7. Probidade Administrativa
A Administração Pública encontra-se erigida a status constitucional. O texto da Lei Maior dedica um capítulo inteiro a ela (Cap. VII, do Título III), onde são tratadas as diretrizes básicas de seu funcionamento.
As duas primeiras seções do Capítulo específico são destinadas ao delineamento dos princípios norteadores da Administração Pública e seu funcionalismo.
E é no inicio que encontramos o cerne de todo o presente trabalho. Nos princípios constitucionais da Administração Pública. Clássica é a especificação dos cinco princípios que regem a Administração Pública, a saber. Legalidade, Impessoalidade, Moralidade, Publicidade e Eficiência.
Ocorre, todavia, que anteriormente à legislação, ainda que em sede de direito constitucional desses princípios, os mesmos já se encontravam vinculados à Administração Pública. Isso se verifica principalmente pela determinação dos princípios implícitos que a própria doutrina coloca.
Probo significa moral, honrado de caráter íntegro, e assim deve ser a conduta do administrador público ao cuidar da coisa pública, pois não são bens seus, mas de toda a sociedade.
Daí a edição da lei de improbidade administrativa, que tipifica e pune formas de conduta que firam o dever de probidade, vale dizer, dever de ser íntegro, correto, honrado no trato da coisa pública, lei que passaremos a analisar sucintamente em momento oportuno.
8. Princípios jurídicos
Estudar os princípios jurídicos é de salutar importância, não só para o presente trabalho, mas para todo aquele que pretenda uma visão orgânica do arcabouço legislativo de um dado país.
Uma das espécies de atos de improbidade administrativa é a inobservância dos princípios da Administração Pública. E quanto a esta, estabelece a lei os atos de inobservância dos referidos princípios.
Ademais, o estudo se faz mister justamente pelo fato de que probidade significa, em ultima análise, moralidade, sendo também esta um princípio da Administração Pública, de observância compulsória.
Desse modo vejamos as peculiaridades atinentes aos princípios jurídicos.Não nos aprofundarmos demasiadamente no tema, na medida em que não se trata do escopo do trabalho, porém faremos uma explanação no que entendemos necessária.
Assim dissecaremos o tema desde uma visão do que sejam princípios, os princípios constitucionais e enfim os princípios constitucionais expressos e implícitos da Administração Pública até sua natureza jurídica, extensão, eficácia e dever de observância.
8.1. Conceito de princípio jurídico
A terminologia princípio é de grande conteúdo semântico, estendendo-se, podemos dizer, por todos os ramos das ciências em geral. Não é diferente na ciência do direito, que tem nos princípios um norte para uma plena eficácia e constante evolução.
Salutar é a lição do professor Paulo Bonavides que tece comentários acerca do presente tema desde a sua concepção mais elementar:
"A idéia de princípio, segundo Luis Diez Picazo, deriva da linguagem da geometria, ‘onde designa as verdades primeiras’. Logo acrescenta o mesmo jurista que exatamente por isso são ‘princípios’, ou seja, ‘porque esta ao princípio’, sendo ‘as premissas de todo um sistema que se desenvolve more geometrico’.
Declara, a seguir, invocando o pensamento do jurista espanhol F. de Castro, que os princípios são verdades objetivas, nem sempre pertencentes ao mundo do ser, senão do dever ser, na qualidade de normas jurídicas, dotadas de vigência, validez e obrigatoriedade.
Como princípios de um determinado Direito Positivo, prossegue Picazo, têm os princípios, dum lado, ‘servido de critério de inspiração às leis ou normas concretas desse Direito Positivo’ e, doutro, de normas obtidas ‘mediante um processo de generalização e decantação dessas leis’.
Na época em que os princípios ainda se achavam embebidos numa concepção civilista, a saber, em meados da segunda década desse século, por volta de 1916, F. de clemente fazia essa ponderação elementar: assim como quem nasce na vida física, esteja ou não inscrito no Registro Civil, também os princípios ‘gozam de vida própria e valor substantivo pelo mero fato de serem princípios’, figurem ou não nos códigos; afirmação feita na mesma linha de inspiração anipositivista daquela de Mucius Scaevola, por ele referido, ao asseverar que o princípio exprime ‘uma verdade jurídica universal’.
Depois de tecer considerações expositivas em que assinala a equivalência essencial dos princípios à equidade dos romanos como ‘a razão intrínseca do Direiro’, F. de Clemente chega, inspirado em vários juristas, entre os quais Unger, a essa formulação: ‘Princípio de direito é o pensamento diretivo que domina e serve de base à formulação das disposições singulares de Direito de uma instituição jurídica, de um Código ou de todo um Direito Positivo’.
Outro conceito de princípio é aquele formulado pela Corte Constitucional italiana, numa de suas primeiras sentenças, de 1956, vazada nos seguintes termos: ‘Faz-se mister assinalar que se devem considerar como princípios do ordenamento jurídico aquelas orientações e aquelas diretivas de caráter geral e fundamental que se possam deduzir da conexão sistemática, da coordenação e da íntima racionalidade das normas, que concorrem para formar assim, num dado momento histórico, o tecido do ordenamento jurídico’.".
Também Karl Larenz, em vários momentos pontua a respeito dos princípios:
"(...) o «princípio», ao invés do «conceito», deve ser entendido como uma pauta «aberta», carecida de concretização – e só plenamente apreensível nas suas concretizações. Enquanto que o conceito (jurídico) contém valoração só de modo indirecto, como que «em cifra», «o princípio torna a valoração explícita» e é por isso «mais apropriado para reflectir a unidade de valoração do Direito.
(...)
Os princípios éticos-jurídicos são pautas orientadoras da normação jurídica que, em virtude da sua própria força de convicção, podem «justificar» decisões jurídicas. Distinguem-se dos princípios técnico-jurídicos, que se fundam em razoes de oportunidade, pelo seu conteúdo material de justiça; por esse motivo, podem ser entendidos como manifestações e especificações especiais da idéia de Direito, tal como esta se revela na «consciência jurídica geral», neste estádio de evolução histórica. Enquanto «princípios» não são regras imediatamente aplicáveis aos casos concretos, mas ideias directrizes, cuja transformação em regras que possibilitem uma resolução tem lugar em parte da legislação, em parte pela jurisprudência, segundo o processo anteriormente descrito da concretização e do aperfeiçoamento dos princípios mais especiais mediante a formação de grupos de casos. Alguns deles têm, como vimos, o escalão de normas constitucionais; outros, como o princípio da «boa-fé», estão expressos na lei ou inferem-se delas, recorrendo à ratio legis, o fundamento justificante de uma regulação legal".
Herbert L. A. Hart traz importante contribuição para a ciência do direito ao asseverar:
"Dworkin tem sustentado que os princípios jurídicos não podem identificar-se por critérios atribuídos por uma regra de conhecimento manifestada na prática dos tribunais e que, uma vez que os princípios são elementos essenciais do direito, deve abandonar-se a doutrina da regra de conhecimento. Segundo ele, os princípios jurídicos só podem identificar-se através de uma interpretação construtiva, como membros de um conjunto único de princípios que não só se ajusta melhor a toda história institucional do direito estabelecido de um sistema jurídico, como também melhor a justifica. Claro que nenhum tribunal inglês ou americano jamais adoptou explicitamente um critério holístico, extensivo a todo o sistema, para identificar o direito, e Dworkin concede que nenhum juiz humano real, distinto de «Hércules», o seu mítico juiz ideal, podia praticar o feito de construir uma interpretação de todo o direito de seu país, de forma imediata. Não obstante, os tribunais são, do seu ponto de vista, compreendidos de forma mais cristalina enquanto tentam «imitar Hércules»de um modo limitado, e encarar os seus julgamentos dessa forma serve, segundo pensa, para trazer à luz «a estrutura escondida».
O mais famoso exemplo, familiar aos juristas ingleses, de identificação dos princípios através de uma forma limitada de interpretação construtiva é constituído pela formulação de Lorde Atkin, no caso Donoghue vs. Stevenson, do «princípio do vizinho», princípio anteriormente não formulado, o qual subjaz a várias regras diferentes que estabelecem um dever de diligencia em situações diferentes. Não acho plausível o ponto de vista de que, em tais exercícios limitados de interpretação construtiva, os juízes sejam susceptíveis de ser mais bem compreendidos como estando a tentar imitar a aproximação holística do tipo de Hércules, extensiva a todo o sistema. Mas a minha crítica presente reside em que a preocupação com a interpretação construtiva tem levado Dworkin a ignorar o fato de que muitos princípios jurídicos devem o seu estatuto não ao conteúdo que serve como interpretação do direito estabelecido, mas antes àquilo a que ele chama seu pedigree; tal é o modo da sua criação ou adopção por uma fonte dotada de autoridade reconhecida. Esta preocupação levou-o, de facto, segundo penso, a um duplo erro: em primeiro lugar, à crença de que os princípios jurídicos não podem identificar-se pelo seu pedigree, e, em segundo lugar, à crença de que a regra de conhecimento só pode fornecer critérios de pedigree. Ambas estas crenças são erradas: a primeira é-o porque não há nada no carácter não-conclusivo dos princípios, nem nos seus outros aspectos, que impeça sua identificação por critérios de pedigree. Isto, simplesmente, porque uma disposição de uma constituição escrita ou de um aditamento constitucional ou de um acto legislativo pode ser considerada enquanto pretende actuar pelo modo não conclusivo característico dos princípios, conferindo razões para a decisão, as quais podem ser superadas nos casos em que qualquer outra regra ou princípio apresente razões mais fortes para uma decisão alternativa. O próprio Dworkin admitiu que o Primeiro Aditamento à Constituição dos Estados Unidos, que estatui que o Congresso não restringirá a liberdade de palavra, deve interpretar-se precisamente desse modo. Também certos princípios jurídicos, incluindo alguns ptincípios básicos da Common Law, por exemplo o de que ninguém pode aproveitar-se do seu próprio acto ilícito, são identificados como direito pelo teste do pedigree, na medida em que têm sido invocados de forma coerente pelos tribunais, em séries de casos diferentes, como conferindo razoes para decisão, as quais devem ser levadas em conta, embora susceptíveis de ser afastadas em alguns casos por razoes que apontem em sentido oposto. Perante tais exemplos de princípios jurídicos identificados por critérios de pedigree, não poderá ter êxito qualquer argumento geral no sentido de que a inclusão dos princípios como parte do direito acarreta o abandono da doutrina de uma regra de conhecimento. De facto, como mostrarei abaixo, a sua inclusão não só é coerente com tal doutrina, como realmente exige a aceitação dessa doutrina.
