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Sociedade de controle:

uma projeção contemporânea e distópica

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6. CONSIDERAÇÕES FINAIS

A vigilância massiva de todo e qualquer indivíduo é elemento que descortina a privacidade de qualquer cidadão, seja este um potencial criminoso ou não.

As preocupações com relação à sociedade de controle dizem respeito à forma como ela tem se tornado invasiva, desembocando-se em um controle “descontrolável”.

É “Sorria, você esta sendo filmado” para todos os lados. São aparatos desenvolvidos dia-a-dia como canetas, bichos de pelúcia, objetos de decoração de ambiente, que contém micro-câmeras em seu interior capazes de filmar e obter escutas[10]. E frise-se que estes são somente os aparelhos mais comuns de vigilância eletrônica, existindo outros mecanismos mais avançados.

É o bombardeamento de informações e propagandas na caixa de correio eletrônico de cada pessoa, em virtude da exposição e divulgação de seus dados pessoais. São programas de realitys shows apresentando a negação da privacidade de forma glamourizada. São projetos de monitoramento eletrônico para presos, GPS (Sistema de Posicionamento Global) [11] e chips como os desenvolvidos pela Digital Angel[12], além de projetos como Google Earth. São programas específicos utilizados pelo FBI e demais autoridades policiais para desvendamento de cybercrimes[13].

Dentro em breve o que será? As características de nosso DNA, de nossa retina, chips implantandos em nossos corpos para nos monitorar (como já tem sido feito nos Estados Unidos)?

Enfim, um mundo tecnológico sem limites no tocante ao descortinamento da privacidade do indivíduo.

Encaminha-se, como dito anteriormente, para uma realidade similar ao do filme “Minority Report”, e a preocupação é no sentido de uma pessoa ser punida sem que tenha cometido toda a fase do iter criminis, ou seja, na fase da cogitação ou dos atos preparatórios.

Os cidadãos devem estar atentos à sociedade que se descortina, e por parte de cada um (tanto juristas, como aplicadores do direito ou estudantes), há que se ter um mínimo de razoabilidade com o condão de evitar extremismos, desembocando em uma irreversível superexposição e posterior aniquilação da privacidade. O direito a privacidade e o bem jurídico segurança pública devem ser sopesados, mediante a aplicação do princípio da proporcionalidade.

Outra preocupação concerne aos afetos neurológicos gerados nos indivíduos, capazes de afetar sua psique em virtude de saber que esta vivendo sendo constantemente observado. O perigo reside na falta de desenvolvimento social e saudável de cada pessoa, de amadurecimento, pois ninguém, sendo observado constantemente, vai viver sem se sentir restringido, livre, fazendo o que quer, mais sim como robôs que desenvolvem determinados tipos de comportamento por que estão sendo observados[14].

Talvez, a única liberdade que ainda possuamos na presente realidade em que vivemos, seja o da resistência, pois, segundo Deleuze, “o pensamento do lado de fora é um pensamento da resistência”. (DELEUZE, Guilles apud LEVY, internet).

Nas palavras de Cornelius Cartoriades:

[...] O problema da condição contemporânea de nossa civilização moderna é que ela parou de questionar-se. Não formular certas questões é extremamente perigoso, mais do que deixar de responder às questões que já figuram na agenda oficial; ao passo que responder o tipo errado de questões com frequência ajuda a desviar os olhos das questões realmente importantes. O preço do silêncio é pago na dura moeda corrente do sofrimento humano. Fazer as perguntas certas constitui, afinal, toda a diferença entre sina e destino, entre andar a deriva e viajar. Questionar as premissas supostamente inquestionáveis do nosso modo de vida é provavelmente o serviço mais urgente que devemos prestar aos nossos companheiros humanos e a nós mesmos. (CASTORIADIS, Cornelius apud BAUMAN, 1999, p. 11).

Questionar premissas, portanto, é o primeiro passo urgente para tentativa de mudança e quebra de paradigmas. Pois, é da dialética que nasce o direito.  


REFERÊNCIAS:

BAUMAN, Zygmunt. Globalização: as consequências humanas; tradução de Marcus Penchel. Rio de Janeiro: Jorge Zahar, 1999.

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TRINDADE, José Damião de Lima. História Social dos Direitos Humanos. São Paulo: Peirópolis, 2002.

