 235 - Contrair alguém, sendo casado, novo casamento:  Pena - reclusão, de dois a seis anos.

[10] Art. 1.521. Não podem casar:

[...]

VI – as pessoas casadas;

[11] Art. 550. A doação do cônjuge adúltero ao seu cúmplice pode ser anulada pelo outro cônjuge, ou por seus herdeiros necessários, até dois anos depois de dissolvida a sociedade conjugal.

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[12] Art. 1.572. Qualquer dos cônjuges poderá propor a ação de separação judicial, imputando ao outro qualquer ato que importe grave violação dos deveres do casamento e torne insuportável a vida em comum.

[13] Art. 1.727. As relações não eventuais entre o homem e a mulher, impedidos de casar, constituem concubinato.

[14] Art. 1.604. Ninguém pode vindicar estado contrário ao que resulta do registro de nascimento, salvo provando-se erro ou falsidade do registro.

[15] Art. 19. Toda criança ou adolescente tem direito a ser criado e educado no seio da sua família e, excepcionalmente, em família substituta, assegurada a convivência familiar e comunitária, em ambiente livre da presença de pessoas dependentes de substâncias entorpecentes.

[...]

§ 4o Será garantida a convivência da criança e do adolescente com a mãe ou o pai privado de liberdade, por meio de visitas periódicas promovidas pelo responsável ou, nas hipóteses de acolhimento institucional, pela entidade responsável, independentemente de autorização judicial.

