O instituto da filiação na contemporaneidade

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3. FILIAÇÃO BIOLÓGICA E FILIAÇÃO SOCIOAFETIVA

Para o melhor entendimento quanto à filiação biológica e a filiação socioafetiva, sobretudo dentro do que determina o atual ordenamento jurídico (sem levar ainda em conta os entendimentos mais contemporâneos de doutrinadores) importante definir o que é “pai”.

Na biologia “pai é unicamente quem, em uma relação sexual, fecunda uma mulher que, levando a gestação a termo, dá à luz um filho.” (DIAS, 2013, p. 360).

A definição descrita acima parece um tanto ultrapassada, exceto pelo fato de que é científica (no sentido biológico) logo, não deve mesmo ter uma conotação diferente da apresentada.

Para o direito, por outro lado, a figura do pai não se restringe como já estudado, ao ascendente biológico, podendo ser também pai, aquele que a lei determinar nos casos de adoção ou inseminação artificial heteróloga (art.1.593 e art.1.597, inc.v CC).

Ante o exposto, pode-se avançar para a filiação biológica e a socioafetiva, iniciando pela primeira, com a definição de Caio Mário:

É um fenômeno excepcionalmente complexo. Antes de tudo biológico, é examinado pelos cientistas como forma de perpetuação das espécies; é um fenômeno fisiológico, um objeto de indagações sociológicas e históricas, um capítulo da Higiene e da Eugenia. Pertence ao mundo físico e ao mundo moral (Dusi), exprime simplesmente o fato do nascimento e a situação de ser filho, e, num desenvolvimento semântico dentro da Ética, traduz um vínculo jurídico. Compreende simultaneamente o fato concreto da procriação e uma relação de direito. (PEREIRA, 2006, p.1).

Maria Berenice Dias, entende que a filiação biológica, é aquela que decorre da “verdade biológica” (DIAS, 2013, p. 360), sendo considerado “pai” o ascendente biológico do indivíduo, gerando-se o que Maria Berenice Dias critica chamando de “paternidade jurídica.” (DIAS, 2013, p. 360).

Jorge Shiguemitsu Fujita diz que, “Filiação biológica ou natural é a relação que se estabelece, por laços de sangue, entre uma pessoa e seu descendente em linha reta do primeiro grau.” (FUJITA, 2011, p. 63).

Pode-se classificar a filiação biológica, como resultante da reprodução humana “natural ou carnal” e resultante das técnicas de reprodução assistida, conforme preleciona Jorge Shiguemitsu Fujita:

A filiação resultante da reprodução humana natural ou carnal é aquela que envolve uma relação sexual entre um homem e uma mulher com a consequente concepção, pouco importando a sua origem: se ocorreu dentro do matrimônio ou fora do matrimônio, ou entre noivos ou namorados, ou entre meros “ficantes” (termo contemporaneamente utilizado que significa aqueles que, ocasional e descompromissadamente, decidiram ter momentos de intimidade sexual), dos quais resultaram a gravidez e o consequente nascimento de uma criança.

Já a filiação oriunda da reprodução assistida não tem como base a cópula carnal, mas sim, um “conjunto de técnicas que têm como fim provocar a gestação mediante a substituição ou facilitação de alguma etapa que se mostre deficiente no processo reprodutivo”.( FUJITA, 2011, p.63).

O problema da filiação biológica ocorre no momento em que se deixa a “verdade real” (DIAS, 2013, p. 360) de lado, para dar mais importância à “verdade biológica”, como verifica-se nos muitos casos do cotidiano forense onde busca-se a legitimação da paternidade socioafetiva em detrimento de uma paternidade “fictícia”, existente apenas biologicamente. Isso se deve à presunção da paternidade, que ocorre nos casos insculpidos no Código Civil art. 1.597, incisos I e II in verbis:

Art. 1.597 Presumem-se concebidos na constância do casamento os filhos:

I – nascidos cento e oitenta dias, pelo menos, depois de estabelecida a convivência conjugal;

II – nascidos nos trezentos dias subsequentes à dissolução da sociedade conjugal, por morte, separação judicial, nulidade e anulação do casamento;

No caso do inciso I, o prazo conta-se a partir do “efetivo início da convivência entre cônjuges e companheiros.” (LÔBO, 2015, p.202).

Para além das presunções de paternidade constantes do artigo legal supra, Paulo Lôbo menciona em seus escritos, outras modalidades:

  • a) a presunção pater is est quem nuptiademonstrant, impedindo que se discuta a origem da filiação se o marido da mãe não a negar;

  • b) a presunção matersemper certa est, impedindo a investigação de maternidade contra mulher casada. A maternidade manifesta-se por sinais físicos inequívocos, que são a gravidez e o parto, malgrado a manipulação genética se tenha encarregado de pôr dúvidas quanto à origem biológica;

  • c) a presunção de paternidade atribuída ao que teve relações sexuais com a mãe, no período da concepção;

  • d) a presunção de exceptio plurium concubentium, que se opõe à presunção anterior, quando a mãe tiver relações com mais de um homem no período provável da concepção; (LÔBO, 2015, p. 202).

