O novo Código de Processo Civil – CPC estipula que as partes que compõem o processo podem produzir provas, por meio legais e moralmente legítimos, para evidenciar a verdade dos fatos e auxiliar na formação da convicção do juiz. Um dos tipos de provas é a pericial, que é realizada por meio de exame, vistoria ou avaliação de um perito com conhecimento técnico ou científico.
Embora a prova pericial seja comumente utilizada no processo civil, é possível, no âmbito do Tribunal de Contas da União – TCU, a sua utilização como mecanismo que possibilita a ampla defesa e o contraditório.
Pontue-se que o Supremo Tribunal Federal – STF decidiu que cabe ao TCU observar o direito à realização de prova pericial solicitada nos autos do processo administrativo, sob pena de nulidade do acórdão, conforme o Mandado de Segurança nº 26.358-0, relatado pelo ministro Celso de Mello.[1]
Em observância ao referido entendimento, os ministros do TCU proferem despachos determinando a efetivação de prova pericial, com base na sua Lei Orgânica.
O TCU também indefere a realização da prova pericial quando está diante da existência de robusta documentação capaz e suficiente, por si só, de comprovar a irregularidade, com fundamento na premissa de que não é obrigado a deferir diligências inúteis nos termos do art. 370 do novo CPC, aplicado subsidiariamente aos processos do TCU. Para defender tal posicionamento, a Corte de Contas recorre aos julgados do Superior Tribunal de Justiça – STJ e do STF. [2]
Ademais, o TCU reitera que é do responsável o ônus de provar a boa e regular aplicação dos recursos públicos federais repassados. Nesse sentido, o voto condutor do Acórdão nº 473/2015 – Plenário dispõe o seguinte:
No que se refere à solicitação de perícia técnica para comprovação das alegações e demonstração da não existência de superfaturamento do Consórcio (alegação “r”), esclareço: o processo de controle externo, disciplinado pela Lei 8.443/1992 e pelo Regimento Interno do Tribunal, não admite a produção de prova pericial. O ônus de demonstrar a regular aplicação dos recursos federais é do próprio responsável, não sendo competência deste Tribunal, portanto, determinar a realização de perícia para a obtenção das provas (Acórdãos 1.599/2007-Plenário, 611/2007-1ª Câmara e 1.098/2008-2ª Câmara)3.
Ressalta-se que a negativa de realização de prova pericial pode implicar ofensa aos princípios da ampla defesa, contraditório e da verdade real. Nesse sentido, deve ser incorporada a prova para que as garantias inerentes ao devido processo administrativo sejam, efetivamente, aplicadas ao escopo da fiscalização, e haja concreta participação dos interessados.
Notas
[1] STF. MS nº 26.358/DF – 2ª Turma. Relator: ministro Celso de Mello. “A jurisprudência do Supremo Tribunal Federal tem reafirmado a essencialidade do princípio que consagra o ‘due process of law’, nele reconhecendo uma insuprimível garantia, que, instituída em favor de qualquer pessoa ou entidade, rege e condiciona o exercício, pelo Poder Público, de sua atividade, ainda que em sede materialmente administrativa, sob pena de nulidade do próprio ato punitivo ou da medida restritiva de direitos. Precedentes. Doutrina . – Assiste, ao interessado, mesmo em procedimentos de índole administrativa, como direta emanação da própria garantia constitucional do ‘due process of law’ (CF, art. 5º, LIV) – independentemente, portanto, de haver previsão normativa nos estatutos que regem a atuação dos órgãos do Estado –, a prerrogativa indisponível do contraditório e da plenitude de defesa, com os meios e recursos a ela inerentes (CF, art. 5º, LV). – Abrangência da cláusula constitucional do ‘due process of law’, que compreende, dentre as diversas prerrogativas de ordem jurídica que a compõem, o direito à prova . – O fato de o Poder Público considerar suficientes os elementos de informação produzidos no procedimento administrativo não legitima nem autoriza a adoção, pelo órgão estatal competente, de medidas que, tomadas em detrimento daquele que sofre a persecução administrativa, culminem por frustrar a possibilidade de o próprio interessado produzir as provas que repute indispensáveis à demonstração de suas alegações e que entenda essenciais à condução de sua defesa. – Mostra-se claramente lesiva à cláusula constitucional do ‘due process’ a supressão, por exclusiva deliberação administrativa, do direito à prova, que, por compor o próprio estatuto constitucional do direito de defesa, deve ter o seu exercício plenamente respeitado pelas autoridades e agentes administrativos, que não podem impedir que o administrado produza os elementos de informação por ele considerados imprescindíveis e que sejam eventualmente capazes, até mesmo, de infirmar a pretensão punitiva da Pública Administração”.
[2] STJ: AgRg no Ag nº 504.542/PR – Quarta Turma. Relator: ministro Jorge Scartezzini. “[...] Na linha da jurisprudência desta Corte, o julgador não está obrigado a decidir de acordo com as alegações das partes, mas sim, mediante a apreciação dos aspectos pertinentes ao julgamento, conforme seu livre convencimento. A necessidade de produção de determinas provas encontra-se submetida ao princípio do livre convencimento do juiz, em face das circunstâncias de cada caso. A propósito, confiram-se, entre outros, o AgRg no Ag nº 80.445/SP, DJU de 05.02.1996 e AgRg no Ag n.º 462.264/PB, DJU de 10.03.2003. 2 - O juiz pode indeferir diligencias inúteis e protelatórias. Além disso, o laudo pericial não condiciona o seu convencimento, que poderá ser formado à luz dos demais elementos constantes dos autos. 3 - Não caracterizada a existência de ofensa ao art. 330, do CPC, se o Tribunal a quo assinalou ser dispensada a realização de perícia contábil, com base no fundamento de que os diversos documentos juntados aos autos eram suficientes para a formação do livre convencimento do julgador”. No mesmo sentido: Fonte: STF. AI-AgR nº 557383/SP – Primeira Turma. Relator: ministro Carlos Britto. “Questão eminentemente processual, que não enseja apreciação em recurso extraordinário. Demais disso, não caracteriza cerceamento de defesa a decisão que, motivadamente, indefere determinada diligência probatória. Precedentes: AIs 382.214, Relator o Ministro Celso de Mello, e 114.548-AgR, Relator o Ministro Sepúlveda Pertence. Agravo desprovido”; STF. MS nº 21590 – Plenário. Relator: ministro Ilmar Galvão. “[...] Irrogações improcedentes, tendo em vista, primeiramente, que o impetrante foi punido não apenas por aplicação irregular de verba pública, mas também, e principalmente, por ausência de prestação de contas, o que tornou prescindível a perícia técnica reclamada; e, em segundo lugar, porque, contrariamente ao alegado, foi ele punido com base no DL n. 199/67, vigente a época dos fatos. Segurança denegada”.
[3] TCU. Processo TC nº 010.308/2009-2. Acórdão nº 473/2015 – Plenário. Relator: ministro Walton Alencar. Nesse sentido: TCU. Processo TC nº 007.562/2015-2. Acórdão nº 6.532/2016 – 1ª Câmara. Relator: ministro Bruno Dantas.