Se se conceder, como seguramente se deve fazer, que há, pelo menos, alguns princípios jurídicos que podem ser «capturados» ou identificados como direito por critérios de pedigree que uma regra de conhecimento lhes confere então a crítica de Dworkin deve reduzir-se à pretensão mais modesta de que há muitos princípios jurídicos que não podem ser capturados assim, porque são demasiado numerosos, demasiado fugazes, ou demasiado susceptíveis de alteração ou modificação, ou não têm uma característica que permita a sua identificação como princípios de direito por referencia a qualquer outro teste diverso do de pertencerem a esse esquema coerente de princípios que não só melhor se ajusta à história institucional e às práticas do sistema, como também melhor as justifica. À primeira vista, este teste interpretativista parece não constituir uma alternativa a um critério fornecido por uma regra de conhecimento, mas apenas, como certos críticos advertiram, uma forma complexa positivista moderada, de um tal critério que identifica os princípios pelo seu conteúdo e não pelo seu pedigree.
É verdade que uma regra de conhecimento contendo tal critério interpretativo não podia assegurar, pelas razões discutidas a págs. 312. e segs. Supra, o grau de certeza na identificação do direito que, segundo Dworkin, seria desejado por um positivista. Não obstante, a demonstração de que o critério do teste interpretativo fazia parte de uma característica convencional de reconhecimento do direito ainda será uma boa explanação teórica do seu estatuto jurídico. Por isso, não há, com certeza, incompatibilidade, tal como Dworkin pretende, entre a admissão de princípios enquanto fazendo parte do direito, e a doutrina da regra de conhecimento.
O argumento dos dois últimos parágrafos é suficiente para mostrar que, contrariamente à posição de Dworkin, a aceitação dos princípios como parte do direito é coerente com a doutrina de uma regra de conhecimento, ainda que o teste interpretativo de Dworkin fosse, como ele pretende, o único critério para os identificar. Mas, de facto, justifica-se uma conclusão mais forte: a saber, que é necessária uma regra de conhecimento, se os princípios jurídicos tiverem d ser identificados por um tal critério. Isto é assim, porque o ponto de partida para a identificação de qualquer princípio jurídico, que seja trazido à luz pelo teste interpretativo de Dworkin, radica-se em alguma área específica do direito constituído a que o princípio se ajusta e que ajuda a justificar. O uso desse critério pressupõe, por isso, a identificação do direito constituído, e, para tal ser possível, é necessária uma regra de conhecimento que especifique as fontes de direito e das relações de superioridade e de subordinação que se estabelecem entre elas. Na terminologia de Law’s Empire, as regras e práticas jurídicas que constituem os pontos de partida para a tarefa interpretativa de identificação de princípios subjacentes ou juridicamente implícitos constituem «direito pré-interpretativo» e muito do que Dworkin diz acerca dessa matéria parece apoiar o ponto de vista de que, para a sua identificação, é necessário algo muito semelhante a uma regra de conhecimento que identifique as fontes de direito de forma autorizada, como se descreveu nesse livro. A principal diferença, nesta matéria, entre o meu ponto de vista e o de Dworkin reside em que, enquanto eu atribuo o acordo geral existente entre os juízes quanto aos critérios de identificação das fontes do direito à sua aceitação partilhada das regras que atribuem tais critérios, Dworkin prefere falar, não de regras, mas de «consensos», de «paradigmas» e de «pré-compreensões» que os membros da mesma comunidade interpretativa partilham. É claro que, como Dworkin tornou nítido, há uma importante distinção entre um consenso de convicções independentes, em que o concurso de outros não faz parte da razão que cada parte do consenso tem para nele convergir, e um consenso de convenção, em que a pessoa participa desse concurso. É certo que a regra de conhecimento é tratada no meu livro como estando baseada numa forma de consenso judicial. Que nela se baseia efectivamente nessa forma parece bastante claro, pelo menos no direito inglês e no americano, porque, seguramente, a razão de um juiz inglês para tratar a legislação do Parlamento (ou a razão de um juiz americano para tratar a Constituição) como fonte de direito que detém spremacia sobre outras fontes inclui o facto de os seus colegas de judicatura convergirem nesse entendimento, como o fizeram os seus predecessores. Na verdade, o próprio Dworkin fala da doutrina da supremacia legislativa como um facto em um estado bruto da história jurídica, que limita o papel que a convicção do juiz pode desempenhar e afirma que «a atitude interpretativa não pode sbreviver, a menos que os membros dessa mesma comunidade interpretativa partilhem, pelo menos de modo aproximado, das mesmas pré-compreensões» acerca «daquilo que vale como parte da prática». Concluo, por isso, que, sejam quais forem as diferenças que permaneçam entre as regras e as «pré-compreensões», «consensos» e «paradigmas» de que fala Dworkin, a sua explicação da identificação judicial das fontes do direito é substancialmente a mesma que a minha.
Todavia, continuam a existir grandes diferenças teóricas entre o meu ponto de vista e o de Dworkin. Porque Dworkin rejeitaria, seguramente, o meu tratamento de seu teste interpretativo para os princípios jurídicos como, simplesmente, uma forma específica tomada, em alguns sistemas jurídicos, por uma regra de conhecimento convencional, cuja existência e autoridade dependem da sua aceitação pelos tribunais. Isso desvirtua completamente, do seu ponto de vista, e aviltaria o projecto de uma interpretação «construtiva», destinado a mostrar o direito sob uma melhor iluminação moral, a qual está envolvida, do ponto de vista de Dworkin, na identificação do direito. Porque este estilo de interpretação não é concebido por ele como um método de reconhecimento de direito exigido por uma mera regra convencional aceite por juízes e juristas de sistemas jurídicos concretos. Em vez disso, ele apresenta-o como uma característica central de muito pensamento e prática sociais para além do direito, enquanto demonstra «uma profunda conexão entre todas as formas de interpretação», incluindo a interpretação tal como é entendida na crítica literária e mesmo e mesmo das ciências naturais. Contudo, mesmo que esse critério interpretativo não seja apenas um esquema de reconhecimento do direito exigido por uma regra convencional, e tenha afinidades e conexões com a interpretação, tal como é entendida noutras disciplinas, permanece o facto de que, se houver quaisquer sistemas jurídicos em que o critério interpretativo holístico de Dworkin seja efectivamente usado para identificar princípios jurídicos, poderá perfeitamente suceder que, em tais sistemas, o critério seja conferido por uma regra convencional de reconhecimento. Mas uma vez que não há sistemas jurídicos reais em que seja usado esse critério plenamente holístico, mas apenas sistemas, como o direito inglês e o direito americano, em que são levados a cabo exercícios mais modestos de interpretação construtiva, em casos como o de Donoghue vs. Stevenson, para identificar princípios jurídicos latentes, a única questão a considerar é a de saber se tais exercícios devem ser entendidos como a aplicação de u critério fornecido por qualquer regra convencional de reconhecimento ou de outra qualquer forma, e, se tal assim suceder, qual o seu estatuto jurídico".
Ainda discorrendo sobre a amplitude da expressão princípios gerais do direito colacionamos entendimento de Paulo Nader:
"A expressão princípios gerais de Direito, por ser demasiadamente ampla, não oferece ao aplicador do direito uma orientação segura quanto aos critérios a serem admitidos na sua aplicação. Para Lino Rodriguez-Arias Bustamante, ‘o importante é que os princípios gerais de Direito sejam concebidos dentro do âmbito de critérios objetivos...’. Na opinião de Del Vecchio, que os identifica com os princípios do Direito Natural, ‘se bem se observa, o Direito só estabelece um requisito, quanto ao que deve ser existir entre os princípios gerais e as normas particulares do Direito: que entre uns e outros não haja nenhuma desarmonia ou incoerência...’.
Pelo que se observa, ao escolher uma fórmula tão abstrata e indefinida, o legislador, já ciente das divergências doutrinárias que a expressão apresentava, pretendeu oferecer ao aplicador do Direito um critério bem amplo, para a busca dos princípios aplicáveis aos casos concretos. A expressão adotada, atualmente, já constava no art. 7º da Lei Preliminar que, em 1916, acompanhou o nosso Código Civil.
Mans Puigarnau, com o objetivo de clarear o entendimento da expressão, submeteu-a à interpretação semântica destacando, como notas dominantes, a principialidade, generalidade e juridicidade:
Princípios: idéia de fundamento, origem, começo, razão, condição e causa;
Gerais: a idéia de distinção entre o gênero e a espécie e a oposição entre a pluralidade e a singularidade;
Direito: caráter de juridicidade; o que está conforme a reta; o que dá a cada um o que lhe pertence.
