Tribunal do Júri:inovação da tese defensiva na tréplica

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3 DEBATES EM PLENÁRIO

Os debates em plenário são regulados pelo art. 476 do CPP, sendo o momento processual em que as partes manifestarão sua tese sobre os fatos nos termos da pronúncia, ou das decisões posteriores que julgarem admissível a acusação, sustentando, se for o caso, a existência de circunstâncias agravantes. 

Nucci (2008, pg.193) ensina que após a colheita de provas, iniciam-se os debates, tendo a acusação e a defesa uma hora e meia cada uma quando julgado somente um réu, e duas horas e meia a cada parte se houver mais de um réu.  Devendo o juiz presidente controlar a efetividade do período reservado a cada uma das partes, não permitindo o excesso. Se o processo é complexo e em situação excepcional poderá a defesa requerer ao juiz presidente a dilação de seu tempo, que em período razoável, sem exageros, o magistrado poderá deferir. Como no Tribunal do Júri, garante-se a plenitude de defesa e não da acusação, a extensão do tempo para o defensor não implica, na dilação para igual período para o órgão acusatório. Porém se as partes concordarem em haver extensão do período de manifestação para ambas, igualmente assim caminhará a decisão do juiz.

Durante os debates as partes não poderão sob pena de nulidade fazer referências: a) à decisão de pronúncia, às decisões posteriores que julgaram inadmissível a acusação ou a determinação do uso de algemas como argumento de autoridade que beneficiem ou prejudiquem o acusado; b) o silêncio do acusado ou à ausência de interrogatório por falta de requerimento em seu prejuízo. (art. 478, I e II do CPP).

Para alguns doutrinadores, como Tourinho Filho (2010, p. 767), o legislador ao estabelecer as restrições contidas no art. 478 do CPP, pretendeu garantir uma paridade de armas entre a defesa e acusação, porém critica o fato da acusação não poder fazer referências aos termos da pronúncia:

(...) Pretendeu-se com essas restrições estabelecer uma paridade de armas. Se a Acusação não pode tirar partido do silêncio do réu ou da sua recusa a comparecer à sessão de julgamento, ela também não pode prevalecer-se dos argumentos invocados pelo Juiz para a pronúncia. A primeira restrição é válida. É direito constitucional do cidadão. A segunda, não, é um direito do Acusador sustentar a pronúncia. E como sustentá-la sem a ela se referir nos pontos mais importantes?

O art. 479 do CPP, proíbe que durante o julgamento haja leitura de documento ou apresentação de qualquer objeto, que não tiver sido juntado aos autos com antecedência mínima de 3 dias úteis, dando ciência a outra parte.

A produção de provas durante o julgamento, entende Mirabete (2003, p. 1213) ser possível mesmo sendo depois da pronúncia, mas deverá ser requerida tempestivamente e cientificada a parte contrária com antecedência. Porém, entende o doutrinador ser nulo o julgamento se as provas forem apresentadas em plenário durante os debates, sem que tenha concedido ciência anteriormente à parte contrária, pois estaria afetando o princípio do contraditório, causando surpresa a parte adversa.

O art. 497, inciso XII, do CPP, estabelece que é atribuição do juiz presidente do Tribunal do Júri, regulamentar, durante os debates, a intervenção de uma das partes, quando a outra estiver com a palavra, podendo conceder até 3 minutos para cada aparte requerido, que serão acrescidos ao tempo desta última.

Sobre o assunto, Campos (2013, p. 230) explica que:

Aparte é a interrupção, requerida ou não, consentida ou não, da fala do orador por seu adversário para dizer algo. (...) O magistrado deverá ter muita cautela na concessão dos apartes requeridos, quando negados pelo orador, pois terá que equilibrar a ordem dos debates de um modo tal que não impeça alguma intervenção esclarecedora do aparteante, nem interrompa continuamente o expositor, fazendo-o perder o fio lógico condutor de sua oração (...).

Os apartes não são discursos paralelos, estes devem ser evitados pelo juiz presidente, pois provocam confusão no julgamento, é o que menciona Nucci (2008, p. 203):

Não se deve confundir o aparte com o denominado discurso paralelo, significando este a manifestação da parte contrária, sem autorização de quem está discursando, provocando a sobreposição de falas e, consequentemente, a ininteligência por pare dos jurados a respeito do que se passa e das ideias desenvolvidas. Cabe, nesta hipótese, a interferência do juiz presidente, coibindo o discurso não autorizado e causador da confusão.

