Da concessão de liberdade condicional no regime fechado:cabimento

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O livramento condicional é cabível mesmo que o(a) reeducando(a) pratique uma falta grave durante a execução de pena, onde apontamos jurisprudências onde há o reconhecimento desse benefício.

Inúmeras decisões judiciais estão sendo diuturnamente exaradas em clara afronta ao direito inconteste do reeducando em obter seu livramento condicional mesmo com a existência de uma falta grave no curso da execução penal, o que deve ser olhado com muito cuidado por parte dos Advogados e Defensores, sob pena que estender o cumprimento da pena dos apenados.

A justificativa para o indeferimento do pedido de livramento condicional quando há falta grave se baseia no não preenchimento do requisito subjetivo por força de que o (a) reeducando (a) teria cometido falta disciplinar de natureza grave durante o cumprimento de sua pena, o que indicaria que o (a) mesmo (a) não estaria apto a cumprir sua reprimenda em livramento condicional.

Em que pese tal posicionamento de 1ª Instância, entendemos que tal posicionamento não traduz os princípios que regem o Código de Processo Penal, visto que o objetivo da execução penal é justamente a ressocialização e não a permanência do apenado por mais tempo que o devido no cárcere.

Segundo o artigo 83, inciso III do Código Penal brasileiro, o juiz poderá conceder livramento condicional ao condenado a pena privativa de liberdade igual ou superior a dois anos, uma vez comprovado o “comportamento satisfatório” durante a execução da pena, bom desempenho no trabalho que lhe foi atribuído e aptidão para prover a própria subsistência mediante trabalho honesto.

Pois bem. Com base numa interpretação gramatical, devemos buscar o que se deve extrair da expressão “comportamento satisfatório”, inserida no texto legal, para melhor compreensão dos requisitos legais exigidos para este benefício.

O dicionário Aurélio traz os seguintes significados para os adjetivos "bom" e "satisfatório". Vejamos:

Bom [Do lat. Bonu] Adj. 1 Que tem todas as qualidades adequadas à sua natureza ou função: bom carro; boa vaca. 2. Benévolo, bondoso, benigno: Tem bom coração. 3 Misericordioso, caritativo. 4. Rigoroso no cumprimento de suas obrigações: bom pai de família. 5. Que alcançou alto grau de proficiência, eficiente, competente, hábil: bom médico; bom pintor. 6. Digno de crédito; seguro; garantido: bom investimento. 7. Que funciona bem (órgão ou aparelho). 8. Próprio, adequado: água boa para beber.

Satisfatório. [Do lat. Tard. Satisfactoriu] Adj. 1. Que satisfaz. 2. Sofrível, aceitável, regular, suficiente.

Oportuno ressaltar que a Lei de Execução Penal, ao tratar da progressão de regime, exige que o reeducando ostente "bom comportamento carcerário" (art. 112), sendo que o Código Penal, para fins de livramento condicional, exige "comportamento satisfatório durante o cumprimento da pena" (art. 83, III) para o deferimento do benefício.

Com efeito, analisando o significado dos adjetivos empregados na legislação, conclui-se que a progressão de regime exige que o reeducando tenha bom comportamento carcerário atestado pela direção da unidade, enquanto, para fins de livramento, o condenado deve apresentar bom comportamento carcerário e apresentar um comportamento satisfatório, aceitável, durante todo o cumprimento da pena.

Desta forma, a análise do requisito subjetivo para fins de livramento condicional não pode exigir do condenado uma conduta exemplar, ótima, perfeita durante todo o curso de sua pena, sob pena de se exigir mais do que a própria lei determina. Aliás, este é o entendimento vigente na doutrina pátria. Vejamos:

“A previsão anterior exigia que o recluso tivesse 'boa conduta carcerária', como se isso fosse uma tarefa fácil no ambiente deletério da prisão. O bom comportamento, com efeito, parecia exigir conduta irrepreensível, a inadmitir qualquer erro ou falta disciplinar. A conduta satisfatória reduz tal exigência, mas abrange todo e tempo da execução penal, e não somente o período de encarceramento"(BITTENCOURT, Cezar Roberto. Manual de Direito Penal: parte geral. 7. Ed., vol. 1. São Paulo: Saraiva, 2002, p. 645).

