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Os limites do poder normativo das agências reguladoras brasileiras:

o caso do encargo de capacidade emergencial ("seguro apagão")

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19/05/2004 às 00:00
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3. AGÊNCIAS REGULADORAS NO ORDENAMENTO JURÍDICO BRASILEIRO

Dando continuidade à busca pela resposta do questionamento, mister que se passe a estudar, agora, as características gerais das agências reguladoras no Direito Brasileiro, a fim de que se perquira acerca da sua legitimidade para estatuir normas jurídicas, bem como sobre o alcance que estas estatuições poderiam ter em relação ao poder regulamentar conferido ao chefe Poder Executivo.

Outrossim, é necessário que se analise a questão referente à função reguladora no Direito Brasileiro, objetivando determinar quais as competências que podem ser desenvolvidas pelos entes encarregados de seu desempenho.

3.1 EXEGESE DAS AGÊNCIAS REGULADORAS NO DIREITO BRASILEIRO

As agências reguladoras são resultado de processos de reformas administrativa e econômica, cuja origem está nas últimas décadas do século XX, e que visaram à diminuição da atuação do Estado brasileiro, bem como à abertura de certos setores da economia à iniciativa privada e ao capital estrangeiro. Sendo que estas reformas foram implementadas por emendas constitucionais e diversas leis infraconstitucionais.

O referido processo teve início, especificamente, com a edição do Decreto nº 83.740/1979, o qual adotou o Programa Nacional de Desburocratização, cuja instalação se deu no ano seguinte.

A partir de 1981, foi definida uma política restritiva à criação de novas entidades paraestatais e também se estabeleceram as primeiras diretrizes de transferência de empresas públicas ao setor privado.

No ano de 1985, com a publicação do Decreto nº 91.991/1985, aprimorou-se o Programa Nacional de Desburocratização ao se prever a criação do Conselho Interministerial de Privatização, o qual, com a entrada em vigor do Decreto nº 95.886/1988, foi sucedido pelo Conselho Federal de Desestatização.

Com o início da década de 90, iniciou-se outra fase do processo de redução do papel do Estado na seara econômica, que foi as das privatizações. O advento da Medida Provisória nº 155/1990, posteriormente convertida na Lei nº 8.031/1990, trouxe-se a lume o Programa Nacional de Desestatização.

Segundo apregoa o artigo 2º, §1º da Lei nº 8.031/1990, a privatização seria o processo de alienação, instaurado pela União, de direitos que lhe assegurem, diretamente ou através de outras entidades controladas, a preponderância nas deliberações sociais e o poder de eleger a maioria dos administradores da sociedade.

As formas pela quais ocorreria a privatização, segundo determinado pelo artigo 4º da Lei nº 8.031/1990, seriam: 1) a transformação, a incorporação, a fusão ou a cisão da empresa estatal; 2) a alienação de participação societária do Estado; 3) a abertura ou aumento de capital social à iniciativa privada; 4) a dissolução de empresas ou desativação parcial de empreendimentos; 5) a alienação, o arrendamento, a locação, o comodato ou a cessão de bens e instalações.

Devidamente estabelecido o Programa Nacional de Privatização, foi dado início, no âmbito do Poder Legislativo, à edição de emendas constitucionais tendentes à adequação do texto constitucional à nova realidade econômica brasileira.

Luís Roberto BARROSO indica duas fases distintas destas alterações na Constituição Federal de 1988. A primeira foi a extinção de determinadas restrições ao capital estrangeiro que residiam em nosso texto constitucional. Conforme se verifica da redação da Emenda Constitucional nº 06/1995, o artigo 171 da Constituição Federal de 1988, o qual conceituava empresa brasileira de capital nacional e admitia a outorga ás mesmas de proteção, de benefícios especiais e de preferências, foi suprimido. A referida Emenda Constitucional alterou, também, o teor do artigo 176 caput da Constituição Federal de 1988, ao permitir que a pesquisa, a lavra de recursos minerais e o aproveitamento dos potenciais de energia elétrica pudessem ser concedidos ou autorizados para empresas constituídas sob as leis brasileiras, dispensada a exigência anterior do controle do capital nacional.

Na mesma senda, a Emenda Constitucional nº 07/1995 modificou o artigo 178 da Constituição Federal de 1988, ao não mais exigir que a navegação de cabotagem e interior fosse realizada privativamente por embarcações nacionais, bem como ao dispensar a nacionalidade brasileira dos armadores, proprietários e comandantes e de, no mínimo, dois terços dos tripulantes.

Por fim, a primeira época das privatizações ocorreu com a promulgação da Emenda Constitucional nº 36/2002, por meio da qual ficou autorizada a participação de estrangeiros em até trinta por cento do capital social das empresas jornalísticas e de radiodifusão, quando da alteração do artigo 222 da Constituição Federal.

De outro viés, a segunda linha de reformas, que modificaram a feição da ordem econômica brasileira, foi a denominada flexibilização dos monopólios estatais.