Com o término da oratória pelo defensor do acusado, dispõe o art. 477, caput, do CPP, que será concedido ao Ministério Público replicar, em uma hora, e a defesa treplicar, em igual tempo. Sendo o tempo computado em dobro se houver mais de um réu art. 477, §2º, CPP.

A réplica é um direito exclusivo da acusação, e com a sua utilização dará direito à defesa ao uso da tréplica, em homenagem ao contraditório e à ampla defesa. Porém se o promotor não requerer o tempo para a réplica, não pode a defesa exigir que o faça nem tampouco utilizar o momento da tréplica. (NUCCI, 2008, p. 204).

Avena (2014, p.705), explica que:

A réplica é faculdade da acusação. Logo, não é obrigatória, ainda que, no curso dos debates, a acusação faça referências sugestivas de que pretenderá exercer esse direito após a exposição da defesa. Em consequência, se esta não esgotar suas teses no tempo ordinário, reservando uma ou mais para expor durante a tréplica, correrá o risco de não ter oportunidade para sustentar os argumentos postergados perante o Conselho de Sentença, caso a acusação resolva não ir à réplica; Não pretendendo replicar, descabe à acusação, tão logo indagada pelo juiz a respeito, tecer comentários, tais como “não é necessário, pois os fatos estão suficientemente comprovados”, pois, se o fizer, abrirá à defesa o direito à tréplica, que poderá exercê-lo pela integralidade do tempo previsto no art. 477, caput, e seu § 2º.

Nucci (2008, p. 205) esclarece que o Ministério Público ao ser consultado sobre o direito a réplica, não poderá mencionar qualquer comentário e sim simplesmente negá-lo, pois se fizer o defensor passará a ter o direito de usar a tréplica em seu tempo completo.

Mesmo entendimento é manifestado por Barros (2008, p. 131):

A réplica é uma faculdade, portanto, quando o juiz perguntar ao representante do Ministério Público: “V. Exa. Pretende ir à réplica?”, o promotor de Justiça deve responder: “Não”. Se o promotor de Justiça responder: “Não Exa., já existem elementos suficientes para se fazer justiça e concordar o réu”, o promotor terá feito uma réplica de dois segundos; portanto, o juiz deve consultar a defesa sobre a necessidade de ir à tréplica”

A polêmica em relação à tréplica se dá na possibilidade da defesa apresentar uma tese nova, até então não questionada durante a instrução processual e nos debates.

A questão é polêmica porque não tem uma lei que a regulariza, havendo entendimentos doutrinários e jurisprudências diversos.

E para entender os fundamentos doutrinários que são utilizados, torna-se necessário o entendimento de três princípios constitucionais, consistente no contraditório, na plenitude de defesa e no devido processo legal.


4. PRINCÍPIOS

4.1 CONTRADITÓRIO

O artigo 5º, inciso LV da Constituição Federal, assegura aos litigantes em processo judicial ou administrativo, e aos acusados em geral o contraditório e ampla defesa, com os meios e recursos a eles inerentes.

O Princípio do Contraditório consiste na possibilidade que as partes possuem de contraditar as alegações produzidas pela outra, Paulo e Alexandrino (2012, p. 187), ensinam que:

Por contraditório entende-se o direito que tem o indivíduo de tomar conhecimento e contraditar tudo que é levado pela parte adversa ao processo. É o princípio constitucional do contraditório que impõe a condução dialética do processo, significando que, a todo ato produzido pela acusação, caberá igual direito da defesa de opor-se, de apresentar suas contrarrazões, de levar ao juiz do feito uma versão ou uma interpretação diversa daquela apontada inicialmente pelo autor. O contraditório assegura, também, a igualdade dos pares no processo, pois equipara, no feito, o direito da acusação com o direito da defesa.

Explica Vargas (2010, p.361) que o “contraditório é um dos princípios mais caros ao processo, constituindo verdadeiro requisito de validade do processo, na medida em que a sua não observância é passível de nulidade absoluta”.

Donizetti (2012, p. 90) menciona que o princípio do contraditório apresenta duas dimensões, uma no sentido formal, fundamentada no direito da parte de participar do processo e a outra na capacidade que tem essa participação de influenciar o convencimento do magistrado.

Greco Filho (1996, p. 90), menciona que o contraditório se efetiva se houver disposto os seguintes elementos:

O contraditório se efetiva assegurando-se os seguintes elementos: a) o conhecimento da demanda por meio de ato formal de citação; b) a oportunidade, em prazo razoável, de se contrariar o pedido inicial; c) a oportunidade de produzir prova e se manifestar sobre a prova produzida pelo adversário; d) a oportunidade de estar presente a todos os atos processuais orais, fazendo consignar as observações que desejar; e) a oportunidade de recorrer da decisão desfavorável. 

