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A imunidade tributária dos templos de qualquer culto sob a interpretação constitucional do Supremo Tribunal Federal

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01/05/2017 às 12:30
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5 POSICIONAMENTO DO SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL: RECORTES DA JURISPRUDÊNCIA

Após a exaustiva discussão e exposição doutrinária referente ao tema em apreço, há que se discorrer sucintamente sobre a fundamentação jurídica adotada pelo Supremo Tribunal Federal.

O STF vem defendendo a análise mais extensiva da aplicação da norma imunizante para os templos de qualquer culto, estendendo sua abrangência às atividades não essenciais dos templos religiosos, desde que examinada a destinação dos recursos obtidos pelo templo; ou seja, havendo relação entre o patrimônio, renda e serviços e as finalidades essenciais, deve-se aplicar o dispositivo constitucional. Igualmente, aplica a acepção extensiva sobre o conceito de "templo", albergando, além do próprio imóvel onde se realiza, efetivamente, a cerimônia religiosa, seus anexos.

Nesse passo, torna-se de grande valia o conhecimento de alguns julgados do Supremo Tribunal Federal.

Antes do advento da Constitução Federal de 1988, a egrégia Corte chegou a adotar, sobre o tema em estudo, uma linha restritiva, que foi consagrada em seu Recurso Extraordinário 21.826, julgado na sessão de 02 de julho de 1953, onde se considerou imune somente o imóvel no qual estivesse instalado o templo e não toda extensão da atividade religiosa.

O voto condutor da decisão foi do Ministro Relator Ribeiro da Costa. Acompanharam o relator, os Ministros Nelson Hungria, Mário Guimarães, Luis Galloti e o Ministro-Presidente Barros Barreto, in verbis:

A IMUNIDADE ESTATUIDA NO ART. 31,5, LETRA B DA CONSTITUIÇÃO, E LIMITADA, RESTRITA, SENDO VEDADO A ENTIDADE TRIBUTANTE LANCAR IMPOSTOS SOBRE TEMPLOS DE QUALQUER CULTO, ASSIM ENTENDIDOS A IGREJA, O SEU EDIFICIO, E DEPENDÊNCIAS. UM LOTE DE TERRENO, ISOLADO, NÃO SE PODE CONSIDERAR O SOLO DO EDIFICIO DO TEMPLO. (STF- RE 21826, Relator(a):  Min. RIBEIRO DA COSTA, SEGUNDA TURMA, julgado em 02/07/1953, ADJ DATA 07-03-1955 PP-00898 ADJ DATA 24-06-1957 PP-01534 DJ 31-12-1953 PP-16099 EMENT VOL-00158-01 PP-00352) [73]

Contudo, o STF evolui seu posicionamento desde este julgamento, mitigando a questão das imunidades em decorrência das mudanças nos contextos econômico, social e político do cenário mundial, de forma que a visão mais restritiva quanto à imunidade foi gradativamente abandonada, passando a se assumir uma postura mais liberal e ampliativa, acompanhando os ditames doutrinários.

Com o fluir do tempo, houve a assunção de um posicionamento mais flexível daquela Corte Excelsa, que passou a reconhecer o benefício da imunidade com relação ao IPTU, ainda que sobre imóveis locados a terceiros (RE 257.700/MG, julgado em 13/06/2000; RE 237.718/SP, julgado em 29/03/2001) ou utilizados como escritório e residência de membros da entidade imune (RE 221.395/SP, julgado em 08/02/2000); contudo, foi reconhecida a imunidade sob o pálio da alínea “c” e não "b" do inciso VI, do art. 150, da CRFB/88, pois embora as entidades fossem religiosas, tinham fins assistenciais não lucrativos, desempenhando o papel de uma instituição de assistência social.