Pela Emenda Constitucional nº 5 de 15 de agosto de 1995, modificou-se o parágrafo 2º do artigo 25 da Constituição Federal de 1988 e foi aberta a possibilidade de os Estados-membros concederem às empresas privadas a exploração dos serviço público de distribuição de gás canalizado, o qual, anteriormente, era, apenas, delegado à empresa sob controle acionário estatal.

A mesma situação ocorreu com os serviços de telecomunicações e de radiodifusão sonora de sons e imagens. A Emenda Constitucional nº 8, de 15 de agosto de 1995, transmudou os incisos XI e XII do artigo 21 da Constituição Federal de 1988, que só admitiam as concessões à empresa estatal, bem como previu a criação, na forma da lei, de um órgão regulador no âmbito do serviço de telecomunicações.

Com a Emenda Constitucional nº 9, de 09 de novembro de 1995, se pôs fim ao monopólio estatal na área petrolífera, de modo a facultar à União Federal a contratação com empresas privadas de atividades relativas à pesquisa e lavra de jazidas de petróleo, gás natural e outros hidrocarbonetos fluidos, a refinação do petróleo nacional ou estrangeiro, a importação, exportação e transporte dos produtos e derivados básicos de petróleo.

Outrossim, a referida Emenda Constitucional nº 9 instituiu a criação de um órgão regulador para o setor petrolífero, conforme se verifica da nova redação conferida ao artigo 177, § 2º, III, da Constituição Federal de 1988.

Ainda no ano de 1995, foi elaborado o Plano Diretor da Reforma do Estado elaborado pelo Ministério da Administração Federal e da Reforma do Estado, atual Ministério do Planejamento, Orçamento e Gestão.

Coube ao Plano Diretor da Reforma do Estado, datado de setembro de 1995, relevar a função reguladora estatal, ao indicar que "a reforma do Estado deve ser entendida dentro do contexto da redefinição do papel do Estado, que deixa de ser responsável pelo desenvolvimento econômico e social pela via da produção de bens e serviços, para fortalecer-se na função de promotor e regulador desse desenvolvimento".

Nesta perspectiva, "o Estado reduz seu papel de executor ou prestador direto de serviços, mantendo-se entretanto no papel de regulador e provedor ou promotor destes".

Posteriormente, no âmbito do extinto Ministério da Administração Federal e da Reforma do Estado, o Conselho de Reforma do Estado, criado pelo Decreto nº 1.738/1996, se reuniu e, por meio da Recomendação de 31 de maio de 1996, sugeriu à Câmara de Reforma do Estado da Presidência da República, a construção de um marco legal dos entes reguladores.

Segundo o teor do referido documento, o aparato regulatório existente à época de sua

elaboração era enorme, obsoleto, burocrático e, em essência, demasiado intervencionista, motivo pelo qual seria necessário, num primeiro momento, desregular alguns setores da economia para, a seguir, regulá-los por meio de novos critérios e formatos mais democráticos, menos intervencionistas e burocratizados.

Para a instituição dos entes reguladores, recomendou-se, ainda, a observância de algumas diretrizes básicas, quais sejam, 1) autonomia e independência decisória do ente regulador; 2) ampla publicidade das normas pertinentes ao ente regulador, de seus procedimentos e decisões e de seus relatórios de atividade, ressalvadas as hipóteses de sigilo previstas em lei; 3) celeridade processual e simplificação das relações mantidas entre o ente regulador e os consumidores, usuários e investidores; 4) participação de usuários, consumidores e investidores no processo de elaboração de normas regulamentares, em audiências públicas, na forma que vier a ser regulada em lei; 5) limitação da intervenção do Estado, na prestação de serviços públicos, aos níveis indispensáveis à sua execução.

O Conselho de Reforma do Estado também considerou indispensável que fossem arrogados aos entes reguladores uma autonomia gerencial, financeira, operacional e que sua organização fosse realizada sob a forma de autarquia.

Ademais, propôs-se a independência decisória do ente regulador, a qual seria assegurada mediante: 1) nomeação dos seus dirigentes pelo Presidente da República, após aprovação pelo Senado Federal, consoante o disposto no art. 52, III, f, da Constituição, com mandato fixo não superior a quatro anos; 2) processo decisório colegiado; 3) dedicação exclusiva dos ocupantes dos cargos de Presidente e membros do colegiado, não se admitindo qualquer acumulação de funções, salvo as constitucionalmente permitidas; 4) recrutamento dos dirigentes da autarquia mediante critérios que atendam exclusivamente ao mérito e à competência profissional, vedada a representação corporativa; 5) perda de mandato do Presidente ou de membros do colegiado somente em virtude da decisão do Senado Federal, atuando por provocação do Presidente da República; 6) perda automática de mandato de membro do colegiado que faltar a determinado número de reuniões ordinárias consecutivas ou a percentual de reuniões intercaladas, resguardados os casos de afastamentos temporários autorizados pelo colegiado.

Noutro momento, por fim, foi publicada a Lei nº 9.491/1997, que revogou totalmente a Lei nº 8.031/1990 e introduziu um conceito mais restrito ao vocábulo privatização, abrangendo, agora, tão-somente, a transferência de ativos ou de ações de empresas estatais para o setor privado.

