Característica inerente às kleptocracias extrativistas é o ultraconservadorismo (“que tudo mude para que tudo fique como está”, diz o ditado lampedusiano) (ver M. Bomfim, A América Latina, p. 332-333). Precisamente por causa dele deixamos de desfrutar mais prontamente das vantagens da 1ª e da 2ª Revoluções Industriais (de meados do século XVIII a meados do século XX), aproveitando-as somente décadas depois; agora se nota claramente o quanto que também estamos negligenciando a 3ª Revolução da Humanidade (que globalizou o mundo, encurtou distâncias e acelerou o tempo). Como tudo desde os anos 80 é muito mais veloz, deu-se o inevitável: rapidamente se agigantou a decrepitude das nações kleptocratas marginais ou periféricas (que precisam se renovar para se reinventar).
Uma das formas (dentre centenas) de se medir a temperatura da evolução dos países (sobretudo depois dos anos 80) reside no desenvolvimento tecnológico. O desenvolvimento humano, claro, é mais importante, mas não há como menosprezar a tecnologia, particularmente depois da revolução digital (que é tida como a 3ª Revolução Industrial). Não existe capitalismo (verdadeiro) sem “destruição criativa” (Schumpeter). Toda inovação aniquila o obsoleto. Muitas elites kleptocratas evitam a ampla inovação (porque isso representa risco). É assim que os países se fecham às modernas tecnologias.
O número de patentes concedidas (que você verá em seguida) constitui um bom indicador (não o único, como se sabe) de quanto cada país está inserido na 3ª revolução (que é global, comunicacional e digital, ao mesmo tempo). É de chorar quando vemos os números do Brasil, também nessa área. Perdemos o bonde da história e, evidentemente, mais uma vez, não é por falta de talentos (sim, por falta de um ambiente político e econômico que prestigie as iniciativas das pessoas).
Vejamos, a seguir, a que extremo as roubalheiras da kleptocracia degenerada (estatal e empresarial) conduziram o Brasil. A lista de 2015 de patenteadores no USPTO (sigla em inglês do escritório norte-americano de marcas e patentes) revela (o texto que segue relacionado aos números de patentes é de Roberto Nicolsky, Valor):
1) os EUA com 141 mil patentes concedidas no ano de 2015, cresceu 66% no período de 2000 a 2015; os países desenvolvidos que tiveram concedidas mais de 2.000 patentes em 2015 são: Canadá, Holanda e Suíça, todos com crescimento acima de 90% no período; Japão, Alemanha, França, Inglaterra e Suécia ficaram em torno dos 70%, enquanto a Itália teve o pior desempenho, apenas 56%, reflexo de sua persistente crise econômica [a Itália, dentre os desenvolvidos, é uma das kleptocracias mais decadentes – um dos sintomas dessa doença é sua posição – 61ª – no ranking da percepção da corrupção da Transparência Internacional];
2) A Coreia do Sul, do tamanho de Pernambuco e com pouco mais de 40 milhões de habitantes, multiplicou por 5,4 vezes as patentes no período, alcançando 17,9 mil, superando a Alemanha e consolidando-se como o terceiro patenteador, abaixo apenas do Japão (52,4 mil) e EUA (141 mil). Taiwan, uma ilha com cerca de 22 milhões de habitantes, multiplicou as patentes por 2,5 vezes chegando a 11,7 mil, o quinto patenteador;
3) Seria de se esperar que a China (incluindo Hong Kong) mostrasse a sua inexorável marcha para o domínio tecnológico, porém o seu avanço é surpreendente. Chegou a 8,7 mil patentes em 2015, que cresceram 29 vezes no período e a levaram à sexta posição, bem à frente do seguinte, o Canadá. A Índia, porém, ficou no mesmo patamar, pois cresceu suas patentes 26 vezes;
4) Esses dois últimos países estavam atrás do Brasil, quando iniciaram a sua trajetória ascendente. O que aconteceu conosco? Alcançamos a aprovação de 323 patentes em 2015, um crescimento de 3,3 vezes nesses 15 anos. Mas isso não conta a verdade, pois ficamos parados por 10 anos e crescemos apenas nos últimos cinco anos porque tivemos os incentivos fiscais da Lei do Bem, ou seja, praticamos somente um pouco e por pouco tempo o que China e Índia fazem em larga escala, assim como ainda fazem Coreia e Japão.
A parasitária kleptocracia brasileira (de uma extensão talvez inigualável no mundo todo) continua destruindo o Brasil, fazendo de conta que não está dizimando a si mesma. As nações dominadas e governadas por uma pequena elite (política e econômica) que desvia o dinheiro público para seus interesses “se esgotam como os terrenos não adubados”. Com menos de 200 anos, a kleptocracia brasileira já atingiu sua velhice imobilizante. Transformou o Brasil numa nação (interna e internacionalmente) decrépita e em recessão, que agora anseia descobrir, desnorteada, um rumo a seguir.
Cada privilégio de que o humano se investe, apropriando-se da riqueza da nação (em prejuízo da maioria), constitui um passo para as degenerescências. Quem quer elevar-se acima dos demais, menospreza as leis do país e abre a cova do sufocamento coletivo, após crises seguidas, que logo se transformam em caos, que é o prelúdio do colapso.
O extrativismo parasitário mata todas as energias das populações que se veem espoliadas na distribuição do patrimônio público (e é essa sensação que cada brasileiro sente a cada divulgação de mais bandalheiras que as elites políticas e econômicas praticam em conjunto em virtude do acesso privilegiado ao Estado).
Temos que discutir como podemos fazer um reset no país (e nos reinventar). Em primeiro lugar, faz-se necessário redesenhar as instituições políticas, cortando seus vínculos negociais e “cordiais” (no sentido de Sérgio Buarque de Holanda) com as elites empresariais e financeiras. As empresas e bancos que financiam candidatos, no mínimo, depois, querem empréstimos subsidiados, contratos sem licitação, obras ou serviços superfaturados.
É assim que as elites políticas e econômicas corruptas afundaram o Brasil, cuja sociedade civil tem que reagir impondo limites a todos eles. A Lava Jato está fazendo uma parte. Tudo o mais compete à sociedade civil. Vaidade, orgulho, egoísmo, ambição (ganância) e avareza: são paixões presentes em todos os humanos, sob todas as formas de governo e, quando infrenes, produzem os mesmos efeitos de fraude, violência e crueldade” (John Adams, 2º presidente dos EUA).