No vasto campo do Direito há uma gradação de amplitude entre os princípios, que varia desde os mais específicos aos absolutamente gerais, inspirados em toda a árvore jurídica. Entendemos que, não obstante a fórmula indique princípios gerais, a expressão abrange tanto os efetivamente gerais quanto os específicos, destinados apenas a um ramo do Direito. De acordo com a classificação que a doutrina apresenta quanto às categorias dos princípios, os de Direito são monovalentes, porque se aplicam apenas à Ciência do Direito; os princípios plurivalentes aplicam-se a vários campos do conhecimento e os onivalentes são válidos em todas as áreas científicas, como o princípio de casusa eficiente".
Para José Cretella Júnior: "Denomina-se princípio toda proposição, pressuposto de um sistema, que lhe garante a validade, legitimando-o".
Como se pode observar, quando tratamos da expressão princípios em sede de ciência jurídica – o que nos leva à expressão princípios jurídicos ou princípios do direito – grande é a gama de informações e entendimentos trazidos pela mais variada doutrina.
Isto torna extremamente difícil uma conceituação de princípios jurídicos. Tal dificuldade leva a doutrina a preferir estudar outras peculiaridades dos princípios a ater-se à conceituação dos mesmos.
As peculiaridades variam de autor para autor, que analisam diferentes pontos dos princípios, cada um sob o prisma que entende ser mais proveitoso.
Seguindo essa linha de raciocínio, passaremos, a partir de agora, a analisar aspectos dos princípios jurídicos que mais são relevantes para o presente trabalho.
Assim veremos sucintamente a diferença entre princípios constitucionais e infraconstitucionais.
Nos princípios constitucionais, trataremos dos princípios da Administração Pública, passando pelos expressos e implícitos.
Também serão analisadas as questões atinentes à necessidade ou não de positividade dos princípios, sua normatividade, dever de observância, natureza jurídica, extensão e eficácia.
Em que pese não se tratar do escopo precípuo do presente trabalho, será trata de forma sucinta a questão do chamado conflito de princípios.
8.2. Natureza jurídica dos princípios
Estudar a natureza jurídica dos princípios do direito importa uma tarefa quase que tão difícil ou mais do que sua conceituação.
Primeiramente há que se estabelecer se os princípios jurídicos são ou não normas jurídicas.
Ao depois, em sendo ou não normas, há que se identificar qual a extensão da incidência que irradia sobre o ordenamento jurídico.
Em um primeiro momento parece fácil a solução, mas ao se adentrar no tema percebe-se desde logo a dificuldade na solução, na medida em que há que se saber o que é norma e o que é princípio dentre outras peculiaridades.
Vejamos como se procede tal solução.
Na doutrina nacional, Paulo Bonavides, um dos maiores expoentes do Direito Constitucional, trata a quaestio:
"A normatividade dos princípios, afirmada categórica e precursoramente, nós vamos encontrá-la já nessa excelente e sólida conceituação formulada em 1952 por Crisafulli: ‘Princípio é, como efeito, toda norma jurídica, enquanto considerada como determinante de uma ou de muitas outras subordinadas, que a pressupõem, desenvolvendo e especificando ulteriormente o preceito em direções mais particulares (menos gerais), das quais determinam, e portanto, resumem, potencialmente, o conteúdo: sejam, pois, estas efetivamente postas, seja, ao contrário, apenas dedutíveis do respectivo princípio geral que as contém’.
Deveras útil é a investigação doutrinária feita por Ricardo Guastini, que recolheu da jurisprudência e de juristas diversos seis distintos conceitos de ‘princípios’, todos vinculados a disposições normativas e assim enunciados:
Em primeiro lugar, o vocábulo ‘princípio’, diz textualmente aquele jurista, se refere a normas (ou disposições legislativas que exprimem normas) providas de um alto grau de generalidade.
Em segundo lugar, prossegue Guastini, os juristas usam o vocábulo ‘princípio’ para referir-se a normas (ou a disposições legislativas que exprimem normas) providas de um alto grau de indeterminação e que por isso requerem concretização por via interpretativa, sem a qual no seriam suscetíveis de aplicação a casos concretos.
Em terceiro lugar, afirma ainda o mesmo autor, os juristas empregam a palavra ‘princípio’ para referir-se a normas (ou disposições normativas) de caráter ‘programático’.
Em quarto lugar, continua aquele pensador, o uso que os juristas às vezes fazem do termo ‘princípio’ é para referir-se a normas (ou a dispositivos que exprimem normas) cuja posição na hierarquia das fontes do Direito é muito elevada.
Em quinto lugar – novamente Guastini – ‘os juristas usam o vocábulo princípio para designar normas (ou disposições normativas) que desempenham uma função ‘importante’ e ‘fundamental’ no sistema jurídico ou político unitariamente considerado, o num ou noutro subsistema do sistema jurídico conjunto (o Direito Civil, o Direito do Trabalho, o Direito das Obrigações)’.
Em sexto lugar, finalmente, elucida Guastini, os juristas se valem da expressão ‘princípio’ para designar normas (ou disposições que exprimem normas) dirigidas aos órgãos de aplicação cuja específica função é fazer a escolha dos dispositivos ou das normas aplicáveis nos diversos casos.
O texto acima, extraído, conforme se assinalou, da exposição de Ricargo Guastini, compreende todas aquelas variantes do conceito de princípio, considerado à luz de sólidas reflexões feitas ultimamente acerca desse tema. A importância do assunto é fundamental, ocupando cada vez mais a atenção e o interesse dos juristas. Sem aprofundar a investigação acerca da função dos princípios nos ordenamentos jurídicos não é possível compreender a natureza, a essência e s rumos do constitucionalismo contemporâneo.
A normatividade dos princípios representa, conforme vimos, o traço comum a todas aquelas acepções, sendo, por conseguinte, o vínculo unificador das seis formulações enunciadas.
Caminhada teórica dos princípios gerais, até a conversão em princípios constitucionais, constitui a matéria das inquirições subseqüentes. Os princípios, uma vez constitucionalizados, se fazem a chave de todo o sistema normativo".
J. J. Gomes Canotilho estuda profundamente o problema:
"A distinção estrutural e material entre princípios e normas constitucionais (Norm-Prinzip, Verfassungsgrundsätzen-Verfassungssätzen, Principles-Rules) tem oscilado entre a diferença entre grau de abstração («tese moderada» da separação entre as duas categorias), a necessidade ou não de concretização (grau de determinabilidade de aplicação), a diversidade de conteúdo de informação (princípios «abertos» ou «informativos» e «princípios-norma» ou «normativos»), e a diversidade radical de estrutura lógica ou de intencionalidade normativa (tese da separação radical). No plano constitucional, interessa sobretudo saber: 1) de que princípios se trata; 2) quais as conseqüências metódicas da diversidade estrutural ou material entre normas e princípios; 3) qual a relação dos princípios com as normas-fim e normas-tarefa.
Relativamente ao primeiro problema, e como vai ver-se em seguida, englobam-se aqui vários princípios doutrinalmente «tipificados»: 1) os princípios político-constitucionais; 2) os princípios jurídicos gerais e constitucionais.
Quanto ao segundo problema, embora se possa discutir a diversidade de estrutura lógica entre normas e princípios ou a separação qualitativa das duas categorias (os princípios como «justo superior» em relação às normas), a posição que vai fundamentalmente ser adoptada é a de que, sob o ponto de vista da metódica constitucional, há muitos problemas comuns a normas e princípios. Assim, desde logo, formulam-se reticências quando, sem qualificações ulteriores, se insiste na diferenciação entre normas e princípios com base no facto de as primeiras conterem uma directiva imediata para determinado círculo de questões, e os segundos exigem uma «concretização normativa» para serem susceptíveis de aplicação. A distinção, sem quaisquer outras precisões, é inconseqüente em numerosas questões constitucionais, pois muitas normas, (normas programáticas, normas-fim), carecem também de «concretização», sendo precisamente esse u dos problemas fundamentais da Constituição dirigente. Em segundo lugar, a distinção entre princípios e normas, claramente estabelecida como reflexo de uma posição metodológica antipositivista, acaba, segundo nos parece, por poder reconduzir a aplicação das «normas» aos esquemas subsuntivos, típicos do positivismo. Ao atribuir-se-lhes um caráter de «programa condicional» ou ao insistir-se nu modo de aplicação «tudo ou nada», insiste-se num esquema inadequado ao direito, em geral, e manifestamente impróprio no que respeita as normas constitucionais, em especial. Acresce que, considerando-se os princípios como simples fundamentos de uma decisão, mesmo nos casos em que são inequívocos os pressupostos do Tatbestand e os respectivos resultados jurídicos, esvazia-se, em muitos deles, o carácter de determinante heterónoma, vinculativa da função legislativa (ex: princípio da proibição do excesso, princípio da igualdade, princípio da legalidade, etc.). em toda a sua extensão, esta tese equivaleria, pr fim, a negar a densidade de norma jurídica aos princípios-garantia (ex: nullum crimen sine lege). Por isso de compreende que LARENZ tenha tido necessidade de distinguir entre princípios abertos e princípios normativos. Sendo uma diferenciação tendencial e gradativa, ela põe em destaque que, se em alguns casos, a mediação semântica é intensa, noutros já a densidade sémica dos princípios é suficiente para os considerar estruturados em «forma de norma jurídica»".
Karl Larenz há pouco citado por Canotilho, também tece seus comentários acerca dos princípios jurídicos.
