O Ser mulher

06/03/2017 às 14:20
Leia nesta página:

Com este breve resumo, busca-se refletir sobre o vasto mundo feminino de teses e antíteses, universo de sabedoria e fonte mágica de onde emerge a produção da vida.

A Mulher sábia

Reveste-se de força e dignidade;  sorri diante do futuro.

Fala com sabedoria e ensina com amor. Provérbios 31:25-26

Mulher – do latim mulier – substantivo que identifica o ser humano do sexo feminino. Embora engrandecida nos poemas de beleza e de amor, ao longo do caminho percorrido pela humanidade, em sua jornada na busca por reconhecimento da igualdade de gênero a mulher, único ser humano capaz de dar continuidade à espécie humana, vem travando árduas lutas por dignidade, direitos e justiça, sendo aviltada em todos os setores da sociedade, onde se despreza a relevância da qual a condição feminina se reveste, colidindo com submissão, ignomínia, preconceitos e injustiças sociais de ordens várias. Segundo Fabio Konder Comparato, a discriminação contra a mulher também ocorre ao ser negado o direito à diferença, ou seja, “a recusa do reconhecimento e respeito dos dados biológicos e valores culturais componentes do universo feminino”.

Há um provérbio hindu que diz: “o nascimento de uma menina é como a chegada de Lakshmi”. Lakshimi é uma deusa hindu, retratada segurando flores de lótus, representando a riqueza e a boa sorte. Considerando o valor que, em verdade, a mulher deveria representar, o provérbio é muito adequado. No entanto, a história tem demonstrado exatamente o contrário. Da antiguidade ao momento atual o percurso das mulheres tem sido árduo e marcado por injustiças. Mesmo firmes e resistentes, ainda assim, de longe, o seu papel tem sido relegado a plano inferior.

 Não obstante a tradição de fé, no povo de Israel seja marcada pela atuação da força feminina onde a resistência se esgotou, e a propagação do Cristianismo no mundo ocidental, nada disso foi empecilho para que ao longo dos tempos as mulheres das mais diversas sociedades fossem silenciadas, tratadas como seres sub-humanos.

O maior dos homens na história da humanidade, Jesus Cristo, foi quem travou a primeira luta em defesa das mulheres, contra o preconceito, a forma desprezível e toda a injustiça com a qual eram tratadas. Jesus pregava para todos que o seguiam, não apresentando distinção entre homens e mulheres, modificando a ordem social da época, repleta de privilégios para os homens. Sua marca surtiu alguns efeitos, no entanto, o processo de igualdade tem sido demasiadamente lento e as mulheres continuam vítimas da escassez de direitos de toda sorte, desde a exclusão da sucessão de bens na herança, à personificação do nome (filha “de” ou esposa de), ou o casamento por pacto entre famílias, sempre em obediência ao interesse dos homens. Reitere-se que, mesmo no mundo ocidental, após Jesus Cristo, as mulheres que transgrediram as normas sofreram rigorosas punições, como exemplo, a clausura em conventos. Sem contar com o nefasto fenômeno repressor da bruxaria, verificado na Europa, entre os séculos XIV ao XVIII. Mais de quatro séculos manchados pela macabra campanha de significado religioso, político e sexual, levada a efeito pela igreja e pelo Estado. Avalia-se que no período executaram-se aproximadamente 9 (nove) milhões de pessoas, das quais, mais de 80% (oitenta por cento) eram mulheres.

Não muito distante dos dias atuais (até o final do século XVIII, com a Revolução Francesa), vigorou uma teoria científica – dominante – em que  a mulher era  considerada imperfeita por natureza. Tratava-se do "modelo do sexo único", descrito por Thomas Laqueur, situando a mulher num degrau abaixo do homem na hierarquia social, a partir da ideia de que as mulheres seriam "homens invertidos", porque seus órgãos sexuais eram os mesmos dos homens, mas voltados para dentro do corpo. Por esta razão, as mulheres não passavam de seres ontologicamente impotentes e mentalmente frágeis. Esses motivos foram usados para fundamentar a supremacia masculina.

Embora a cidadania e o voto estejam diretamente relacionados, desde a civilizações greco-romanas, grandes batalhas foram travadas para garantir o direito das mulheres em participar das decisões políticas. No século XVIII, os ideais iluministas de igualdade, liberdade e fraternidade serviram de parâmetro para a concepção do padrão de direitos e deveres dos cidadãos de um país. E nesse período de luz, muitas mulheres estabeleceram embates, e gravaram suas convicções em prol da igualdade de direitos entre os gêneros, como a francesa Olympe de Gouges que, em 1791, escreveu a Declaração dos Direitos da Mulher e da Cidadã, pedindo a supressão dos apanágios masculinos, ideias que levaram-na à guilhotina em 1793,  e a britânica, Mary Wollstonecraft que escreveu “A reivindicação dos Direitos da Mulher”.

Ressalta-se que, até o início do século XX, o voto, em quase todos os países era um direito essencialmente masculino. Neste cenário, surgem o movimento das mulheres conhecidas como sufragistas.

As vitórias alcançadas entre os anos de 1976 a 1985, foram determinantes para o início da justa igualdade entre os gêneros, a ponto desse período ser declarado “a Década da mulher”. Em 18/12/1979, foi promulgada no âmbito da Organização das Nações Unidas a Convenção sobre a Eliminação de todas as Formas de Discriminação contra as Mulheres (Carta Internacional dos Direitos da Mulher). Destacam-se os direitos relacionados à vida, liberdade, igualdade, informação, educação, saúde, dentre outros.