“Em ambos os casos, deve ser comprovado 'comportamento satisfatório durante a execução da pena', O QUE NÃO IMPLICA A NÃO EXISTÊNCIA DE SANÇÕES OU QUE NÃO TENHA O CONDENADO INCORRIDO EM FALTAS DISCIPLINARES, mas sim que, no conjunto, se demonstre a sua adaptação, mais ou menos regular, ao sistema ou regime progressivo. 'COMPORTAMENTO SATISFATÓRIO' NÃO É SINÔNIMO DE 'COMPORTAMENTO EXEMPLAR', E NEM MESMO 'MUITO BOM'. O problema que pode se apresentar é de não ser o comportamento satisfatório, razão pela qual deve ser denegado o pedido do condenado, ou, quando não tenha sido satisfatório o comportamento, durante todo o tempo de execução com prisão efetiva. Em tais casos, deve-se entender que se trata tão-somente de relativa adaptação ao regime progressivo, ou seja, o importante é como tem sido o comportamento do condenado, na última etapa do cumprimento de pena, e, uma vez melhorado o seu comportamento, o pedido de livramento é procedente. Assim também, se o pedido foi denegado, uma vez decorrido o período de prudência pode o pedido ser renovado, quando, então, deve-se fazer uma nova avaliação acerca de seu comportamento, levando-se em conta a sua conduta na última etapa. (ZAFFARONI, Eugenio Raúl; PIERANGELI, José Henrique. Manual de Direito Penal Brasileiro: parte geral. 4. Ed. São Paulo: RT, 2002, p. 803/804)

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Portanto, para a análise do livramento condicional, devemos partir da premissa que é permitido o (a) condenado (a) possuir faltas disciplinares no curso do cumprimento da pena, sem que isso impeça a concessão do livramento. É cediço que o cometimento de falta grave não altera a data base para fins de livramento condicional.

Agora, pergunta-se, a prática de falta grave é um fator impeditivo e intransponível para a obtenção do referido benefício? Em outras palavras, a falta grave não gera a alteração da data base, mas, a seguir o posicionamento que vem sendo adotado na decisão guerreada, a prática de falta grave pelo reeducando passa a ser causa de impedimento invencível para obtenção de um direito. Assim, passamos à análise do comportamento da reeducanda.

A nosso sentir, deve-se valorar positivamente muito mais todo o tempo de pena cumprido, no qual o reeducando teve bom comportamento, do que os episódios faltosos pelos quais já foi punido administrativamente e judicialmente (alteração de data-base, perda de remição, proibição de estudar e trabalhar na unidade dentro do período de reabilitação, etc.).

Ademais, o cometimento de falta grave já foi objeto de julgamento, sendo que o reeducando já se encontra reabilitado, não podendo a punição perdurar por toda a execução penal. Do mesmo modo, os TRIBUNAIS têm decidido em casos análogos, vejamos:

E M E N T A AGRAVO DE EXECUÇÃO PENAL LIVRAMENTO CONDICIONAL FALTA GRAVE REGRESSÃO DE REGIME INEXISTÊNCIA DE DEMONSTRAÇÃO DO DEMÉRITO DA CONDUTA CARCERÁRIA CLASSIFICADA COMO BOA AUSÊNCIA DE NOVAS INTERCORRÊNCIAS BIS IN IDEM RECURSO PROVIDO. É de se conceder o benefício do livramento condicional ao reeducando que, não obstante tenha praticado falta grave no curso da execução da pena, já cumpriu as devidas e respectivas punições, sem novas intercorrências, hipótese em que não é possível, sob pena de se incorrer em bis in idem, invocar o deslize para demonstrar o demérito e negar a benesse prevista no art. 83 doCódigo Penal. Recurso provido, contra o parecer. (TJMS - Agravo nº 0015945-29.2014.8.12.0001, Segunda Câmara Criminal, Tribunal de Justiça do MS, Relator: Sr. Des. Manoel Mendes Carli, Julgado em 12/05/2014).