"Ocupámo-nos dos «princípios éticos-jurídicos» como critérios teleológico-objectivos da interpretação e em conexão com o desenvolvimento do Direito, atendendo a um tal princípio. Qualificámo-los de «pautas directivas de normação jurídica que, em virtude de sua própria força de convicção, podem justificar resoluções jurídicas». Enquanto «ideias jurídicas materiais» são manifestações especiais da ideia de Direito, tal como esta se apresenta no seu grau de evolução histórica. Alguns deles estão expressamente declarados na Constituição ou noutras leis; outros podem ser deduzidos da regulação legal, da sua cadeia de sentido, por via de uma «analogia geral» ou do retorno à ratio legis; alguns foram «descobertos» e declarados pela primeira vez pela doutrina ou pela jurisprudência, as mais das vezes atendendo a casos determinados, não solucionáveis de outro modo, e que logo se impuseram na «consciência jurídica geral», graças à força de convicção a eles inerente. Decisiva permanece a sua referência de sentido à ideia de Direito. Tudo isto discutimo-lo na sede indicada. Trata-se agora da idoneidade de tais princípios para a formação do sistema.
Os princípios jurídicos não têm o carácter de regras concebidas de forma muito geral, às quais se pudessem subsumir situações de facto, igualmente de índole muito geral. Carecem antes, sem excepção, de ser concretizadas. Mas cabe a esse respeito distinguir vários graus de concretização. No grau mais elevado, o princípio ainda não contém ainda nenhuma especificação de previsão e conseqüência jurídica, mas só uma «ideia jurídica geral», pela qual se orienta a concretização ulterior como por um fio condutor. Dessa espécie são, por exemplo, o princípio do Estado de Direito, o princípio do Estado Social, o princípio do respeito da dignidade da pessoa humana, da autodeterminação e da responsabilidade pessoal. Os primeiros indícios de uma especificação de previsão e conseqüência jurídica e, portanto, do começo da formação de regras, mostra-nos princípios tais como o preceito de igual tratamento jurídico de situações de facto idênticas, o princípio da confiança, nas suas diversas vertentes, como, por exemplo, enquanto proibição de retroactividade de leis desvantajosas ou como base de uma «responsabilidade por confiança» no Direito privado, o preceito da salvaguarda da «boa-fé» em todas as relações jurídicas especiais, op princípio da culpa, o princípio da responsabilidade pelo risco e o de uma imputação daqueles riscos que alguém há-de suoprtar «mais directamente» que outrem, enquanto critérios de uma responsabilidade por danos. Mas tais «subprincípios» estão também ainda longe, todavia, de representar regras de que pudesse resultar directamente a resolução de um caso particular. Ao invés disso, são aqui precisas concretizações ulteriores, que, em primeiro lugar, já o legislador levou a cabo".
Emerson Garcia procura estabelecer parâmetros para a solução da questão da normatividade dos princípios:
"Em sua gênese, conforme a doutrina tradicional, as normas se confundem com as regras de condutas que veiculavam, sendo os princípios utilizados, primordialmente, como instrumentos de interpretação e integração daqueles.
Hodiernamente, tem-se um período pós-positivista, em que os princípios deixaram de ser meros complementos das regras, passando a ser vistos como formas de expressão da própria norma, a qual é subdividida em regras e princípios. Na lição de Jorge Miranda, ‘os princípios não se colocam, pois, além ou acima do Direito (ou do próprio Direito positivo); também eles – numa visão ampla, superadora de concepções positivistas, literalistas e absolutizantes das fontes legais – fazem do complexo ordenamental. Não se contrapõem às normas, contrapõem-se tão-somente aos preceitos; as normas jurídicas é que se dividem em normas-princípios e normas-disposições’.
Aqueles que se opõem ao caráter normativo dos princípios normalmente acenam com sua maior abstração e com a ausência de pressupostos fáticos que delimitarão sua aplicação, o que denotaria uma diferença substancial em relação às normas, as quais veiculam prescrições dotadas de maior determinabilidade, permitindo a imediata identificação das situações, fáticas ou jurídicas, por ela reguladas.
Em nosso entender, tais elementos não são aptos a estabelecer uma distinção profunda o suficiente para dissolver a relação de continência existente entre normas e princípios, figurando estes como espécies daquelas. Inicialmente, deve-se dizer que o maior ou menor grau de generalidade existente em duas normas, a exemplo do maior ou menor campo de aplicação, é parâmetro incapaz de diferenças de ordem ontológica entre elas.
Os princípios, a exemplo das regras, carregam consigo acentuado grau de imperatividade, exigindo a necessária conformação de qualquer conduta aos seus ditames, o que denota seu caráter normativo (dever ser). Sendo cogente a observância dos princípios, qualquer ato que deles destoe será inválido, conseqüência esta que representa a sanção para a inobservância de um padrão normativo cuja reverência é obrigatória.
Em razão de seu maior grau de generalidade, os princípios veiculam diretivas comportamentais que devem ser aplicadas em conjunto com as regras sempre que for identificada uma hipótese que o exija, o que, a um só tempo, acarreta um dever positivo para o agente – o qual deve ter seu atuar direcionado à consecução dos valores que integram o princípio – e um dever negativo, consistente na interdição da prática de qualquer ato que se afaste de tais valores. Constatada a inexistência de regra específica, maior importância assumirão os princípios, os quais servirão de norte à resolução do caso apreciado.
Discorrendo sobre o tema, Norberto Bobbio afirma que ‘os princípios são apenas, a meu ver, normas fundamentais ou generalíssimas do sistema, as normas mais gerais. A palavra princípios leva a engano, tanto que é velha a questão entre os juristas se os princípios gerais são normas. Para mim, não há dúvida: os princípios gerais são normas como todas as outras. E esta também é a tese sustentada Crisafulli. Para sustentar que os princípios gerais são normas, os argumentos são dois, e ambos válidos: antes de mais nada, se são normas aquelas das quais os princípios são extraídos, através de um procedimento de generalização sucessiva, não se vê porque não devam ser normas também eles: se abstraio da espécie animal obtenho sempre animais, e não flores ou estrelas. Em segundo lugar, a função para qual são extraídos e empregados é a mesma cumprida por todas as normas, isto é, a função de regular um caso. E com que finalidades são extraídos em caso de lacuna? Para regular um comportamento não-regulamentado: mas então servem ao mesmo escopo a que se devem as normas expressas. E por que não deveriam ser normas’.".
A par dos ensinamentos trazidos à colação, nos parece que a primeira indagação cuja resposta se faz mister é acerca de se os princípios são ou não normas jurídicas.
Como já visto, grandes são os argumentos nos mais variados sentidos. Para que não haja desvio da finalidade do presente texto, tentaremos estabelecer da maneira mais sucinta possível o nosso entendimento.
A resposta à indagação a respeito de serem os princípios jurídicos, normas jurídicas nos parece estar atrelada a questões de abstração, generalidade e falta de cominação expressa de sanção por parte daqueles.
Como visto, uma das características dos princípios é a abstração e generalidade, impossíveis de serem retiradas dos mesmos dada a sua finalidade no ordenamento jurídico.
Argumenta-se que uma conseqüência dessa abstração e generalidade seria a impossibilidade de aplicação in casu.
De fato, concordamos que a abstração e generalidade são inseparáveis da principiologia jurídica o que não os desabona, na medida em que, nas palavras de Celso Ribeiro Bastos: "Pode-se afirmar que os princípios, embora percam em concretitude, ganham em abrangência".
Raúl Canosa Usera já falava: "todo principio por su propria naturaleza pretende abarcar um número, cuanto más alto mejor, de cuestiones de hecho".
Isso não quer dizer, todavia, que não se possa aplicar princípios jurídicos a casos em concreto.
Dois são os argumentos que fundamentam esse entendimento.
Em primeiro lugar, como já salientado por Norberto Bobbio, na lição acima transcrita, em caso de lacuna de lei aplicar-se-ão os princípios de direito, que ao regularem o caso desempenham nada mais do que a função de norma jurídica.
E em segundo lugar, ainda que não se trate de um processo de aplicação principiológica em conseqüência de lacuna de lei, haverá sua incidência direta nos casos de nulidade gerada pela inobservância de algum princípio do direito.
Outra questão também ligada à normatividade dos princípios jurídicos é a falta de cominação expressa de sanções. Tal argumento não deve prosperar. Ao contrário, merece ser rejeitado de pronto, vez que a nulidade de ato que atente contra princípio do direito é – notadamente no Direito Administrativo e Processual – sem sombra de dúvidas, sanção.
Ademais, como será visto a diante, a própria lei de improbidade administrativa prevê expressamente a possibilidade de sanção aos agentes públicos que atentarem contra os princípios da Administração Pública.
O que se pode argumentar é a ausência de sanção pessoal ou direta, ou ainda que gere conseqüências mais diretas e palpáveis no caso concreto. Esta sim ficaria a cargo da especificação e determinação, típicas da legislação. Mas em nenhum momento tais argumentos poderiam retirar dos princípios jurídicos o seu caráter normativo.
Como se não bastasse, pelo próprio exame da terminologia "norma", já poderíamos concluir que princípio jurídico é norma, pois esta nada mais é do que "Regra; modelo; preceito".
8.2.1. Princípios constitucionais e infraconstitucionais
Pacífico que princípios jurídicos são normas, vejamos as diferenças, atinentes a serem esses princípios oriundos da Constituição ou da legislação infraconstitucional.
Topograficamente podemos citar dois exemplos onde encontramos na legislação pátria a aplicação de princípios de direito.
O primeiro deles, não poderia deixar de ser a própria Constituição Federal, que é extremamente carregada de princípios de direito. Isto se pode inferir da obrigatoriedade de observância inerente à Constituição para com o ordenamento jurídico e aqueles que dele fazem uso, vale dizer, toda a sociedade.
São os chamados princípios constitucionais, que encontram especial menção em se tratando de Direito Administrativo, qual seja, a previsão expressa de cinco princípios que regem a Administração Pública, a saber: legalidade; impessoalidade; moralidade; publicidade e eficiência.
