Transparência ativa dos sítios eletrônicos do judiciário.

Uma análise dos Tribunais de Justiça estaduais à luz dos princípios constitucionais, lei de acesso à informação e resoluções do conselho nacional de justiça

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04/02/2017 às 11:21
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4. NORMAS E INFLUÊNCIAS INTERNACIONAIS

Normas internacionais depois de serem processadas no rito constitucional se tornam parte do Ordenamento Jurídico do país. Fora isso, mesmo as que não passam nesse rito estão adquirindo cada vez mais importância, com técnicas de interpretação baseadas no direito comparado, influenciando sobremaneira o nosso sistema.

É claro perceber que, nos tempos hodiernos, o mundo se relaciona muito intensamente em diversos campos, como educação, informação, cultura e comércio. Assim alguns problemas passam a ser compartilhados pelas nações. E, também, se torna muito difícil combater organizações supranacionais danosas aos interesses dos Estados, porque os crimes podem envolver peças, criminosos e suas instrumentalizações, além da soberania do território do Estado lesado.

Inicialmente é importante destacar a relevância do tema foi dada pela Declaração Universal dos Direitos Humanos, que foi a norma de maior marco das relações de direito internacional:

Art.19 Toda pessoa tem direito à liberdade de opinião e expressão; este direito inclui a liberdade de, sem interferência, ter opiniões e de procurar, receber e transmitir informações e idéias por quaisquer meios e independentemente de fronteiras.

A meta do Milênio é um bom exemplo da direção que as soberanias pretendem adotar, e que se relacionam diretamente com princípios que se desenvolvem a transparência, como democracia e estado de direito, explicado em capítulos anteriores: “Não pouparemos esforços para promover a democracia e reforçar o Estado de Direito, bem como o respeito por todos os direitos humanos internacionalmente reconhecidos e liberdades fundamentais, incluindo o direito ao desenvolvimento.”. Disponível em 09/05/2016 https://www.un.org/millennium/declaration/ares552e.pdf

Desta forma, os países cooperando, orientados principalmente pela Organização das Nações Unidas, ONU, buscaram grupos de estudos e adesão dos interessados para medidas efetivas e combater os problemas comuns.

Inicialmente, cabe destaque neste trabalho, o esforço para o enfrentamento da corrupção, que é um mal de proporções dantescas mundialmente e, especialmente, no Brasil, que culminou na Convenção das Nações Unidas Contra Corrupção.

Assim o item 10 da Convenção estabelece:

Tendo em conta a necessidade de combater a corrupção, cada Estado Parte,em conformidade com os princípios fundamentais de sua legislação interna, adotará medidas que sejam necessárias para aumentar a transparência em sua administração pública, inclusive no relativo a sua organização, funcionamento e processos de adoção de decisões, quando proceder. Essas medidas poderão incluir, entre outras coisas:

a) A instauração de procedimentos ou regulamentações que permitam ao público em geral obter, quando proceder, informação sobre a organização, o funcionamento e os processos de adoção de decisões de sua administração pública, com o devido respeito à proteção da intimidade e dos documentos pessoais, sobre as decisões e atos jurídicos que incumbam ao público;

b) A simplificação dos procedimentos administrativos, quando proceder, a fim de facilitar o acesso do público às autoridades encarregadas da adoção de decisões; e

c) A publicação de informação, o que poderá incluir informes periódicos sobre os riscos de corrupção na administração pública.https://www.unodc.org/documents/lpo-brazil//Topics_corruption/Publicacoes/2007_UNCAC_Port.pdf

O artigo pressupõe o reconhecimento internacional da correlação inversamente proporcional entre transparência e corrupção. É de suma importância esse reconhecimento internacional para efetivar medidas previstas, mas ainda não utilizadas.

Existem outras normas internacionais que tratam o direito à informação do Estado, ou no sentido amplo, como direitos fundamentais civis, políticos e de liberdade de expressão como a Declaração Interamericana de Princípios da Liberdade de Expressão que diz “O acesso à informação mantida pelo Estado constitui um direito fundamental de todo indivíduo. Os Estados têm obrigações de garantir o pleno exercício desse direito” e o Pacto Internacional dos Direitos Civis e Políticos que diz “Toda pessoa terá direito à liberdade de expressão; esse direito incluirá a liberdade de procurar, receber e difundir informações e ideias de qualquer natureza (...)”.

Importante lembrar que essas normas são cogentes, obrigatórias, pois todas tiveram o devido procedimento para internalizar no sistema.

