Após o ano de 1988, com o advento de nossa Carta Magna, o funcionamento da Corte Constitucional como ator na atual democracia tem sido pouco versado e analisado pelo prisma do estudo da ingerência desta no cenário da política brasileira. Neste vértice, resta cristalino que a atuação de magistrados, advogados privados e do setor público, além de procuradores e promotores, é um ingrediente essencial do processo político da democracia contemporânea.
Atribuímos a Kelsen o pensamento sistemático da Jurisdição Constitucional a importância do conceito de democracia, que é, exatamente, a possibilidade de sobrevivência e de proteção das minorias. Para Kelsen, o sistema democrático não se legitima pela verdade, mas, sim, pelo consenso[1].
Com a iniciativa dos operadores do direito moderno no manejo de demandas judiciais, provocando a Corte Constitucional a exarar sua manifestação quanto a temas relacionados a políticas públicas, tem-se observado o desenvolvimento de um fenômeno de judicialização da política no Brasil. Com isso, o judiciário – in casu o Supremo Tribunal Federal, STF - amplia sua juris dictio e poder, havendo a transferência decisória dos Poderes Legislativo e Executivo para os Ministros da Corte Constitucional.
Apresentando o tema proposto para debate, mister se faz, em análise primária, proceder com a abordagem acerca dos motivos que levaram à expansão do poder judicial, bem como versar sobre as condições para a realização desse fenômeno.
O motivo desta ampliação do poder da Jurisdição Constitucional, em cognição sumária, nos remete em grande parte pelo considerável aumento das demandas judiciais, o duplo grau de jurisdição e revisão judicial, e ainda da própria jurisprudência, que tornaram mais sofisticados os mecanismos de controle jurisdicional.
Neste raciocínio primário, constata-se também que questões inerentes à judicialização da política ligadas a interesses econômicos domésticos e globais, podem ter resultados determinantes para normatização, alteração, criação e reforma de instituições públicas e privadas, como também para a formulação e implementação de políticas públicas como a distribuição da riqueza, ajustes econômicos e fiscais, além de definição de identidades sociais, como exemplo máximo o casamento homoafetivo, normatizado e regulado via judicial, remetendo o poder decisório à Jurisdição Constitucional, ceifando da casa legislativa seu poder precípuo de criar leis.
Entretanto, a análise de casos jurídicos atuais em seu grau constitucional e sua interação e atuação com o sistema de políticas públicas, sendo elas de cunho econômico ou social, além de realizar a verificação da extensão do poder atual da Jurisdição Constitucional na democracia, demonstram a realidade jurídico-democrática brasileira. É passível de verificação e estudo os motivos que levaram ao processo de judicialização da política no Brasil, as condições para o desenvolvimento desse processo e outras abordagens possíveis a essa problemática e sua extensão no processo de criação e/ou modificação das políticas públicas nacionais.
Com isto, sera possível proceder com a análise técnica deste fenômeno, e, assim, verificar e dissertar sobre casos práticos como a união homoafetiva, instituto da desaposentação e outros que venham a agregar valor a presente pesquisa.
Deparamo-nos com as linhas escritas pelo Ministro Gilmar Mendes:
“nos Estados constitucionais contemporâneos, é incumbência da Jurisdição Constitucional ser a guardiã da Constituição, nunca em detrimento dos demais Poderes democraticamente constituídos[2].”
Atualmente, este “detrimento” citado supra tem ocorrido, em proporções cada vez mais expressivas, com impacto determinante nas políticas públicas e na sociedade brasileira.
A referencia a judicialização versa sobre o fenômeno de expansão do Poder Judiciário, no caso deste estudo, o Supremo Tribunal Federal, na vida política do país, fato que a rigor não é novo, pois desde há muito tempo muitos paises ocidentais e democráticos passaram a adotar o Tribunal Constitucional como mecanismo de controle dos demais poderes[3].
A idéia de que a Judicialização da Política como fenômeno sócio-político, modifica a ação de dizer o Direito – Jurisdição - enfraquecendo e desequilibrando as instituições, assim como a relação entre os poderes, bem como a própria democracia.
Muitas vezes, é o Judiciário quem está mais próximo dos cidadãos, que podem, diretamente, reivindicar a satisfação de seus direitos constitucionais, trazendo a baila justificativa para o crescimento do fenômeno da judicialização das políticas públicas – Vide o instituto da “desaposentação”, onde a decisão sobre o tema está empatada em votos no STF, onde possivelmente este ano haverá entendimento sobre a matéria. (Recurso Extraordinário 661256. Relator Min. Barroso).
Em análise de preliminar de julgados do STF, podemos trazer como exemplo do controle de políticas públicas por parte do Judiciário a decisão tomada na ADPF 45, na qual o Supremo Tribunal Federal foi instigado a manifestar-se sobre cumprimento de políticas públicas. No caso em apreço, a ação versou sobre a inconstitucionalidade do veto do Presidente da República sobre o § 2o do art. 55 do Projeto de Lei que se converteu na Lei 10707/2003 – Lei de Diretrizes Orçamentárias - que violaria a Emenda Constitucional 29/2000 (que estabelece recursos financeiros mínimos para o financia- mento das ações e serviços da saúde).
Com isto, verifica-se a problemática dos conceitos democráticos da divisão dos poderes, judicializacao da política e seu resultado efetivo nas políticas públicas do estado brasileiro, onde poderá este estudo versar sobre novos conceitos democráticos através de decisões judiciais, adquirindo a Jurisdição Constitucional poderes legislativos.
[1] KELSEN, Hans. Vom Wesen und Wert der Demokratie. 2a ed. 1929, p. 101
[2] Mendes, Gilmar. A Jurisdição constitucional no Brasil e seu significado para a liberdade e a igualdade. Disponível em http://www.stf.jus.br/arquivo/cms/noticiaartigodiscurso/anexo/munster_port.pdf. Acesso em 25.01.2016.
[3] Moraes, A. “Jurisdição Constitucional e tribunais constitucionais”, São Paulo, ed. ATLAS. - 2000