Epistemologia do pragmatismo.

Uma introdução ao pensamento pragmático

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29/10/2016 às 12:36
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O artigo tem por objetivo discorrer, de forma introdutória, a respeito do pragmatismo do ponto de vista epistemológico e, consequentemente, em um cunho filosófico.

INTRODUÇÃO

O presente artigo tem por objetivo geral a introdução do pragmatismo dentro de uma perspectiva de cunho filosófica, dentro da discussão da epistemologia. Para tanto, já que se pretende um enfoque epistemológico, inicialmente, será objetivo específico deste artigo tratar do conceito de epistemologia, com base nas obras clássicas de Châtelet (1973, I) e Abbagnano (2007). A seguir, também será objetivo específico desenvolver sobre as bases filosóficas da perspectiva pragmática, para tanto, serão abordados autores basilares de tal escola, William James e Charles Sanders Peirce, os quais discutem sobre a transcendência da dicotomia entre teoria e prática, que mais adiante será a essência para o conceito de experiência deweyano. Neste sentido, por fim, também será objetivo específico do primeiro capítulo asseverar sobre o pensamento de Dewey no que tange sua influência para o movimento escolanovista, maxime nas obras Experiência e educação e Educação e democracia, onde o autor discorre sobre o fundamental papel do educador e sua importância no desenvolvimento saudável do educando. Destarte, a pergunta que propulsiona e melhor sintetizaria este capítulo pode ser assim formulada: levando-se em conta o conceito deweyano de experiência, como é possível pensar na filosofia pragmatista?

A Epistemologia pode ser entendida como um campo filosófico interessado em se chegar ao conhecimento mais verdadeiro possível, sendo, pois, também é fundamental para a construção da Ciência. O ato de se debruçar diante de determinado objeto cognoscível, seja um fenômeno, um fato ou uma criação teórica – que, em uma visão pragmática poderia ser generalizado na própria experiência, visto que teoria e prática por ela não se diferenciam, como será mais bem discutido alhures –, demonstra não apenas o interesse por compreender as questões mais estruturais, mas aponta para um método propriamente filosófico de isolamento e esquadrinhamento do conhecimento, na tentativa de se chegar a seu estado mais rudimentar (ABBAGNANO, 2007).

A epistemologia, em princípio, pode ser compreendida como o estudo das coisas puras, por único meio do exercício da reflexão, de modo que seria impossível dissociá-la da filosofia. Inclusive, poderia se dizer que por este método, na busca pelo estado primordial e genuíno, a filosofia, enquanto caminho das incertezas e dos questionamentos infindáveis, encontra, talvez, sua vereda mais pragmática, uma vez que o filósofo sai do discurso unicamente teórico e se volta para a prática e os dilemas e problemas da experiência. É neste sentido que Châtelet (1973, I) relembra o sentido etimológico, a asseverar que a expressão deriva da composição entre ἐπιστήμη, onde se lê episteme, relativo à ideia de ciência, conhecimento; e λόγος, onde se lê logos, a significar estudo. O que, reiteradamente, reforma a ideia de que a epistemologia está ligada à ideia de um estudo ou método filosófico do conhecimento – ressaltando, mais uma vez, que não se trata de um conhecimento, mas de o conhecimento. A questão que se coloca, obviamente retomando à antiguidade é se, de fato, seria possível ao homem, por meio de sua razão, cognição, sentido e percepção, lapidar determinado conhecimento e tal grau de pureza?