Sintetizando todas estas informações, Maria Sylvia Zanella di Pietro enumera que a política de redução estatal no Brasil foi levada a cabo das seguintes maneiras: 1) a desregulação, entendida como a diminuição da intervenção do Estado no domínio econômico; 2) a desmonopolização de atividades econômicas; 3) a venda de ações de empresas estatais ao setor privado; 4) a concessão de serviços públicos, com a devolução da qualidade de concessionário à empresa privada e não mais a empresas estatais, consoante vinha ocorrendo; 5) os contracting out, entendida como a forma pela qual a Administração Pública celebra acordos de variados tipos para buscar a colaboração do setor privado, podendo-se mencionar, como exemplos, os convênios e os contratos de obras e prestação de serviços.

Percebe-se, portanto, que o processo de privatização brasileiro e a reestruturação das estratégias de intervenção estatal no domínio econômico foram acompanhadas de uma política econômica que privilegiou a abertura comercial, a sobrevalorização da moeda nacional, como forma de refreamento ao crescimento da inflação, e a desregulamentação do mercado financeiro brasileiro, com vistas a atrair o capital estrangeiro e, também, de desconstituição de monopólios.

Tem-se claro, ainda, que a conseqüência natural do amplo processo de remodelação do Estado brasileiro, o que é reflexo de uma política econômica, foi a diminuição da sua atuação no domínio econômico, enquanto "Estado-empresário", passando a exercer mais fortemente a regulação de atividades econômicas do que a sua prestação direta.

Neste cenário, surgem as agências reguladoras como opção do Estado para cumprir os mandamentos do artigo 174 da Constituição Federal de 1988. Ao criar as agências reguladoras, o Estado delegá-lhes a missão de serem agentes reguladores e normativos da atividade econômica.

3.2 A FUNÇÃO REGULADORA NO DIREITO BRASILEIRO

A compreensão exata do papel exercido pelas agências reguladoras está vinculada à definição da denominada função reguladora. Entretanto, as dificuldades que surgem para a identificação desta função estatal são enormes, em razão de poderem ser analisados pela Ciência do Direito e da Ciência da Economia. Obviamente, para os fins deste trabalho, importa estudar a função reguladora sob o prisma jurídico.

O fundamento jurídico da função reguladora, no ordenamento jurídico brasileiro, se encontra no artigo 174 da Constituição Federal de 1988, o qual dispõe que o Estado é agente normativo e regulador da atividade econômica. Contudo, o texto constitucional, por si só, não permite elaborar qualquer definição do que é a função reguladora.

Para melhor esclarecer o assunto, indispensável se valer das diversas lições doutrinárias. Sem dúvida, o autor que melhor analisou o tema da regulação foi Vital MOREIRA. Conforme ensina o referido doutrinador, o termo regulação abarca três acepções jurídicas distintas.

Num primeiro sentido, mais amplo, a regulação seria toda forma de intervenção do Estado no domínio econômico, independentemente dos instrumentos usados, bem como dos fins perseguidos. Ou seja, "cobriria todas as atividades do Estado em relação com a economia, incluindo o exercício de actividades empresariais (empresas públicas em sentido genérico) e as tarefas de condicionamento e disciplina da actividade privada".

Noutro momento, a regulação, numa acepção menos abrangente, seria a intervenção estatal na economia por outros meios que não a participação direta na atividade econômica. Equivaleria à coordenação, ao condicionamento e à disciplinação da atividade econômica privada pelo Estado. Melhor dizendo: indica toda e qualquer intervenção do Estado na atividade econômica exercida sobre os entes privados, excluindo-se a participação direta estatal.

Pelo terceiro significado, mais restrito, a regulação é apenas o condicionamento normativo da atividade econômica privada, por meio de lei ou de outro instrumento normativo. A regulação estaria reduzida à estatuição de normas de conduta da atividade econômica, deixando-se de lado as tarefas de implementação administrativa ou técnica dessas regras.

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Sem dúvidas, o parâmetro mais utilizado pela literatura jurídica para delinear o que seria a regulação, é o segundo daqueles propostos por Vital MOREIRA.

De outro lado, para Alexandre Santos de ARAGÃO, a regulação estatal seria o "conjunto de medidas legislativas, administrativas e convencionais, abstratas ou concretas, pelas quais o Estado, de maneira restritiva da liberdade privada ou meramente indutiva, determina, controla ou influencia o comportamento dos agentes econômicos, evitando que lesem os interesses sociais definidos no marco da Constituição e orientando-os em direções socialmente desejáveis".

Ainda demonstrando a riqueza de conceitos que permeia o tema, expõe-se o entendimento de Fernando Herren AGUILLAR, para quem a atividade regulatória do Estado pode ser normativa ou operacional, conforme se verifique a maior ou menor responsabilidade estatal na imposição de normas jurídicas aos particulares para o desempenho de atividades econômicas.

Do exposto, resta incontroverso o fato de que a regulação estatal se dá por instrumentos normativos, em razão dos princípios constitucionais da legalidade e do devido processo legal.

