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A imunidade fiscal aos templos de qualquer culto:

a utilização do preceito constitucional da liberdade religiosa como um negócio rentável

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20/04/2016 às 12:33
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4    O PROBLEMA DO DESVIO DE FINALIDADE DA IMUNIDADE FISCAL DOS TEMPLOS DE QUALQUER CULTO

A finalidade é o fator primordial para assegurar a incidência da norma imunizadora. Visto que o exercício de uma atividade que não almeje garantir e/ou zelar pela livre expressão de culto, não deve ser revestido pelos ideais imunizatórios.

Por conseguinte, quando um templo exerce uma atividade econômica estará perseguindo objetivo diverso da Imunidade Tributária. Afinal, o propósito da prática de uma atividade econômica, é o lucro.

Dessa forma, a questão do desvio de finalidade se tornou um problema para a garantia do preceito constitucional da liberdade religiosa. Não obstante esse fato, a incidência da  norma aludida a essas práticas, consubstancia um escárnio aos princípios da Isonomia Fiscal e da Livre Concorrência.

4.1    O PRINCÍPIO DA ISONOMIA TRIBUTÁRIA

O conceito de igualdade para o sistema jurídico brasileiro é apresentado pela Magna Carta em seu Art. 5º onde assevera que “todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade”.

Essa igualdade é expressa de forma ambígua. De um lado prevê que a norma deve ser aplicada com base na conduta descrita, e por outro, que ao legislador cumpre instituir a lei de forma isonômica, levando em conta as desigualdades dos indivíduos.Desse modo, o conceito de Isonomia Tributária deriva desta concepção – o qual é definido no art. 150, II da CF/88 da seguinte forma:

Sem prejuízo de outras garantias asseguradas ao contribuinte, é vedado à União, aos Estados, ao Distrito Federal e aos Municípios:

[...]

II - instituir tratamento desigual entre contribuintes que se encontrem em situação equivalente, proibida qualquer distinção em razão de ocupação profissional ou função por eles exercida, independentemente  da denominação jurídica dos rendimentos, títulos ou direitos;

A igualdade no âmbito jurídico é vista como uma forma de evitar a discriminação das pessoas, físicas ou jurídicas, respeitando a sua posição na relação jurídica. Afinal não poderá ser dado um mesmo tratamento jurídico às pessoas que estão em posição inferior nesta relação.Na seara tributária esse tratamento “desigual” aos desiguais é estabelecido com base  na capacidade contributiva da pessoa, isto é, se um contribuinte possui uma situação econômica superior, deverá pagar mais tributos. Desta maneira revela Leandro Paulsen:

[...] decorre deste princípio, basicamente, que o Estado deve exigir das pessoas que contribuam para as despesas públicas na medida da sua capacidade econômica, de modo que os mais ricos contribuam progressivamente mais em comparação aos menos providos de riqueza (PAULSEN, 2012 sp.).

Entretanto, o princípio em questão determina a não ocorrência de tratamento desigual àqueles que estejam em situação jurídica semelhante.

4.2    O PRINCÍPIO DA LIVRE CONCORRÊNCIA

Para uma maior compreensão acerca deste princípio é importante explicar o que vem a ser o princípio da Livre Iniciativa, já que o princípio da Livre Concorrência é um corolário deste.

O princípio da Livre Iniciativa consiste no pensamento de liberdade econômica, ou seja, todos podem exercer uma atividade econômica, usufruindo dos seus benefícios e  também que podem dispor do tempo em que ficará explorando essa atividade econômica (art. 170, parágrafo único, da CF/88). Esse princípio ratifica os ideais do sistema econômico brasileiro – que é capitalista e neoliberal.

Como o princípio da Livre Iniciativa concede uma permissão “absoluta” para a prática econômica, o princípio da Livre Concorrência aparece como meio de limitar esta exploração, uma vez que determina normas de conduta com o fulcro de garantir o pleno funcionamento do mercado.A livre concorrência por assim dizer, é a liberdade de que possui as pessoas físicas ou jurídicas que exercem uma atividade econômica de forma igualitária (art. 170, IV, da CF/88).