O fardo exige esforço, a caminhada longa, e contra as mulheres ainda sopram ventos de injustiças, faltando muito espaço a percorrer e conquistas a alcançar, posto que, nos dias atuais, algumas culturas mais severas estampam a bárbara e atroz realidade feminina. Exemplificando, traz-se à baila, dados informados no site Maps4aid.com (que mapeia e documenta crimes contra a mulher), após consulta a especialistas em gênero, indicam a Arábia Saudita como o segundo pior lugar para as mulheres, depois da Índia. De acordo com Semear Padinzjharedil, "É um milagre que uma mulher sobreviva na Índia. Mesmo antes de ela nascer, ela corre risco de ser abortada devido à nossa obsessão por filhos homens".

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Não obstante os direitos desses bravos seres humanos serem ignorados ao longo da estrada, recentemente, em especial nas civilizações mais desenvolvidas, a sapiência humana tem progredido e firmaram-se muitas conquistas, garantindo-se e institucionalizando-se direitos às mulheres, as quais têm se destacado na administração de negociações comerciais e na política, bem como, brilhado em grandes competições desportivas. Mesmo assim, em pleno século XXI, noticiam-se casos de submissão e violência e vários tipos de maus-tratos contra as mulheres, assuntos corriqueiros em todo o mundo.

Contudo, esses bravos seres humanos seguem a marcha da vida, transformando sua dor em coragem, e até em arte. Para ilustrar este artigo reverencia-se a italiana Artemísia Gentileschi, a brasileira Maria da Penha e paquistanesa Malala Yousafzai, pela bravura de suportar e vencer a aflição.

No ano de 2016, a cantora Madonna, através do Billboard Woman in Music 2016, foi eleita a “Mulher do Ano”. Na solenidade ela fez um discurso sobre a sua resistência contra preconceito com o qual foi tratada em 34 (trinta e quatro) anos de carreira. Transcreve-se, a seguir, trecho de sua fala:

“O que eu gostaria de dizer para todas as mulheres que estão aqui hoje é: Mulheres têm sido oprimidas por tanto tempo que elas acreditam no que os homens falam sobre elas. Elas acreditam que elas precisam apoiar um homem. E há alguns homens bons e dignos de serem apoiados, mas não por serem homens, mas porque eles valem a pena. Como mulheres, nós temos que começar a apreciar nosso próprio mérito. Procurem mulheres fortes para serem amigas, para serem aliadas, para aprenderem com elas, para serem inspiradas, para serem apoiadas e para serem instruídas.”.

Enfim, o ser humano já evoluiu bastante, de modo suficiente para descartar comportamentos mesquinhos. Com este breve resumo do incompreendido SER, mulher, busca-se refletir sobre o vasto mundo de teses e antíteses femininos, universo de sabedoria e fonte mágica de onde emerge a produção da vida. Preciosidade que, além de juntar e desenvolver os papéis de esposa, mãe e administradora do lar, ainda consegue trabalhar e contribuir para o crescimento da economia mundial. Se não bastasse tudo isso, com a própria vida calcada na mais espinhosa luta do ser humano,  segue buscando atenuar as mazelas do mundo e melhorar a humanidade. Muitas mulheres, mesmo marcadas em submissão e sofrimento, continuam com a magnitude de quem não aceita a minudência e se eleva na serena felicidade, persistindo na criação da possibilidade de vitórias.

Referências:

  1. A "caça às bruxas": uma interpretação feminista: Disponível em: https://www.espacoacademico.com.br/053/53angelin.htm [consultado em 05-03-2017].
  2. A condição feminina: uma breve retropesctiva histórica. Disponível em: http://www.ebah.com.br/content/ABAAAAecQAB/a-condicao-feminina-breve-retropesctiva-historica?part=2 [consultado em 05-03-2017].
  3. Madonna - Discurso. Disponível em: http://madonnaonline.com.br/2016/12/12/madonna-faz-discurso-sobre-preconceito-e-resistencia-ao-receber-premio-de-mulher-do-ano/ [consultado em 05-03-2017].
  4. Marianna de Leyva – Monaca di Monza –  http://www.treccani.it/enciclopedia/virginia-maria-de-leyva_(Dizionario-Biografico)/ [consultado em 05-03-2017].
  5. Mary Wollstonecraft. Disponível em: http://www.liberal-social.org/mary-wollstonecraft [consultado em 05-03-2017].
  6. Mulher. Disponível em: https://www.priberam.pt/dlpo/MULHER [consultado em 05-03-2017].
  7. O DIREITO DAS MULHERES INDIANAS - Disponível em: http://jornalggn.com.br/blog/luisnassif/o-direito-das-mulheres-indianas [consultado em 05-03-2017].
  8. Olympe de Gouges. Disponível em: http://www.toupie.org/Biographies/De_gouges.htm [consultado em 05-03-2017].

Curiosidades:

a. Artemísia Gentileschi – A pintora que, século XVII, foi estuprada e teve sua denúncia questionada publicamente, sofreu com a indiferença e a rejeição do mundo artístico se sua época, por ser mulher.

b. Em 1832, Nísia Floresta publicou “Direitos das mulheres e injustiças dos homens”, artigo em que exigia igualdade e educação para todas.

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Sobre a autora
Liduina Araújo

Mulher, mãe, esposa, avó. Graduada em Direito pela Universidade Federal do Ceará - UFC (1997). Advogada (1998 a 2013). Analista Processual - Ministério Público do Trabalho - MPT.

Informações sobre o texto

Este texto foi publicado diretamente pelos autores. Sua divulgação não depende de prévia aprovação pelo conselho editorial do site. Quando selecionados, os textos são divulgados na Revista Jus Navigandi

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