No entanto, no Direito Brasileiro, coube preferencialmente às agências de regulação o exercício de função reguladora, sendo ainda tarefa da Constituição Federal e das leis de criação destes órgãos delinear as funções que permitem construir um conceito da referida competência estatal.

Desta forma, realizada uma análise detida do texto constitucional e das normas infraconstitucionais pertinentes, as quais serão especificadas abaixo, percebe-se que, à luz do Direito brasileiro, a competência regulatória compreende cinco ações estatais distintas, a saber: 1) a normatização do comportamento dos agentes econômicos, 2) a fiscalização da conduta dos mesmos, 3) o poder de sancionar atos contrários aos princípios constitucionais da ordem econômica e aos ditames legais, 4) o arbitramento de conflitos entre os prestadores de serviços regulados e 5) o fomento da atividade econômica.

A normatização possui expressa previsão no artigo 174 da Constituição Federal de 1988 e significa a edição de normas jurídicas tendentes ao regramento da conduta dos agentes econômicos participantes de um setor da economia que esteja regulado. No plano legal, um exemplo de deferimento de competência normativa, como nota caracterizadora da função reguladora, pode ser percebido nos artigos 3º, I da Lei nº 9.427/1996 e 19, X da Lei nº 9.472/1997.

Por sua vez, a fiscalização é o controle exercido sobre os entes exploradores de atividade econômica, com o objetivo de se manter a observância aos preceitos constitucionais fundantes da ordem jurídica brasileira, sejam princípios fundamentais como os do âmbito econômico, ou seja, é um verdadeiro poder de polícia exercido sobre o mercado regulado.

Também pode ser entendida como uma permissão conferida ao agente econômico pelo órgão regulador de explorar determinada atividade, desde que presentes condições constitucionais e legais indispensáveis ao ingresso no setor regulado.

A fiscalização é evidenciada como um dos fatores essenciais à caracterização da competência reguladora por meio do caput do artigo 174 da Constituição Federal. Além disso, os artigos 8º, VII da Lei nº 9.478/1996 e 4º, XXIII da Lei nº 9.961/2000, dentre outros dispositivos das outras leis, disciplinam algumas das hipóteses em que será exercido o poder de fiscalização pelos entes reguladores.

De outro viés, entende-se que o poder de impor sanções é uma verdadeira complementação à função fiscalizadora, pois de nada adiantaria atribuir às agências, ou aos outros entes que exerçam a competência reguladora, o poder de fiscalização se não pudessem reprimir as atitudes lesivas aos preceitos normativos.

Um dos fundamentos legais da possibilidade de imposição de sanções encontra-se, no âmbito das agências reguladoras, nos artigos 19, XI da Lei nº 9.472/1997 e 3º, X da Lei nº 9.427/1996.

O arbitramento de conflitos é uma faculdade conferida aos entes reguladores para que, em função de serem os órgãos técnicos específicos do setor, dirimam as desavenças surgidas entre as partes que integram a área regulada.

Tendo em vista o fato de não possuir fundamento constitucional, expresso ou implícito, como é o caso do poder sancionador, a aceitação do poder de dirimir conflitos poderia ser obstaculizada por entendimentos que nele vislumbrariam afrontas ao princípio da inafastabilidade do Poder Judiciário, contido no artigo 5º, XXXV da Constituição Federal de 1988.

No entanto, de acordo com o que faz Maria Sylvia Zanella di PIETRO, a resolução deste aparente conflito não guarda maiores percalços, tendo em vista que a independência, uma das características das agências reguladoras, não deve ser interpretada de tal modo que afaste os assuntos submetidos à esfera administrativa à futura apreciação jurisdicional, em face do aludido princípio da inafastabilidade da jurisdição. O poder de dirimir contendas está contido, exemplificativamente, nos artigos 19, XVII da Lei nº 9.472/1997 e 15, VII da Lei nº 9.782/1999.

Por fim, o poder de fomento também possui seu fundamento no artigo 174 da Lei Maior. Nas palavras de Celso Ribeiro BASTOS, fomentar é o incentivo dado pelo Estado a determinados ramos da atividade econômica, por meio da concessão de isenções tributárias, incentivos de ordem fiscal e creditício, tudo objetivando a redução das desigualdades sociais e à busca pelo pleno emprego. Na legislação infraconstitucional, por amostragem, o fomento está previsto no artigo 7º, II da Lei nº 9.782/1999

Realizadas estas ponderações acerca da função reguladora, é necessário que se estude as agências reguladoras no Direito brasileiro, com o intuito de verificar alguns de seus aspectos fundamentais, os quais vêm causando polêmicas dentre os juristas pátrios.

3.3. AS AGÊNCIAS REGULADORAS NO DIREITO BRASILEIRO

3.3.1 Agências Reguladoras Existentes no Direito Brasileiro

A par da discussão doutrinária, segundo a qual as agências reguladoras não seriam novidade no direito brasileiro, tendo em vista a existência de outras entidades que também exerceriam competências reguladoras, pode-se afirmar que somente no ano de 1996 surgiu a primeira agência reguladora brasileira: a Agência Nacional de Energia Elétrica, instituída pela Lei nº 9.427 de 26 de dezembro de 1996 e regulamentada pelo Decreto nº 2.235/1997.