Neste diapasão, Abbagnano (2007), ao relacionar Epistemologia com a Teoria do Conhecimento, de acordo com o autor, o termo Gnoseologia é mais utilizado. Em italiano, o termo mais usado é gnoseología. Em alemão, o termo Gnoséologie, cunhado pelo wolffiano Baumgarten, teve pouco sucesso, ao passo que o termo Erkenntnistheorie, empregado pelo kantiano Reinhold, Versuch einer neuen Theorie des menschlichen Vorstellungsvermôgens, 1789, foi comumente aceito. Em inglês, o termo Epistemology foi introduzido por J. F. Ferrier, Institutes of Metaphysics, 1854, e é o único empregado comumente, sendo Gnoseology bem raro. Todos esses nomes têm o mesmo significado: não indicam, como muitas vezes se crê ingenuamente, uma disciplina filosófica geral, como a lógica, a ética ou a estética, mas um modo de tratar um problema nascido de um pressuposto filosófico específico, no âmbito de determinada corrente filosófica, que é o idealismo. O problema cujo tratamento é tema específico da Teoria do Conhecimento é a realidade das coisas ou, em geral, do mundo externo. E completa o autor:

A Teoria do Conhecimento começou a perder o primado e também o significado quando se começou a duvidar da validade de um de seus pressupostos, isto é, que o dado primitivo do conhecimento e “interior” à consciência ou ao sujeito e que, portanto, a consciência ou o sujeito devem ir para fora de si mesmos – o que, em princípio, é impossível – para apreender o objeto. Kant, em Refutação do Idealismo, acrescentada à 2a edição de Crítica da Razão Pura (1787), demonstrara a sua falta de fundamento. Os analistas contemporâneos também rejeitam o primeiro pressuposto da Teoria do Conhecimento, isto é, que o conhecimento é uma forma ou categoria universal que pode ser indagada como tal: assumem como objeto de indagação os procedimentos efetivos ou a linguagem científica, e conhecimento em geral. Portanto, a Teoria do Conhecimento perdeu seu significado na filosofia contemporânea e foi substituída por outra disciplina, a metodologia, que é a análise das condições e dos limites de validade dos procedimentos de investigação e dos instrumentos lingüísticos do saber científico (ABBAGNANO, 2007, p. 183).

Por meio da análise da Crítica da Razão Pura, Kant (1971) diferencia o conhecimento empírico, ou seja, aquele adquirido pela experiência, por meio da prática e observação, e aquela categoria pura, da qual não se necessita ter qualquer experiência que ser concebido, pois são intuitivos. No clássico exemplo da gravidade, diz o autor, “se alguém escava os alicerces de uma casa, a priori poderá esperar que ela desabe sem precisar observar a experiência da sua queda, pois, praticamente, já sabe que todo corpo abandonado no ar sem sustentação cai ao impulso da gravidade” (p. 24). Contudo, diante desse exemplo poderia se dizer que mesmo a noção da gravidade, que se demonstra tão evidente, não está desvinculada da prática, embora seja óbvio ao adulto que qualquer objeto pesado tende a ser atraído para o solo, este conhecimento algum dia foi aprendido ou observado, não sendo improvável supor que desde a mais tenra idade os bebês já podiam contemplar os objetos largados caíram ao chão.

O que se entende, então, por meio dos autores pós-kantianos, em alusão à própria afirmação de Abbagnano, é que a ideia de um conhecimento puro, totalmente desvinculado da prática e da experiência, a qual se torna objetivo de investigação e obsessão do epistemólogo se aproxima à comprovação de um fato histórico com base em um mito ou a busca arqueológica baseada em falácias lendárias. Uma vez que a epistemologia, tradicionalmente é entendida como a busca por um conhecimento puro e, a priori, inacessível ao homem, qual seria o sentido de continuar buscando algo que já se sabe ser impossível ser atingido?

É nesta trincheira que se diz que o sentido clássico de epistemologia se tornou obsoleto com o legado dos filósofos modernos e descendentes de Kant, visto que hodiernamente não se consolida mais a ideia de uma verdade pura e inacessível à razão humana, a qual deveria se tentar atingir, sendo que este meio – e não o fim, já que seria impossível – se tornaria um campo filosófico autônomo. Em lugar desta busca utópica por um estado de conhecimento que jamais poderia ser atingido, ou quiçá apenas ser tocado no caso de uma mente absolutamente brilhante, se tornou comum à busca por um método que pudesse dar validade ou credibilidade quase que científica ao conhecimento. A concepção contemporânea de epistemologia toma como ponto de partida a análise do conhecimento enquanto tal, ou seja, verificar, por meio dos pressupostos filosóficos, se se está diante de um conhecimento. A experiência, pois, se torna meio para tal investigação, o que poderia supor que a epistemologia está muito próxima de uma matriz teórica pragmática.