A influência internacional é importante porque dela somos estimulados a rever pontos frágeis da construção cultural institucional por uma visão externa. Neste aspecto Martins Junior nota uma maior preocupação no sistema escandinavo e anglo-saxão.

Quanto maior grau de transparência não é elementar aos ordenamentos jurídicos de influência romano-germânica, florescendo no sistema anglo-saxão com muito vigor, notadamente no direito norte-americano com a edição do federal Administrative procedure Act em 1946. O direito escandinavo, principalmente na Suécia, também registra uma tradição secular de transparência administrativa. O fluxo de influência proporcionou nos países do sistema romano-germânio a adoção da transparência administrativa como pedra fundamental da estrutura e organização da administração pública e de suas relações com os administrados. (MARTINS JÚNIOR, 2004, p.27)

A Controladoria Geral da União também observa um pioneirismo dos escandinavos em seguida dos anglo-saxões.

A primeira nação no mundo a desenvolver um marco legal sobre acesso foi a Suécia, em 1766. Já os Estados Unidos aprovaram sua Lei de Liberdade de Informação, conhecida como FOIA (Freedom of Information Act), em 1966, que recebeu, desde então, diferentes emendas visando a sua adequação à passagem do tempo. Na América Latina, a Colômbia foi pioneira ao estabelecer, em 1888, um Código que franqueou o acesso a documentos de Governo. Já a legislação do México, de 2002, é considerada uma referência, tendo previsto a instauração de sistemas rápidos de acesso, a serem supervisionados por órgão independente. Chile, Uruguai, entre outros, também aprovaram leis de acesso à informação. Acesso à Informação Pública: Uma introdução à Lei 12.527, de 18 de novembro de 2011. Brasília, 2011. Disponível em: <www.cgu.gov.br>.

É nítido que a preocupação histórica na gênese da cultura institucional sobre a transparência tem relação direta com o desenvolvimento pelo índice IDH, elevando mais motivos para a quem pretende implantar o estado de bem-estar social. Porém mesmo sendo motivo suficiente, ainda existem mais como a respeitabilidade e influência internacional. A ONU trata da transparência como traço de governança e seus aspectos qualitativos.

Na comunidade das nações, o governo é considerado “bom” e “democrático” se as instituições e os processos do país forem transparentes. As instituições dizem respeito a órgãos como o Parlamento e seus vários ministérios. Seus processos incluem atividades como eleições e procedimentos legais, que devem estar livres da corrupção e prestar contas à população. O sucesso de um país em alcançar esse padrão tornou-se uma medida chave de credibilidade e respeito no mundo.

A boa governança promove a igualdade, a participação, o pluralismo, a transparência, a responsabilidade e o Estado de Direito, de forma efetiva, eficiente e duradoura. Ao pôr em prática estes princípios, vemos a realização de eleições livres, justas e frequentes, legislaturas representativas que fazem e supervisionam as leis e um judiciário para interpretá-las. Disponível em 09/05/2016 https://nacoesunidas.org/acao/governanca/

Assim o “consenso” da comunidade internacional é que a credibilidade de um país está ligada a todos os princípios já comentados neste estudo. Lembrando que todos se interligam trazendo sinergia para as normas de transparência.


5. LEGISLAÇÃO INFRACONSTITUCIONAL NACIONAL PERTINENTE

Como dito nos capítulos anteriores, o país desenvolve a normatização do dever de transparência a passos vagarosos, pela cultura da administração pública predominante ser patrimonialista, mesmo que desde a primeira constituição promulgada já haja arcabouço constitucional consistente. Apesar dos avanços não serem em um ritmo desejável, eles existem e são relevantes. Nesta secção terá destaque a legislação infraconstitucional.

Destaque inicial para a lei de arquivos, Lei 8159/91, em seu artigo 4º e 22, que assegura o direito de acesso pleno aos documentos públicos para particular, coletivo e geral, ressalvadas questões de sigilo pela segurança nacional, intimidade, honra e imagem.

Apesar da redação clara e da sustentação constitucional já tratada aqui, a lei se prende na questão de definição e gestão dos arquivos e não dispõe maior foco para transparência. Esta Lei permanece com a maioria de seus dispositivos em vigor.

A Lei 11.111/2005 estabelece que:

Art. 2º O acesso aos documentos públicos de interesse particular ou de interesse coletivo ou geral será ressalvado exclusivamente nas hipóteses em que o sigilo seja ou permaneça imprescindível à segurança da sociedade e do Estado, nos termos do disposto na parte final do inciso XXXIII do caput do art. 5º da Constituição Federal.

