Star Trek Beyond (Jornada nas Estrelas sem Fronteiras):Krall e sua defesa utilitarista

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Comentar filme pelo ângulo jurídico é prazeroso e, com certeza, cativa leitores que têm curiosidades pelo universo jurídico, mas desanimam pela linguagem acadêmica. O artigo aborda Utilitarismo e faz o leitor repensar sobre justiça.

Tive a oportunidade de assistir os episódios originais de Star Trek [Jornada nas Estrelas]. Viajar pelo espaço em busca de novas civilizações nas profundezas do espaço. Gene Roddenberry soube cativar gerações, e ainda cativa, com os tramas vividos pelos tripulantes da USS Enterprise. Em plena Guerra Fria, algo surpreendente, Roddenberry, muito utópico, até para este início de século XXI, apresentou ao público um planeta no qual todos os habitantes vivem em paz, não importando qual etnia, religião etc. É o planeta Terra. No novo filme, Sem Fronteiras, Hikaru Sulu, o piloto daEnterprise, tem um uma família, nada tradicional para nós terráqueos, em pleno século XXI: relacionamento homoafetivo. Detalhe, na série original, década de 1960, o ator George Takei, que era o piloto da Enterprise, defendia os LGBTs. Takei era homossexual assumido.

Krall, o principal antagonista, aqui me desculpo para quem ainda não assistiu — recomendo assisti-lo antes de prosseguir na leitura —, é o vilão da história, mas terráqueo. Krall foi um dos primeiros capitães, com sua tripulação, a viajar pelo espaço infinito. Krall e sua tripulação tiveram que aterrizar num planeta desconhecido. Para ele sobreviver, usou tecnologia alienígena, encontrada no planeta, para sobreviver. A Federação Unida dos Planetas, para Krall, era uma instituição perversa, pois, nas palavras dele, nunca se importou em procurá-lo. Krall se sentiu traído pela Federação Unida dos Planetas e jurou destruir tudo que fosse relacionado a ela.

O UTILITARISMO DE KRALL

Krall viveu numa época em que as guerras eram comuns. Ele foi educado — ou seria doutrinado pelo Estado? — para combater inimigos. Para Krall, a Federação Unida dos Planetas assumiu uma filosofia que enfraqueceu os seres humanos: paz. O complexo Krall apresenta justificativas plausíveis para sua ira contra a Federação Unida dos Planetas. E qual o motivo de ser plausível? Existe o sentimento de comunidade em cada ser humano. Cada indivíduo, querendo ou não, assume compromissos e comportamentos do habitat em que vive. Há o instinto de grupo, que leva cada ser vivo a se ajustar ao habitat. A criança nasce, sem qualquer valor moral e religioso. Esses valores são aprendidos ao longo do desenvolvimento cognitivo. Claro que a criança apenas imita [reflexo condicionado] nos primeiros anos de sua vida. Na adolescência, a fase das descobertas, das perguntas, dos atrevimentos aos pais e à sociedade, à Justiça. Contudo, há os indivíduos que assumem uma personalidade coletiva, o patriotismo. Para esses indivíduos os valores de sua pátria são sólidos e verdadeiros. Na maioria das vezes, a maioria dos cidadãos se comportam, pelo aparelho ideológico do Estado na educação, como aconteceu durante o Golpe Militar de 1964 e na matéria Moral e Cívica — deixo claro que deveria retornar essa matéria, contudo, sem a ideologia militar de que se deve perseguir os comunistas, pois a Guerra Fria acabou —, por doutrinação sistêmica. Lealdade e filiação, eis o patriotismo.

Krall, então, antes da paz total promovida pela Federação, era exímio cidadão/patriota. Agiu conforme o utilitarismo de sua época, e foi, com certeza, aplaudido pelo Estado e pelos concidadãos. Krall, como ótimo cidadão e patriota defendia a forma de viver verdadeira, justa. A Federação Unida dos Planetas, por sua vez, era uma instituição contrária a tudo que aprendera, aos valores sociais e políticos dos quais foram transmitidos como justos, corretos, benéficos ao grupo e a ele próprio. Agora, a Federação Unida dos Planetas, a tripulação da Enterprise e os habitantes do planeta Terra dizem que Krall está errado, e que sua postura constitui crime.