1. A Epistemologia pragmatista: as bases de Charles Sanders Peirce e William James

O Pragmatismo é quase tão antigo quanto à própria Filosofia, muito embora a escola seja majoritariamente atribuída aos estadunidenses no século XIX, suas raízes retomam os sofistas da Grécia Antiga. Uma vez que os mais arcaicos e primitivos vestígios do pensamento filosófico se iniciaram com as incompreensões cotidianas da vida, seja qual for a perspectiva histórica que se adote, pode-se dizer que a ideia de Pragmatismo sempre esteve ligada à Filosofia. Na medida em que os dilemas observados e vivenciados pela prática deram origem às primeiras inquietações humanas, não há como negar que antes mesmo que o homem se elucubrasse sobre as questões mais subjetivas de si, ele se voltou para os objetos a sua volta e para as infinitas questões que envolviam sua relação com a natureza e o meio social em que vivia. Sendo assim, a prática, em seu sentido mais pragmático, e a Filosofia sempre caminharam juntas.

Conforme aponta Graciano (2012), foi entre os sofistas, mormente com advento do pensamento de Protágoras1 que se observam as primeiras construções pragmáticas na história da filosofia. Em um tempo em que havia pouca ou quase nenhuma educação sistemática na Grécia, os sofistas se prestaram a cumprir essa tarefa. Eles eram mestres itinerantes. Embora os sofistas tenham desempenhado um papel valioso na educação literária, eles tratavam de vários temas, e alguns deles ensinavam assuntos de uso prático mais imediato. É entre os sofistas que se encontra Protágoras, o qual, embora abandone a busca da verdade, parece admitir que uma opinião seja melhor do que outra no sentido pragmático.

Como bem demonstra Châtelet (1973, I), é em Protágoras que se encontra o grande retrato do relativismo sofista, o primeiro em data e o mais prestigoso dos sofistas, é talvez a doutrina de um homem sem doutrina, que sabe o que valem o pró e o contra teóricos, dentre as citações mais famosas atribuídas ao ator encontra-se “O homem é a medida de todas as coisas, das coisas que são enquanto são, das coisas que não são enquanto não são” (p. 62), a qual, deveras ambígua e misteriosa, segundo interpretação platônica, indica que o homem, em sentido plural, atribui sua significação as coisas, sendo, então, que cada um dará sua própria interpretação, tornando relativo o entendimento de cada objeto. Tal afirmação acaba por esbarrar na concepção pragmatista moderna, na medida em que a existência das coisas – “são” – estão relacionadas à construção da realidade que cada homem constrói por meio de sua experiência, sendo cada uma delas singular. Além dos sofistas, outros pensadores também se utilizaram do pragmatismo, não apenas na Antiguidade como também durante o período Moderno, neste sentido sintetiza William James:

Não há nada de novo absolutamente no método pragmático. Sócrates foi adepto dele. Aristóteles empregou-o metodicamente. Locke, Berkeley e Hume fizeram contribuições momentâneas à verdade por seu intermédio. Shadworth Hodgson insiste em que as realidades são somente o que sabem delas. Esses precursores do pragmatismo, porém, usaram-no de madeira fragmentária: apenas o preludiaram. Não foi senão em nossa época que seu generalizou, tornou-se consciente de uma missão universal, aspirou a um destino conquistador. Acredito nesse destino, e espero poder terminar transmitindo-lhe toda a minha fé (JAMES, 1967, p. 46).

