Abandono afetivo e dano moral

30/03/2017 às 15:23
Leia nesta página:

Este artigo tem como objetivo tratar acerca do abandono afetivo e o cabimento do seu ressarcimento por dano moral, segundo o posicionamento dos Tribunais.

Muito se tem falado acerca do abandono afetivo e do seu ressarcimento por dano moral. Neste presente artigo vamos abordar o presente tema para reflexão do leitor. Para tal, apresentarei o conceito de família nos tempos atuais, assim como o abandono e a sua evolução para abandono afetivo. Em seguida, é cabível o dano moral em caso de abandono afetivo.

Em 1988, a Constituição da República do Brasil realizou grande avanço e contribuição à sociedade e ao ramo do direito de família ao definir em seu artigo 226 as seguintes palavras:

Art. 226. A família, base da sociedade, tem especial proteção do Estado.

§ 1º O casamento é civil e gratuita a celebração.

§ 2º O casamento religioso tem efeito civil, nos termos da lei.

§ 3º Para efeito da proteção do Estado, é reconhecida a união estável entre o homem e a mulher como entidade familiar, devendo a lei facilitar sua conversão em casamento.

§ 4º Entende-se, também, como entidade familiar a comunidade formada por qualquer dos pais e seus descendentes.

§ 5º Os direitos e deveres referentes à sociedade conjugal são exercidos igualmente pelo homem e pela mulher.

§ 6º O casamento civil pode ser dissolvido pelo divórcio.

§ 7º Fundado nos princípios da dignidade da pessoa humana e da paternidade responsável, o planejamento familiar é livre decisão do casal, competindo ao Estado propiciar recursos educacionais e científicos para o exercício desse direito, vedada qualquer forma coercitiva por parte de instituições oficiais ou privadas.

§ 8º O Estado assegurará a assistência à família na pessoa de cada um dos que a integram, criando mecanismos para coibir a violência no âmbito de suas relações. 

A Constituição Federal de 1988 amplia o conceito de família, passando então a escutar os anseios da sociedade. Em linhas gerais de acordo com o artigo supracitado família é um grupo de pessoas ligadas entre si por relações pessoais e patrimoniais resultantes do casamento, da união estável e do parentesco. A fim de verificarmos que a alteração constitucional não ficou apenas na lei escrita, mas que era um desejo da sociedade segue abaixo o conceito de alguns dos nossos principais doutrinadores acerca do instituto da família:

Silvio Rodrigues em um conceito amplo, diz ser a formação por todas aquelas pessoas ligadas por vínculo de sangue, ou seja, todas aquelas pessoas provindas de um tronco ancestral comum, o que inclui, dentro da órbita da família, todos os parentes consanguíneos. Num sentido mais estrito, constitui a família o conjunto de pessoas compreendido pelos pais e sua prole.

Já Maria Helena Diniz discorre sobre família no sentido amplo como todos os indivíduos que estiverem ligados pelo vínculo da consanguinidade ou da afinidade, chegando a incluir estranhos. No sentido restrito é o conjunto de pessoas unidas pelos laços do matrimônio e da filiação, ou seja, unicamente os cônjuges e a prole.

A partir da leitura desses conceitos podemos concluir que há uma sinergia entra a família e a sociedade, uma vez que ambas influenciam-se mutuamente. Nos dias atuais podemos verificar o conjunto de pessoas sem vínculo biológico nenhum sendo considerada família, pois o que está cada vez mais valorizado é o vínculo sócio afetivo entre os indivíduos.

É justamente a partir desse momento que o abandono passa a ter uma interpretação mais ampla; não sendo considerado apenas o abandono material, ou seja, a desassistência com as necessidades básicas da criança e do adolescente. No passado, tinha-se a ideia de que quando os pais se separavam aquele que não estivesse com a guarda, tinha o dever de pagar a pensão e o direito de visita apenas. No entanto, a Constituição Federal em seu artigo 227 afirma que a criança e o adolescente possuem os direitos com absoluta prioridade à vida, à saúde, à educação, ao lazer, à dignidade, ao respeito e à convivência familiar, direitos esses oponíveis à família.

A Constituição Federal de 1988, como lei maior, traz todos os direitos e garantias estabelecidas para preservação da família, destacando-se o princípio da afetividade, que está diretamente relacionado com a dignidade da pessoa humana e da solidariedade familiar. Assim, a Constituição Federal garante aos filhos a assistência material e moral, incluindo nesta o afeto. Direito dos filhos, mesmo após a separação dos pais, de ter uma convivência familiar que lhe permitam ter um desenvolvimento sadio e harmonioso e que o descumprimento desse dever pode gerar uma indenização para os filhos.

Portanto, é possível afirmar que em decorrência de um eventual abandono afetivo haveria alguma consequência negativa na criança ou no adolescente quando na vida adulta? Por certo, no campo psicológico podemos afirmar que esta seria uma resposta bastante subjetiva, visto que cada indivíduo irá reagir de forma diferente diante deste abandono. No entanto, juridicamente falando, em virtude dos dispositivos constitucionais mencionados e da legislação civil podemos perfeitamente concluir que aquele pai ou aquela mãe que abandona afetivamente seu filho descumpre um de seus deveres, sendo passível de uma responsabilidade civil.

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Alguns autores didaticamente utilizam o princípio da afetividade para se tratar de afeto, estando aquele com essência constitucional, pautada na dignidade da pessoa humana, na solidariedade social e na igualdade entre filhos.

Sendo assim, sob o argumento de descumprimento do dever de cuidado e afeto algumas pessoas têm ajuizado ações com o objetivo de requererem uma compensação por essa perda. No presente momento o posicionamento do STJ ainda não está pacificado, havendo decisões ora a favor ora contra o cabimento de indenização. Em verdade, trata-se de tema bastante delicado, pois estamos a falar de relação de afetividade. O mais importante, antes de decidirmos se há ou não cabimento ao dano moral, é analisarmos o caso concreto, houve de fato omissão de um dos pais? Caso contrário podemos cair em mais um erro da banalização do dano moral e assim prejudicando aqueles que realmente sofreram um dano em função dessa ausência.

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Sobre a autora
Marina de Barros Menezes

Advogada - formada pela UNESA em 2006. MBA em Gestão de Pessoas pela UCAM (2008) Especialização em Engenharia de Produção pela UCP (2013) Especialização em Advocacia Empresarial - PUC MINAS (2018) Agilidade no Direito (2020)

Informações sobre o texto

Este texto foi publicado diretamente pelos autores. Sua divulgação não depende de prévia aprovação pelo conselho editorial do site. Quando selecionados, os textos são divulgados na Revista Jus Navigandi

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