No âmbito do Processo Penal, as decisões judiciais devem verificar a ocorrência do princípio do contraditório, pois se o julgador proferir decisão exclusivamente sobre documentos em que não houve a observância do referido princípio, a mesma será nula, foi o entendimento proferido pela quarta turma, do Tribunal Regional Federal – 1ª Região, Desembargador Federal I'TALO FIORAVANTI SABO MENDES:

PENAL. PECULATO. PROVA INDICIÁRIA. PROVAS PRODUZIDAS NA ESFERA ADMINISTRATIVA SEM A OBSERVÂNCIA DO PRINCÍPIO CONSTITUCIONAL DO CONTRADITÓRIO. INAPTIDÃO PARA FUNDAMENTAR UMA CONDENAÇÃO NA ESFERA PENAL. SENTENÇA REFORMADA. ABSOLVIÇÃO COM FUNDAMENTO NO ART. 386, INCISO VII, DO CÓDIGO DE PROCESSO PENAL. PRINCIPIO DO IN DUBIO PRO REO. 1. A prova indiciária hábil a embasar um decreto condenatório é aquela que encontra suporte, amparo, nos demais elementos probatórios coligidos aos autos, o que não é a hipótese dos autos (Precedentes do STF, STJ e deste Tribunal). 2. A condenação somente poderá estar fundamentada nas provas colhidas na esfera administrativa e durante a fase do inquérito policial, se forem confirmadas, posteriormente, em juízo, com a devida observância do princípio constitucional do contraditório, pois vigora no processo penal brasileiro a regra do juízo de certeza. 3. In casu, o magistrado sentenciante, para condenar as rés, ora apelantes, baseou-se exclusivamente no procedimento administrativo - feito sem observância do princípio do contraditório e da ampla defesa - o que não se apresenta juridicamente possível. 4. As provas colhidas em juízo, ao longo da instrução criminal, são insuficientes para concluir que as apelantes teriam, de fato, de forma livre e consciente praticado o delito que lhes é imputado, portanto, a v. sentença condenatória deve ser reformada, com fundamento no art. 386, VII, do Código de Processo Penal. 5. Apelações providas.

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Fernandes (2005, p. 61) destaca que:

No processo penal é necessário que a informação e a possibilidade de reação permitam um contraditório pleno e efetivo. Pleno porque se exige sua observância durante todo o desenrolar da causa, até seu encerramento. Efetivo porque não é suficiente dar à parte a possibilidade formal de se pronunciar sobre os atos da parte contrária, sendo imprescindível proporcionar-lhe os meios para que tenha condições reais de contrariá-los.

Por fim, o princípio do contraditório deve ser observado em todas as fases processuais, por todos os integrantes do processo, é um dos princípios mais importantes do processo, tendo em vista a garantia dada às partes de se manifestarem, exercendo assim a igualdade processual, ou seja, a igualdade entre as partes que se encontram num mesmo plano.

4.2 DEVIDO PROCESSO LEGAL

Disposto no art. 5º, inciso LIV, da Constituição Federal, o princípio do devido processo legal, assegura que ninguém será privado da liberdade ou de seus bens sem um processo com todas as suas etapas previstas em lei.

Menciona a doutrina que esse princípio tem sua origem inglesa disposto na Carta Magna de 1215, a qual dizia que “nenhum homem será detido ou preso, nem privado de seus bens, banido ou exilado ou, de algum modo, prejudicado, nem agrediremos ou mandaremos agir contra ele, senão mediante um juízo legal de seus pares ou segundo a lei da terra”.

Paulo e Alexandrino (2012, p. 184), explicam que:

O princípio do devido processo legal deve ser entendido como garantia material de proteção ao direito de liberdade do indivíduo, mas também é garantia de índole formal, num dado processo restritivo de direito. Significa dizer que deve ser assegurada ao indivíduo paridade de condições em face do Estado, quando este intentar restringir a liberdade ou o direito aos bens jurídicos constitucionalmente protegidos daquele.

Vargas (2010, p. 359) divide o princípio do devido processo legal em duas etapas: “legal objeto ou formal, sendo a exigência de um processo justo e legalmente regulado, e legal substantivo ou material, o que permite ao judiciário controlar o arbítrio do legislador, impedindo-lhe de criar leis imoderadas”.