Deve-se ter em conta uma disputa econômica sem a ocorrência de privilégio ou abusos de poder. Deste modo leciona José Afonso Nascimento Neto:

Livre concorrência, portanto, significa a possibilidade de os agentes econômicos atuarem sem embaraços juridicamente plausíveis, em um dado mercado, visando à produção, à circulação e ao consumo de bens e serviços, isto é, a livre concorrência procura garantir que os agentes econômicos tenham oportunidade de competir de forma justa no mercado (2009, sp.).

Corroborando com a definição aludida, o Excelentíssimo Senhor Juiz Federal da 17º vara do Rio de janeiro Eugênio Rosa de Araújo traz conceito de livre concorrência estabelecido pelo CADE:

O princípio da livre concorrência está previsto na Constituição Federal, em seu artigo 170, inciso IV e baseia-se no pressuposto de que a concorrência não pode ser restringida por agentes econômicos com poder de mercado. Em um mercado em que há concorrência entre os produtores de um bem ou serviço, os preços praticados tendem a se manter nos menores níveis possíveis e as empresas devem constantemente buscar formas de se tornarem mais eficientes, a fim de aumentarem seus lucros. Na medida em que tais ganhos de eficiência são conquistados e difundidos entre os produtores, ocorre uma readequação dos preços que beneficia o consumidor. Assim, a livre concorrência garante, de um lado, os menores preços para os consumidores e, de outro, o estímulo à criatividade e inovação das empresas (2011, sp.).

Com base nesses princípios é possível entender que a Constituição Federal de 1988 não visa proibir a atividade econômica, ao contrário, a incentiva. Contudo não tolera qualquer comportamento que inviabilize a ordem econômica brasileira.

4.3    A EXPLORAÇÃO DE ATIVIDADES ECONÔMICAS PELOS TEMPLOS RELIGIOSOS E OS PRINCÍPIOS DA ISONOMIA TRIBUTÁRIA E LIVRE CONCORRÊNCIA.

Como já fora demonstrado anteriormente neste trabalho, os templos não se restringem, apenas, aos edifícios onde são realizados os cultos religiosos, mas a tudo aquilo que tenha como finalidade essencial salvaguardar a liberdade religiosa.

No entanto, há práticas realizadas pelos templos religiosos que não tem como finalidade essencial a garantia da liberdade de culto, embora até possa vir a ser um objetivo secundário do exercício destas práticas.

No caso da exploração de atividades econômicas, como a venda de artigos religiosos,  a locação de imóveis, a criação de canais televisivos, a administração de centros comerciais, entre outros, a finalidade essencial da exploração da atividade econômica é o Lucro, e não a liberdade religiosa. O Ministro Ilmar Galvão no seu voto como relator do Recurso Extraordinário nº 325.822-2/SP, expõe citação de Baleeiro que preleciona:

O templo não deve ser apenas a igreja, sinagoga ou edifício principal, onde  se celebra a cerimônia pública, mas também a dependência acaso contígua, o convento, os anexos por força de compreensão, inclusive a casa ou  residência especial, do pároco ou pastor, pertence á comunidade religiosa, desde que não empregados em fins religiosos (grifo nosso) (Acórdão nº 325.822-2/SP, p. 254).

Assim, quando uma pessoa jurídica explora uma atividade econômica, o seu objetivo principal é auferir lucro, isto é, uma parcela excedente entre o montante investido e o percebido. Esta pessoa jurídica, por sua vez, equivale-se a concepção do Direito Empresarial conhecida como empresário. Nesse diapasão, Fábio Ulhoa Coelho entende que “empresário é a pessoa que toma a iniciativa de organizar uma atividade econômica de produção ou circulação de bens ou serviços. Essa pessoa pode ser tanto física, como jurídica” (COELHO, 2010, p. 64) .