A presunção de paternidade representa um mecanismo jurídico que visa “proteger” e dar “estabilidade” ao instituto da família, com seu sistema legal “especial” para tal fim (DIAS, 2013, p. 360) como visto no dispositivo legal exposto acima.

Para a lei, “pai é o marido da mãe”, independentemente da verdade biológica do indivíduo, o que em tese, dirime a incerteza do marido em relação aos filhos de sua esposa. A esta presunção dá-se o nome de pater is est, e não se estende para os casos de união estável, fixando-se nas filiações em decorrência das relações entre pessoas legalmente casadas, ao que se pode chamar de “filiação matrimonial.” (DIAS, 2013, p. 366).

Para os casos de filiação em decorrência de inseminação artificial heteróloga, a paternidade é presumida com base na verdade afetiva, ou seja, neste caso se tem a certeza de que não é possível a paternidade ser biológica devido ao procedimento utilizado para a concepção, não havendo oposição por parte do marido, não há que se falar em presunção da paternidade “acreditando ser este o pai biológico”(DIAS, 2013, p. 369), mas sim, como explicado acima, presume-se pai, pela verdade afetiva que quer dizer, o ato de o marido aceitar a paternidade do indivíduo concebido (art. 1.597, inc.v CC).

A filiação biológica era exclusiva, incorporando-se a filiação socioafetiva no ordenamento jurídico de forma gradativa, como se observa nos escritos de Paulo Lôbo:

Sob o ponto de vista do direito brasileiro, a filiação é biológica e não biológica Por ser uma construção cultural, resultante da convivência familiar e da afetividade, o direito a considera como um fenômeno socioafetivo, incluindo a de origem biológica, que antes detinha a exclusividade. (LÔBO, 2015, p. 199).

Neste sentido, vale destacar o entendimento que Valter Kenji Ishida estabelece acerca da filiação biológica e filiação socioafetiva:

Duas teses se digladiam no cenário do direito de família: a primeira, tradicional, defende o vínculo biológico ou a chamada herança genética. A segunda, mais moderna, lastreia o vínculo da paternidade na convivência diária, ou seja, na denominada afetividade. (ISHIDA, 2015, p. 78).

Entendemos que, atualmente, deva-se reconhecer a possibilidade do vínculo socioafetivo, mas com base principalmente no melhor interesse da criança e do adolescente e com cuidados de exame profundo da situação fática oferecida, evitando-se favorecer interesses oportunistas ou de má-fé como é mencionado no REsp 119.346-GO. (ISHIDA, 2015, p. 79).

Apesar desse autor referir sobre a filiação biológica e a socioafetiva sob uma ótica voltada para a criança e o adolescente, com menção à importante tendência moderna no ordenamento jurídico brasileiro que é priorizar o melhor interesse da criança acima de tudo (no que tange à proteção de seus direitos) pode-se interpretar tal entendimento de forma extensiva ao indivíduo já adulto, que objetive definir sua filiação, seja biológica ou socioafetiva, respeitado seu melhor interesse, desde que não seja um interesse escuso,mas legítimo.

Agora, em relação à filiação socioafetiva, essa é definida por Jorge Shiguemitsu Fujita como:

Aquela consistente na relação entre pai e filho, ou entre mãe e filho, ou entre pais e filho, em que inexiste liame de ordem sanguínea entre eles, havendo, porém, o afeto como elemento aglutinador, tal como uma sólida argamassa a uni-los em suas relações , quer de ordem pessoal, quer de ordem patrimonial. (FUJITA, 2011, p. 71).

Jorge Shiguemitsu Fujita transcreve o entendimento de outro autor, chamado Rolf Madaleno, onde diz que a “filiação socioafetiva é a real paternidade do afeto e da solidariedade; são gestos de amor que registraram a colidência de interesse entre o filho registral e o seu pai de afeto” (FUJITA, 2011, p. 71).

No ordenamento jurídico atual, prevalece a filiação socioafetiva sobre a filiação biológica, como por exemplo, no caso da inseminação artificial heteróloga ou então na adoção, onde a presunção se dá pela afetividade.

Maria Berenice Dias diz que:

A filiação socioafetiva corresponde à verdade aparente e decorre do direito à filiação. A consagração da afetividade como direito fundamental subtrai a resistência em admitir a igualdade entre a filiação biológica e a socioafetiva. A necessidade de manter a estabilidade da família faz com que se atribua um papel secundário à verdade biológica. (DIAS, 2013, p. 381).

Conclui-se a esse ponto, que a filiação socioafetiva ganhou grande relevo no ordenamento jurídico brasileiro, dentro do instituto da filiação, de modo que veio garantir legalmente (por meio dos dispositivos legai estudados) que pais e filhos, que tenham uma ligação que supera aquela relativa à consanguínea (que desenvolvam um vínculo afetivo muito consistente a ponto de considerarem-se pais e filhos reciprocamente) possam ser formalmente considerados como tal, ainda que existentes os pais biológicos.

3.1. ESPÉCIES DE FILIAÇÃO

Necessário se faz, agora que já se consegue diferenciar os gêneros “filiação biológica” e “filiação socioafetiva”, conhecer as espécies de filiação, onde se iniciará a verificação de como é efetivamente que se dá a filiação na conjuntura contemporânea, seja de acordo com o texto da lei ou então com outros dispositivos e a doutrina, auxiliando na analogia para a aplicação da lei no caso concreto.