Respectivamente:

EMENTA: IMUNIDADE TRIBUTÁRIA. ART. 150, VI, C, DA CONSTITUIÇÃO. INSTITUIÇÃO DE ASSISTÊNCIA SOCIAL. EXIGÊNCIA DE IMPOSTO PREDIAL E TERRITORIAL URBANO SOBRE IMÓVEL DE PROPRIEDADE DA ENTIDADE. ALEGAÇÃO DE QUE O ÔNUS PODE SER TRANSFERIDO AO INQUILINO. A norma inserta no art. 150, inciso VI, alínea c, da Constituição Federal prevê a imunidade fiscal das instituições de assistência social, de modo a impedir a obrigação tributária, quando satisfeitos os requisitos legais. Tratando-se de imunidade constitucional, que cobre patrimônio, rendas e serviços, não importa se os imóveis de propriedade da instituição de assistência social são de uso direto ou se são locados. Recurso não conhecido. (STF- RE 257700, Relator(a):  Min. ILMAR GALVÃO, Primeira Turma, julgado em 13/06/2000, DJ 29-09-2000 PP-00098 EMENT VOL-02006-04 PP-00863) [74]

EMENTA: Imunidade tributária do patrimônio das instituições de assistência social (CF, art. 150, VI, c): sua aplicabilidade de modo a preexcluir a incidência do IPTU sobre imóvel de propriedade da entidade imune, ainda quando alugado a terceiro, sempre que a renda dos aluguéis seja aplicada em suas finalidades institucionais. (STF - RE 237718, Relator(a):  Min. SEPÚLVEDA PERTENCE, Tribunal Pleno, julgado em 29/03/2001, DJ 06-09-2001 PP-00021 EMENT VOL-02042-03 PP-00515) [75]

IMUNIDADE - INSTITUIÇÕES DE EDUCAÇÃO E ASSISTÊNCIA SOCIAL SEM FINS LUCRATIVOS - IMÓVEIS - ESCRITÓRIO E RESIDÊNCIA DE MEMBROS. O fato de os imóveis estarem sendo utilizados como escritório e residência de membros da entidade não afasta a imunidade prevista no artigo 150, inciso VI, alínea "c", § 4º da Constituição Federal. (STF- RE 221395, Relator(a):  Min. MARCO AURÉLIO, Segunda Turma, julgado em 08/02/2000, DJ 12-05-2000 PP-00028 EMENT VOL-01990-02 PP-00353) [76]

Necessário trazer ao debate a Súmula 724 do STF (atual Súmula Vinculante 52, aprovada em 18/06/2015), que a rigor não se refere aos templos, e sim, às entidades referidas no art. 150, VI, “c”, da Constituição (partidos políticos, entidades sindicais, educacionais e de assistência social), mas utiliza a mesma fundamentação quando aplicada às entidades religiosas, ipsis litteris:

Ainda quando alugado a terceiros, permanece imune ao IPTU o imóvel pertencente a qualquer das entidades referidas pelo art. 150, VI, c, da Constituição, desde que o valor dos aluguéis seja aplicado nas atividades essenciais de tais entidades. Aprovada em 26/11/2003. (A redação da Súmula Vinculante 52 apenas alterou a parte final para "nas atividades para as quais tais entidades foram constituídas.") [77]

Nessa linha, é pertinente trazer à baila a decisão do RE 325822/SP (Informativo 295 STF), ocorrido em 18 de dezembro de 2002, relatado pelo Ministro Ilmar Galvão e pelo Ministro Gilmar Mendes (como relator para o acórdão), no qual era discutido se a imunidade referente ao IPTU alcançaria somente os prédios destinados à celebração dos cultos religiosos ou se abrangeria todo o acervo imobiliário daquela instituição, incluindo os lotes vagos e prédios comerciais locados a terceiros.