[16] DIREITO DE FAMÍLIA. CASAMENTO CIVIL ENTRE PESSOAS DO MESMO SEXO (HOMOAFETIVO). INTERPRETAÇÃO DOS ARTS. 1.514, 1.521, 1.523, 1.535 e1.565 DO CÓDIGO CIVIL DE 2002. INEXISTÊNCIA DE VEDAÇÃO EXPRESSA AQUE SE HABILITEM PARA O CASAMENTO PESSOAS DO MESMO SEXO. VEDAÇÃOIMPLÍCITA CONSTITUCIONALMENTE INACEITÁVEL. ORIENTAÇÃOPRINCIPIOLÓGICA CONFERIDA PELO STF NO JULGAMENTO DA ADPF N. 132/RJ EDA ADI N. 4.277/DF. 1. Embora criado pela Constituição Federal como guardião do direito infraconstitucional, no estado atual em que se encontra a evolução do direito privado, vigorante a fase histórica da constitucionalização do direito civil, não é possível ao STJ analisar as celeumas que lhe aportam "de costas" para a Constituição Federal, sob pena de ser entregue ao jurisdicionado um direito desatualizado e sem lastro na Lei Maior. Vale dizer, o Superior Tribunal de Justiça, cumprindo sua missão de uniformizar o direito infraconstitucional, não pode conferir à lei uma interpretação que não seja constitucionalmente aceita. 2. O Supremo Tribunal Federal, no julgamento conjunto da ADPF n.132/RJ e da ADI n. 4.277/DF, conferiu ao art. 1.723 do Código Civil de 2002 interpretação conforme à Constituição para dele excluir todo significado que impeça o reconhecimento da união contínua, pública e duradoura entre pessoas do mesmo sexo como entidade familiar, entendida esta como sinônimo perfeito de família. 3. Inaugura-se com a Constituição Federal de 1988 uma nova fase do direito de família e, consequentemente, do casamento, baseada na adoção de um explícito poliformismo familiar em que arranjos multifacetados são igualmente aptos a constituir esse núcleo doméstico chamado "família", recebendo todos eles a "especial proteção do Estado". Assim, é bem de ver que, em 1988, não houve uma recepção constitucional do conceito histórico de casamento, sempre considerado como via única para a constituição de família e, por vezes, um ambiente de subversão dos ora consagrados princípios da igualdade e da dignidade da pessoa humana. Agora, a concepção constitucional do casamento - diferentemente do que ocorria com os diplomas superados - deve ser necessariamente plural, porque plurais também são as famílias e, ademais, não é ele, o casamento, o destinatário final da proteção do Estado, mas apenas o intermediário de um propósito maior, que é a proteção da pessoa humana em sua inalienável dignidade. 4. O pluralismo familiar engendrado pela Constituição -explicitamente reconhecido em precedentes tanto desta Corte quanto do STF - impede se pretenda afirmar que as famílias formadas por pares homoafetivos sejam menos dignas de proteção do Estado, se comparadas com aquelas apoiadas na tradição e formadas por casais heteroafetivos. 5. O que importa agora, sob a égide da Carta de 1988, é que essas famílias multiformes recebam efetivamente a "especial proteção do Estado", e é tão somente em razão desse desígnio de especial proteção que a lei deve facilitar a conversão da união estável em casamento, ciente o constituinte que, pelo casamento, o Estado melhor protege esse núcleo doméstico chamado família. 6. Com efeito, se é verdade que o casamento civil é a forma pela qual o Estado melhor protege a família, e sendo múltiplos os "arranjos" familiares reconhecidos pela Carta Magna, não há de ser negada essa via a nenhuma família que por ela optar, independentemente de orientação sexual dos partícipes, uma vez que as famílias constituídas por pares homoafetivos possuem os mesmos núcleos axiológicos daquelas constituídas por casais heteroafetivos, quais sejam, a dignidade das pessoas de seus membros e o afeto. 7. A igualdade e o tratamento isonômico supõem o direito a ser diferente, o direito à auto-afirmação e a um projeto de vida independente de tradições e ortodoxias. Em uma palavra: o direito à igualdade somente se realiza com plenitude se é garantido o direito à diferença. Conclusão diversa também não se mostra consentânea comum ordenamento constitucional que prevê o princípio do livre planejamento familiar (§ 7º do art. 226). E é importante ressaltar, nesse ponto, que o planejamento familiar se faz presente tão logo haja a decisão de duas pessoas em se unir, com escopo de constituir família, e desde esse momento a Constituição lhes franqueia ampla liberdade de escolha pela forma em que se dará a união. 8. Os arts. 1.514, 1.521, 1.523, 1.535 e 1.565, todos do Código Civil de 2002, não vedam expressamente o casamento entre pessoas do mesmo sexo, e não há como se enxergar uma vedação implícita ao casamento homoafetivo sem afronta a caros princípios constitucionais, como o da igualdade, o da não discriminação, o da dignidade da pessoa humana e os do pluralismo e livre planejamento familiar. 9. Não obstante a omissão legislativa sobre o tema, a maioria, mediante seus representantes eleitos, não poderia mesmo "democraticamente" decretar a perda de direitos civis da minoria pela qual eventualmente nutre alguma aversão. Nesse cenário, em regra é o Poder Judiciário - e não o Legislativo - que exerce um papel contra majoritário e protetivo de especialíssima importância, exatamente por não ser compromissado com as maiorias votantes, mas apenas com a lei e com a Constituição, sempre em vista a proteção dos direitos humanos fundamentais, sejam eles das minorias, sejam das maiorias. Dessa forma, ao contrário do que pensam os críticos, a democracia se fortalece, porquanto esta se reafirma como forma de governo, não das maiorias ocasionais, mas de todos. 10. Enquanto o Congresso Nacional, no caso brasileiro, não assume, explicitamente, sua coparticipação nesse processo constitucional de defesa e proteção dos socialmente vulneráveis, não pode o Poder Judiciário demitir-se desse mister, sob pena de aceitação tácita deum Estado que somente é "democrático" formalmente, sem que tal predicativo resista a uma mínima investigação acerca da universalização dos direitos civis. 11. Recurso especial provido. (STJ, Relator: Ministro LUIS FELIPE SALOMÃO, Data de Julgamento: 25/10/2011, T4 - QUARTA TURMA)

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Sobre o autor
Lima e Leitão Advocacia e Consultoria

Graduado em Direito pela Universidade da Amazônia. Pós-graduando em Direito Civil e Processo Civil.

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

LIMA FILHO, Lima Leitão Advocacia Consultoria. Afeto: o novo dogma do Direito da Família. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 21, n. 4586, 21 jan. 2016. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/45907. Acesso em: 24 abr. 2024.

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