A primeira espécie de filiação é a biológica, que já foi estudada a pouco e não sofre desdobramentos, porque é objetivamente ligada à consanguinidade, onde pai e mãe são os ascendentes biológicos do filho. Portanto, as espécies de filiação que serão estudadas a seguir, serão as relacionadas à filiação socioafetiva, porque essas sim desdobram-se em espécies.

Para tanto, será utilizada a classificação prelecionada por Jorge Shiguemitsu Fujita, que traz de forma pertinente algumas espécies de filiação socioafetiva classificando-as, por adoção, adoção homoafetiva, técnica de reprodução heteróloga, posse do estado de filho, adoção à brasileira e aquela consistente no “filho de criação”.

Iniciando pela filiação por adoção, tem-se uma ou mais pessoas, maiores ou menores, capazes ou incapazes, ingressando em determinada família adotante, sem que necessariamente exista uma relação de parentesco consanguíneo ou por afinidade entre estes, sendo que desfrutam ainda, de todos os direitos e deveres inerentes à filiação (FUJITA, 211, p. 72).

Trata-se do instituto da adoção, que é uma das formas previstas onde se estabelece o que se chama como gênero de filiação socioafetiva, onde deverão ser cumpridos alguns requisitos formais da adoção, para que com o tempo se possa determinar se o adotando está ambientado e desenvolvendo uma boa relação socioafetiva com seus adotantes.

A adoção pode ocorrer bilateralmente, quando se tem um casal adotando determinado indivíduo, ou então unilateralmente, quando apenas uma pessoa é que está buscando habilitar-se como pai ou mãe do adotando, podendo ser esta pessoa (adotante) solteiro(a) ou então casado(a) (mesmo que em união estável) com o pai ou mãe biológico do adotando.

Um exemplo se dá quando determinada mulher até então solteira, submete-se a um procedimento de reprodução assistida, na modalidade inseminação artificial heteróloga, onde um terceiro doador desconhecido doa o sêmen para que seja fecundado e, posteriormente, esta vem a conhecer uma pessoa com a qual pretende se casar, ensejando então que o futuro cônjuge ingresse com uma ação de adoção unilateral, para ser considerado pai do filho biológico de sua futura esposa.

Nesse exemplo, existe uma relação de parentesco consanguíneo do nascido com sua mãe, com o terceiro doador anônimo que, nesse caso não terá qualquer relação com o nascido (apesar de ser biologicamente seu progenitor) e por fim, uma relação de parentesco por socioafetividade (filiação socioafetiva) com o pai socioafetivo (marido da mãe biológica).

Na Filiação pela adoção homoafetiva (por singular ou por casal) existe a possibilidade de que uma pessoa homossexual ou casal homoafetivo tenha acesso à adoção, da mesma forma que teriam os heterossexuais.

Neste sentido, Jorge Shiguemitsu Fujita diz:

No plano singular, prevalece a possibilidade, embora contestada de adoção por parte de um pretendente homossexual, tendo em vista o direito constitucional à liberdade, incluindo a de opção sexual, assim como a exigência de que a adoção constitua um efetivo benefício para o adotando (Estatuto da Criança e do Adolescente, art. 43).(FUJITA, 2011, p. 74).

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A polêmica se estabelece quando se fala na adoção pretendida por um casal homossexual, haja vista o disposto no § 2º, do art. 42, do Estatuto da Criança e do adolescente, que preceitua que, para a adoção conjunta, é indispensável que os adotantes sejam casados civilmente ou mantenham união estável, comprovada a estabilidade da família. Portanto, a lei civil não preconiza, de modo expresso, a sua aquiescência relativamente a parceiros do mesmo sexo pretendentes à adoção. (FUJITA, 2011, p. 74).

Nesse tipo de filiação, importante salientar que, pelo fato de ser ainda um tema polêmico e novo no Brasil, existem correntes de doutrinadores que se posicionam a favor e contra a adoção homoafetiva.

Os que se opõe à ideia alegam, entre outras coisas, que a criança tem que ter a referência de um pai (homem) e uma mãe (mulher) enquanto os que apoiam a adoção homoafetiva, defendem que o rol de entidades familiares elencadas no art. 226, § 3º da Constituição Federal é meramente exemplificativo, o que permitiria a inclusão de qualquer outra entidade tida por muitos como familiar, incluído a filiação homoafetiva. (FUJITA, 2011, p. 74).

Independente das discordâncias existentes no mundo jurídico sobre o tema, a jurisprudência tem sido majoritária no entendimento favorável à concessão do direito de adoção para o homossexual ou casal homoafetivo, pautado pelo melhor interesse da criança, a existência de um vínculo afetivo saudável entre adotante e adotado, além de um contexto vantajoso para ambas as partes.

Outra modalidade de Filiação é aquela consequente da técnica de reprodução assistida heteróloga, prevista no Código Civil art. 1.596, inciso V, que fala sobre a presunção de serem concebidos na constância do casamento os filhos havidos por técnica de reprodução assistida por doador ou heteróloga, com autorização prévia do marido, requisito sine qua non para a validade do ato quando oriundo de casal.