Prado (1999), menciona que o princípio do devido processo legal estabelece que qualquer pessoa somente será submetida a julgamento se tal conduta estiver previamente estabelecida em lei, devendo ser conduzido por um juiz imparcial, e por partes em igualdade de condições.

4.3 PLENITUDE DE DEFESA

O art. 5º, inciso XXXVIII, da Constituição Federal, reconhece a instituição do júri, como organização que a lei lhe der, assegurando: a) plenitude de defesa; b) o sigilo das votações; c) a soberania dos veredictos; d) a competência para o julgamento dos crimes dolosos contra a vida.

O princípio da plenitude de defesa determina que, “no júri não basta a ampla defesa cabível em todos os processos, é necessário que ela seja plena, ou seja que o trabalho do defensor se situe acima da média, seja o mais perfeito possível”. Campos (2013, p. 8)

Estefam (2009, p 13) diz que: “a defesa exercida pelo Tribunal do Júri não é simplesmente ampla, mas plena. (...) devendo ser assegurada com mais vigor, disponibilizando-se um número maior de meios e recursos para o seu exercício”.

Tourinho Filho (2010, p. 755) explica a diferença entre os princípios da ampla defesa e da plenitude de defesa:

Ampla defesa é uma defesa vasta, espaçosa. Já a plenitude de defesa, além de vasta é completa, plena. Evidentemente que a plenitude de defesa não deve ficar angustiada dentro do limitado encerro das provas, do contraditório, da recusa dos jurados, da paridade de armas. A acusação também goza desses direitos. Seria o mesmo que ampla defesa. Mas estamos convencidos de que a plenitude tem um campo mais vasto, mais profundo, que estende ao protesto por novo Júri, aos embargos infringentes e até mesmo à revisão criminal, malgrado a soberania dos vereditos. Todas essas normas integram e perfazem a plenitude de defesa.

Importante citar que a jurisprudência vem entendendo ser o princípio da plenitude de defesa mais abrangente que a ampla defesa, como mencionado no julgado proferido pela Terceira Câmara Criminal do Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul, Relator Nereu José Giacomolli:

RECURSO EM SENTIDO ESTRITO. TRIBUNAL DO JÚRI. PRELIMINARES. NULIDADE POR AUSÊNCIA DE REQUISIÇÃO DE RÉU PRESO PARA AUDIÊNCIA. NULIDADE POR REALIZAÇÃO DE INTERROGATÓRIO SEM A PRÉVIA CITAÇÃO DOS COACUSADOS. NULIDADE POR COLIDÊNCIA DE DEFESA. 1. A garantia da plenitude de defesa, assegurada pela Constituição Federal aos acusados de crimes dolosos contra a vida, é composta não apenas pelo exercício da defesa técnica, mas, também, pela defesa pessoal. Exige, a Constituição Federal, no âmbito do Tribunal do Júri, mais que a ampla defesa, ou seja, a plenitude de defesa (art. 5º, XXXVIII)...

Alguns doutrinadores, porém dizem que o princípio da plenitude de defesa decorre do princípio do contraditório, porém Barros (2008, p. 3), diz ser um equívoco esse entendimento, pois o “princípio do contraditório é consequência lógica da igualdade”:

De forma analógica, podemos dizer que, em uma guerra, ou seja, em um processo, devem-se propiciar as mesmas armas aso contendores, e, em nenhuma hipótese, será possível conceder um melhor armamento a uma das partes. Veja que o princípio supõe completa igualdade entre acusação e defesa; portanto, qualquer restrição ilegal poderá acarretar: a) cerceamento de defesa; b) cerceamento de acusação.

Por fim cabe destacar que a possibilidade de plenitude de defesa ser bem mais abrangente que a ampla defesa justifica-se pelo fato de que quem está julgando a causa são cidadãos leigos, tendo o promotor e o defensor do acusado total liberdade de argumentos, não se limitando aos jurídicos. Gomes (2014).

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Sobre os autores
Alessandro Dorigon

Mestre em direito pela UNIPAR. Especialista em direito e processo penal pela UEL. Especialista em docência e gestão do ensino superior pela UNIPAR. Especialista em direito militar pela Escola Mineira de Direito. Graduado em direito pela UNIPAR. Professor de direito e processo penal na UNIPAR. Advogado criminalista.

Graziele Ansanelo

Formada em direito pela Universidade Paranaense - Unipar. Servidora pública do Tribunal de Justiça do Estado do Paraná.

Informações sobre o texto

Este texto foi publicado diretamente pelos autores. Sua divulgação não depende de prévia aprovação pelo conselho editorial do site. Quando selecionados, os textos são divulgados na Revista Jus Navigandi

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