O servidor público comum não entende muita coisa sobre regras de aposentadoria. Também, pudera... Após cinco emendas constitucionais e várias normas infraconstitucionais que criaram inúmeras possibilidade de aposentadoria no Serviço Público, ficou muito complicado conhecer todas as alterações.
Atualmente, encontram-se em vigor, dentre regras permanentes e de transição, cerca de uma dezena de configurações possíveis de inativação, cada qual com seus requisitos de elegibilidade e regras de cálculo.
A complexidade destas normas, muitas vezes, confunde até mesmo os especialistas da área, o que dirá o servidor público que não tem a mínima intimidade com o tema!
Em razão desta diversidade de hipóteses de inativação, é muito comum o servidor público, em face da sua elevada idade e do vasto tempo de contribuição vertido, ter direito a se aposentar em mais de uma regra de aposentadoria. Há casos em que se apura tal direito em duas, três ou mais regras. Quando esta situação ocorre, deparamo-nos com um importante questionamento: qual das regras, dentre as possíveis, deve ser a escolhida para aposentar este servidor?
Ora, vejam só. A questão poderia ser facilmente dirimida perguntando-se ao servidor por qual das regras ele pretende se aposentar. Entretanto, as coisas não funcionam desta forma, pois o servidor é desconhecedor dos critérios técnicos envolvidos e das consequências que decorrem da escolha de cada regra. Nesta situação, a melhor resposta que o RPPS teria do servidor seria: “opto pela que eu perco menos”.
Evidentemente, neste caso, o servidor não fez diretamente opção por regra alguma, entretanto, ele deixa uma mensagem muito clara e importante para o RPPS: quero me aposentar pela regra em que eu perco menos dinheiro. Quero me aposentar pela que me pague mais. Quero a melhor dentre as que estão à minha disposição.
E é exatamente este óbvio e singelo apelo que impõe à Administração Pública o dever de oferecer ao servidor público sempre a melhor regra dentre as possíveis. A melhor dentre as que ele implementou os requisitos. A melhor em face das consequências financeiras advindas do cálculo e forma de reajuste. Aquela que mantenha, na medida do possível, o padrão remuneratório que o servidor percebia em atividade.
Eis aqui, portanto, o fundamento e a razão de ser, do princípio do melhor benefício, que é um direito do servidor e é oponível contra o RPPS. É dever da Administração sempre oferecer ao servidor a melhor opção de aposentadoria, dentre as eventualmente possíveis. Não se trata de um favor estatal. Constitui-se, na verdade, em verdadeiro direito subjetivo.
Desta forma, quando o servidor implementa 75 anos de idade, sendo, portanto, compulsório o seu afastamento do serviço ativo, deve-se verificar por quais regras ele poderá se aposentar, caso tenha implementado os requisitos. Se existirem diversas regras possíveis, deve-se esclarecer qual a mais vantajosa. Com esta informação, cabe ao servidor escolher. Caso, por algum motivo, ele não o faça ou se recuse a optar, cabe à Administração, prestigiando o princípio do melhor benefício, fazê-lo, aposentando-o na melhor regra.
Evidentemente, quando falamos em melhor regra dentre as possíveis, estamos nos referindo, sem sobra de dúvidas, àquelas cujo cálculo e forma de reajuste, melhor atendam aos anseios do servidor. Estamos nos referindo às regras que mantenham o direito à integralidade e paridade. Estamos nos referindo às regras que não adotam a média como critério de cálculo.
Como é de conhecimento público, inúmeras alterações ocorreram nas normas previdenciárias, sobretudo as decorrentes da EC nº 41/03 em c/c a MP nº 167/04, que extinguiram a integralidade e a paridade, criando o cálculo pela média que, em regra, diminui o valor da aposentadoria.
