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A futura reforma da previdência poderá revogar ou alterar as atuais regras de transição?

08/09/2016 às 15:05
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Com a iminência de uma futura reforma na Previdência dos servidores, seria provável, ou mesmo razoável, a revogação ou a indesejada alteração no texto das atuais regras de transição?

Sem sobra dúvidas, o questionamento acima esposado, que intitula o presente artigo, já passou pela cabeça de muitos servidores públicos.

Com a iminência de uma futura reforma na Previdência dos servidores, seria provável, ou mesmo razoável, imaginarmos que as atuais regras de transição podem ser revogadas ou mesmo sofrer indesejadas alterações em seu texto?    

Antes de respondermos ao presente questionamento, devemos primeiro explicar, em poucas linhas, o que são, quais são e por qual motivo existem regras de transição.

Regras de transição são criadas quando o regime previdenciário é alterado pela lei, agravando/piorando a situação do servidor que já se encontrava no sistema, trabalhando, contribuindo e que possuía a expectativa de direito de se aposentar com base nos requisitos e critérios de cálculo até então vigentes.  

Quando estes requisitos e/ou critérios de cálculo são alterados ou extintos por meio de lei ou emenda constitucional, mitigando direitos e dificultando a vida do servidor, entram em cena as regras de transição que servem como ponte entre as duas situações: a inicial que era mais branda e favorável aos servidores e a recém-criada que é mais rigorosa e menos vantajosa.

Para melhor explicar, vejamos o que aconteceu no dia 16/12/98:

Neste dia, entrou em vigor a EC nº 20, que alterou substancialmente os requisitos de aposentadoria voluntária até então existentes e nascidos com o texto original da CF/88. A título de exemplo, a EC nº 20/98, na data de sua publicação, passou a exigir, para que o servidor pudesse se aposentasse com proventos integrais, 10 anos de efetivo exercício no serviço público, 5 anos no cargo em que se daria a aposentadoria, 35 anos de contribuição e 60 de idade para homens e 30 anos de contribuição e 55 de idade para mulheres. Todos estes requisitos, a partir da emenda, passaram a ser exigidos conjuntamente.

No texto anterior, para que o servidor se aposentasse com proventos integrais, exigia-se apenas 35 anos de serviço para o homem e 30 para a mulher.

Percebam que, entre a situação anterior e a posterior à EC nº 20/98, muita coisa mudou. Novos requisitos para a aposentadoria foram acrescentados, sobretudo, a necessidade de cumprimento de tempo mínimo no serviço público e no cargo, além do necessário implemento de idade mínima.  

As novas exigências agravaram muito a situação dos servidores, que passaram a ter que ficar por mais tempo contribuindo até que implementassem a idade mínima.

Imaginem um servidor que ingressou cedo no serviço público e que, lá em dezembro de 1998, quase na iminência de se inativar, entra em vigor a EC nº 20 e frustra completamente suas expectativas de se aposentar com base no regramento então em vigor.

Para solucionar a questão, mesmo que de forma tardia, entrou em vigor a EC nº 47/2005, que, em seu art. 3º, trouxe uma regra de transição para compensar/ajudar os servidores que ingressaram muito jovens e que haviam sido dramaticamente prejudicados pela mencionada EC nº 20/98.

Nesta regra de transição, possibilitou-se a antecipação da aposentadoria, lançando-se mão da regra 85/95, na medida em que, para cada ano a mais de contribuição, diminui-se um na idade mínima exigida. Assim, os servidores não precisariam permanecer em atividade até implementarem integralmente a idade mínima cobrada com o advento da EC nº 20/98 (60 anos para o homem e 55 para a mulher).  Melhor do que nada, concordam?

E, ainda, para melhor ilustrar a importância das regras de transição, vamos a outra situação:

No dia 31/12/2003, entrou em vigor a EC nº 41, que extinguiu a integralidade e a paridade, substituindo-as pelo cálculo com base na média aritmética simples e reajuste na forma da lei.

Evidentemente, esta emenda constitucional trouxe uma situação menos vantajosa para os servidores públicos, na medida em que, a partir dela, ou a partir da MP nº 167/04, que a regulamentou, não mais poderiam se aposentar com 100% da última e atual remuneração e nem poderiam ter paridade com os ativos na hora do reajuste dos proventos.

Entretanto, para preservar o direito daqueles que já se encontravam no regime de previdência e que possuíam a expectativa de se aposentar com o critério de cálculo e reajuste até então existente, foi criada, no corpo da própria emenda 41, a regra de transição do art. 6º, que estabeleceu alguns critérios cuja implementação assegura e preserva a possibilidade de se aposentar ainda hoje com integralidade e paridade.

Estas, portanto, são hoje as duas regras de transição em aposentadorias voluntárias que realmente interessam aos servidores públicos. São elas que ainda garantem paridade e integralidade, mesmo com estes institutos já tendo sido revogados nas atuais regras permanentes de aposentadoria.

Atualmente, estamos à beira de uma nova reforma da Previdência que, inquestionavelmente, alcançará o RGPS e o RPPS.

Os servidores se preocupam, pois há muita especulação sobre a questão. E uma das principais dúvidas norteiam exatamente as duas regras de transição acima ventiladas: há a possibilidade delas serem extintas? Terão o texto modificado para agravar mais ainda a situação do servidor?

Ora, lembremos que elas nasceram com o objetivo de aliviar, para o servidor que já se encontrava no regime, os rigores trazidos nas reformas perpetradas pelas emendas 20/98 e 41/03.

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Existem ainda milhares e milhares de servidores federais, estaduais, municipais e distritais que podem se aposentar por alguma dessas regras de transição.

A revogação das mesmas seria, obviamente, o pai de todos os calotes. Traria um verdadeiro desassossego jurídico à Administração Pública.  

Embora se tratando de regras transitórias, o Governo não poderia simplesmente retirar do ordenamento jurídico regras que ainda podem ser usufruídas por milhares de servidores que acreditaram na promessa de que poderiam ter direito à integralidade e paridade, desde que implementassem os requisitos de tais regras.

Da mesma forma, a mínima alteração em seus requisitos, com a adoção de critérios mais gravosos, também seria, em nosso sentir,  outra forma de calote no servidor, na medida em que criar-se-ia regra de transição sobre regra de transição. As regras em vigor já possuem requisitos bastante rigorosos. Imagine-se incrementar este rigor.

Compreendemos que as atuais regras de transição simplesmente não podem ter seu texto alterado, com a adição de requisitos mais complexos de serem alcançados. Tal providência implantaria um status de total insegurança jurídica, de total retrocesso. Seria, sem dúvida, uma grande apunhalada no servidor.

Desta forma, em resposta às indagações acima formuladas, no cenário de total incerteza em que vivemos, embora não sendo impossível de acontecer, é desarrazoado, injusto e desaconselhável a implementação de qualquer proposta tendente a revogar ou mesmo alterar o texto das atuais regras de transição.

Aguardemos!

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Sobre o autor
Alex Sertão

Professor de RPPS.

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

SERTÃO, Alex. A futura reforma da previdência poderá revogar ou alterar as atuais regras de transição?. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 21, n. 4817, 8 set. 2016. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/51028. Acesso em: 25 abr. 2024.

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