O sigilo bancário é mantido pela receita federal

10/04/2016 às 15:02
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Este artigo trata-se de uma análise acerca da possibilidade de acesso pelas Administrações Tributárias e Auditores-Fiscais dos respectivos entes (União, Estados, Distrito Federal e Municípios) às informações sobre movimentações financeiras de pessoa física e pessoa jurídica.

Julgamento do RECURSO EXTRAORDINÁRIO 601.314/SP, em 17/02/2016.

Este artigo trata-se de uma análise simplificada acerca da possibilidade de acesso pelas Administrações Tributárias e Auditores-Fiscais dos respectivos entes (União, Estados, Distrito Federal e Municípios) às informações sobre movimentações financeiras realizadas pelas pessoas físicas e jurídicas no Brasil.

Inicialmente destaco o Art. 145, §1º, da Constituição Federal de 19881 que previu o princípio da “Capacidade Contributiva” ao mesmo tempo em que autoriza a Administração Tributária a identificar, nos termos da lei, o patrimônio, os rendimentos e as atividades econômicas do contribuinte, in verbis:

“Art. 145.A União, os Estados, o Distrito Federal e os Municípios poderão instituir os seguintes tributos:(…)

§ 1º Sempre que possível, os impostos terão caráter pessoal e serão graduados segundo a capacidade econômica do contribuinte, facultado à administração tributária, especialmente para conferir efetividade a esses objetivos, identificar, respeitados os direitos individuais e nos termos da lei, o patrimônio, os rendimentos e as atividades econômicas do contribuinte.”

Importante destacar que o próprio comando constitucional direciona os Entes Públicos a graduarem os impostos segundo a capacidade contributiva dos contribuintes, seja ele pessoa física ou jurídica. Esse direcionamento busca atender um outro princípio previsto na CF/88, o Princípio da Igualdade (Art. 5º, caput), ou seja, tratar igualmente os iguais e desigualmente os desiguais.

E, para que se atenda a tais princípios, há necessidade da identificação correta dos bens e rendimentos auferidos pelos contribuintes. Daí surge a necessidade do fisco ter à disposição as ferramentas atuais e necessárias na correta identificação das informações para a cobrança mais justa possível dos impostos.

Ademais, necessário destacar que o próprio §1º do Art. 145 autoriza os fiscos, nos termos da lei, a realizarem as identificações dos rendimentos auferidos.

Assim sendo, em 10 de janeiro de 2001, foi publicada a Lei Complementar nº 105/20012, que, em seu Art. 6º, previu o acesso, sem autorização judicial, às movimentações financeiras pelos fiscos. Referido dispositivo legal dispôs que, para acessar tais dados seriam necessárias a instauração de Procedimento Fiscal prévia e a verificação da indispensabilidade desses dados na conclusão dos trabalhos, in verbis:

“Art. 6o As autoridades e os agentes fiscais tributários da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios somente poderão examinar documentos, livros e registros de instituições financeiras, inclusive os referentes a contas de depósitos e aplicações financeiras, quando houver processo administrativo instaurado ou procedimento fiscal em curso e tais exames sejam considerados indispensáveis pela autoridade administrativa competente.     (Regulamento)

        Parágrafo único. O resultado dos exames, as informações e os documentos a que se refere este artigo serão conservados em sigilo, observada a legislação tributária.”

É oportuno ressaltar, ainda, que no §1º do Art. 145 há previsão de que as informações e os documentos acessados nas condições previstas serão conservados em sigilo, ou seja, não há quebra ou interrupção do sigilo bancário, mas, sim, há apenas transferência do sigilo bancário das instituições financeiras para as Administrações Tributárias. Assim, de fato, não ocorre quebra de sigilo bancário, pois as autoridades que acessarem referidas informações não poderão divulgá-los à sociedade, ao público em geral, sob pena de sofrerem sanções administrativas e criminais.

Por outro lado, há também defensores de ponto de vista oposto, e seus argumentos fundamentam-se no Art. 5º, X e XII, da CF/88. Eles entendem que o acesso às movimentações financeiras pelos fiscos, sem autorização judicial, não estaria autorizado pelos comandos mencionados, in verbis:

“Art. 5. Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes: (…)

X - são invioláveis a intimidade, a vida privada, a honra e a imagem das pessoas, assegurado o direito a indenização pelo dano material ou moral decorrente de sua violação;”(...)

“XII - é inviolável o sigilo da correspondência e das comunicações telegráficas, de dados e das comunicações telefônicas, salvo, no último caso, por ordem judicial, nas hipóteses e na forma que a lei estabelecer para fins de investigação criminal ou instrução processual penal;”

Dessa forma, é de se constatar que o embate jurídico acerca do tema proposto gira basicamente em torno do “confronto aparente” entre o §1º do Art. 145 e o Art. 5º, X, XII.

Contudo, os valores tutelados pelos comandos mencionados (Art. 5º, X e XII) não se tratam de movimentações financeiras, mas, sim, da intimidade, da vida privada, tais como “relações familiares, ideologia política e crença religiosa” etc. (conforme mencionados no Relatório Voto Ministro Edson Fachin. Sigilo Bancário. Site Conjur.), enquanto as movimentações financeiras revelam as transações financeiras realizadas pelos contribuintes, dados que apresentam viés patrimonial.

Embora, os bens patrimoniais também devam ser resguardados pelo sigilo fiscal, conforme dispositivos legais pertinentes da legislação tributária, não seria apropriado buscar guarida nos comandos constitucionais acima transcritos, pois o acesso às movimentações financeiras é necessário na correta identificação da capacidade contributiva dos contribuintes visando dar um tratamento mais justo aos mesmos, observando-se, assim, o princípio da igualdade.

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Por derradeiro, importante lembrar que, desde o ano de 1922, quando foi instituído no Brasil o “Imposto Geral Sobre a Renda”, a Administração Tributária Brasileira tem acesso às informações de caráter patrimonial dos contribuintes, cujos dados sempre estiveram resguardados pelo sigilo fiscal. Assim, o julgamento do RECURSO EXTRAORDINÁRIO 601.314/SP, em 17 de fevereiro de 2016, pelo STF, não permitiu a quebra do sigilo bancário, mas, sim, autorizou a transferência do sigilo das instituições financeiras para as Administrações Tributárias.


Notas

1Constituição Federal 88

2Lei Complementar nº 105/2001

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Sobre o autor
Antonio Nakaoka

Graduado em Direito, MBA em Administração Tributária pela FGV/SP, Mestre em Direito Empresarial e Cidadania pela UNICURITIBA/Curitiba/PR.

Informações sobre o texto

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