Essa associação pode suscitar o questionamento de que se não há um intuito profissional na exploração da atividade econômica, como é possível relacionar os templos aos empresários? Ora, não se pretende afirmar neste trabalho que os templos são empresários, até porque possuem finalidades distintas, mas apenas evidenciar que, ao praticarem atividade semelhante a estes, tornam-se equivalentes juridicamente, pois, possuem, no que se refere à exploração desta atividade, os mesmos direitos e deveres.

Busca-se, dessa forma, com esta equiparação demonstrar que toda pessoa que exerce uma atividade econômica tem no lucro o seu objetivo primordial.

O  lucro,  segundo  Eduardo  Chaves32,  será  sempre  o  intuito  de  uma  empresa independentemente do seu objeto33 (2010, sp.). Desta maneira, quando um templo religioso passa a exercer atividades econômicas, assume um caráter de sociedade empresária, uma   vez que embora supostamente pretenda investir a receita obtida por esta atividade na melhoria  e/ou manutenção dos edifícios em que são realizados os rituais religiosos ou até mesmo na perpetuação do culto religioso, o seu objetivo primeiro sempre será o lucro.

Diante o exposto, é possível afirmar que a atividade econômica explorada pelos templos não é fator determinante para a garantia da liberdade religiosa, posto que não se trata de uma finalidade essencial dos templos.

O termo finalidade significa propósito, objetivo, fim. Logo, quando se pensa em finalidade essencial, pode ter em conta que se trata de um objetivo que é indispensável. E no caso do exercício de uma atividade econômica a garantia da liberdade religiosa é facilmente prescindível – o que não a torna finalidade essencial desta exploração econômica. Por outro lado, tal raciocínio pode ser aplicado ao lucro – visto que figura como finalidade essencial desta prática econômica.

Dessa forma, já que o exercício desta atividade não pretende, primordialmente, salvaguardar a liberdade de culto, não há porque se defender a imunidade tributária da exploração de atividades econômicas, pelo simples fato de serem exercidas por templos religiosos. Afinal, é a finalidade essencial da atividade exercida que irá legitimar a imunidade tributária e não apenas o fato desta ser realizada por templos religiosos.

Ademais, como há um objetivo comum com aos demais entes jurídicos que realizam atividades econômicas, qualquer norma implementada para beneficiar um determinado grupo em detrimento de outros, caracterizará um privilégio – o que, estará ferindo o princípio da Isonomia Tributária, que prevê a não ocorrência de tratamento desigual entre contribuintes que se situam em condições de igualdade jurídica.

Quando se fala de igualdade jurídica, refere-se à realidade jurídica criada pelo princípio da livre iniciativa, cujo preceito principal é o de que toda e qualquer pessoa, seja física ou jurídica, possui o direito de exercer uma atividade econômica, bem como de cessá-la.

Assim, não obstante o desrespeito ao princípio da Isonomia Tributária, deve-se ter em conta que a imunidade fiscal aos templos de qualquer culto no que tange a prática de atividades mercantis também irá de encontro ao princípio da livre concorrência. Tendo em vista que a Constituição Federal de 1988 não condena a prática econômica, mas sim o seu abuso que poderá revolver o livre funcionamento da estrutura do mercado.

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Eduardo Sabbag, discutindo a questão, elabora uma situação hipotética a fim de obter uma maior compreensão do tema:

Exemplo2: Igreja Beta, verificando o mercado de roupas, decidiu abrir uma fábrica, haja vista o êxito alcançado pelas empresas locais na mencionada atividade. Assim sendo, questiona se deve haver a imunidade de ICMS sobre a saída de mercadorias do estabelecimento comercial.

[...]

No presente caso, a referida atividade comercial ou econômica, se preponderante, poderá transformar o templo religioso em um verdadeiro“templo-empresa”, provocando uma mutilação da concorrência, mediante a “blindagem” dos seus lucros com o manto da norma imunizante (2011, p. 332).