Em seguida, surge a Agência Nacional de Telecomunicações, cuja criação se deu pela Lei nº 9.472, de 16 de julho de 1997 e que foi objeto de regramento do Decreto nº 2.338/1997. Posteriormente, foi publicada a Lei nº 9.478, de 6 de agosto de 1997, completada pelo Decreto nº 2.455/1998, por meio da qual adveio a Agência Nacional do Petróleo.

Com a Lei nº 9.782, de 26 de janeiro de 1999, instalou-se a Agência Nacional de Vigilância Sanitária, objeto de regulamentação pelo Decreto nº 3.029/1999. Por meio da Lei nº 9.961, de 28 de janeiro de 2000, concebeu-se a Agência Nacional de Saúde Suplementar, cuja regulamentação se deu pelo Decreto nº 3.327/2000.

Por sua vez, com a Lei nº 9.984, de 17 de julho de 2000, objeto de tratamento do Decreto nº 3.692/2000, nasceu a Agência Nacional das Águas. Com a Lei nº 10.233/2001, de 5 de junho de 2001, despontaram no direito brasileiro a Agência Nacional de Transportes Terrestres e a Agência Nacional de Transportes Aquaviários.

Por fim, completando a relação das agências reguladoras brasileiras, foi instituída, por meio da Medida Provisória nº 2.281-1, de 06 de setembro de 2001, a Agência Nacional do Cinema.

Expostas quais são as agências existentes no ordenamento jurídico brasileiro, cumpre, agora, estudar qual seria a sua natureza jurídica.

3.3.2 Natureza Jurídica, Características e o Conceito de Agências Reguladoras à Luz do Direito Positivo Brasileiro

O Direito positivo brasileiro não contemplou qualquer definição do que venham a ser as agências reguladoras, legando a integração desta lacuna normativa pela interpretação dos operadores do Direito. Ressalte-se que a conceituação do sejam as agências reguladoras no Direito brasileiro não é desprovida de significações práticas, tendo em vista que, somente de posse dela, é que se poderá enquadrar as entidades que estarão submetidas aos regramentos da Lei nº 9.986 de 18 de julho de 2000, a qual dispõe, dentre outros assuntos, acerca da gestão dos recursos humanos na esfera das agências reguladoras.

Deste modo, o caminho escolhido para se atingir o desiderato acima apontado, será o da análise dos textos normativos, extraindo-se os traços comuns às agências.

É o que se propõe a fazer agora.

3.3.2.1 Natureza Jurídica

Num primeiro momento, vislumbra-se que todas as agências reguladoras criadas no direito brasileiro são qualificadas como autarquias especiais.

Hely Lopes MEIRELLES ensina que será autarquia especial "aquela a que a lei instituidora conferir privilégios específicos e aumentar sua autonomia comparativamente com as autarquias comuns, sem infringir preceitos constitucionais pertinentes a essas entidades de personalidade pública".

Todavia, mister que se proceda à uma investigação do que seria o aludido regime especial a que estão submetidas autarquias sob regime especial denominadas agências reguladoras.

Conforme observado por Celso Antônio Bandeira de MELLO, o regime especial das agências reguladoras está definido em quatro de todos os diplomas normativos que as instituíram.

Segundo o artigo 8º, § 2º, da Lei nº 9.472/1997, a especialidade do regime dos entes reguladores brasileiros estaria garantida pelas suas independência administrativa, ausência de subordinação hierárquica, estabilidade e determinabilidade dos mandatos de seus dirigentes, bem como sua autonomia financeira.

De outro lado, o artigo 1º, parágrafo único, da Lei nº 9.961/2000, prescreve que o regime especial se caracteriza pela autonomia administrativa, financeira, patrimonial e de gestão de recursos humanos das autoridades reguladoras, pela autonomia nas suas decisões técnicas e pelo mandato fixo de seus dirigentes.

Já a Lei nº 9.782/1999, em seu artigo 3º, parágrafo único, estabelece que o regime em exame está vislumbrado pela independência administrativa, pela estabilidade de seus dirigentes e pela autonomia financeira.

Por último, a Lei nº 10.233/2001, no artigo 21, § 2º, apregoa que o regime especial das autarquias é determinado pelas independências administrativa, financeira e funcional, bem como pela atribuição de mandato fixo aos seus dirigentes.

Percebe-se, desta maneira, num apanhado destas estatuições, que o regime especial das agências reguladoras estaria configurado pela atribuição de independência administrativa e financeira aos referidos entes; a concessão, aos seus dirigentes, de mandatos fixos e estáveis, além da definitividade administrativa das decisões técnicas exaradas.

Caso se almejasse, apenas, identificar qual a natureza jurídica e as características das agências reguladoras, esta conclusão parcial seria suficiente.

Todavia, como o que se apresentou não é suficiente para se destacar, completamente, as agências reguladoras das demais autarquias, é necessário, ainda, se verificar qual o conceito tradicional de autarquia.

Nos termos do artigo 5º, I do Decreto-Lei nº 200/67, autarquia é o serviço autônomo, criado por lei, com personalidade jurídica, patrimônio e receita próprios para executar atividades típicas da Administração Pública, que requeiram, para seu melhor funcionamento, gestão administrativa e financeira descentralizada.