Percebe-se que a dicção é de mesma direção da Lei de arquivos e o seu foco se dá para regulamentar o sigilo e não da amplitude da obrigatoriedade da transparência. Esta Lei foi totalmente revogada pela superveniência da Lei de Acesso à Informação - Lei n. º 12.527/2011, lei infraconstitucional de maior impacto. Com esta Lei o foco alterou-se para transparência, estabelecendo um rol de princípios e situações práticas que devem ser seguidas por toda a Administração Pública: Órgãos Públicos, autarquias, fundações públicas, empresas públicas, sociedades de economia mista, entidades controladas direta ou indiretamente pelos entes públicos e entidades sem fins lucrativos que recebam recursos e subvenções para realização de atividade de serviço público devidamente formalizado.

É assustador como no Brasil é necessário que a Lei tenha que explicitar detalhadamente o que deve ser feito para se iniciar a reflexão dos gestores públicos, pois o cumprimento amplo da transparência já era obrigatório por todo o Ordenamento como visto nesse trabalho. O não amadurecimento do neoconstitucionalismo, a falta de costume do commom law ou até mesmo pelo nível paralisante de disfunção burocrática que elimina qualquer iniciativa dos gestores, tornando obrigação só o que estiver devidamente disposto por pormenores na legislação, induzem este comportamento.

Destarte, a nova Lei estabelece no art. 3º: observância da publicidade como preceito geral e do sigilo como exceção, deixando clara a mudança de foco já comentada; divulgação de informações de interesse público, independentemente de solicitações, divulgação de informação de maneira ativa; utilização de meios de comunicação viabilizados pela tecnologia da informação, adaptação aos instrumentos modernos; fomento ao desenvolvimento da cultura de transparência na administração pública, tentativa de combater as disfunções patrimonialistas; desenvolvimento do controle social da administração pública, efetivação da república e democracia.

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A principal mudança é de postura, saindo da divulgação apenas se solicitado, transparência passiva, para, utilizando a tecnologia disponível, divulgar as informações de interesse geral sem provocação, transparência ativa.

No mais, os artigos seguintes reforçam a ideia do amplo acesso à informação, devendo ser atualizada e integra. Quando não possível divulgar de maneira ativa, deve a administração pública explicar de maneira clara de como obter. Caso não haja negativa de informação, esta deverá ser fundamentada sob pena de responsabilidade, art. 7º, § 4º.

O artigo 8º traz relevantes obrigações como a divulgação de dados gerais para acompanhamento de ações, programas, projetos e obras, §1º, V, e obrigatoriedade de divulgação no sítio eletrônico para municípios com mais de 10 mil habitantes. O primeiro trata-se de uma cláusula aberta para definir o que seriam dados gerais, mas está cristalino que não deve dizer só o que se trata a ação, mas de dados para “acompanhar”, que dê para medir o resultado em consonância com a administração gerencial. O segundo é para efetivar algo que já deveria ser feito, mas não foi pela falta de iniciativa ou de interesse dos gestores públicos.

Percebe-se que a transparência exige bem mais que a perspectiva financeira e orçamentária, pois todo o poder é delegado pelo povo e, assim, para o povo se devem prestar contas se as ações estão se dando de maneira satisfatória.

Outro aspecto relevante está no artigo 5º, que trata que o Estado assegurará a informação por procedimentos objetivos e ágeis, de forma transparente, clara e em linguagem de fácil compreensão. A questão que se estabelece é que as informações não devem ser restritas ao linguajar de especialistas e sim ser facilitada pela compreensão fácil e legendas das rubricas.

No mais, a Lei passa a tratar do procedimento de informação passiva e das exceções que são as informações sigilosas, para proteção da intimidade e honra, segredos comerciais e segurança.

Muitos gestores alegam não cumprir as obrigações, principalmente as genéricas e de cláusulas abertas, pelo princípio da reserva do possível, ou seja, que não possuem meios para cumprir todas as obrigações seja pela limitação de recursos patrimoniais ou humanos qualificados. Porém uma administração que minimamente ciente, com dados, de como está atuando é um direito fundamental dos cidadãos, direito a boa administração. Sendo um direito fundamental, é obrigatório possuir estes dados básicos. Possuindo, o esforço da transparência ativa se limita a divulgar estas informações já disponíveis, diminuindo demasiadamente o custo da informação.