Reafirmando a tese aludida, Eduardo Sabbag diz:

[...] é vital a inexistência de prejuízo a livre concorrência, vedando-se o cunho empresarial na atividade econômica desempenhada. Trata-se de um critério decisivo na aferição das situações de imunidade tributaria, posto que um tanto subjetivo, principalmente na precisa demarcação dos traços empresariais da atividade em analise, evitando o que o direito americano denomina “business purposes” (2011, p. 330) .

Este doutrinador, por sua vez, acredita que, apenas, a atividade econômica realizada pelos templos com caráter empresarial seria suscetível de tributação, por entender que de  outra forma não atingiria ao livre funcionamento do mercado (SABBAG, 2011, p. 332). Essa perspectiva revela um pensamento restritivo acerca do assunto abordado. Afinal, a violação ao princípio da livre concorrência independe se a atividade econômica exercida é de pequeno ou grande porte.

Entender ser possível a aplicação da norma imunizadora sobre a exploração da atividade econômica pelos templos é corroborar com a prática da concorrência desleal, já que está sendo favorecida a dominação dos mercados, à eliminação da concorrência e o aumento arbitrário do lucro, conforme assegura o art. 173, § 4º, da CF/8834. Em conclusão, a pessoa jurídica que estiver sobre o manto protetor da imunidade tributária poderia estabelecer preços a baixo ou igual aos valores de mercado sem, contudo, ter que pagar impostos durante este processo.

A ordem econômica brasileira é caracterizada como neoliberal. Entende-se por neoliberalismo  “o  modelo  econômico  definido   na  Constituição  que   se  funda  na livre iniciativa, mas consagra também outros valores com os quais aquela deve se compatibilizar” (COELHO, 2010, p. 191). Dessa forma, surge a livre concorrência como sendo um princípio derivado desta ordem econômica.

Com efeito, a livre iniciativa, prevista no art. 170, parágrafo único, da Constituição Federal de 1988, é um dos sustentáculos do sistema capitalista, e como tal é de suma importância para a manutenção desta ideologia. Segundo José Afonso Nascimento Neto35 no artigo “O Princípio da Livre Concorrência na Constituição federal de 1988”36:

[...] a livre iniciativa, traduz, também, o ideal de liberdade econômica, e seu reconhecimento pela ordem jurídica importa assegurar aos indivíduos a livre escolha da atividade que queiram desenvolver para seu sustento, e limitar a atuação do Estado no campo das opções econômicas dos agentes (2009, sp.).

Versando o sobre o mesmo princípio Jocema Bittencourt da Cruz defende que:

Assim, ressalvadas as razões de ordem pública que reservam ao Estado a ini- ciativa econômica e o controle do exercício de certas atividades, há de ser assegurado a todo indivíduo o direito de livremente iniciar a atividade econômica que lhe aprouver. Naqueles limites, os únicos requisitos neces- sários ao exercício de uma atividade econômica são o talento e o capital, não podendo o Estado vedar o acesso dos indivíduos aos meios de produção e instrumentos de trabalho. Essa é a ideia de democracia econômica, que  prega a difusão de conhecimento econômico a todos os componentes da sociedade, para que todos possam formular suas escolhas. Isso, porém, não significa uma imunidade total a qualquer regulação, pois a função social da propriedade e a justiça social, valores consagrados pela Constituição, impedem o exercício irrestrito de qualquer liberdade de conteúdo econômico (2012, p. 37).

