ASSOCIAÇÃO DE SOCORRO MÚTUO: UM ESTUDO NO ATUAL CENÁRIO BRASILEIRO

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CONCLUSÃO

Em análise dos fundamentos citados, resta evidente que atividade desenvolvida pelas associações de socorro mútuo é absolutamente distinta do seguro empresarial, aquele exercido por sociedades anônimas. Tal diferenciação foi colocada de forma cristalina, pois as características do seguro empresarial são inexistentes no socorro mútuo.

A diferença elementar está no fato do seguro empresarial proteger o segurado contra evento futuro e incerto e a associação de socorro mútuo fazer contra evento pretérito e ocorrido.

Sobre esse ponto, interessante fazer a seguinte indagação: (i) Qual a proibição (legislação) de um grupo de pessoas que se unem por um interesse comum e decidem dividir as despesas (certas e passadas) entre elas ocorridas?; (ii) Pode considerar atividade de seguro sem a devida autorização o condomínio que realiza o rateio das despesas entre os condôminos? e (iii) Se uma família, em comum acordo, decide dividir as despesas (certa a passada) de seus membros, essa entidade (família) está agindo como uma “seguradora” e, consequentemente, deverá sofrer a intervenção da SUSEP?.

As indagações acima traz de forma fiel a atividade exercida pela associaçãode socorro mútuo, a qual não possui qualquer impedimento legal. Ainda utilizando o terceiro exemplo, a família poderia criar uma associação para formalizar esse interesse comum (ajuda mútua aos membros), ou seja, organizar os membros em torno desse objetivo e mesmo nessa hipótese não configuraria uma seguradora.

Não se pode conceituar um instituto fazendo analogias ou traçando semelhanças, com intuito de tentar configurar a atividade da associação como seguradora. Para tanto é necessário o estudo aprofundado, para assim verificar cada peculiaridade, estas que fazem com que os institutos que possam parecer semelhantes, sejam completamente distintos.

A verificação apenas das semelhanças ou só a realização de analogias, sem considerar as peculiaridades da atividade da associação, traz uma conclusão errada. Trata-se de uma falácia, a indução de um raciocínio errado com aparência de verdadeiro. Exemplificando de maneira bem simples:

_ É seguradora porque restitui o carro quando roubado

_ João teve o carro roubado e restituído por seu pai

_ Logo, o pai de João é uma seguradora

Veja que ao conceituar de forma generalizada, sem qualquer estudo das peculiaridades, traz uma conclusão errada, não podemos confundir sua natureza, atividade, finalidades e suas peculiaridades que faz ser diferente do seguro empresarial.

Ao logo dos debates sobre o tema foram verificando tais especificidades e reconhecendo a inegável diferença entre o seguro empresarial e a atividade exercida por uma associação de socorro mútuo, resultado disso são as decisões judiciais dos Tribunais Federais e Estaduais, bem como os pareceres do Poder Legislativo.

Portanto, a partir dos fundamentos jurídicos e doutrinários pode concluir que a atividade de uma associação está amparada pelo art. 5º, incisos XVII a XXI da Constituição Federal, Código Civil em seu artigo 53 e seguintes, artigo 2º do Decreto Lei nº. 2063/40 e artigo 143, §1º do Decreto Lei nº. 73/66, não havendo nenhuma ilicitude ou semelhança com o seguro empresarial.


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