Colaciona-se:

EMENTA: Recurso extraordinário. 2. Imunidade tributária de templos de qualquer culto. Vedação de instituição de impostos sobre o patrimônio, renda e serviços relacionados com as finalidades essenciais das entidades. Artigo 150, VI, "b" e § 4º, da Constituição. 3. Instituição religiosa. IPTU sobre imóveis de sua propriedade que se encontram alugados. 4. A imunidade prevista no art. 150, VI, "b", CF, deve abranger não somente os prédios destinados ao culto, mas, também, o patrimônio, a renda e os serviços "relacionados com as finalidades essenciais das entidades nelas mencionadas". 5. O § 4º do dispositivo constitucional serve de vetor interpretativo das alíneas "b" e "c" do inciso VI do art. 150 da Constituição Federal. Equiparação entre as hipóteses das alíneas referidas. 6. Recurso extraordinário provido. (STF- RE 325822, Relator(a):  Min. ILMAR GALVÃO, Relator(a) p/ Acórdão:  Min. GILMAR MENDES, Tribunal Pleno, julgado em 18/12/2002, DJ 14-05-2004 PP-00033 EMENT VOL-02151-02 PP-00246). [78]

Este julgamento ficou conhecido como o leading case da adoção de uma postura mais ampliativa quanto à imunidade dos templos de qualquer culto, a qual vem prevalecendo até os dias de hoje. Por isso, é de suma importância compreender o julgado.

Preliminarmente, a questão dividiu a Corte. Alguns Ministros veneravam a corrente restritiva, como o relator originário do RE, o Ministro Ilmar Galvão, que finalizou seu voto dizendo que os lotes vagos e prédios comerciais dados em locação não estão relacionados às finalidades do culto e devem ser tributados, não merecendo a garantia imunizante. Foi acompanhado pelos Ministros Carlos Velloso, Ellen Gracie e Sepúlveda Pertence, vencidos.

Prevalecerame os votos dos Ministros que adotaram uma interpretação mais extensiva em relação às imunidades aos templos de qualquer culto, por maioria.

O Ministro Gilmar Mendes, no mesmo raciocínio esboçado pelo Ministro Moreira Alves, inaugurou a divergência, seguido pelos Ministros Nelson Jobim, Maurício Corrêa e Marco Aurélio. Argumentou:

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[...] entendo que, de fato, o dispositivo do art. 150, VI, "b", há de ser lido com o vetor interpretativo do § 4º deste mesmo artigo da Constituição. Vê-se,pois, que a letra "b"se refere apenas à imunidade dos "templos de qualquer culto"; a letra "c", ao "patrimônio, renda ou serviço". Portanto, o disposto no § 4º alcança o patrimônio, a renda ou serviços dos templos de qualquer cuto, em razão da equiparação entre as letras "b"e "c". [79]

Posteriormente, consagrou-se o posicionamento liberal pelo STF, interpretanto a norma imunizante na sua linha mais funcional, ampla e extensiva, como se vê nas decisões dos RE 578.562/BA.

EMENTA: RECURSO EXTRAORDINÁRIO. CONSTITUCIONAL. IMUNIDADE TRIBUTÁRIA. IPTU. ARTIGO 150, VI, "B", CB/88. CEMITÉRIO. EXTENSÃO DE ENTIDADE DE CUNHO RELIGIOSO. 1. Os cemitérios que consubstanciam extensões de entidades de cunho religioso estão abrangidos pela garantia contemplada no artigo 150 da Constituição do Brasil. Impossibilidade da incidência de IPTU em relação a eles. 2. A imunidade aos tributos de que gozam os templos de qualquer culto é projetada a partir da interpretação da totalidade que o texto da Constituição é, sobretudo do disposto nos artigos 5º, VI, 19, I e 150, VI, "b". 3. As áreas da incidência e da imunidade tributária são antípodas. Recurso extraordinário provido. (STF - RE 578562, Relator(a):  Min. EROS GRAU, Tribunal Pleno, julgado em 21/05/2008, DJe-172 DIVULG 11-09-2008 PUBLIC 12-09-2008 EMENT VOL-02332-05 PP-01070 RTJ VOL-00206-02 PP-00906 LEXSTF v. 30, n. 358, 2008, p. 334-340) [80]

Cabe destacar que, nos últimos anos, houve uma ampla renovação na composição do STF. Por isso, é interessante acompanhar se o posicionamento da Suprema Corte se manterá em consonância com a linha extensiva da interpretação das imunidades tributárias dos templos de qualquer culto. Algumas decisões mais recentes proferidas já se mostram contrárias ao entendimento ora dominante.