Sem olvidar do quantum declinado até o presente momento, pontue-se que no que diz respeito a livros, jornais, periódicos, e igualmente o papel destinado a sua impressão o art. 150, VI, “c”, da CF/88, defere a imunidade fiscal. Logo, a produção e comercialização, pelos templos, de artigos dessa ordem estariam protegidas pela imunidade tributária. Nessa esteira, defende o eminente Eduardo Sabbag que:

[...] desde 2003, quando o Pleno do STF apreciou os Embargos de Divergência no Recurso Extraordinário n. 210.251/SP, de relatoria da eminente Ministra Ellen Gracie, com julgamento em 26 de fevereiro daquele ano, entendeu-se que a imunidade prevista no art. 150, VI, “c”, da Carta Magna aplicava-se as operações de vendas de mercadorias fabricadas por entidades imunes, impedindo a incidência de ICMS, com a condição de que  o lucro obtido fosse vertido a consecução da finalidade precípua da entidade. Sabe-se que a orientação adotada acima foi reiterada em 2006, pelo Pleno do STF, nos Embargos de Divergência no Recurso Extraordinário n. 186.175/SP, de relatoria da eminente Ministra Ellen Gracie, com julgamento em 23 de agosto daquele ano [...] (2011, p. 333).

Desse modo, não há uma inclinação acerca da proibição da exploração de atividades econômicas pelos templos religiosos, mas tão somente o intuito de defender a tributação destas práticas, posto que tal exploração os revestem de caráter empresarial – o que enseja a tributação de suas atividades econômicas em respeito aos princípios da isonomia tributaria e da livre concorrência.

O STF, entretanto, defende a tese de que não apenas o templo será imune de impostos, mas também toda e qualquer atividade exercida por este que esteja relacionada com a finalidade essencial do mesmo, independente de se tratar de uma atividade econômica.

Data vênia ao entendimento da Suprema Corte brasileira, a ideia de que toda a atividade explorada pelo templo deverá ser regulada pela norma imunizadora com o objetivo de não interferir no livre culto, acaba sendo muito permissiva. Haja vista que é fato notório que há atividades realizadas pelos mesmos que não visam atender esta finalidade. E como não há uma fiscalização por parte do Estado quanto à instituição desses templos, como também com a renda obtida pelas práticas mercantis, há uma grande possibilidade de ocorrer uma inversão de valores.

Hodiernamente, é perceptível a mudança de postura de algumas entidades religiosas – que ao invés de ter como objetivo a livre manifestação da religião, tem como fim em si mesmo a obtenção de renda, escondendo-se sobre os preceitos constitucionais da imunidade fiscal e da liberdade religiosa. O Estado deve, assim, estar atento às práticas lesivas realizadas no âmbito de alguns templos que estão infringindo o arcabouço jurídico brasileiro.

Para fundar uma organização religiosa no Brasil, por exemplo, é impreterível o seu registro no Cartório de Pessoa Jurídica, com base no art. 44, VI, § 1º, do CC/02. Com isso, quando um indivíduo, visando propósito diverso do livre exercício de culto, abre um templo registrando-o para não levantar suspeitas das suas reais intenções e passa a receber doações dos “fiéis”, a cobrar o dízimo, como também a explorar atividades econômicas com o único fim de beneficiar interesses individuais, estará incorrendo no crime de estelionato (art. 171, do CP) - que segundo Fernando Capez

Consiste em induzir ou manter alguém em erro, mediante o emprego de artifício, ardil ou qualquer meio fraudulento, a fim de obter para si ou para outrem, vantagem ilícita em prejuízo alheio.

Trata-se de crime em que, em vez da violência, ou grave ameaça, o agente emprega um estratagema para induzir em erro a vítima, levando-a a ter uma errônea percepção dos fatos, ou para mantê-la em erro, utilizando-se de manobras para impedir que ela perceba o equívoco em que labora (2010, p.569).

Há casos ainda em que é evidente um interesse associativo de indivíduos que administram os templos religiosos, de se utilizar da organização religiosa para alcançar proveitos individuais. Esta associação, segundo Fernando Capez, pode configurar o tipo penal de quadrilha ou bando (art. 288, do CP), desde que esta conexão seja composta por mais de três indivíduos (2010, pp.318-319).