Outro ponto em que se encontra presente expressamente a aplicação dos princípios jurídicos é a Lei de Introdução ao Código Civil que em seu art. 4.º expõe textualmente: "Quando a lei for omissa, o juiz decidirá o caso de acordo com a analogia, os costumes e os princípios gerais de direito". (grifo nosso).
Com isso temos os princípios constitucionais – que derivam diretamente da Constituição. E os infraconstitucionais – decorrentes da legislação infraconstitucional.
Em um primeiro momento salientamos que a expressão princípios gerais de direito deve ser entendida como gênero do qual são espécies os princípios constitucionais e os infraconstitucionais.
Isso se deduz pela possibilidade de o burgomestre poder aplicar perfeitamente os princípios constitucionais pela faculdade que lhe é conferida pelo art. 4.º da LICC.
Assim, apenas mencionamos como exemplo as legislações acima pelo fato de que a Constituição só impõe a observância de seus princípios, enquanto a LICC permite o uso de quaisquer princípios de direito, sejam eles constitucionais ou não.
Celso Ribeiro Bastos ensina que "(...) os princípios gerais de Direito se identificam e se diferenciam dos demais princípios constitucionais pelo fato de apresentarem como nota característica a generalidade absoluta de sua incidência".
A Constituição é o mais alto grau em se tratando de ordenamento jurídico em um Estado, assim já ensinava Hans Kelsen:
"A estrutura hierárquica da ordem jurídica de um Estado é, grosso modo, a seguinte: pressupondo-se a norma fundamental, a constituição é o nível mais alto dentro do Direito nacional. A constituição é aqui compreendida não num sentido formal, mas material. A constituição num sentido formal é certo documento solene, um conjunto de normas jurídicas que pode ser modificado apenas com a observância de prescrições especiais, cujo propósito é tornar mais difícil a modificação dessas normas. A constituição no sentido material consiste nas regras que regulam a criação das normas jurídicas gerais, em particular a criação de estatutos".
Ainda nesse sentido Kelsen:
"Já nas páginas precedentes por várias vezes se fez notar a particularidade que possui o Direito de regular a sua própria criação. Isso pode operar-se de forma a que uma norma apenas determine o processo por que outra norma é produzida. Mas também é possível que seja determinado ainda – em certa medida – o conteúdo da norma a produzir. Como, dado o caráter dinâmico do Direito, uma norma somente é válida porque e na medida em que foi produzida por uma determinada maneira, isto é, pela maneira determinada por uma outra norma, esta outra norma representa o fundamento imediato de validade daquela. A relação entre a norma que regula a produção de uma outra e a norma assim regularmente produzida pode ser figurada pela imagem espacial da supra-infra-ordenação. A norma que regula a produção é a norma superior, a norma produzida segundo as determinações daquela é a norma inferior. A ordem jurídica não é um sistema de normas jurídicas ordenadas no mesmo plano, situadas umas ao lado das outras, mas é uma construção escalonada de diferentes camadas ou níveis de normas jurídicas. A sua unidade é produto da conexão de dependência que resulta do fato de a validade de uma norma, que foi produzida de acordo com outra norma, se apoiar sobre essa outra norma, cuja produção, por sua vez, é determinada por outra; e assim por diante, até abicar finalmente na norma fundamental – pressuposta. A norma fundamental – hipotética, nestes termos – é, portanto, o fundamento de validade último que constitui a unidade dessa interconexão criadora.
Se começarmos levando em conta apenas a ordem jurídica estadual, a Constituição representa o escalão de Direito positivo mais elevado. A Constituição é aqui entendida num sentido material, quer dizer: com esta palavra significa-se a norma positiva ou as normas positivas através das quais é regulada a produção das normas jurídicas gerais. Esta Constituição pode ser produzida por via consuetudinária ou através de um ato de um ou vários indivíduos a tal fim dirigido, isto é, através de um ato legislativo. Como, nesse segundo caso, ela é sempre condensada num documento, fala-se de uma Constituição ‘escrita’ para a distinguir de uma Constituição não escrita, criada por via consuetudinária. A Constituição material pode consistir, em parte, de normas escritas, noutra parte, de normas não escritas, de Direito criado consuetudinariamente. As normas não escritas da Constituição, cridas consuetudinariamente, podem ser codificadas; e, então, quando esta codificação é realizada por um órgão legislativo e, portanto, tem caráter vinculante, elas transformam-se em Constituição escrita.
Da Constituição em sentido material deve distinguir-se a Constituição em sentido formal, isto é, um documento designado como ‘Constituição’ que – como Constituição escrita – não só contém normas que regulam a produção de normas gerais, isto é, a legislação, mas também normas que se referem a outros assuntos politicamente importantes e, além disso, preceitos por força dos quais as normas contidas neste documento, a lei constitucional, não podem ser revogadas o alteradas pela mesma forma que as leis simples,mas somente através de processo especial submetido a requisitos mais severos. Estas determinações representam a forma da Constituição que, como forma, pode assumir qualquer conteúdo que, em primeira linha, serve para a estabilização das normas que aqui são designadas como Constituição material e que soa o fundamento de Direito positivo de qualquer ordem jurídica estadual.
A produção de normas jurídicas gerais, regulada pela Constituição em sentido material, tem, dentro da ordem jurídica estadual moderna, o caráter de legislação. A sua regulamentação pela Constituição compreende a determinação do órgão ou dos órgãos que são dotados de competência para a produção de normas jurídicas gerais – leis e decretos. Quando os tribunais também são considerados competentes para aplicar Direito consuetudinário, eles têm de receber da Constituição poder para isso – tal como o recebem para a aplicação das leis. Quer dizer: é preciso que a Constituição institua o costume, que é constituído pela conduta habitual dos indivíduos submetidos à ordem jurídica estadual – os súditos do Estado –, como fato gerador de Direito. Se a aplicação do Direito consuetudinário pelos tribunais é considerada como legal, embora na Constituição escrita não exista uma tal atribuição de poder ou autorização, essa autorização não pode – como mais tarde veremos – ser dada numa norma da Constituição não escrita, produzida consuetudinariamente, mas tem de ser pressuposta, como tem de ser pressuposto que a Constituição escrita tem o caráter de norma objetivamente vinculante sempre que se consideram como normas jurídicas vinculativas as leis e os decretos de conformidade com ela editados. Nesse caso, a norma fundamental – como Constituição em sentido lógico-jurídico – institui como fato produtor de Direito não apenas o ato do autor da Constituição, mas também o costume constituído pela conduta dos indivíduos sujeitos à ordem jurídica constitucionalmente criada.
A Constituição estadual pode – como Constituição escrita – aparecer na específica forma constitucional, isto é, em normas que não podem ser revogadas ou alteradas como as leis normais mas somente sob condições mais rigorosas. Mas não tem de ser necessariamente assim; e não é assim quando sequer existia Constituição escrita, quando a Constituição surgiu por via da consuetudinária, quer dizer: através da conduta costumeira dos indivíduos submetidos à ordem jurídica estadual, e não foi codificada. Nesse caso, também as normas que têm o caráter de Constituição material podem ser revogadas ou alteradas por leis simples ou pelo Direito consuetudinário.
É possível que o órgão que é competente para estabelecer, revogar e modificar leis constitucionais no sentido formal específico, seja diferente do órgão que é competente para estabelecer, revogar ou modificar as leis normais. Para a primeira função pode ser chamado, por exemplo, um órgão especial, diferente do órgão competente para a segunda função, quanto à sua composição e quanto ao processo de eleição: v. g., um parlamento constituinte (melhor: um parlamento legislador da Constituição). No entanto, geralmente as duas funções são desempenhadas pelo mesmo órgão.
A Constituição, que regula a produção de normas gerais, pode também determinar conteúdo das futuras leis. E as Constituições positivas não raramente assim procedem ao prescrever ou excluir determinados conteúdos. No primeiro caso, geralmente apenas existe uma promessa de leis a fixar e não qualquer obrigação de estabelecer tais leis, pois, já mesmo por razoes de técnica jurídica, não pode facilmente ligar-se uma sanção ao não-estabelecimento de leis com o conteúdo prescrito. Com mais eficácia, porém, podem ser excluídas pela Constituição leis de determinado conteúdo. O catálogo de direitos e liberdades fundamentais, que forma uma parte substancial das modernas constituições, não é, na sua essência, outra coisa senão uma tentativa de impedir que tais leis venham a existir. É eficaz quando pelo estabelecimento de tais leis – v. g., leis que violem a chamada liberdade da pessoa ou de consciência, ou a igualdade – se responsabiliza pessoalmente determinado órgão que participa da criação dessas leis – chefe do Estado, ministros – ou existe a possibilidade as atacar e anular. Tudo isto sobre o pressuposto de que a simples lei não tenha força para derrogar a lei constitucional que determina sua produção e o seu conteúdo, de que esta lei somente possa ser modificada ou revogada sob condições mais rigorosas, como sejam uma maioria qualificada ou um quorum mais amplo. Isto quer dizer que a Constituição prescreve para sua modificação ou supressão um processo mais exigente, diferente do processo legislativo usual; que, além da forma legislativa, existe uma específica forma constitucional".
Sobre a importância da Constituição ensina Konrad Hesse:
"Nem de um Estado determinado, independente de atividade humana, nem de um direito encontrado pode, por conseguinte, ser partido, senão somente das tarefas expostas. Para poder satisfazê-las, é necessária uma ordem constituinte: a Constituição.