Destarte, segundo o próprio autor, embora o referencial teórico pragmático tenha sido desenvolvido apenas em período coevo, precisamente no final do século XIX com as contribuições de Charles Sanders Peirce e William James, o método do Pragmatismo já estava a ser usado há muito tempo no campo filosófico. Sendo assim, até então não havia nenhum resultado particular, mas somente uma atitude de orientação, que é o que o método pragmático significa. A atitude de olhar além das primeiras coisas, dos princípios, das categorias, das supostas necessidades; e de procurar pelas últimas coisas, frutos, consequências e fatos. O processo, já observado por Schiller e Dewey, pelo qual qualquer indivíduo estabelece novas opiniões é sempre o mesmo, qual seja, há um estoque de novas experiências que as põe em processo de triagem. Alguém as contradiz; ou então, em algum momento de reflexão, descobre que elas se contradizem umas com as outras; ou toma conhecimento de fatos como as quais são incompatíveis; ou surgem desejos que elas deixam de satisfazer.

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Em um dos esboços mais embrionários a respeito do pragmatismo, Peirce, a criticar o pensamento tradicional sedimentando até então, da qual ao homem é capaz construir ideias originais por meio de sua capacidade cognitiva, assevera que “o mecanismo da mente só pode transformar conhecimento, mas nunca originá-lo, a menos que alimentado com fatos da observação” (PEIRCE, 1975, p. 27)2. Neste entendimento, enquanto o pensamento tradicional baseado no racionalismo pregava que a verdade só poderia ser alcançada pela razão, ou seja, pela construção simbólica, visto que o conhecimento advindo da prática e percebido pelos sentidos se apresentada demasiadamente duvidoso, esta nova concepção filosófica inova ao afirmar que é impossível chegar à verdade senão por meio da prática. Então, é possível entender com base na afirmação de Peirce, que a cognição humana não produz novos conhecimentos, sua capacidade está em analisar os já apreendidos, que por sua vez o são por meio da experiência.

O termo deriva da mesma palavra grega prágma, que significa ação, do qual vêm as nossas palavras prática e prático. Foi introduzida pela primeira vez em filosofia por Charles Peirce, em 1878, em um artigo intitulado Como tornar claras nossas ideias, em Popular Science Monthly de janeiro daquele ano. Peirce, após salientar que nossas crenças são, realmente, regras de ação, dizia que, para desenvolver o significado de um pensamento, necessitamos apenas determinar que conduta está apta a produzir: aquilo é para nós o seu único significado, e o fato tangível na raiz de todas as nossas distinções de pensamentos, embora sutil, é que não há nenhuma que seja tão fina ao ponto de não resultar em alguma coisa que não seja senão uma diferença possível de prática. Para atingir uma clareza perfeita em nossos pensamentos em relação a um objeto, pois, precisamos apenas considerar quais os efeitos concebíveis de natureza prática que o objeto pode envolver – que sensações devemos esperar daí, e que reações devemos preparar. Nossa concepção desses efeitos, seja imediata, seja remota, é então para nós, o todo de nossa concepção do objeto, na medida em que essa concepção tenha afinal uma significação positiva (JAMES, 1967, p. 40)3.

O método pragmático, ainda segundo o autor, é primeiramente um método de assentar disputas metafísicas que, de outro modo, se estenderiam interminavelmente. É o mundo um ou muito? – predestinado ou livre? – material ou espiritual? – eis aqui noções, quaisquer das quais podem ou não valer verdadeiras para o mundo; e as disputas em relação a tais noções são intermináveis. O método pragmático nesse caso é tentar interpretar cada noção traçando as suas consequências práticas respectivas. Na prática, que diferença haveria para alguém se essa noção, de preferência àquela outra, fosse verdadeira? Se não pode ser traçada nenhuma diferença prática qualquer, então as alternativas significam praticamente a mesma coisa, e toda disputa é vã. Sempre que uma disputa é séria, devemos estar em condições de mostrar alguma diferença prática que decorra necessariamente de um lado, ou o outro está correto (JAMES, 1967).

