Perdoai-os, Senhor, eles não sabem o que fazem!

22/01/2016 às 15:35
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Um ensaio sobre a triste realidade vivida no Rio de Janeiro, cuja população agoniza pela completa falência do sistema público de saúde, no exato momento em que aguarda dois eventos de repercussão mundial: o carnaval e as Olimpíadas de 2016.

Um ensaio sobre a triste realidade vivida no Rio de Janeiro, uma das mais belas cidades do mundo, cuja população agoniza pela completa falência do sistema público de saúde, no exato momento em que aguarda dois eventos de repercussão mundial: o carnaval e as Olimpíadas de 2016.

“Rio 40 graus, cidade maravilha, purgatório da beleza e do caos”.

Nunca o refrão da música de Fernanda Abreu refletiu de forma tão perfeita a situação vivida pelo povo carioca, neste momento crítico e de completa decadência do sistema público de saúde.

Pessoas agonizando de dor na porta dos superlotados ou fechados estabelecimentos médicos, pessoas morrendo nas filas. Casos que deveriam ser tratados em UTIs sendo mantidos em Unidades de Pronto Atendimento – UPAs, aguardando uma vaga para transferência ou a morte, o que vier primeiro.

Os “Donos da Cidade” e do Estado (a crise não é só na Capital) alegam falta de verbas para investir na saúde, no exato momento em que os preparativos para o carnaval estão a todo vapor, bem como as inúmeras obras de infra-estrutura que estão sendo feitas para receber as Olimpíadas.

Quem já precisou de um atendimento hospitalar de urgência sabe o desespero que é. O carioca tem de suportar, além da dor da própria enfermidade, o mais completo descaso das autoridades e ficar baldeando, de posto em posto, para tentar achar algum lugar que possa aliviar minimamente seu sofrimento.

Não vou ser hipócrita e dizer que o carnaval não tem importância para a cidade. São milhões e milhões de divisas que entram no país, trazidos por pessoas do mundo inteiro.

As Olimpíadas são de igual relevância, colocando o Rio de Janeiro, mais uma vez, na vitrine, para ser assistido em escala global por pessoas de países do mundo inteiro.

O ser humano, todavia, tem uma escala de necessidades, na qual a saúde está no topo da pirâmide. É ato de extrema hipocrisia alocar recursos que poderiam estar aliviando a agonia do povo carioca – que literalmente morre de dor sem atendimento – em prol de eventos exibicionistas, que em nada melhoram a qualidade da vida dos que necessitam de atendimento médico.

A crise na saúde, certamente, não será mostrada na vitrine da demagogia. Vão varrer a sujeira para debaixo do tapete.

Será que compensa manter as aparências, mostrando uma mentira para o mundo, se quando baixarem as lonas dos circos do carnaval e das Olimpíadas, o que sobrará será a triste realidade da dor dos que sofrem sem tratamento?

Sou mineiro, uai, de Belo Horizonte. Apaixonado pelo Rio de Janeiro, já que é impossível conhecer o Rio e não se enamorar. Cada canto da cidade é um cartão postal, exceto aqueles dominados pelas mazelas criadas pelo homem.

Deus fez do Rio um jardim do Éden. Uma cidade caprichosamente desenhada e esculpida pelas mãos do Criador, que não poupou esforços para criar um paraíso na Terra.

O homem, todavia, vem destruindo essa obra de Deus, pelo exercício indevido de seu livre arbítrio. Seja pela violência dos que querem o que não lhes pertence, seja pela falta de controle das autoridades. E, o que é pior: seja pelo abandono e descaso daqueles que foram eleitos para garantir aos cidadãos do Rio condições mínimas de decência e dignidade.

Há décadas, a beleza do Rio de Janeiro contrasta com as faces da violência. Hoje, além disso, a cidade sucumbe diante do mais cruel abandono na área de saúde. A Cidade Maravilhosa adoece e morre, sob o olhar inerte daqueles que a deveriam defender, no meio de uma multidão que grita, silenciosa, por ajuda, por socorro.

O maravilhoso povo carioca, tão de bem com a vida, tão bem-humorado, escuta entristecido o gemido de dor de nossos semelhantes, que choram às portas dos hospitais e clamam por atendimento básico.

Sejam bem-vindas, pessoas do mundo inteiro! O espetáculo vai começar! Beleza e caos abrirão o desfile do carnaval, em uma bizarra evolução, em que Mestre-Sala e Porta-Bandeira apregoarão, ao som das baterias, a união da contemplação do paraíso com a perplexidade dos que morrem de dor, ou daqueles que assistem a tudo de um camarote na Avenida.

Que venham as Olimpíadas, com todos os deuses do Olimpo... Enquanto nosso Cristo Redentor chora de tristeza e compaixão pelo sofrimento de Seus filhos, que morrem de dor.

Vidas que se vão, vidas que se seguem...

O Rio de Janeiro, todavia, continua lindo!

Oremos, todos, para o único Deus que existe, a quem entregamos nossas vidas, para que cuide do Rio e de todos os nossos irmãos pelo país afora e por todo o mundo, que igualmente sangra por conta do abandono, do descaso, da cobiça, da intolerância; enfim, por todos os desvios de caráter criados pelo livre arbítrio do homem.

Fiquem com Deus!

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Sobre o autor
André Mansur Brandão

Advogado da André Mansur Advogados Associados (Minas Gerais). Administrador de Empresas. Escritor.Saiba mais sobre nossa empresa em: http://andremansur.com/portfolio/

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