Notícia divulgada como um “direito” ou uma “conquista” dos trabalhadores privados esconde uma perigosa e cruel armadilha. O governo federal editou a Medida Provisória 719 que, dentre outros assuntos, permite que os trabalhadores da iniciativa privada possam se endividar com os bancos que operam empréstimos consignados, usando como garantia parcelas de seu FGTS.
Ocorre que nem tudo o que parece realmente é.
De acordo com a referida MP, 10% do valor do saldo do FGTS e 100% dos 40% que as empresas devem arcar se o trabalhador for demitido sem justa causa poderão ser utilizados como garantia de dívidas emprestadas a juros pelos bancos.
Assim, se um trabalhador tiver R$ 15.000,00 (quinze mil reais) na conta de FGTS, os bancos poderão emprestar R$ 7.500,00, assim garantidos:
- 10% do valor do saldo no FGTS: R$ 1.500,00.- Multa a que o trabalhador terá o direito, se for dispensado: R$ 6.000,00.- Total: R$ 7.500,00
As taxas de juros serão aquelas que os bancos cobram, via de regra, exorbitantes em nosso País.
Se o empregado não pagar, pelo que entendemos, o banco poderá sacar o valor dessa garantia direto do FGTS, o que será um absurdo, já que o trabalhador pagará juros muito maiores do que aqueles que receberá na correção do Fundo, durante a vigência do contrato.
Se alguém pode ficar feliz com essa MP, esse alguém são os bancos, que reduzirão ainda mais os riscos de seus empréstimos. Este, inclusive, é o argumento: ao reduzir o risco dos bancos, as taxas automaticamente serão reduzidas, o que, todos sabemos, em uma economia como a nossa, termina por se tornar uma ficção econômica.
Traduzindo, de uma forma bem simples: os trabalhadores privados poderão tomar dinheiro em bancos privados ou na rede dita oficial, usando como garantia seu próprio FGTS. Pagando taxas de juros muito maiores do que as que remunerarão os saldos de seus fundos de garantia.
A nosso modesto ver, isso é uma vergonha!
Por que simplesmente não liberam essas parcelas, que seriam dadas em garantia, diretamente para o trabalhador, para este suprir suas necessidades emergenciais, muitas delas nascidas de dívidas causadas pelo excesso de tributos e custos arcados por todos no início do ano, como material escolar, IPVA, IPTU, dentre outros?
A armadilha torna-se ainda maior pelo momento econômico pelo qual passamos. As empresas, em geral, estão acelerando as demissões, devido a um necessário corte de custos. O cenário somente piora, diante do agravamento da crise política, que cria um clima de total incerteza para os negócios, principalmente para as micro, pequenas e médias empresas, grande celeiro de empregos.
O desespero pelo qual passa a classe trabalhadora certamente fará com que milhões de brasileiros tomem esses famigerados empréstimos, feitos com garantia do seu próprio dinheiro, e se endividem. Se forem demitidos, o que é um risco potencialmente elevado para qualquer trabalhador no atual cenário, ao invés de poderem contar com seus FGTSs, assistirão o saldo de seus fundos engordarem os cofres e os lucros dos bancos, que não têm como não comemorar essa “intervenção” do governo em nossa quase falida economia.
Senhores trabalhadores, pensem muito, muito, antes de caminharem por tal estrada. Nem sempre um passo à frente conduz ao futuro. Muitas vezes, pode conduzir à destruição; principalmente se estivermos diante de um precipício.