Doutrinariamente, a mesma autarquia é "uma entidade estatal da administração indireta, criada por lei, com personalidade de direito público, descentralizada funcionalmente, para desempenhar competências administrativas próprias e específicas, com autonomia patrimonial, administrativa e financeira".

Assim, ante o cotejo dos traços característicos das autarquias tradicionalmente concebidas e daquelas ditas especiais, percebe-se que a diferença existente entre elas está na investidura de mandato fixo e estável aos dirigentes, bem assim pela falta de ingerência hierárquica da Administração Central sobre os atos decisórios, ambas no que atine às agências reguladoras.

Visto que a natureza a natureza jurídica das agências reguladoras é a de autarquia sob regime especial, bem como quais seriam as características que o configura, mister, agora, que se proceda a um detalhamento dos traços dos entes reguladores brasileiros, ainda que alguns deles em consonância com as características apresentadas pelas autarquias.

3.3.3 Características Gerais das Agências Reguladoras

Relembre-se, antes de tudo, o rol das características das agências reguladoras, a saber: 1) independência administrativa; 2) independência financeira, 3) mandatos fixos e estáveis aos dirigentes e 4) definitividade administrativa das suas decisões.

Como é cediço, para se evitarem quaisquer problemas, as leis, no Brasil, em razão da composição plúrima das Casas Legislativas, nem sempre são dotadas das melhores técnicas jurídicas.

Tanto isto é verdade que a principal tarefa do jurista contemporâneo é saber interpretar, ou seja, conhecer os métodos para buscar o sentido das expressões equivocadamente utilizadas nos textos normativos, adequando-as, sistematicamente, conforme a Constituição Federal.

Diferentemente não ocorreu com as leis que criaram as agências reguladoras, pois, conforme ensina Carlos Ari SUNDFELD, a autonomia administrativa dos entes reguladores é verificada, justamente, pela ausência de exoneração ad nutum dos dirigentes e, também, pelo fato de as suas decisões gozarem de definitividade no âmbito administrativo.

Desta forma, percebe-se que as quatro características apontadas pelas leis instituidoras de agências reguladoras como formadoras do regime especial, resumem-se a duas, sob o ponto de vista da dogmática jurídica: autonomia administrativa e financeira, encontrando-se na primeira delas as duas notas que destoam as agências reguladoras das demais autarquias, quais sejam a impossibilidade de exoneração desmotivada dos dirigentes e a definitividade das decisões administrativas.

Assim, para melhor sistematizar a exposição, passar-se-á, primeiramente a estudar a autonomia administrativa das agências reguladoras, ponto este que gera maiores discussões acerca do tema. Num segundo momento, verificar-se-á a autonomia financeira, a qual, apesar de não demandar muitas discussões, é fundamental para a garantia de independência aos entes reguladores, principalmente no que atine ao exercício da função reguladora que lhes foram atribuídas.

3.3.3.1 Autonomia Administrativa

A autonomia administrativa é, estreme de dúvidas, um dos pontos que suscita maior polêmica na atividade diuturna das agências reguladoras, pois, de acordo com o que esclarece Carlos Ari SUNDFELD, "a opção por um sistema de entes com independência em relação ao Executivo para desempenhar as diversas missões regulatórias é uma espécie de medida cautelar contra a concentração de poderes nas mãos do Estado". No entanto, a aludida opção pode ser aceita ou rechaçada, consoante o perfil ideológico do grupo que se encontra no governo, tal qual demonstra o passado recente do Brasil.

Como referido dantes, o surgimento das agências reguladoras se deu na metade final da década de 90, quando o Presidente da República era Fernando Henrique Cardoso, cuja aspiração ideológica, durante os mandatos, foi tachada de neoliberal, ou seja, favorável à redução do papel do Estado no desempenho de atividades econômicas.

De outro lado, o atual Presidente da República, Luiz Inácio Lula da Silva, logo em seu segundo mês de mandato, pôs o tema da independência das agências reguladoras em voga, em contraposição ao modelo instaurado, dizendo que: "o Brasil foi terceirizado. As agências mandam no Brasil, pois as decisões que afetam o dia-a-dia da população não passam pelo governo".

É importante salientar que esta declaração teve repercussão bastante forte no cenário político-econômico brasileiro, a ponto de ser montado um grupo de trabalho, coordenado pela Casa Civil, cuja atribuição foi a de estudar a atuação das agências reguladoras e, com base dos resultados, sugerir um novo modelo regulatório para o país, no qual o poder decisório não fosse tão descentralizado como no modelo atual.

Conforme se observou do conteúdo do relatório, uma das conclusões e sugestões do grupo foi a de condicionar a estabilidade dos dirigentes das agências reguladoras aos casos de cumprimento de um contrato de gestão a ser firmado com o Ministério respectivo.