Jorge Shiguemitsu Fujita diz a esse respeito:

O Código Civil de 2002 oferece, em seu art. 1.596, inciso V, a presunção de serem concebidos na constância do casamento os filhos havidos por técnica de reprodução assistida por doador ou heteróloga, desde que tenha prévia autorização do marido.

Serão filhos matrimoniais aqueles resultantes de técnica de reprodução assistida envolvendo o óvulo do cônjuge virago e o sêmen de terceiro, desde que tenha havido a priori a autorização do cônjuge varão, o qual não precisa ser, necessariamente, estéril, ou que não tenha a possibilidade de procriar, “por qualquer razão física ou psíquica”. (FUJITA, 2011, p. 76).

Como se observa no excerto acima, o autor fala em “filhos matrimoniais”, ou seja, aqueles que têm relação de filiação com o casal, apesar de terem origem na reprodução heteróloga envolvendo um terceiro, que neste caso, não terá nenhuma relação com o nascido por essa técnica senão a de mero “dador” ou “doador”.

Difere-se da inseminação artificial homóloga, prevista no art. 1597, inciso III do Código Civil, onde o material genético (gameta) manipulado na inseminação é do próprio marido, não se exigindo o cumprimento de qualquer formalidade de consentimento por parte deste.

Existem outras relações na realidade social, que ultrapassam os dispositivos sobre o tema no Código Civil, ensejando que se faça uma equiparação por analogia dos mencionados dispositivos para atender a essas relações diversas que surgem, como por exemplo, nas relações de união estável e na relação homoafetiva.

Um grande problema sobre esse tema é que não existe uma lei específica que regule a Reprodução Assistida no Brasil, senão um apanhado principiológico, um dispositivo legal no Código Civil (art. 1596, V) e a Resolução 2.121/2015 do Conselho Federal de Medicina que, apesar de não se tratar de lei, regula atualmente a reprodução assistida e é utilizada como parâmetro para definir algumas peculiaridades sobre a inseminação artificial heteróloga, como por exemplo, a questão do anonimato do doador do gameta, que apesar de ser biologicamente o progenitor do nascido, não tem qualquer relação de paternidade com este, ou então em relação à quebra de paradigma, ao estabelecer que qualquer pessoa pode submeter-se ao procedimento de inseminação artificial heteróloga, ou seja, é possível que um homem casado ceda seu gameta para ser introduzido em um óvulo de uma terceira doadora anônima também, o que representa um grande avanço vez que não se limita à atual letra de lei.

Portanto, nos casos mencionados (que ultrapassam o art.1596, V, C.C.) de união estável, união homoafetiva ou qualquer nova relação que venha a surgir na sociedade, onde uma das partes (pai ou mãe biológico) se submeta a inseminação artificial heteróloga, se faz necessário para seu cônjuge (que não tem ligação biológica com o nascido) buscar eventual direito de filiação com o nascido na justiça, através de uma ação de adoção unilateral (segundo o que se extrai de consultas jurisprudenciais) onde caberá ao juiz analisar um conjunto de fatores para deferir ou não o reconhecimento do(a) requerente como pai ou mãe do nascido.

Na filiação decorrente da inseminação artificial heteróloga, o nascido pode requerer na justiça o direito de ter acesso à sua origem genética, para fins de conhecer sua herança genética, prevenindo assim algumas doenças ou até as tratando, ou mesmo para saber quem é seu progenitor ou progenitora, com a finalidade de conhecer sua “identidade”, ligada ao direito de personalidade do indivíduo (art. 12 C.C.).

A filiação pode ocorrer também pela chamada “posse de estado de filho” ou “posse de estado de filiação”, que está diretamente ligada à filiação socioafetiva, visto que se trata daquela onde existe comprovadamente um vínculo afetivo, amoroso e duradouro entre as partes (paterno-filial ou materno-filial) bem como, reputação ou fama na qualidade de filho perante terceiros (FUJITA, 2011, p. 78).

Nessa espécie de filiação, uma vez que está consolidada, só é possível revertê-la nos casos de vício, dolo ou coação, conforme disposto no art. 1.609 do Código Civil, ou seja, esse vínculo de filiação socioafetiva é tão forte que se sobrepõe por vezes à filiação biológica, como por exemplo, em um caso onde determinado menor seja adotado por um casal e, alguns anos mais tarde seus pais biológicos busquem na justiça reaver para si o estado de “pais” desse menor. Muito provavelmente (claro que no direito sempre é possível haver surpresas por conta do princípio do livre convencimento do juiz) a decisão do juiz será no sentido de manter a relação de filiação socioafetiva e afastar a possibilidade de filiação com os pais biológicos.

A filiação chamada “à brasileira” ou “adoção à brasileira”, consiste no reconhecimento registral sem respaldo legal algum, de estado de “filho” em relação a determinado “pai”, “mãe” ou ambos, de modo que esta relação “inexiste” a princípio para o direito, ocorrendo apenas de fato.