O servidor público desconhece a sistemática de tais alterações normativas. Ele não conhece, a fundo, o teor da EC nº 20/98 da EC nº 41/03 ou mesmo da EC nº 47/05. Mas a Administração conhece. Deve conhecer. Precisa conhecer. Ela só pode dar cumprimento ao princípio do melhor benefício se conhecer, dentre as regras em vigor, quais oferecem o melhor cálculo, cujo resultado resulte em valores, se não iguais, pelo menos próximos à remuneração do servidor em seu cargo efetivo.
Para bem ilustrar o tema aqui tratado, vejamos um caso real que ocorreu repetidas vezes no RPPS de um Município do Nordeste do Brasil: Vários servidores, após o advento da MP nº 167/04, haviam implementado os requisitos do art. 6º da EC nº 41/03, podendo, por esta norma, aposentar-se, com direito a integralidade e paridade. Entretanto, o RPPS municipal aposentou todos estes servidores com base no art. 40, §1º, III, “a”, da CF/88, regra que, após a MP nº 167/04, deixou de garantir integralidade e paridade, ou seja, o cálculo passou a ser pela média aritmética simples e o reajuste dos proventos na forma da lei.
Ora, em tese, quem implementa os requisitos do art. 6º da EC nº 41/03, também implementa os requisitos do art. 40, §1º, III, “a”, da CF/88, pois ambos exigem do homem, 60 anos de idade e 35 de contribuição e, da mulher, 55 anos de idade e 30 de contribuição. Quanto aos demais requisitos, verifica-se que o art. 6º impõe o cumprimento de 20 anos de efetivo exercício no serviço público, 10 na carreira e 5 no cargo em que se dará a aposentadoria. Já o art. 40, §1º, III, “a”, da CF/88, exige apenas a implementação de 10 anos de efetivo exercício de serviço público e 5 no cargo em que se dará a aposentadoria. Portanto, é de fácil constatação que o primeiro dispositivo engloba o segundo.
O referido art. 6º exige requisitos mais qualificados do que o do art. 40 da CF/88. Portanto, em regra, quem pode se aposentar pelo art. 6º pode se aposentar pelo art. 40, §1º, III, “a”, da CF/88. Quem pode o mais, pode o menos. A recíproca, entretanto, não é verdadeira. Quem implementa rigorosa e estritamente os requisitos do art. 40, §1º, III, “a”, da CF/88 não pode pleitear se aposentar pelo art. 6º da EC nº 41/03, visto serem aqueles requisitos mais brandos, mais fáceis de serem alcançados.
O município, neste caso, injustificadamente, só visualizou o direito implementado no art. 40, §1º, III, “a” da CF/88, mesmo com os servidores tendo implementado todos os requisitos do art. 6º da EC nº 41/03, inclusive a data de ingresso no Serviço Público, que deve ser anterior ao dia 31/12/03.
Percebam que os servidores tinham, nitidamente, direito a se aposentarem em duas regras de aposentadoria: a do art. 40, §1º, III, “a”, da CF/88, que, por não oferecer integralidade e paridade, é desvantajosa; e a do art. 6º da EC nº 41/03, que, por oferecer estes direitos, é, evidentemente, mais vantajosa.
Neste particular, o Município andou bem longe de atender ao princípio do melhor benefício, pois não expôs aos servidores as duas regras possíveis de aposentadoria, com as respectivas consequências. O município deixou de apontar qual seria a melhor. Deixou de oferecer a opção. Ao contrário, de forma desarrazoada, aposentou-os na pior regra, sem maiores discussões.
O Tribunal de Contas, ao analisar a legalidade das aposentadorias, chamou atenção a este fato, realçando o evidente prejuízo sofrido pelos servidores, na medida em que deixaram de se aposentar com valores correspondentes à remuneração do cargo efetivo, integralidade, para se aposentarem com valores menores, resultantes do cálculo da média.
Destarte, trata-se de um verdadeiro direito subjetivo do servidor, aposentar-se pela melhor regra de aposentadoria, dentre as várias que tenha implementado os requisitos. As mais vantajosas são as que possuem requisitos mais rigorosos e difíceis de serem alcançados. Se o servidor se esforçou para alcança-los, merece que a Administração lhe ofereça o direito de se aposentar pela melhor.
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