Assim, a título ilustrativo, evidencia-se denegação a impetração de Habeas Corpus feita pelo pastor Edir Macedo, acerca da denúncia do Ministério Público de São Paulo sobre indícios da realização de práticas ilícitas realizadas em suas igrejas:

EMENTA. PENAL E PROCESSUAL PENAL - HABEAS CORPUS - CRIMES DE "LAVAGEM" DE VALORES, EVASÃO DE DIVISAS E FORMAÇÃO DE QUADRILHA - RECEBIMENTO DA DENÚNCIA - ALEGAÇÃO DE AUSÊNCIA DE JUSTA CAUSA - INÉPCIA - FALTA DE DESCRIÇÃO DO ENVOLVIMENTO DO PACIENTE NOS FATOS NARRADOS - MATERIALIDADE E FORTES INDÍCIOS DE AUTORIA EXISTENTES - TRANCAMENTO DA AÇÃO PENAL QUE SE AFASTA - DENEGAÇÃO DA ORDEM.

1.    A realização de condutas inerentes às espécies delitivas em análise, em regra, independem da presença física do agente, bem como em nada estão relacionadas à gestão societária, parecendo-me evidente que a remessa ilegal de divisas ao exterior, via "operação cabo", a sua manutenção em bancos estrangeiros e o seu posterior "branqueamento" por meio de procedimentos escusos e fraudulentos, podem facilmente realizar-se por meio de "laranjas", sem que o nome e demais dados qualificativos do mandante ou autor mediato, detentor do poder de ordem ou do domínio do fato conste nos respectivos contratos entabulados.

2.    Há nos autos provas testemunhais e documentais, todas ainda indiciárias,  é claro, dando conta da existência de sérios indícios de o paciente estar envolvido, em tese, com os crimes de evasão de divisas, "lavagem" de valores (tendo como crime antecedente a evasão) e de formação de  quadrilha, porquanto, ao que se dessume, teria ele se unido a diversas  pessoas para enviar grande quantidade de capital ao exterior, sem dar conhecimento às autoridades monetárias brasileiras competentes, e depois promover à sua ocultação e dissimulação, utilizando-se para tanto de procedimentos ilícitos, descritos pelos testemunhos colhidos, sendo ele o detentor do domínio do fato ou o autor das ordens e das diretrizes a serem seguidas por seus comparsas, visando ao "branqueamento" de valores e bens, como bem explanado em primeiro grau.

3.    Os fatos estão claramente descritos, possibilitando o contraditório e a ampla defesa, inexistindo razão, pois, para o trancamento imediato da ação penal originária.

4.    Ordem denegada.

(BRASIL. Seção judiciária de São Paulo. (5º vara). Processo nº 38794 SP 0038794-85.2011.4.03.0000. Desembargador Federal Luiz Stefanini, São Paulo, 27 de outubro de 2012.)

Diante tudo o que foi exposto, diga-se, por fim, que não há, em hipótese alguma, a pretensão de afirmar que a determinação de cobrança de tributos sobre a exploração de atividades econômicas pelos templos será meio decisivo para erradicar o surgimento destas práticas criminosas. Em verdade, o presente estudo buscou simplesmente uma  conscientização no sentido de que a sua tributação, atrelada à fiscalização pelos entes políticos, ensejará um freio ao ambiente propício aos abusos praticados através da utilização capciosa do manto da imunidade em apreço.

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Sobre o autor
Emily Rosas Souza Farias

Advogada. Bacharel em Direito pela Universidade do Estado da Bahia - UNEB. Hodiernamente, é discente do curso de Pós Graduação em Direito Tributário da Universidade Católica de Salvador - UCSAL.

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

FARIAS, Emily Rosas Souza. A imunidade fiscal aos templos de qualquer culto:: a utilização do preceito constitucional da liberdade religiosa como um negócio rentável. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 21, n. 4676, 20 abr. 2016. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/47957. Acesso em: 22 dez. 2024.

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