Trata-se, portanto, de procedimento irregular, conforme assevera Jorge Shiguemitsu Fujita:

Consiste no reconhecimento registral de determinada pessoa como sendo filho de outros que não se traduzem como seus pais biológicos, sem obedecer aos trâmites legais, caracterizando um procedimento irregular, tipificado de crime de parto suposto, constante no art. 242, do Código Penal. (FUJITA, 2011, p. 79).

Apesar da irregularidade do ato registral desta “filiação à brasileira”, a jurisprudência, a depender do caso concreto, garante àquele que tenha desenvolvido laço socioafetivo com seu “pai”, “mãe” ou ambos, a condição de “filho”, não bastando o vínculo biológico para distrato da relação de filiação entre filho e pais socioafetivos, por mera liberalidade.

Nesse sentido, o art. 1604 do Código Civil dispõe que não se pode "vindicar estado contrário ao que resulta do registro de nascimento, salvo provando-se erro ou falsidade do registro".

Interessante também observar que uma das possibilidades de desfazimento do vínculo socioafetivo entre “filho(a)” e “pais” pode ocorrer quando da maioridade do até então menor que tenha vivido sob a modalidade de filiação socioafetiva, pela inafastabilidade de seu direito em buscar sua origem genética, mesmo que a filiação tenha decorrido de uma adoção regular por exemplo (art. 27 e art. 48 do Estatuto da Criança e do Adolescente – ECA).

Tal prática ainda ocorre no Brasil, porém, o rigor em relação a essas relações não reconhecidas (a princípio) pelo direito tem aumentado, sobretudo por conta de casos onde pessoas de outros países vem para o Brasil e literalmente compram crianças de famílias carentes, registrando-as como sendo seus filhos e levando-as para o exterior. O problema é que não se sabe o que ocorre com essas crianças depois que saem do Brasil, podendo de fato serem simplesmente criados no exterior como filhos, ou então serem objeto de fins mais nefastos como o tráfico de órgãos, violência de todo gênero incluindo a sexual, etc.

Por fim, tem-se a chamada “filiação consistente no filho de criação”, que se refere àqueles indivíduos que mantém, educam e amam sem vínculo biológico de paternidade ou maternidade, determinadas pessoas como se filhos fossem sem, contudo, proceder com a adoção desses, apenas mantendo a guarda.

Jorge Shiguemitsu Fujita diz a esse respeito que:

Os denominados “filhos de criação” são os que, embora pertencentes a outrem, são sustentados, educados , amados e providos por casais que os consideram como filhos próprios, embora apenas se encontrem sob a guarda, e não sob o amparo de uma adoção. (FUJITA, 2011, p. 81).

Trata-se de uma adoção informal ou de fato, não podendo, para alguns, ser considerados filhos adotivos, por não haver amparo legal, inexistindo equiparação aos filhos biológicos, para os devidos efeitos jurídicos. (FUJITA, 2011, p. 81).

Verificou-se, portanto, as espécies de filiação que predominam no instituto da filiação atualmente, sendo que vale destacar que a filiação socioafetiva por vezes pode predominar em relação à filiação biológica, sendo que depois de feito o reconhecimento voluntário da paternidade/maternidade do filho socioafetivo, apenas se comprovado erro, dolo, coação, falsidade do registro, ou a posteriori, quando da maioridade do filho socioafetivo, é que se poderá desconstituir tal relação. (art. 1604 e 1609 Código Civil; art. 27 e art. 48 do Estatuto da Criança e do Adolescente).

O reconhecimento voluntário a propósito, é um tema que será estudado a seguir, porque diz respeito às formas de reconhecimento dos pais em relação aos filhos, o que se aplica tanto na filiação biológica como também na filiação socioafetiva.

Destaca-se para o presente artigo a esse ponto, as espécies de filiação que tem maior ligação com a atual conjuntura social e cultural pela qual o país passa, ou seja, aquelas espécies que se conformam com o gênero filiação socioafetiva, como é o caso da filiação por adoção, que é diretamente voltada para a relação de socioafetividade, ao passo que traz para si também questões ligadas à mudança cultural como a adoção unilateral por parte de casal homoafetivo por exemplo.

Outra espécie que merece destaque para esse estudo é a filiação decorrente da posse de estado de filho, que também conjuga-se dentro da filiação socioafetiva, por se tratar de reconhecimento de vínculo de filiação entre aquele(a) filho(a) que manteve uma relação de aparente filiação com um “pai”, “mãe” ou ambos, de modo socioafetivo, ensejando que tal relação, apesar de não prevista ainda na lei de forma específica seja reconhecida.

Por fim, merece destaque a filiação decorrente da inseminação artificial heteróloga, que também liga-se diretamente com a filiação socioafetiva em relação ao nascido e o pai o mãe socioafetivos que assumem esse estado de filiação ao concordar que o cônjuge se submeta ao procedimento de inseminação que utilizará o material genético desse com o de um terceiro(a) doador(a) de sêmen ou mesmo óvulo para tal procedimento. Inova no sentido de que a lei prevê tal procedimento apenas para a mulher sendo que o marido é quem concorda com o procedimento, sendo portanto, pai sociafetivo, ao passo que na prática, conforma-se o texto legal em conjunto com a Resolução 2.121/2015 para estender tal vínculo aos casos onde o marido será o pai biológico e a sua esposa é que será a mãe socioafetiva, bem como para casos onde haja união estável ou união homoafetiva.