A Constituição é a ordem fundamental jurídica da coletividade. Ela determina os princípios diretivos, segundo os quais deve formar-se unidade política e tarefas estatais ser exercidas. Ela regula procedimentos de vencimento de conflitos no interior da coletividade. Ela ordena a organização e o procedimento da formação da unidade política e da atividade estatal. Ela cria bases e normaliza traços fundamentais da ordem total jurídica. Em tudo, ela é ‘o plano estrutural fundamental, orientado por determinados princípios de sentido, para a configuração jurídica de uma coletividade’. Como ordem fundamental jurídica da coletividade, a Constituição não está restringida a uma ordem da vida estatal. Suas regulações compreendem – especialmente claro em garantias como aquelas do matrimonio e da família, da propriedade, da formação e da atividade de grupos sociais ou da liberdade de arte e ciência – também bases da ordem da vida não-estatal. Por causa disso por um lado, Direito ‘Constitucional’ estende-se mais que Direito ‘Estatal’ que, conforme o significado da palavra em objeto, indica somente direito do estado; por outro lado, ele está limitado mais estreitamente, pelo fato que o Direito Estatal também pode compreender o direito do estado, que não deve ser incluído na ordem fundamental da coletividade. Os conceitos são, portanto, idênticos somente em uma parte. Como a Constituição produz os pressupostos da criação, validez e realização das normas da ordem jurídica restante e determina, em grande parte, seu conteúdo, ela converte-se em um elemento de unidade da ordem jurídica total da coletividade, no interior da qual ela exclui um isolamento entre Direito Constitucional e outros setores jurídicos, em especial, do direito privado, do mesmo modo como uma coexistência não-unida daqueles setores jurídicos mesmos".
Não se pode negar a supremacia da Constituição enquanto ordenamento jurídico vigente.
Sobre a supremacia e imperatividade das disposições constitucionais Agustín Gordillo tece os seguintes comentários:
"Esa supremacía que la Constitución comparte con normas superiores no es por supueno moral o ética: se trata de una supremacía jurídica, lo que explica por qué una ley o un acto administrativo, que son expresiones de la voluntad coactiva del Estado, puedan perder validez e imperatividad en algún caso.
Decir que una ley o un acto administrativo puedan perder juricidad e imperatividad en algún caso, importa a su vez afirmar que aquello que destruye dicha juricidad, es forzosamente algo de más imperatividad que la ley o el acto administrativo: de otra manera la hipótesis resultaría absurda.
Y bien, a pesar de que ela supremacía jurídica va enlazada a la suprema imperatividad o fuerza coactiva, no siempre se admite con seguridad lo segundo. Que la Constitución o los tratados de derechos humanos o derecho comunitario sean supremos, nadie lo discute; pero que sean imperativos, es decir, normas vigentes y obligatoriamente aplicables en todo momento, a toda circunstancia, y por todo tribunal del país, es objeto de frecuentes dudas expresas o implícitas.
Sin embargo, el razonamiento básico es elemental: si la Constitución y normas superiores de rango supranacional tienen la virtud de dejar sin fuerza coactiva a una ley o a un acto administrativo – expresiones ambas de la potestad pública – ello tiene que ser debidom inexorablemente, a que ellas mismas tiene la suficiente imperatividad para inhibir la que a su vez tienen aquéllos.
Si la Constitución y el orden jurídico internacional son un conjunto de reglas imperativas de conducta humana, y si son supremos, constituyen un orden jurídico rudimentario, pero orden al fin, y carente de lagunas: lo que conceden con su imperatividad suprema (derechos individuales, poderes públicos) se tiene el derecho de hacerlo, haya o no ley al respecto: en ausencia de ley, corresponde al juez hacer la aplicación directa de la Constitución o de las normas jurídicas supranacionales.
Del mismo modo, todo lo que ese orden supremo exige, se tiene el deber de cumplirlo; es así un sistema normativo completo, con valor autónomo propio, inmediato y directo.
Algunos sostuvieron que las disposiciones constitucionales no eran normas jurídicas porque carecen de sanción. Ello es inexacto: las sanciones no son siempre penas (privación de la liberdad, la vida o la propriedad, a título no de reparación sino de castigo), puesto que pueden consistir en el establecimiento de una relación jurídica nueva, la extinción de una relación jurídica preexistente, o la ejecución coactiva del deber jurídico violado.
Si se quiere, en todos estos hay un aliquid de castigo, pero debe apreciarse que salvo en el caso del derecho penal, lo más importante en la sanción o "específica reacción del derecho ante la violación de un deber jurídico", no es el castigo, sino la a aplicación forzada del objeto del derecho, es decir, el cumplimiento o ejecución coactiva del deber no cumplido.
En el ejemplo de la norma "si no pagas, entonces debe ser embargo y remate", ¿qué es el embargo y remate sino la ejecución forzada del deber de pagar? Por eso, y precisamente porque no nos hallamos en el campo del derecho penal, es evidente que si una norma constitucional establece en forma imperativa un deber jurídico, no es extraño a ella interpretar que ante el incumplimiento de éste debe realizarse su ejecución forzada; como la norma imperativa establece con esa particularidad un deber jurídico determinado, la existencia y la medida de la sanción para la violación del mismo no necesitan ser declarados especialmente por otro artículo, desde que dicha existencia y dicha medida están comprendidas en la existencia y medida del deber mismo. Al aplicar como sanción la ejecución forzada del objetivo del derecho (el deber jurídico violado), nada se está realizando que la primera norma no haya previsto; que existía el deber jurídico de realizar tal o cual acción u omisión. Como ya la norma jurídica que establece el primer deber jurídico tiene por su contenido imperativo la característica de latente coactividad, no es extraño a ella el que ese deber jurídico se realice por la fuerza: esa es una sanción de la norma jurídica, y todas las normas jurídicas constitucionales la tienen".
Ocorre, todavia, que quando falamos em princípios jurídicos, estamos falando em algo acima do próprio ordenamento jurídico no qual se insere a Constituição, como texto normativo que é.
Deste modo, entendemos não haver hierarquia entre princípios constitucionais e demais princípios de direito, até porque, a Constituição é a consagração legislativa de muitos princípios de direito que se forjaram durante a história.
Sobre esse aspecto vislumbramos apenas uma hipótese na qual se poderia falar em superioridade hierárquica de princípios constitucionais. Estamos falando das hipóteses de princípios presentes no ordenamento jurídico infraconstitucional, que pela própria hierarquia das leis, não poderiam ir contra a Lei Maior.
Ainda assim, em ultima análise, não se encontrariam na exceção mencionada, aqueles princípios presentes na legislação infraconstitucional em conseqüência de processo legislativo, mas que derivam de diretivas principiológicas supralegais, como exemplo os deveres de honestidade e imparcialidade presentes no art. 11. da lei de improbidade administrativa.
Esses princípios não se encontram hierarquicamente abaixo dos princípios constitucionais, justamente pelo fato de o corroborarem.
O entendimento segundo o qual não há hierarquia entre princípios constitucionais e infraconstitucionais é justamente a supralegalidade dos princípios de direito. O que se poderá verificar a seguir, quando tratamos da questão da desnecessidade de positivação dos princípios.
8.3. Desnecessidade de positivação dos princípios jurídicos
Há uma discussão acerca da necessidade ou não da positivação, vale dizer, consagração legislativa dos princípios jurídicos.
A esse respeito, em conclusão da linha de raciocínio que traçamos até o presente momento, bem como do próprio título que demos ao presente tópico, já se depreende nossa inclinação à desnecessidade de positivação dos princípios jurídicos.
O professor Wallace Paiva Martins Júnior consegue, em sintética análise, realizar ampla explanação da questão:
"Considerada a natureza prescritiva derivada da sua condição de valor jurídico da comunidade, os princípios não necessitam de posterior consagração legislativa (normalização) para adquirir eficácia, pois a obrigatoriedade deles tem explicação em sua integração com a consciência coletiva. Sendo fonte do direito e derivando sua condição jurídica da própria existência independente de positivação, o problema de sua natureza jurídica não se finca em torno do caráter prescritivo e da correlata força de obrigar, averba Margarita Beladiez Rojo.
Karl Larenz demonstra a diferença entre positivação (ou consagração legislativa) e regulamentação de princípios jurídicos. Estes não passam a integrar o ordenamento jurídico a ser vigentes, com força jurídica pela positivação. Positivação e regulamentação são diferentes, pois na regulamentação jurídica o princípio adquire concretização, é inflado de pressuposto de fato do qual é deficiente ou carente, mas isso é apenas o exercício de sua função positiva. O princípio jurídico é, mesmo sem regulamentação, integrante do direito positivo. A conexão das indicações do pensamento diretor como uma explicação da regulamentação em que o princípio se encontra, concretizado no direito positivo demonstra que ele penetrou neste, assevera Larenz, e, portanto, não é uma fórmula vazia. Entretanto, nessa parte, o próprio autor confunde a positivação (isto é, o ato de pertencer ou integrar o direito positivo) com a regulamentação (a adoção pelo direito positivo através de norma jurídica, dos valores consagrados pelo princípio, ou seja, o incremento da sua função positiva), certamente porque dá mais importância aos princípios do direito justo (causas de justificação de todas as regulamentações jurídicas, ligadas ao fim último do direito, traduzidas na expressão de um ideal de direito) em contraposição aos do direito positivo.
Segundo Esser, citado por Karl Lrenz, existem princípios subjacentes à regulação legal e reconhecidos na jurisprudência (boa-fé, confiança, proporcionalidade, responsabilidade etc.), mas distingue princípio e norma, porque princípio não é mandamento, mas base, critério ou justificação do mandamento jurídico. Positivado o princípio, é direito positivo não como mandamento independente ou separado e sim como condição imanente da função do particular. Dessa maneira, é a autonomia da vontade no direito privado e a divisão dos Poderes no direito público, sem abdicar de seu caráter de princípio e sem se converter em mandamento. Na regulamentação jurídica, o princípio adquire concretização, anota Larenz.