Vale dizer: pretendeu-se terminar com uma prerrogativa conferida, dentre outros dispositivos, pelo artigo 9º da Lei nº 9.986/2000 aos ocupantes dos cargos de direção das agências reguladoras, que, para tanto, foram sabatinados conforme prescrição do artigo 52, III, "f" da Constituição Federal de 1988, em detrimento ao cumprimento de um plano de metas pactuado entre o órgão regulador e a pasta governamental correspondente, numa perigosa equiparação entre as agências reguladoras e as agências executivas.

No entanto, conforme recentemente se observou, o governo brasileiro realizou uma espécie de mea culpa em relação às agências reguladoras. Após uma série de críticas, o governo atenuou o discurso e decidiu não mais modificar a estrutura administrativa das agências reguladoras.

Do que se depreende do novo relatório feito pelo governo, pretende-se, apenas, incrementar os instrumentos de controle social das agências, com a criação de ouvidorias em cada um dos entes reguladores.

A par da pertinência ou não das críticas feitas pelo atual governo, incumbe ressaltar que a independência das agências reguladoras em relação ao Poder Executivo não é algo tão puro quanto afirmado.

Sob o prisma constitucional, de acordo com os artigos 84, II, e 87, parágrafo único, I, da Lei Fundamental brasileira de 1988, estão postos à disposição do Presidente da República e dos Ministros de Estados todos os mecanismos de controle passíveis de serem lançados em face das referidas autarquias especiais para que se efetive o poder de controle imanente ao cargo que ocupam.

Obviamente, a restrição à liberdade de atuação das agências reguladoras não poderá afetar as garantias especiais da destituição imotivada dos seus dirigentes e da irrecorribilidade administrativa das decisões tomadas pelas referidas autarquias.

Deve-se compreender a impossibilidade de exoneração ad nutum dos dirigentes como sendo uma garantia que lhes foi conferida pela legislação específica, com o objetivo de assegurar a continuidade de orientação e a independência de ação das entidades que encabeçam, não obstante as injunções políticas sofridas, tudo com o intuito primordial de conferir maior especialidade técnica aos setores regulados.

Importa mencionar que Celso Antônio Bandeira de MELLO crê que os mandatos dos dirigentes não poderiam ultrapassar o período governamental, sob a pecha de inconstitucional, por ser uma forma indireta do antigo governante prolongar a sua administração, ferindo o princípio republicano, que pressupõe a temporalidade dos mandatos.

Ademais, destaque-se que a questão já foi objeto da Ação Direta de Inconstitucionalidade nº 1.949-0, por meio da qual o Supremo Tribunal Federal julgou, em caráter liminar, constitucional o novo sistema instituído com relação à estabilidade dos dirigentes de autarquias especiais, a qual estaria em xeque, apenas, em casos de justa causa, de exoneração mediante o prévio procedimento administrativo, onde se assegurem o contraditório e a ampla defesa, ou caso a legislação das agências reguladoras sejam alteradas.

De outro lado, a definitividade, no âmbito administrativo, das decisões proferidas pelas agências reguladoras também se demonstra como uma das manifestações de sua autonomia administrativa.

No geral, as legislações das agências reguladoras não são específicas ao determinar o não cabimento do denominado recurso hierárquico impróprio das decisões proferidas pela Diretoria Colegiada ao Ministério vinculado à sua atuação.

Contudo, os artigos 19, XXV da Lei nº 9.472/1997, 15, VII e §2º da Lei nº 9.782/1999 e 27, §4º da Lei nº 10.233/2001 dispõem que a Agência Nacional de Telecomunicações, a Agência Nacional de Vigilância Sanitária e a Agência Nacional de Transportes Aquaviários se constituem nas últimas instâncias administrativas de julgamento, sob a esfera da atividade regulada.

Ademais, a par do silêncio normativo quanto os recursos hierárquicos impróprios, outra não poderia ser a conclusão senão a da autonomia administrativa. Conforme a doutrina de Alexandre Santos de ARAGÃO, "não é a sua (recurso hierárquico impróprio) que deve ser expressa, mas sim a sua admissão". Outrossim, ressalte-se que este posicionamento doutrinário está em consonância com o princípio da taxatividade dos recursos, observado no âmbito da Ciência Processual, segundo o qual somente são considerados recursos aqueles numerus clausus definidos em lei federal.

Em suma, somente por meio da impossibilidade de revisão das questões definidas pelas agências reguladoras pelos órgãos da Administração Central, estar-se-ia garantindo a vedação de proferimento de decisões políticas em assuntos que, por opção legislativa, devem ser avaliados sob juízos técnicos.

3.3.3.2 Autonomia Financeira

Consoante as lúcidas advertências de Edmir Netto de ARAÚJO, a autonomia orçamentária "não pode significar que a entidade possa realizar despesas não previstas para a autarquia na lei geral orçamentária do Estado, que terá como apêndice justamente o orçamento da autarquia. O mesmo se diga da autonomia financeira, pois a execução financeira do orçamento tem regras próprias de controle no orçamento, inclusive para as autarquias".

Com efeito, como autarquias especiais que são, as agências reguladoras possuem seu orçamento regido pelo artigo 165, § 5º, I, da Constituição Federal de 1988, ou seja, o orçamento de cada agência reguladora estará compreendido na lei orçamentária anual.