3.2 RECONHECIMENTO VOLUNTÁRIO E JUDICIAL NA FILIAÇÃO

Compreendido o que seja filiação, seus gêneros e suas espécies, agora se estudará as formas de reconhecimento do vínculo de filiação, que são duas, Reconhecimento Voluntário e Reconhecimento Judicial.

O Reconhecimento voluntário, como o próprio termo leva a concluir, é aquele onde o pai, a mãe ou ambos, de forma livre e de espontânea vontade, reconhecem sua condição de pais de determinado indivíduo, podendo este, ser menor ou mesmo maior de idade.

Tal reconhecimento é obrigatório apesar de pressupor-se ser também voluntário, e está disciplinado no art. 52 da Lei n° 6.015/1973 – Lei dos Registros Públicos in verbis:

Art. 52. São obrigados a fazer declaração de nascimento:

1º) o pai ou a mãe, isoladamente ou em conjunto, observado o disposto no § 2º do art. 54; (Redação dada pela Lei nº 13.112, de 2015)

2º) no caso de falta ou de impedimento de um dos indicados no item 1º, outro indicado, que terá o prazo para declaração prorrogado por 45 (quarenta e cinco) dias; (Redação dada pela Lei nº 13.112, de 2015)

3º) no impedimento de ambos, o parente mais próximo, sendo maior achando-se presente;

4º) em falta ou impedimento do parente referido no número anterior os administradores de hospitais ou os médicos e parteiras, que tiverem assistido o parto;

5º) pessoa idônea da casa em que ocorrer, sendo fora da residência da mãe;

§ 1° Quando o oficial tiver motivo para duvidar da declaração, poderá ir à casa do recém-nascido verificar a sua existência, ou exigir a atestação do médico ou parteira que tiver assistido o parto, ou o testemunho de duas pessoas que não forem os pais e tiverem visto o recém-nascido.

§ 2º Tratando-se de registro fora do prazo legal o oficial, em caso de dúvida, poderá requerer ao Juiz as providências que forem cabíveis para esclarecimento do fato.

Observa-se que existem outras previsões, na falta da possibilidade de pai e mãe procederem com o reconhecimento, atribui-se a um parente maior de idade mais próximo essa tarefa de reconhecimento do nascido, sendo que subsidiariamente essa competência vai passando para outras pessoas, administradores do hospital, médicos e parteiras que tiverem assistido ao parto e pessoa idônea da casa em que ocorrer o nascimento fora da residência da mãe.

Os parágrafos 1° e 2° ainda estabelecem situações onde existam dúvidas quanto a declaração de nascimento por parte do oficial de registro, podendo ir à casa do recém nascido auferir in loco os fatos, ou mesmo requerer ao juiz nos casos de declaração que extrapole o prazo legal, providências para que se esclareçam os fatos.

Paulo Lôbo diz que “O reconhecimento voluntário é ato livre, pessoal, irrevogável e de eficácia erga omnes” (LÔBO, 2015, p. 232) e que o ato de reconhecimento, no direito contemporâneo, “além de personalíssimo, apresenta as características de voluntariedade, irrevogabilidade, incondicionalidade” (LÔBO, 2015, p. 232).

Ainda em relação ao reconhecimento voluntário, uma vez que seja feito, dele não se pode vindicar, como dispõe o art. 1604 do Código Civil que diz, “ninguém pode vindicar estado contrário ao que resulta do registro de nascimento, salvo provando-se erro ou falsidade do registro”.

Nesse sentido diz ainda Maria Berenice Dias, “o registro faz público o nascimento, tornando-o incontestável” (DIAS, 2013, p. 373).

O reconhecimento voluntário, portanto, só é possível quando não há ainda registro de pai, mãe ou ambos em relação ao filho, se houver por algum motivo dois registros de filiação da criança, prevalecerá o primeiro em detrimento do segundo e, é assegurado ao filho no caso de omissão dos pais no seu registro, a ação de prova de filiação, conforme estabelece o artigo 1.606 do Código Civil, que não pode ser confundido com o reconhecimento forçado, sequer com a investigação de paternidade, in verbis:

Art. 1.606. A ação de prova de filiação compete ao filho, enquanto viver, passando aos herdeiros, se ele morrer menor ou incapaz.

Parágrafo único. Se iniciada a ação pelo filho, os herdeiros poderão continuá-la, salvo se julgado extinto o processo.

Na relação de casamento (diferente de um casal não casado que reconhece o filho) não há que se falar em reconhecimento, porque presume-se com certeza a maternidade da mulher que concebeu a criança e ocorre a presunção pater is est , em relação ao marido, conforme já verificado anteriormente.

O reconhecimento voluntário será possível então quando não tiver sido feito registro do filho ou quando for feito apenas por uma das partes, devendo ser feito pelo pai ou mãe, ou então como diz Orlando Gomes a esse respeito, que o reconhecimento voluntário poderá ser feito através de “procurador com poderes especiais”, “podendo realizar-se antes do nascimento, em vida ou depois da morte do filho” (GOMES, 1998, p. 342).