Jesus Gonzalez Perez ressalta que o fato de o art. 7º do Código Civil espanhol prever a boa-fé como norma jurídica não minimiza a importância a natureza jurídica do princípio, pois ‘el hecho de su consacración em una norma legal no supone que con anterioridad no existiera, ni que por tal consagración legislativa haya perdido su carácter. Pues si los principios generales del Derecho, por su propria naturaleza, existen con independencia de su consagración em una norma jurídica positiva, como tales subsistirán cuando en un Ordenamiento jurídico se recogen en un precepto positivo, con objeto de que no queda duda su pleno reconocimiento’, observando que a consagração legislativa rende bons frutos, de modo que, se o princípio não perde seu caráter como tal (notadamente como informador do ordenamento jurídico), no entanto, adquire aplicabilidade imediata.
Assim, como sucedido com a Constituição brasileira de 1988, a Carta Espanhola incorporou diversos princípios jurídicos, consagrando-os legislativamente. E na Espanha essa consagração legislativa irradiou-se para a legislação infraconstitucional e, com menos freqüência, para os regulamentos. Porém, observa Jesus Gonzalez Perez, o princípio jurídico não perde a principal característica de informador de um ordenamento jurídico com sua consagração legislativa, senão é solenemente submetido a uma confirmação. Não perde, portanto, posição de destaque no ordenamento jurídico e tampouco sua função informadora, embora exista e tenha eficácia, independentemente de sua consagração legislativa.
Desse modo, conclui Jesus Gonzalez Perez que ‘los principios jurídicos constituen la base del Ordenamiento jurídico, ‘la parte permanente y eterna del Derechoy también l cambiante y mudable que determina la evolución jurídica’; son las ideas fundamentales e informadoras de la organización jurídica de la Nación’, de tal sorte integrantes do ordenamento jurídico que sua violação é sancionada com a mesma energia reservada às normas jurídicas. A consagração legislativa dos princípios jurídicos não cessa sua característica principal e ‘no se produce una transformación de esencia normativa que transforma un principio general en parte de la Ley; seguirá siendo pincipio general del Derecho y también norma jurídica de aplicación inmediata’. Por fim, sua revogação (como norma jurídica) não implicará na caducidade do princípio jurídico, que continuará existindo (independência do princípio) com força suficiente (como se fosse norma juridica superior) para invalidar norma jurídica superveniente ou não recepcionar alguma precedente.
Explica Guido Falzone que, na Itália, a boa administração, tida como diretiva do poder discricionário, é um princípio jurídico elementar ao ordenamento jurídico, pouco importando se formulado legislativamente ou implícito, porque sempre constituirá norma aplicável, e sua consagração em norma jurídica constitucional tem o efeito de eliminar qualquer eventual questionamento sobre sua existência ou validade jurídica.
Os princípios de direito são positivos, e tanto faz serem explícitos ou implícitos, pois, em verdade, são eles enunciados basilares de um ordenamento jurídico que age, reage e interage, inclusive com suas normas, pela perfeita compreensão de seus alicerces fundamentais (os princípios jurídicos). No necessitam, por isso, consagração legislativa, como alguns textos constitucionais fizeram. Nesse passo, a Constituição de 1988 foi pródiga, positivando alguns (não todos, frise-se) princípios, especialmente os que orientam as atividades da Administração Pública. Essa consagração legislativa, que pode conduzir à banalização dos princípios jurídicos, tem explicação na tímida postura da jurisprudência, fortemente influenciada por um positivismo exagerado – o que é um erro porque os princípios (explícitos ou implícitos) são positivados elementarmente por sustentarem a própria ordenação jurídica positiva. Porém. Essa característica do direito brasileiro, muito assemelhado ao português, gera uma conseqüência, bem observada por Carmem Lúcia Antunes que adota a postura de J. J. Gomes Canotilho, salientando que, sendo a Constituição uma lei, não se pode deixar de concluir que todos os princípios que nela se incluem, expressa ou implicitamente, são leis, normas jurídicas postas à observância insuperável e incontornável à atividade estatal".
A questão da positivação dos princípios resta superada pela doutrina contemporânea, mais ainda pela jurisprudência, que tem aplicado cotidianamente tais normas que nada mais fazem senão permitir uma adequação do ordenamento jurídico ao fenômeno social.
8.4. Conflito de Princípios. A ponderação de bens
Ainda que não se trate do escopo principal do presente trabalho, entendemos importante a ressalva de uma questão atinente aos princípios constitucionais que se levanta na doutrina contemporânea.
Dada a incidentalidade, o tema não será abordado em profundidade. Será destarte, tratado sob um prisma de sujeição à discussão, levantando o tema para possíveis e frutíferos debates.
A questão aqui mencionada diz respeito aos princípios fundamentais consagrados na Lei Maior.
Contudo não deixa de incidir sobre o presente tema, na medida em que a lei de improbidade administrativa dá salutar importância aos princípios de direito, mormente os da Administração Pública.
Nos referimos à questão de otimização dos princípios constitucionais, o que por vezes gera conflitos de princípios, solucionáveis através da teoria da ponderação de bens no caso concreto.
Prevê a Constituição em seu art. 5º uma série de princípios fundamentais da pessoa humana. Ocorre que, às vezes, em casos concretos tais princípios possam colidir entre si.
Melhor dizendo, não se trata exatamente de colisão de princípios, mas sim de situações em que haja pessoas com garantias fundamentais de um lado e de outro, outra pessoa ou ainda a sociedade com seus princípios norteadores.
Diante de tal celeuma, qual princípio deveria preponderar? O correto seria a aplicação de um em detrimento do outro?
Parece-nos que dois pontos dão a melhor solução para a indagação.
Em primeiro lugar deve-se ter em mente que não há princípios mais importantes que outros. Nesse sentido, há que se buscar uma maneira pela qual todos os princípios tenham uma eficácia maior possível sem interferir no âmbito de incidência do outro.
Em segundo lugar, mister se faz que seja analisado, de maneira concentrada, caso a caso, na medida em que somente assim se poderá definir qual seria o mais correto âmbito de eficácia de cada princípio naquele caso.
E essas duas linhas que culminam numa pacífica solução são encontradas na teoria da ponderação de bens no caso concreto. Trata-se de método de otimização constitucional, ou seja, um meio pelo qual a Constituição logrará regular todas as matérias da maneira mais completa possível.
Em se tratando dessa linha de raciocínio não há como não mencionar a doutrina alemã e portuguesa, ambas muito avançadas nesses estudos.
Karl Larenz, um dos maiores expoentes do direito alemão pondera que para que se possa fazer uma correta ponderação de bens mister se faz elucidar a possibilidade de, segundo a ordem de valores dos bens constitucionalmente protegidos, estabelecer uma ordem de valores, entre os bens no caso concreto.
Para tal estabelece um critério segundo o qual "haverá que se dizer, sem vacilar, que à vida humana e, do mesmo modo, à dignidade humana, corresponde um escalão superior ao de outros bens, em especial os bens materiais", pondera ainda :
"Finalmente, têm validade os princípios da proporcionalidade, do meio mais idôneo, ou da menor restrição possível. Nestes termos, a lesão de um bem não deve ir além do que é necessário, ou, pelo menos, é «defensável», em virtude de outro bem ou de um objectivo jurídico material, que se converte em fio condutor metodológico da concretização judicial da norma. É evidente que, mesmo observando esses princípios, fica ainda uma margem livre muito ampla para uma valoração judicial pessoal (...). Mas, por outro lado, também se torna manifesto que a «ponderação de bens» não é simplesmente matéria do sentimento jurídico, é um processo racional que não há-de fazer-se, em absoluto, unilateralmente, mas que, pelo menos até um certo grau, segue princípios identificáveis e, nessa medida, é também comprovável.
(...)
"A «ponderação de bens no caso concreto» é um método de desenvolvimento do Direito, pois que serve para solucionar colisões de normas – para as quais falta uma regra expressa na lei –, para delimitar umas das outras as esferas de aplicação das normas que se entrecruzam e, com isso, concretizar os direitos cujo âmbito, como o direito geral de personalidade, ficou em aberto. Do mesmo modo que a concretização paulatina pela jurisprudência de pautas de valoração carecem de ser preenchidas de conteúdo, também aqui é de se esperar que, com o acréscimo de sentenças de tribunais superiores, se hão-de criar possibilidades de comparação, mediante as quais serão tornadas mais estreitas as margens residuais da livre apreciação. Mas, posto que cada vez se requererá a consideração de todas as circunstancias do caso concreto, que nunca são iguais em tudo, não se deve esperar que, com o tempo, se venham a formar regras fixas que possibilitem uma subsunção simples do caso concreto. A comparação de casos possibilita analogias e porventura uma certa tipificação dos casos; a «ponderação » de bens será desse modo aliviada, mas não se tornará supérflua".
