Violência Doméstica:aplicabilidade da Lei Maria da Penha (Lei 11.340/2006)

04/02/2016 às 19:50
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Este texto tem por escopo levantar a problemática sobre o grande número de mortes que envolvem mulheres vitimadas no próprio ambiente familiar.

Diariamente, os noticiários nos mostram o crescente número de mulheres que sofrem violência dentro de suas próprias casas. Os personagens dessa história, em quase 100% dos casos, são maridos, companheiros e até namorados. Uma parte menor envolve o pai e o irmão. Por óbvio, não somente mulheres sofrem violência doméstica, mas também, homens, incluindo aí, em sua grande maioria, crianças, porém, como o tema envolve de forma específica a mulher, é mais do que necessário destacarmos o número cada vez maior das vítimas dos próprios companheiros e maridos.

A Lei 11.340/2006 foi criada com o escopo de punir e coibir a prática de violência contra mulheres. Essa lei, popularmente conhecida como "Lei Maria da Penha", em homenagem a mais uma vítima de violência doméstica, a biofarmacêutica Maria da Penha Maia Fernandes, duas vezes vítima de tentativa de assassinato pelo marido, ganhou notoriedade ao apresentar o seu caso à Comissão Interamericana dos Direitos Humanos da OEA (Organização dos Estados Americanos). Essa lei foi considerada pela Organização da Nações Unidas, em 2012, como sendo a 3ª melhor Lei do Mundo no combate a esse tipo de violência, perdendo apenas para Espanha e Chile. Diante disso, é flagrante a necessidade prática nos dias de hoje, ou seja, de vê-la cumprindo tais finalidades. Porém, permito-me, aqui, com o meu humilde ponto de vista, dizer que essa lei teve as melhores intenções, mas, na prática, inúmeras vezes, notamos sua ineficiência.

Segundo o dicionário Aurélio, INEFICIÊNCIA significa: 1. que não produz o efeito desejado 2. que não é competente. fonte: http://www.dicionariodoaurelio.com/.

Assim, percebe-se que essa lei, como artifício e instrumento hábil a coibir violência doméstica contra a mulher, não tem produzido efeitos práticos para que haja a abstenção desse tipo de atitude. A mulher vitimada, na grande maioria das vezes por seus companheiros e maridos, deixa de procurar a delegacia de polícia competente e dar início à persecução penal, sendo, então, os fatos por ela noticiados, a partir daí, objeto de AÇÃO PENAL PÚBLICA INCONDICIONADA, como entendido pelo Supremo Tribunal Federal, em 2012, no julgamento da Rcl 14354 formulada pela PGJ - Procuradoria-Geral de Justiça do MP/SP.

Após o citado entendimento não houve mais como enquadrar os casos de violência doméstica na lei 9099/95 (Lei dos Juizados Especiais), como ocorria antes. A inércia da vítima que por vezes, deixa de ir à delegacia de polícia, está relacionada não apenas ao medo do próprio companheiro, mas, por questões íntimas envolvendo até mesmo a afeição e o suposto sentimento que ainda nutre pelo seu agressor, que, quando percebe que irá ser denunciado, modifica repentinamente suas atitudes. Torna-se presente e amoroso novamente, até que se inicie um novo ciclo de ameaças e agressões, que em sua maioria, estão relacionadas ao sentimento de posse e ciúmes que nutre pela vítima. Diante desse suposto arrependimento, as vítimas acham que "tudo irá mudar", quando, na verdade, toda a violência aflora de maneira cada vez mais preocupante.

Em relação às vítimas que criam coragem e vão até uma delegacia de polícia, notamos que, muitas vezes, as medidas protetivas impostas pela Lei 11.340/2006, de forma clara, são ineficazes. Tais medidas compreendem:

- Afastamento do agressor do lar ou local de convivência

- Limite mínimo de distância da vítima

- Suspensão da posse, ou restrição do porte de armas

Também, o agressor pode ser proibido de entrar em contato com a vítima, familiares e testemunhas, por qualquer meio, ou ainda deverá obedecer à restrição ou suspensão de visitas aos dependentes menores, ouvida a equipe de atendimento multidisciplinar ou serviço militar. Outra medida que pode ser aplicada pelo juiz, para a proteção à mulher vítima de violência, é a obrigação de o agressor pagar pensão alimentícia provisional ou alimentos provisórios.

Diante de tais medidas, resta-nos saber quando estamos tratando de um agressor que irá cumpri-las e quando estamos tratando de um agressor que não se importa com as medidas protetivas. No primeiro caso, percebemos que há o objetivo firmado pela lei, isto é, coibir o agressor. Infelizmente, no segundo caso, percebemos o não alcance do objetivo dessa lei, agindo o agressor de forma reiterada contra as medidas que lhe foram impostas e, por vezes, evoluindo para atitudes mais graves.