É possível aplicar-se o reconhecimento voluntário ainda, segundo Paulo Lôbo, além dos pais sem vínculo de casamento, ao “cônjuge e o companheiro de união estável, estes sem anuência dos respectivos cônjuge e companheiros, em relação a filhos havidos com outras pessoas”, desde que os filhos reconhecidos estejam entre 16 e 18 anos (LÔBO, 2015, p. 233) pois do contrário, sendo absolutamente incapazes (art. 3° do Código Civil) não poderão expressar com valor jurídico o que desejam para si.

Existem 4 modalidades de reconhecimento voluntário, que se aplicam na maioria dos casos à figura do pai, porém, pode haver casos onde quem fará o reconhecimento será a mãe, fazendo valer as mesmas regras dispostas no art. 1609 do Código Civil, in verbis:

Art. 1.609. O reconhecimento dos filhos havidos fora do casamento é irrevogável e será feito:

I - no registro do nascimento;

II - por escritura pública ou escrito particular, a ser arquivado em cartório;

III - por testamento, ainda que incidentalmente manifestado;

IV - por manifestação direta e expressa perante o juiz, ainda que o reconhecimento não haja sido o objeto único e principal do ato que o contém.

Parágrafo único. O reconhecimento pode preceder o nascimento do filho ou ser posterior ao seu falecimento, se ele deixar descendentes.

A primeira modalidade que se extrai do texto legal supra no inciso I, diz respeito àquela mais comum, feita no próprio termo ou registro de nascimento, onde o pai ou mãe, que não tenha o nome constante de tal registro, promove reconhecimento formal, perante oficial de registro competente, com a assinatura final de testemunhas (LÔBO, 2015, p. 235).

Ana Cláudia Silva Scalquette diz a esse respeito que, a mãe poderá contestar sua maternidade, “desde que provando a falsidade do termo ou das declarações nele contidas” (SCALQUETTE, 2014, p. 91).

A segunda modalidade (inc. II) diz respeito ao reconhecimento indireto, , ou seja, aquele que é feito por incidente em qualquer ato notorial idôneo, sendo que necessita de uma declaração “explícita e inequívoca” (VENOSA, 2007, p. 237).

Em suma, essa modalidade, serve para os casos onde “a” ou “as” partes não querem reconhecer de imediato em certidão de nascimento seu vínculo paterno ou materno com o filho, por questões pessoais, não ficando prejudicada eventual investigação de paternidade/maternidade para comprovar o que seja declarado.

A terceira modalidade (inc. III) diz respeito ao reconhecimento feito através de testamento ou reconhecimento testamentário, sendo que não se faz imprescindível um testamento próprio para tal feito, podendo ser o reconhecimento de paternidade ou maternidade, feito através de testamento genérico (que trate também de outros assuntos ligados à sucessão testamentária).

Caberá também eventual investigação de paternidade para comprovar o alegado (LÔBO, 2015, p. 237) vez que pode se tratar de declaração falsa, sendo que será também averiguado se já existe registro feito em relação ao suposto “filho(a)”, salvo nos casos de invalidação do termo de registro anterior ao suscitado no testamento (LÔBO, 2015, p. 237).

Por fim, se tem a quarta modalidade (inc.IV) que trata do reconhecimento incidental, feito mediante manifestação expressa e direta ao juiz, onde interessante dizer que não é necessário que seja o juiz competente para julgar o pedido de reconhecimento, bastando que o juiz receba “manifestação clara de que o manifestante é pai (ou mãe) de determinada pessoa”, para que o juiz então reduza-a a termo. (LÔBO, 2015, p. 238).

Ana Cláudia Silva Scalquette ainda faz duas ressalvas quanto ao reconhecimento voluntário, sendo que na primeira ela diz que “o reconhecimento de filho não pode estar sujeito a condição ou termo (art. 1.613,C.C.)” (SCALQUETTE, 2014, p. 92) e, diz ainda, que “o filho maior não poderá ser reconhecido sem seu consentimento, e ao filho menor caberá impugnar esse reconhecimento nos quatro anos que se seguirem a sua maioridade ou emancipação (art. 1.614, C.C.)” (SCALQUETTE, 2014, p. 92).

O Reconhecimento Judicial, também chamado de Reconhecimento Forçado, é aquele “decorrente de uma decisão judicial, também conhecido como investigação da paternidade ou da maternidade” (LÔBO, 2015, p. 241).

Cabe a qualquer filho a propositura da ação de investigação de paternidade, pessoalmente, ou por meio de seu “representante legal, se incapaz, em face de seu genitor ou de seus herdeiros ou legatários” (SCALQUETTE, 2014, p. 90).

Cézar Fiuza diz, “É garantida ao filho, a fim de provar seu estado de filho de homem não casado com sua mãe, ou para provar que é filho de mulher não casada com o pai” (FIUZA, 2009, p. 985).