Em sentido diverso, Konrad Hesse, não concorda com a aplicação da ponderação de bens, tecendo os seguintes comentários:
"Onde nascem colizões (sic) não deve, em ‘ponderação de bens’ precipitada ou até ‘ponderação de valor’ abstrata, um ser realizado à custa do outro. Antes, o princípio da unidade da Constituição põe a tarefa de uma otimização: a ambos os bens devem ser traçados limites, para que ambos possam chegar a eficácia ótima. Os traçamentos dos limites devem, por conseguinte, no respectivo caso concreto ser proporcionais; eles não devem ir mais além do que é necessário para produzir a concordância de ambos os bens jurídicos. ‘Proporcionalidade’ expressa, nessa conexão, uma relação de duas grandezas variáveis e precisamente esta que satizfaz (sic) o melhor aquela tarefa de otimização, não uma relação entre uma ‘finalidade’ constante e um ‘meio’ variável ou vários. Ela fica clara, por exemplo, na ‘ação recíproca’ (equivocadamente assim indicada) entre liberdade de opinião e lei geral limitadora no artigo 5º da Lei Fundamental: trata-se de concordância prática pela coordenação ‘proporcional’ na liberdade de opinião por um lado, dos bens jurídicos protegidos por ‘leis gerais’, por outro. Sobre isto, que é proporcional em cada caso particular o princípio não diz nada; ele indica, todavia, como diretiva contida na Constituição e, por causa disso, obrigatória, a direção e ele determina o procedimento no qual uma resolução constitucional somente deve ser procurada. – ‘Ponderação de bens’ carece, para suas valorações, de uma tal diretiva; a ela falta não só o apoio sustentador, mas ela cai também sempre no perigo de abandonar a unidade da Constituição. O mesmo vale, quando a relação entre concessões e restrições de liberdade jurídico-constitucionais é determinada no sentido de uma presunção inicial a favor da liberdade (in dubio pro libertate), motivo pelo qual não é possível ver nessa presunção um princípio de interpretação constitucional." (negritamos)
J. J. Gomes Canotilho também não concorda com o modelo da ponderação de bens, fundamentando seu entendimento da seguinte maneira:
"Muitas das conseqüências que pretendem extrair da separação lógica entre normas e princípios, com base na ideia de «peso» ou «espessura» dos princípios (especialmente relevante em caso de colisão de princípios) também ficam, dentro da posição metódico-metodológica deste trabalho, substancialmente esbatidas. A dimension of weight, que permitiria gradação valorativa e a solução de conflitos sem afectar a validade de princípios eventualmente colidentes, aponta para o conhecido modelo de ponderação de bens, que não é acolhido aqui por várias razões. A primeira é a de que, ao utilizar-se o modelo de ponderação de bens constitucionais na tarefa de interpretação dos princípios e normas, o sentido que se lhe dá não é o de medida e comparação do «peso» dos princípios (com os conhecidos resquícios da «hierarquia de valores» e da «ordem de valores») mas o de discussão das valorações de bens constitucionais igualmente valiosos. É um problema de meios e fins, de ponderação de resultados, de necessidade da adequabilidade de soluções, de garantia de posições constitucionais. Em segundo lugar, não se acolhe a ideia dos «princípios» como um «justo superior» que, em caso de necessidade, justificará a invalidade de normas constitucionais em conflito irremediável com os princípios axiológico-normativos superiores («normas constitucionais inconstitucionais»). A eventual tarefa de optimização constitucional alicerça-se mais racionalmente num princípio da concordância prática do que numa escala ordinal ou cardinal de «valores» constitucionais".
Já em outro momento Canotilho acaba pr concordar com a teoria que dá valores aos bens constitucionalmente protegidos. Nesse sentido pontua o eminente constitucionalista lusitano:
"As ideias de ponderação (Abwägung) ou de balanceamento (Balancing) surge em todo o lado onde haja necessidade de ‘encontrar o direito’ para resolver ‘casos de tensão’ (Ossenbühl) entre bens juridicamente protegidos. O método da ponderação de interesses é conhecido há muito tempo pela ciência jurídica. Nos últimos tempos, porém, a sua relevância tem sido sobretudo reconhecida no direito constitucional e no direito do planejamento urbanístico.
O relevo da ponderação do direito constitucional
A agitação metódica e teórica em torno do método de balanceamento ou ponderação do direito constitucional não é uma ‘moda’ ou um capricho dos cultores de direito constitucional. Várias razões existem para esta viragem metodológica: 1) inexistência de uma ordenação abstracta de bens constitucionais o que torna indispensável uma operação de balanceamento desses bens de modo a obter uma norma de decisão situativa, isto é, uma norma de decisão adoptada às circunstâncias do caso; 2) formatação principal de muitas das normas do direito constitucional (sobretudo das normas consagradoras de direitos fundamentais) o que implica, em caso de colisão, tarefas de ‘concordância’, ‘balanceamento’, ‘pesagem’, ‘ponderação’ típicas dos modos de solução de conflitos entre princípios (que não se reconduzem, como já se frisou, a alternativas radicais de ‘tudo ou nada’); 3) fractura da unidade de valores de uma comunidade que obriga a leituras várias dos conflitos de bens, impondo uma cuidadosa análise dos bens em presença e uma fundamentação rigorosa do balanceamento efectuado para a solução dos conflitos.
Interpretação e ponderação
Em muitas propostas metodológicas a ponderação é apenas um elemento do procedimento da interpretação/aplicação de normas conducente à atribuição de um significado normativo e à elaboração de uma norma de decisão. Aqui o balancing process vai recortar-se em termos autónomos para dar relevo à ideia de que no momento de ponderação está em causa não tanto atribuir um significado normativo ao texto da norma, mas sim equilibrar e ordenar bens conflituantes (ou, pelo menos, em relação de tensão) num determinado caso. Neste sentido, o balanceamento de bens situa-se a jusante da interpretação. A actividade interpretativa começa por uma reconstrução e qualificação dos interesses ou bens conflituantes procurando, em seguida, atribuir um sentido aos textos normativos e aplicar. Por sua vez, a ponderação visa elaborar critérios de ordenação para, em face dos dados normativos e factuais, obter a solução justa para o conflito de bens.
A topografia do conflito ou da relação de tensão entre bens constitucionais
A ponderação é um modelo de verificação e tipicização da ordenação de bens em concreto. Não é, de modo algum, um modelo de abertura para uma justiça ‘casuística’, ‘impressionística’ ou de ‘sentimentos’. Precisamente por isso, é que o método de balancing não dispensa uma cuidadosa topografia do conflito nem uma justificação da solução do conflito através da ponderação.
Em termos tendenciais, designa-se por topografia de conflitos a descrição das modalidades segundo as quais a norma que regula um determinado direito ou interesse incide, num caso específico, no âmbito (área, esfera) de direitos ou bens conflituantes. A análise de topografia do conflito exige, assim, que se esclareçam dois pontos: 1 se e em que medida a área ou esfera de um direito (âmbito normativo) se sobrepõe à esfera de um outro direito também normativamente protegido; 2 qual o espaço que ‘resta’ aos dois bens conflituantes para além da zona de sobreposição.
A ponderação dos bens
Quando é que, afinal, se impõe a ponderação ou o balanceamento ad hoc para obter uma solução dos conflitos de bens constitucionais? Os pressupostos metódicos básicos são os seguintes. Em primeiro lugar, a existência, pelo menos, de dois bens ou direitos reentrantes no âmbito de protecção de duas normas jurídicas que, tendo em conta as circunstancias do caso, não podem ser ‘realizadas’ ou ‘optimizadas’ em todas as suas potencialidades. Concomitantemente, pressupõe a inexistência de regras abstractas de prevalência, pois neste caso o conflito deve ser resolvido segundo o balanceamento abstracto feito pela norma constitucional (ex.: art. 38.º/2/a da CRP que faz prevalecer os direitos dos jornalistas sobre o poder de orientação da direcção da empresa jornalística). Excluem-se, por conseguinte, relações de preferência prima facie, pois nenhum bem é, prima facie, que excluído porque se afigura excessivamente débil, quer privilegiado porque, prima facie, se afigura com valor ‘reforçado’ ou até absoluto. Isto implica a verificação e ordenação, em cada caso ou grupos de casos específicos, de esquemas de prevalência parciais ou relativos, porque, nuns casos, a prevalência pode pender para um lado e noutros para outro segundo as ponderações ou balanceamentos efectuados ad hoc. Finalmente, é indispensável a justificação e motivação da regra de prevalência parcial assente na ponderação, devendo ter-se em conta sobretudo os princípios constitucionais da igualdade, da justiça, da segurança jurídica. Registre-se ainda a observância das regras constitucionais de competência, pois o método de balancing não pode dissolver os esquemas de competência constitucionalmente definidos.
As ‘ponderações’ subjacentes ao balanceamento ad hoc estão já presentes noutros esquemas hermenêuticos anteriormente referidos. É o caso, por exemplo, da concordância prática e da observância do princípio da proporcionalidade em sentido estrito. A importância que ultimamente é atribuída à ponderação de bens constitucionais radica, como se disse, na natureza tendencialmente principal de muitas normas jurídico-constitucionais. O apelo à metódica de ponderação é, afinal, uma exigência de solução justa de conflitos entre princípios. Neste sentido se pôde afirmar recentemente que a ponderação ou o balancing ad hoc é a forma característica de aplicação do direito sempre que estejam em causa normas que revistam a natureza de princípios. A dimensão de ponderabilidade dos princípios justifica a ponderação como método de solução de conflito de princípios".
Como visto muitas são as teorias que pretendem uma otimização das normas constitucionais, principalmente no que respeita os princípios fundamentais. A nós cabe, no presente momento, procurar demonstrar as variadas correntes. Consignamos apenas a opinião de que, em se tratando de direito constitucional, não há que se medir esforços para que suas disposições tenham a maior eficácia possível.
Assim, entendemos proveitosas quaisquer das teorias de otimização e plenitude de eficácia das normas constitucionais.
Ainda que o sistema de ponderação de bens, sob o aspecto da sujeição à subjetividade do burgomestre, não seja o mais indicado, não vislumbramos a impossibilidade de uso desse sistema, vez que, haverá momentos em que terá que se decidir entre duas partes em que ambas estejam amparadas por direitos fundamentais constitucionalmente previstos.