Assim a norma entende, obrigando com requisito objetivo do número da população, não ser razoável que um município com a situação semelhante ao de Newton Bello, com cerca de 10 mil habitantes em 2015 pelo censo do IBGE, que recebeu na compensação de contas apenas do Fundo de Participação dos Municípios em 2015 próximo a 4 milhões, não tenha informação gerencial suficiente para exercer a administração e manter um sítio eletrônico oficial. Disponível em 30/05/2016 em https://www42.bb.com.br/portalbb/daf/beneficiario.bbx.

Raciocínio análogo se dá ao analisar a razoabilidade de se exigir os dados para se medir os resultados dos tribunais de justiça, cujo o de menor orçamento é da ordem de aproximadamente 175 milhões, no TJ de Roraima.

Mais difícil é justificar se evadir dessa obrigação quando vários dados de produtividade já são enviados para o CNJ divulgar no “Justiça Aberta”.

No Judiciário foi editada norma específica, a Resolução 215 de 2015, pelo CNJ para regulamentar a Lei de Acesso à Informação. A Resolução reforça vários aspectos principiológicos da Lei de Acesso à Informação e dispõe de alguns itens mais concretos.

Art. 6º Os sítios eletrônicos do Poder Judiciário deverão conter:

I – finalidades e objetivos institucionais e estratégicos, metas, indicadores e resultados alcançados pelo órgão;

II – registro das competências e da estrutura organizacional, endereços, inclusive eletrônicos, e telefones das respectivas unidades e horários de atendimento ao público;

III – dados gerais para o acompanhamento de programas, ações, projetos e obras desenvolvidos;

IV – levantamentos estatísticos sobre a sua atuação;

V – atos normativos expedidos;

VI – audiências públicas realizadas e calendário das sessões colegiadas;

VII – campo denominado “Transparência”, em que se alojem os dados concernentes à:

a) programação e execução orçamentária, inclusive informações referentes a procedimentos licitatórios, com os respectivos editais e resultados, e a todos os contratos celebrados;

b) Tabela de Lotação de Pessoal (TLP) de todas as unidades administrativas e judiciárias, com identificação nominal dos servidores, cargos efetivos, cargos em comissão e funções de confiança ocupadas, atualizadas semestralmente...

Pode-se perceber que os incisos II e III não diferem da Lei, mas os incisos I, IV, V, VI e VII vão um pouco além. O inciso I trata de divulgar uma ótica fundamental para o campo do planejamento da administração, o IV revela a preocupação com a divulgação ampla de dados de resultados e o V, VI e VII de organização.

O artigo 5º, inciso III estabelece que a transparência ativa se deva dar sob “livre acesso, a integralidade, a exatidão e a integridade das informações alusivas à gestão administrativa, financeira e orçamentária dos tribunais e conselhos”. Há uma ascensão da priorização da visão administrativa em detrimento da visão puramente de gastos. Atos discricionários e de administração continuam com sua natureza própria, porém existe a preocupação de se prestar contas por esses atos, afinal os atos dos administradores públicos são delegados pelo povo.

Cabe rememorar que as obrigações advindas de cláusulas abertas não são meramente decorativas e sem efeito, mas produzem efeito concreto pela interpretação do operador do Direito em conjunto com todo o sistema normativo.

O legislador vale-se de cláusulas gerais, abdicando da técnica regulamentar que, na égide da codificação, define os tipos jurídicos e os efeitos deles decorrentes. Cabe ao intérprete depreender das cláusulas gerais os comandos incidentes sobre inúmeras situações futuras, algumas delas sequer alvitradas pelo legislador, mas que se sujeitam ao tratamento legislativo pretendido por se inserirem em certas situações-padrões: a tipificação taxativa dá lugar a cláusulas gerais, abrangentes e abertas. (TEPEDINO, 2001, p. 9)

Assim toda a normatização da Lei de Acesso à Informação e Resolução CNJ 215 de 2015 tem força normativa e devem ser seguidas pela administração pública do judiciário, seja de maneira principiológica ou com definição mais concreta.

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Sobre o autor
Hugo Graça Pinheiro

Graduado em Ciências Contábeis pela Universidade Federal do Maranhão.Graduado em Direito pela Universidade Federal do Maranhão.Especialista em Auditoria e Controladoria pelo UNICEUMA. Especialista em Gestão Pública pela Universidade Federal do Maranhão.Analista Judiciário - Contador do Tribunal de Justiça do Maranhão.

Informações sobre o texto

Este texto foi publicado diretamente pelos autores. Sua divulgação não depende de prévia aprovação pelo conselho editorial do site. Quando selecionados, os textos são divulgados na Revista Jus Navigandi

Mais informações

Monografia apresentado à coordenação do Curso de Direito da Universidade Federal do Maranhão.

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