O método pragmático, de acordo com esta afirmação, pode ser entendido como o próprio processo de aprendizagem e, em última análise, como a educação4. Independente do tipo de conhecimento que se está a analisar, ao assumir a concepção pragmatista, o indivíduo ao entrar em contato com o mundo a seu redor, por meio de suas capacidades cognitivas de sensação e percepção, apreende o objeto que deseja conhecer. Contudo, antes que o faça, ele identifica e o compara com outros conhecimentos que já possui e que fazem parte de seu repertório. O estoque, já citado por James, se refere aos conhecimentos já apreendidos pelo indivíduo que, por meio de novas experiências estão constantemente se renovando. O processo educativo, que em última instância se refere à adaptação cultural sofrida pelos entes sociais, em detrimento da experiência, pode ser entendido como a construção de algo que já era conhecimento, de modo a ser melhor dizer que educação significa reconstrução. Não obstante sua apreensão e reflexão, o conhecimento não se constitui como verdade pelo simples fato de ser absorvido.

O caso mais simples de verdade nova é naturalmente, a mera adição numérica de novas espécies de fatos, ou de fatos novos isolados de velhas espécies, à nossa experiência – uma adição que envolve nenhuma alteração em nossas velhas crenças. Dia após dia, e os seus conteúdos são simplesmente acrescentados. Os novos conteúdos em si não são verdadeiros, simplesmente aparecem e são. A verdade é que dizem a respeito deles, e quando dizemos que aparecem, a verdade é satisfeita pela simples fórmula aditiva (JAMES, 1967, p. 52).

A verdade, pois, nada mais é que outra construção não estando relacionada com a experiência. O conhecimento, para a concepção pragmática, é obtido por meio da experiência, ou seja, por meio da prática e da vivência. A verdade, contudo, opera no campo simbólico, e não necessariamente se relaciona com algo experienciado. Talvez não seja apropriado dizer que a experiência se desvincula totalmente da verdade ou que se ligue à não-verdade, mesmo porque, segundo a concepção pragmatista, independente de ser algo simbólico, a verdade continuaria a se referir ao mundo da experiência, visto que ao homem seria impossível conceber ideias absolutamente desprovidas das experiências. De modo que a questão proposta pelo pensamento pragmático se refere ao conhecimento ligado à prática e não a uma construção abstrata e simbólica. Em suma, diferenciar verdade de experiência perde seu sentido ao passo que teoria e prática se confundem, ao ponto de tudo – como será mais bem examinado a seguir – John Dewey afirmar que tudo é experiência5. É neste ponto que se diferencia Empirismo de Pragmatismo, uma vez, enquanto o Empirismo representa a construção do conhecimento baseado na comprovação por meio da experiência, o Pragmatismo se refere a uma construção de ordem filosófica por meio da prática, onde não se observa a cientificidade metódica6.

Completa James (1967) que se as ideias teológicas provam ter valor para a vida concreta, ou seja, são verdadeiras, pois o pragmatismo as aceita, no sentido de serem boas para tanto. O quanto serão verdadeiras, entretanto, dependerá inteiramente de sua relação com as demais verdades, que têm, também, de ser reconhecidas. Supondo-se que uma ideia ou crença seja verdadeira, diz, que diferença concreta, em sendo verdadeira fará na vida real de alguém? Como será compreendida a verdade? Quais experiências serão diferentes que prevaleceriam se crença fosse falsa? Qual, em suma, é o valor em caixa da verdade, em termos experimentais? No momento em que o pragmatismo faz essa pergunta, infere-se a resposta: as ideias verdadeiras são aquelas que podem ser assimiladas, validadas, corroboradas e verificadas; as ideias falsas são aquelas com as quais não se pode fazê-lo. Essa é a diferença prática que se faz ter ideias verdadeiras, portanto, esse é o significado da verdade, pois é tudo como pode ser conhecida a verdade.

