Na atualidade, se torna cada vez mais comum casais optarem por conviver em União Estável. O casamento já não é regra absoluta de convivência matrimonial. Mas, será que é a mesma coisa quando tem herança envolvida?
A Família é reconhecida constitucionalmente como a base da sociedade, tendo, portanto, proteção do Estado. Até o advento da Carta Magna de 1988, o legislador e a doutrina se referiam e condicionavam a ideia de família à de casamento. Por isso, a união estável, ainda que calcada no afeto, amor, auxílio mútuo e demais princípios, era discriminada no âmbito legal, como reflexo do que se tinha pela moral da Sociedade.
Após a Constituição da República de 1988, e, ficando essa atenta às normas morais e costumes que iam se modificando, reconheceu-a (a união estável) como entidade familiar, momento em que o casamento deixou de ser a única forma existente de constituir família.
Sendo assim, os Direitos Sucessórios dos companheiros decorrentes da união estável, à luz das normas jurídicas contidas no Novo Código Civil brasileiro começou a ocorrer com a promulgação da Constituição da República de 1988, que trazem no seu bojo o artigo 226, caput e parágrafo, cujo teor reconhece a união entre o homem e a mulher como entidade familiar, em consequência, gozando da proteção do Estado.
É pertinente reconhecer que, embora não haja obrigatoriedade de celebração de contrato para que seja reconhecida união de fato entre um homem e uma mulher, o Código Civil/2002 manteve a possibilidade, prevista anteriormente no art. 5º da Lei 9278/1996, de os companheiros celebrarem contrato escrito que venha dispor sobre o regime de bens que prevalecerá entre eles, já que a Lei Civil, no art. 1725, enunciou que “Na união estável, salvo contrato escrito entre os companheiros, aplica-se às relações patrimoniais, no que couber, o regime da comunhão parcial de bens”.
Assim sendo, o companheiro e a companheira ficam numa situação cediça e de extrema inferioridade quanto à sucessão, diante do marido e da mulher. Note-se que a herança destinada ao companheiro sobrevivente é limitada aos bens adquiridos onerosamente na vigência da união estável, o que representa uma restrição, considerada injustificável por alguns doutrinadores. Há autores que querem uma pacificação (uma real e efetiva paridade jurídica) entre união estável e casamento.
Reitera-se que tanto o casamento como a união estável têm início por existência de elo afetivo, e se diferenciam pelo modo de constituição. Aos enlaces extra matrimoniais de pessoas que estejam impedidas de se casarem dá-se o nome de concubinato, sendo que a esses não são conferidos direitos no âmbito do direito de família, mas poderão ser conferidos na esfera obrigacional (VENOSA, 2003).
Por sua vez, o Código Civil de 2002 concede aos nubentes e aos companheiros a prerrogativa de estipularem os efeitos patrimoniais pertinentes ao casamento e à união estável. “Na ausência de estipulação, aplicar-se-á o regime de comunhão parcial tanto ao casamento quanto à união estável” (VENOSA, 2003, p. 61). Desse modo, no caso de desagregação intervivos, foram concedidos direitos semelhantes às espécies de entidades familiares, assegurando-lhes igualdade de tratamento.
Muitos aspectos cingem o instituto da união estável, de acordo com Silva e Silva (2006) o conflito surgiu com a entrada em vigor do Código Civil de 2002 que tratou da situação da união estável de forma muito superficial, diversamente do que se esperava, pois se vislumbrava uma grande evolução, o que não aconteceu, pelo menos no que tange à tutela sucessória da união estável. “Tal norma ao invés de manter ou até mesmo ampliar este direito, fez exatamente o contrário, prejudicando o direito do companheiro sobrevivente em comparação com o do cônjuge” (p. 12).
Ao analisar o artigo 1790 do Código Civil de 2002, que registra o direito sucessório dos companheiros, observa-se a injustiça cometida pelo legislador originário desse texto civilista, se comparado ao tratamento do direito sucessório dispensado aos cônjuges (STRAZZI, 2015). “Tal afirmativa se dá pelo fato da concorrência com outros parentes sucessíveis do de cujus ser muito maior no caso de união estável, dificultando o alcance no patrimônio devido a título de herança” (p. 5).
Entende-se que desse problema, criou-se, portanto, um grande retrocesso, tendo em vista que se esperava uma revolução jurídica no Direito Privado com a entrada do Código Civil de 2002, colocando-se, pois, um ponto final nas questões controvertidas existentes e que persistiam na vigência do diploma civilista anterior.
Frisa-se que no ordenamento jurídico atual, o companheiro sobrevivente concorrerá com parentes distantes, o que é reconhecida e juridicamente injusto.
Ou seja, aquele que deu boa parte de sua vida a dedicação do outro, vindo a disputar com primo (a) do de cujos, que via de regra, não possui nenhuma intimidade com o autor da herança, pois, trata-se apenas de parente em linha colateral de 4º grau, e mesmo assim herdará maior parte do patrimônio, deixando, o(a) companheiro(a) sobrevivente a mercê da mau elaboração do legislador do art. 1.790 e seus incisos.
Felizmente, a inconstitucionalidade do art. 1790 do Código Civil de 2002 vem sendo reconhecida por alguns Tribunais Estaduais, que estão deixando de aplicá-la tendo em vista tamanha injustiça nele incorporado.
Em sede de direitos sucessórios na união estável é onde o Código Civil de forma desmesurada acabou infringindo o princípio maior da Constituição da República de 1988 que impôs o predomínio da igualdade e elevou a união estável à mesma situação que o casamento. O tratamento desigual dado ao cônjuge e ao parceiro não se justifica, em vista do reconhecimento da união estável como entidade familiar.
Tal fato se torna ainda mais grave, se não houver ao menos uma escritura pública declaratória. Nesse caso, se uma das partes vem a óbito, seria ainda necessário entrar com uma Ação de Reconhecimento de União estável Post mortem, para assegurar os direitos sucessórios. Nesse caso, sem possibilidade de opção, o regime considerado será o parcial de bens!
A grande verdade é que, seja através do casamento ou da união estável, construir uma família, pode ser a maior obra da sua vida. Assim sendo, é importante resguardar os seus direitos e estar consciente das consequências que essa escolha pode causar.
A propósito, existem aqueles que acreditam que o mais importante é estarem juntos, entretanto, no que tange ao direito sucessório, a sua escolha pode fazer toda a diferença!