KRALL E OS DIREITOS HUMANOS

Imaginemos que Krall, usando dobra espacial de sua nave, consegue voltar no tempo, para ser exato, o início do século XXI. Os direitos humanos visam à paz entre os povos, aos moldes da Federação Unida dos Planetas. Para Krall, os direitos humanos é uma ameaça que deve ser combatida, pois vai de encontro a tudo que acredita, ao que aprendera como verdadeiro, absoluto, justo para si e para a humanidade. Não seria difícil para Krall encontrar seres humanos afins, isto é, que fossem soldados para sua causa justa, correta. Os direitos humanos, o início da Federação Unida dos Planetas, deveria ser extirpada antes que se fortalecesse e corrompesse todos os seres humanos.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

O que é justiça, senão convenções de valores. Valores que mudam conforme o entendimento do que seja viver e como se comportar. E como se forma o Estado? Simples, quem tem poder em mãos para coordenar, decidir, punir quem não lhe obedecer. Mesmo na democracia, ainda assim, há grupos que controlam [utilitarismo] e determinam o modo de se viver, de se comportar. No Brasil, o personagem Krall não encontraria muita resistência aos seus ideais, já os direitos humanos são males e defende bandidos. Direitos humanos defendem: o sagrado direito de viver em paz, com saúde, física e mental; ter os direitos sociais materializados, e não tão somente na lei de papel; a fraternidade entre os povos; a liberdade de escolha [religiosa, sexual etc.] sem que tal liberdade tire o direito de liberdade que também tem a outra pessoa.

Desde a promulgação da Carta Política de 1988, e as consequentes mudanças no ordenamento jurídico pátrio, o valores de justiça e cidadania têm mudado. Ainda vejo e ouço, seja na rua ou na internet, que antigos valores eram melhores do que os atuais, que os valores atuais estão destruindo os laços familiares, o poder do Estado em coibir criminalidades diversas, principalmente do narcotráfico, dos milicianos. Quanto aos últimos, o problema está nas desigualdades sociais, no pífio controle de entrada de armas pelas fronteiras brasileiras, na [quase] ausência de educação cívica aos direitos humanos. É um conjunto de problemas que não se resolverá pelo simples extermínio do efeito, é necessário agir nas causas, e uma das causas é, sem dúvida, a corrupção dentro das instituições democráticas. A violência, as desigualdades sociais, enfim, todos os tormentos presentes neste início de século, no Brasil, se devem aos ímprobos representantes do povo.

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Certo que Krall encontraria duas batalhas, a primeira ao combater os direitos humanos, a segunda de acabar com os ímprobos políticos. Porém, se a corrupção é sistêmica, Krall seria morto se tentasse acabar com a corrupção. Refletir é preciso sobre os acontecimentos no Brasil. Se alguém pensar que os direitos humanos são péssimos para a vida brasileira, então, por consequência, a Lei Maria da Penha, a Defensoria Pública, os Juizados Especiais, entre outros, os quais são frutos da CF/88, terão que ser revogados. Indo mais além, a assistência social, os direitos dos trabalhadores, tudo deverá ser revogado. Todos os brasileiros viverão um estado autossobrevivência, isto é, sobrevive quem tiver força, garra, saúde. Se ficar doente, e não tiver dinheiro para pagar por plano de saúde, pois o SUS não existirá mais, a cova será o novo leito. Se alguém afirmar que a família tradicional é a correta e justa, então, por consequência, as norma contidas no revogado Código Civil de 1916 terão que ser ressuscitadas, e a mulher perderá sua liberdade, a qual conhece presentemente.

FIAT LUX!

REFERÊNCIAS:

ROTHBARD, Murray N. A Anatomia do Estado. MisesBrasil, 2009.

SANDEL, Michael J. Justiça / Michael J. Sandel; tradução de Heloisa Matias e Maria Alice Máximo. – Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 2015.

Star Trek Beyond [Jornada nas Estrelas sem Fronteiras].

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Sobre o autor
Sérgio Henrique da Silva Pereira

Articulista/colunista nos sites: Academia Brasileira de Direito (ABDIR), Âmbito Jurídico, Conteúdo Jurídico, Editora JC, Governet Editora [Revista Governet – A Revista do Administrador Público], JusBrasil, JusNavigandi, JurisWay, Portal Educação, Revista do Portal Jurídico Investidura. Participação na Rádio Justiça. Podcast SHSPJORNAL

Informações sobre o texto

Este texto foi publicado diretamente pelos autores. Sua divulgação não depende de prévia aprovação pelo conselho editorial do site. Quando selecionados, os textos são divulgados na Revista Jus Navigandi

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