Tal ação investigatória é imprescritível (art. 1606 C.C.) no que tange ao seu caráter declaratório da paternidade, não influindo com a imprescritibilidade em relação a outros assuntos relacionados como, por exemplo, os alimentos (art. 206, § 2° do C.C.) que prevê prescrição em 2 anos para requerer alimentos a partir da data de seu vencimento. O art. 1606 C.C. dispõe in verbis:

Art. 1.606. A ação de prova de filiação compete ao filho, enquanto viver, passando aos herdeiros, se ele morrer menor ou incapaz.

Parágrafo único. Se iniciada a ação pelo filho, os herdeiros poderão continuá-la, salvo se julgado extinto o processo.

No mesmo sentido é a Súmula 149 do STF que diz, “É imprescritível a ação de investigação de paternidade, mas não o é a de petição de herança”.

Quanto aos meios de prova, contemporaneamente, pode-se dizer que nas ações de investigação de paternidade ou maternidade, o meio de prova mais cabal, é o exame de DNA, pois determina com muita precisão se existe vínculo biológico entre pai, mãe ou ambos e o filho (a) mas existem outras formas de se comprovar o vínculo de paternidade ou maternidade, inclusive em se tratando de pais socioafetivos, onde o exame de DNA de nada adiantaria.

A ação de investigação de maternidade é um tanto rara, mas pode ocorrer, e os meios de prova são via de regra mais fáceis, sendo que pode-se comprovar a maternidade através da certidão de casamento dos pais, através do parto que seja realizado durante o casamento e sua identidade com a mãe. Para os casos onde a mãe seja solteira, “dever-se-á provar a gravidez, o parto e a identidade do interessado com a provável mãe” (FIUZA, 2009, p. 984).

Outra forma de se comprovar o vínculo de filiação é através do reconhecimento da Posse de Estado de Filho, onde o interessado (filho) pretende que seja comprovado o vínculo socioafetivo entre ele e seu pai, mãe ou ambos, também no plano da socioafetividade, excluindo-se nessa modalidade, os casos de pais biológicos.

A posse de estado de filho não encontra respaldo na legislação de forma expressa, porém, parte da doutrina entende que se legitima tal modalidade, no que dispõe o art. 1.605 do C.C., que diz “poderá provar-se a filiação por qualquer modo admissível em direito: (...) II – quando existirem veementes presunções resultantes de fatos já certos”.

Muitas são as definições doutrinárias a esse respeito que confluem no mesmo resultado, valendo destacar a definição de Orlando Gomes que diz ser a posse de estado de filho, “um conjunto de circunstâncias capazes de exteriorizar a condição de filho legítimo do casal que o cria e educa” (GOMES, 1999, p. 324) e também a definição de Paulo Lôbo que diz:

“a posse de estado de filiação constitui-se quando alguém assume o papel de filho em face daquele ou daqueles que assumem os papéis ou lugares de pai ou mãe ou de pais, tendo ou não entre si vínculos biológicos”. Acrescentando, ainda, que a posse de estado de filho é a exteriorização da convivência familiar e dos vínculos afetivos.” (LÔBO, 2004, p. 49).

Maria Berenice Dias diz ainda a esse respeito que “A filiação que resulta da posse do estado de filho constitui modalidade de parentesco civil de “outra origem”, isto é, de origem afetiva (CC 1.593).” (DIAS, 2013, p. 381).

Por fim, ressalta-se que a jurisprudência tende a refutar o entendimento de vínculo de filiação na posse de estado de filho, a despeito dos vários entendimentos doutrinários no sentido contrário, o que torna ainda mais imprescindível que se regule adequadamente o tema.

Concluindo, verificou-se á essa altura, que existe a possibilidade de reconhecimento voluntário por parte do pai, da mãe ou de ambos em relação ao(s) filho(s) mas também existe o reconhecimento forçado ou judicial, que ocorre quando promove-se judicialmente ação por parte daquele que se considere filho, em relação a seus pais conjuntamente ou separadamente, para o fim de ter reconhecido seu vínculo de filiação, sem prejuízo de ação visando o contrário, como já visto em outro momento do estudo, ou seja, o filho(a) requerendo a desvinculação do vínculo de filiação em relação a seus pais, sejam biológicos, ou afetivos. Importante para o instituto da filiação também e para o presente artigo, a questão contemporânea (apesar de a prática ser antiga) da posse de estado de filho, que apesar de ser comum a ocorrência na sociedade, não encontra ainda respaldo legal expresso, senão através de interpretações da lei a partir da doutrina.

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Sobre os autores
Juliano Dias Barbosa Ribas

Advogado com atuação nacional e escritório sediado em Curitiba - Paraná. Bacharel em direito pela Faculdade de Direito de Curitiba - UNICURITIBA. Pós-graduado em Direito do Trabalho pela Universidade Católica de Minas Gerais - PUC/MG. Pós graduado em Direito Previdenciário pela Universidade Católica de Minas Gerais - PUC/MG.

Waldyr Grisard Filho

Doutor e Mestre em Direito das Relações Sociais pela Universidade Federal do Paraná – UFPR, Professor na Faculdade de Direito de Curitiba, Membro do Instituto dos Advogados do Paraná – IAP e do Instituto Brasileiro de Direito de Família – IBDFAM, Juiz substituto do TRE-PR, Advogado em Curitiba.

Informações sobre o texto

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