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Notas

[1] Michel Foucalt: Nasceu em Poitiers em 1926. Foi um importante filósofo e professor da cátedra de história dos Sistemas de Pensamento no Collège de France desde 1970 a 1984. Formado em Filosofia e Psicopatologia, sua fama vem sobretudo do livro As Palavras e as Coisas (1966), ensaio de uma epistemologia das ciências sociais. Suas idéias notáveis envolvem o biopoder e a sociedade disciplinar. Faleceu em Paris em 1984. (FOUCALT, Michel, 2007).

[2] Texto original em reportagem sobre privacidade, matéria de capa da revista Amanhã, de Porto Alegre, edição nº 160, 17/11/00. Disponível em: <http://forum.jus.uol.com.br/18055/direito-a-informacao/>. Acesso em 04 agost.2010.

[3] Mais informações disponíveis no sítio <http://www.eff.org>.

[4]  Lei de proteção e cuidado aos pacientes. In: <http://waysandmeans.house.gov/media/pdf/111/ AAHCA09001xml.pdf.>, p. 1001. Acesso em 20 de junho de 2012.

[5]  THE DAILY SQUIB. In: < http://www.dailysquib.co.uk/health/3734-obamacare-subtitle-c-11-section-2521.html>. Acesso em: 30 de novembro de 2015.

[6] CONSERVAPEDIA. In: <http://www.conservapedia.com/ObamaCare>. Acesso em 30 de nov. de 2015.

[7] Vide: https://www.youtube.com/watch?v=v6AGESSavVw.

[8] Mais informações em: <http://www12.senado.gov.br/publicacoes/estudos-legislativos/tipos-de-estudos/textos-para-discussao/td178>. Acesso em 30 de nov. 2015.

[9] Autor desconhecido. Disponível em: <http://hem.passagen.se/replikant/dystopia_timeline.htm>. Acesso em: 16 agost. 2010.

[10]Visitem os seguintes sites da internet: http://www.ciakgbbrasil.com.br/?gclid=CMi6t-mCuaMCFQgf7godbzpjfw>; <http://www.btrinfo.com.br/>; <http://www.itecdiffusion.com/>; < http://www.wtinvestigacoes.com.br/> e < http://www.painelshop.com.br/espionagem>.

[11]   Inclui um conjunto de satélites, sendo um sistema de informação eletrônico que fornece, via rádio, a um aparelho receptor móvel a exata posição do mesmo com referencia as coordenadas terrestres. Melhores explicações no site: <http://informatica.hsw.uol.com.br/receptores-gps.htm>.

[12]   Chips com tecnologias que permitem a identificação rápida e precisa, bem como, rastreamento de localização e monitoramento do que é importante para as pessoas. A aplicação destes produtos incluem a identificação e monitoramento de animais e peixes, através de,, através de,  microchips RFID implantáveis, identificação dos animais com tags, pesquisas baseadas em GPS e balizas de emergência de aeronaves, navios e barcos. Informações no site: <http://digitalangel.com/>.

[13] Conduta delituosa praticada mediante emprego de recursos tecnológicos, que se amolda em dispositivo legal previsto no ordenamento jurídico brasileiro. Melhores explicações: <http://jus2.uol.com.br/doutrina/texto.asp?id=1830>;<http://jus2.uol.com.br/doutrina/texto.asp?id=327> e <http://law.udayton.edu/cybercrimes/>.

[14] Lembrando que o vencedor de programas como Big Brother, A Fazenda, etc., é sempre aquele que sabe dissimular sua personalidade e conquistar o público. Aquele que sabe se amoldar de forma rápida ao ambiente que está condicionado. 

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Sobre a autora
Daniela Costa Queiróz Medeiros

Advogada. Especialista em Direito e Processo Contemporâneo pela Faculdade de Telêmaco Borba (FATEB). Graduada em Direito pela Universidade Estadual de Ponta Grossa (UEPG). Currículo em: http://lattes.cnpq.br/7387827966250219

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

MEDEIROS, Daniela Costa Queiróz. Sociedade de controle:: uma projeção contemporânea e distópica. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 21, n. 4649, 24 mar. 2016. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/47337. Acesso em: 19 mai. 2024.

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