AGRAVO EM EXECUÇÃO. LIVRAMENTO CONDICIONAL. REQUISITOS LEGAIS IMPLEMENTADOS. CONCESSÃO DO BENEFÍCIO. Tendo o apenado implementado o requisito objetivo (cumprimento de ½ da pena) e subjetivo (comportamento satisfatório) previstos no artigo 83 do Código Penal, deve ser deferido o livramento condicional. O fato de o apenado ter cometido falta grave nos doze meses anteriores à decisão não pode ser óbice à concessão do benefício, MORMENTE QUANDO JÁ FOI OBJETO DE SANÇÃO CABÍVEL - REGRESSÃO DE REGIME. AGRAVO PROVIDO. (TJRS - Agravo Nº 70052564697, Sexta Câmara Criminal, Tribunal de Justiça do RS, Relator: José Luiz John dos Santos, Julgado em 28/02/2013)

AGRAVO EM EXECUÇÃO. LIVRAMENTO CONDICIONAL. Para a concessão do livramento condicional, com a alteração do art. 112, § 2º, da Lei das Execuções Penais com redação dada pela Lei nº10.792/2003, basta o implemento do lapso temporal e declaração acerca de satisfatório comportamento carcerário. O fato do apenado ter liderado um motim dentro do estabelecimento prisional não pode impedir a concessão do benefício, uma vez que por tal fato o apenado já restou punido, não podendo a punição se alastrar para o restante da execução penal. AGRAVO PROVIDO, POR MAIORIA (TJRS - Agravo Nº 70052566353, Quinta Câmara Criminal, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Genacéia da Silva Alberton, Julgado em 22/05/2013)

RECURSO DE AGRAVO INTERPOSTO PELO MINISTÉRIO PÚBLICO CONTRA DECISÃO DO JUIZ DAS EXECUÇÕES PENAIS QUE DEFERIU PEDIDO DE LIVRAMENTO CONDICIONAL. FALTAS GRAVES COMETIDAS HÁ MAIS DE DOIS ANOS DA DATA DE CONCESSÃO DO BENEFÍCIO. AUSÊNCIA DE NOVAS INTERCORRÊNCIAS. COMPORTAMENTO SATISFATÓRIO. RECURSO CONHECIDO E NÃO PROVIDO. 1. O Regimento Interno do Sistema Penitenciário do Distrito Federal estabelece em seu artigo 42 que o comportamento do preso não poderá ser reclassificado no prazo de seis meses, o que equivale a dizer que, passados seis meses da última avaliação, o preso deve ser novamente avaliado, de onde se conclui que, não havendo novas intercorrências nos últimos seis meses, deve ser considerado de comportamento satisfatório para fins de concessão de livramento condicional. 2. Admitir que faltas graves cometidas há mais de seis meses impedem a concessão do benefício importaria em negar para sempre ao apenado os princípios da individualização e progressão da pena, o que atenta contra o princípio da razoabilidade. 3. No caso, cumprido o requisito objetivo de cumprimento de metade da pena e considerando-se satisfatório o comportamento do requerente, pelo não cometimento de qualquer falta nos últimos dois anos, é de rigor a concessão do benefício. 4. Recurso de agravo conhecido e não provido para manter a decisão que deferiu o pedido de livramento condicional. (Recurso de Agravo nº. 503.901, da 2ª Turma Criminal do TJDF DF, Rel. Desembargador ROBERVAL CASEMIRO BELINATI, julgamento em 05.05.2011).

CONCLUSÃO

Entendemos, assim, que a falta grave não é barreira intransponível à concessão do livramento condicional, em especial após o cumprimento da penalidade da falta grave no curso da execução, sob pena de negativa de garantias constitucionais insculpidas em nossa Carta Magna.

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Sobre o autor
Chrístopher Pinho Ferro Scapinelli

Advogado especialista em Licitações e Improbidade Administrativa, possui mais de 11 anos de experiência de gestão pública e serviços de saúde, com atuação no Estado de Mato Grosso do Sul.

Informações sobre o texto

Este texto foi publicado diretamente pelos autores. Sua divulgação não depende de prévia aprovação pelo conselho editorial do site. Quando selecionados, os textos são divulgados na Revista Jus Navigandi

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