De outro lado, o patrimônio das agências é reputado como patrimônio público, o qual é destinado a cada órgão regulador, conforme disposto na legislação específica dos entes.

Para que se tenha um exemplo, o qual é fornecido por Paulo Roberto Ferreira MOTTA, as rendas da Agência Nacional de Energia Elétrica são constituídas por recursos que surgem da cobrança de taxas de fiscalização sobre os serviços de energia elétrica, a teor do que prevêem os artigos 11, I e 12 da Lei nº 9.427/1996; recursos ordinários provindos do Tesouro Nacional, os quais estão assinalados no Orçamento Fiscal da União e em seus créditos adicionais, transferências e repasses que lhe forem conferidos, de acordo com o artigo 11, II da mesma lei federal.

Além disso, a referida Agência obtém recursos do produto da venda de publicações, material técnico, dados e informações, inclusive para fins de licitação pública, de emolumentos administrativos e de taxas de inscrição em concurso público, em consonância com o disposto no artigo 11, III da Lei nº 9.427/1996.

A Agência Nacional de Energia Elétrica também angaria recursos por meio de rendimentos de operações financeiras que realizar; recursos provenientes de convênios, acordos ou contratos celebrados com entidades, organismos ou empresas, públicas ou privadas, nacionais ou internacionais, conforme os incisos IV e V do aludido artigo 11 da Lei nº 9.427/1996.

Ainda recebe recursos de doações, legados subvenções e outros recursos que lhe forem destinados; valores apurados na venda ou no aluguel de bens móveis e imóveis de propriedade da própria Agência, de acordo com o disposto no artigo 11, VI e VII da lei federal instituidora da referida autarquia especial.

Por fim, a Agência Nacional de Energia Elétrica poderá arrecadar valores relativos à compensação financeira pela exploração de recursos hídricos para fins de geração de energia elétrica e os valores relativos aos royalties devidos pela Itaipu Binacional e de outros aproveitamentos binacionais.

3.3.4. Conceito

Os conceitos doutrinários acerca do que venha a ser agência reguladora são os mais diversos e levam em conta elementos distintos, conforme a abordagem dada ao assunto.

Exemplo desta multiplicidade de definições pode ser encontrada no seguinte inventário de lições doutrinárias.

Marçal JUSTEN FILHO, o qual realiza uma ampla abordagem do tema sob o prisma de direito comparado e direito positivo brasileiro, propõe que agência reguladora independente é uma "autarquia especial, criada por lei para intervenção estatal no domínio econômico, dotada de competência para regulação de setor específico, inclusive com poderes de natureza regulamentar e para arbitramento de conflito entre particulares, e sujeita a regime jurídico que assegure a sua autonomia em face da Administração direta".

Alexandre Santos de ARAGÃO, de outro lado, com base em alguns elementos trazidos pelas normas jurídicas brasileiras, as define como "autarquias de regime especial, dotadas de considerável autonomia frente à Administração centralizada, incumbidas do exercício de funções regulatórias e dirigidas por colegiado cujos membros são nomeados por prazo determinado pelo Presidente da República, após prévia aprovação pelo Senado Federal, vedada a exoneração ad nutum".

Em sentido semelhante, Marcos Juruena Villela SOUTO entende que as agências reguladoras são:

Entidades que integram a Administração Pública indireta, criadas por lei para o exercício da autoridade inerente à função de intervir na liberdade privada por meio de ponderação entre interesses em tensão, tendo, assim, personalidade de direito público, caracterizando-se como autarquia, por exigir autonomia em relação ao poder central, da espécie de autarquia especial, por ser dotada de independência, que se manifesta, principalmente, pela atribuição de mandatos fixos a uma direção colegiada.

Finalmente, Paulo Roberto Ferreira MOTTA ensina que:

Uma agência reguladora deve ser conceituada como um ente administrativo dotado de autonomia, sendo que a sua criação deve ser realizada por lei específica, com personalidade jurídica de direito público interno, patrimônio próprio e competências perfeitamente especificadas no texto legal criador daquela. A lei de criação, por sua vez, deve limitar, detalhadamente, toda a competência, delegada pelo legislador à agência reguladora. Os limites da delegação devem encontrar na lei criadora o locus de sua intensidade e dimensão, a fim de que possa o intérprete, com presteza e correção, verificar, no futuro, o campo normativo que continua no âmbito de competência do Parlamento e do Executivo.

No entanto, do que foi exposto, percebe-se que, à luz do direito positivo brasileiro e das lições doutrinárias colacionadas, as agências reguladoras são autarquias sob regime especial voltadas ao exercício de função reguladora estatal sobre o domínio econômico, as quais estão estruturadas com estabilidade funcional dos seus dirigentes, definitividade administrativa de suas decisões e receitas financeiras próprias.

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Sobre o autor
Guilherme Mussi

advogado em Curitiba/PR

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

MUSSI, Guilherme. Os limites do poder normativo das agências reguladoras brasileiras:: o caso do encargo de capacidade emergencial ("seguro apagão"). Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 9, n. 316, 19 mai. 2004. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/5274. Acesso em: 4 mai. 2024.

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