Sobre os casos em que o agressor não respeita as medidas que lhe foram impostas, será conferido a ele, nos termos do art. 313, III, do Código de Processo Penal, a requisição policial e decretação de sua prisão preventiva pelo juiz. Muitas vezes é nessa fase que o agressor age de maneira ainda mais perigosa, convencido de seu doentio desiderato de pôr fim a vida da vítima.

A lei 13.104/2015 inovou ao adicionar ao artigo 121 do Código Penal a figura típica do feminicídio, da seguinte maneira:

Art. 1o O art. 121 do Decreto-Lei no 2.848, de 7 de dezembro de 1940 - Código Penal, passa a vigorar com a seguinte redação:

“Homicídio simples

Art. 121. ........................................................................

.............................................................................................

Homicídio qualificado

§ 2o ................................................................................

.............................................................................................

Feminicídio

VI - contra a mulher por razões da condição de sexo feminino:

.............................................................................................

§ 2o-A Considera-se que há razões de condição de sexo feminino quando o crime envolve:

I - violência doméstica e familiar;

II - menosprezo ou discriminação à condição de mulher.

..............................................................................................

Aumento de pena

..............................................................................................

§ 7o A pena do feminicídio é aumentada de 1/3 (um terço) até a metade se o crime for praticado:

I - durante a gestação ou nos 3 (três) meses posteriores ao parto;

II - contra pessoa menor de 14 (catorze) anos, maior de 60 (sessenta) anos ou com deficiência;

III - na presença de descendente ou de ascendente da vítima.” (NR)

Art. 2o O art. 1o da Lei no 8.072, de 25 de julho de 1990, passa a vigorar com a seguinte alteração:

“Art. 1o  .........................................................................

I - homicídio (art. 121), quando praticado em atividade típica de grupo de extermínio, ainda que cometido por um só agente, e homicídio qualificado (art. 121, § 2o, I, II, III, IV, V e VI);

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A nova capitulação jurídica quanto àquele que pratica homicídio contra mulheres, nas condições impostas pela Lei, este responderá não mais por homicídio, mas sim, por FEMINICÍDIO. Objetiva a referida lei, acima de tudo, uma resposta jurisdicional mais efetiva àqueles agressores que tornam-se assassinos, seja porque descumpriram as medidas impostas pela Lei 11.340/2006, por não temerem a punibilidade estatal, seja porque, simplesmente, sem qualquer pedido de socorro da vítima às autoridades públicas, decidiu simplesmente matá-la sem conferir à vítima qualquer chance de defesa.

A luta contra a violência doméstica vai muito além das medidas repressivas, isto é, medidas que são aplicadas após alguma ação do agente agressor contra a esposa/namorada/companheira/filha ou irmã. A efetividade da Lei 11.340/2006 (Lei Maria da Penha) deve pautar-se na melhor fiscalização das medidas impostas. A ofendida pode e deve ter segurança enquanto está protegida pela referida lei, pois fornecer segurança à vítima é também um dos objetivos dessa lei. Porém, infelizmente, com o elevado número de casos envolvendo esse tipo de violência, e a falta de política prática para conceder a segurança necessária a essas mulheres, tem se tornado cada vez mais flagrante o crescimento do número de casos envolvendo desde agressão verbal até a morte dessas mulheres. As delegacias especializadas, ainda poucas e sem estrutura suficiente, deixam clara a falta de políticas voltadas ao atendimento das mulheres vitimadas.

Por fim, a prevenção é sempre o melhor caminho. O ensino nas escolas públicas dirigidas a crianças e adolescentes deve pautar-se na construção de uma mentalidade voltada à compreensão de que o amor é diferente do sentimento de posse, e que respeito deve sempre ser o fator predominante em uma relação, seja entre homens e mulheres, ou mesmo na relação de pessoas do mesmo sexo. Entretanto, essa problemática envolve a cooperação de todos os entes públicos internos: União, Estados, Distrito Federal e Municípios. Conscientizar, investir em Delegacias Especializadas em crimes contra a mulher, e dar a devida atenção à segurança de mulheres que invocam o auxílio das autoridades públicas para vencer a triste rotina da insegurança dentro de suas próprias casas são caminhos que devem ser seguidos e que necessitam de total atenção do Poder Público.


Fonte: 

http://www.compromissoeatitude.org.br/lei-no-11-340-de-07082006-lei-maria-da-penha/

Planalto: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2004-2006/2006/lei/l11340.htm

http://www.investidura.com.br/biblioteca-juridica/artigos/direito-penal/1643-lei-maria-da-penha-acao-penal-publica-incondicionada-ou-condicionada-a-representacao-nos-casos-de-lesoes-corporais.html

http://ambito-juridico.com.br/site/?n_link=revista_artigos_leitura&artigo_id=14923

http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/decreto-lei/Del3689Compilado.htm

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Sobre o autor
Mariana Santos Chaves

Advogada Criminalista

Informações sobre o texto

Este texto foi publicado diretamente pelos autores. Sua divulgação não depende de prévia aprovação pelo conselho editorial do site. Quando selecionados, os textos são divulgados na Revista Jus Navigandi

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