Importa ressaltar que embora os pragmatismos, escusados pelo legado de James, defendam que a verdade é uma construção abstrata e relativa a um indivíduo, sendo, pois, subjetiva, haveria então diversas verdades que, apesar de contraditórias, não deixariam de fazer sentido no contexto em que foram concebidas. Todavia, tal pluralidade de abstrações, conceitos, ideias e teorias não podem ser confundidas com o pensamento perspectivista nietzschiano, o qual defende que não existem verdades absolutas, nem conceito derradeiro, imortalizado pelo aforismo 483: “Convicções são inimigas da verdade mais perigosas que as mentiras” (NIETZCHE, 2005, p. 239)7. O pragmatismo, ao contrário do pensamento perspectivista, não se detém à desconstrução dos discursos dogmáticos, sua crítica está na própria defesa da importância da experiência e da negação da dicotomia entre teoria e prática.

Neste sentido, poderia cometer a ousadia de afirmar que os pensadores pragmáticos transcenderam os perspectivista, visto que enquanto estes ainda estão apegados a tal decrépita dicotomia, os pragmáticos já iniciam seu discurso partindo de sua negação. Em suma, a verdade, ou seja, aquele conhecimento derivado da experiência e vivenciado pelo indivíduo, só existe enquanto tal naquele momento em que foi estabelecido, visto que ela é um reflexo histórico, heterogêneo e complexo. Então, fora daquele contexto o fato deixaria de ser verdade. O pragmatismo encerra a tradicional dicotomia platônica entre fato e ideia, pois para esta concepção os fatos são necessariamente pretéritos às ideias, que por sua vez só podem ser transformadas, jamais criadas. Qualquer que seja o conhecimento a ser analisado este adveio da prática. Igualmente, o pensamento pragmático também encerra o debate entre física e metafísica, teologia e ciência, porque em última análise todo conhecimento é derivado da prática e, portanto, verdadeiro.

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Sobre o autor
Felipe Adaid

Advogado e consultor jurídico em Direito Penal e Direito Penal Empresarial no Said & Said Advogados Associados. Foi Diretor de Gerenciamento Habitacional da Secretaria de Desenvolvimento Social e Habitação e Primeiro Secretário do Conselho de Habitação do Município da Valinhos, SP. Mestre em Educação e Políticas Públicas pela PUC Campinas. Ingressou em primeiro lugar no mestrado e foi contemplado com a bolsa CAPES durante os dois anos de curso. Cursou disciplinas de pós-graduação na Unicamp. É especializando em Direito Penal, Processo Penal e Criminologia, pela PUC Campinas. Na graduação, tem 5 semestres de créditos no cursos de Psicologia, também pela PUC Campinas. Durante a graduação de Direito também foi bolsista de iniciação científica, CNPq, e foi monitor em diversas disciplinas, tanto no curso de Direito como no curso de Psicologia. Foi membro do grupo de pesquisa Direito à Educação do Programa de Pós-Graduação da PUC Campinas. É corretor de revistas científicas pedagógicas e jurídicas. É autor de 11 livros, sendo 3 ainda em fase de pré-lançamento, e organizador de outros 10 livros, além da autoria de 44 capítulos de livros publicados no Brasil, no Chile e em Portugal. É autor de mais de 100 publicações científicas, entre artigos científicos, resenhas e anais, nacionais e internacionais. Ademais, também escreve periodicamente ensaios e artigos para jornais e blogs. No âmbito acadêmico, suas principais bases teóricas são: Foucault, Lacan, Freud, Dewey e Nietzsche. Por fim, tem interesse sobre os seguintes temas: Direito, Direito Penal, Criminologia, Psicologia, Psicologia Forense, Psicanálise, Sexualidade, Educação e Filosofia.

Informações sobre o texto

Este texto foi publicado diretamente pelos autores. Sua divulgação não depende de prévia aprovação pelo conselho editorial do site. Quando selecionados, os textos são divulgados na Revista Jus Navigandi

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