Conforme o RE 604.390/SP[81], no qual, em sede de decisão monocrática do Ministro Dias Toffoli, em 16 de agosto de 2011, negou-se seguimento ao recurso interposto, mantendo-se a decisão do juízo a quo que não concedeu a exoneração tributária, sob o fundamento de que não haviam provas suficientes de que o imóvel sobre o qual incide IPTU fosse utilizado com finalidade essencial aos serviços religiosos. Em que pese o emprego da intrepretação funcional da norma, restringiu-se sua concessão no caso concreto.

Ademais, no RE 562351/RS, deliberou-se que a imunidade tributária conferida pelo art. 150, VI, ''b", é restrita aos templos de qualquer culto religioso, não se aplicando à maçonaria, em cujas lojas não se professa qualquer religião.

Ementa: : CONSTITUCIONAL. RECURSO EXTRAORDINÁRIO. IMUNIDADE TRIBUTÁRIA. ART. 150, VI, C, DA CARTA FEDERAL. NECESSIDADE DE REEXAME DO CONJUNTO FÁTICO-PROBATÓRIO. SÚMULA 279 DO STF. ART. 150, VI, B, DA CONSTITUIÇÃO DA REPÚBLICA. ABRANGÊNCIA DO TERMO “TEMPLOS DE QUALQUER CULTO”. MAÇONARIA. NÃO CONFIGURAÇÃO. RECURSO EXTRAORDINÁRIO CONHECIDO EM PARTE E, NO QUE CONHECIDO, DESPROVIDO. I – O reconhecimento da imunidade tributária prevista no art. 150, VI, c, da Constituição Federal exige o cumprimento dos requisitos estabelecidos em lei. II – Assim, para se chegar-se à conclusão se o recorrente atende aos requisitos da lei para fazer jus à imunidade prevista neste dispositivo, necessário seria o reexame do conjunto fático-probatório constante dos autos. Incide, na espécie, o teor da Súmula 279 do STF. Precedentes. III – A imunidade tributária conferida pelo art. 150, VI, b, é restrita aos templos de qualquer culto religioso, não se aplicando à maçonaria, em cujas lojas não se professa qualquer religião. IV - Recurso extraordinário parcialmente conhecido, e desprovido na parte conhecida. (STF - RE 562351, Relator(a):  Min. RICARDO LEWANDOWSKI, Primeira Turma, julgado em 04/09/2012, ACÓRDÃO ELETRÔNICO DJe-245 DIVULG 13-12-2012 PUBLIC 14-12-2012) [82]

Pelo tema abarcar uma questão de grande interesse social, em razão da relevância que as entidades religiosas desempenham na sociedade, esperam-se novas decisões do STF firmando seu posicionamento sobre as imunidades tributárias concedidas aos templos de qualquer culto.

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Sobre a autora
Isabella Bishop Perseguim

Advogada. Graduada pela PUCPR em Direito em 2014. Pós- Graduada pela PUCPR em Direito Tributário Empresarial e Processual Tributário 2015. Curso de Extensão de Direito Empresarial na Universidade Federal do Paraná - UFPR – 2015-2016.Pós- Graduada Processo Civil pelo IBMEC 2017.Certificação em Propriedade Intelectual e Contratos de Tecnologia, pela WIPO e Instituto Nacional de Propriedade Intelectual - INPI 2022. MBA em Gestão Tributária, pela Universidade de São Paulo – USP 2023-2025. Membro da comissão de Direito Tributário da OAB/SP. Advogada atuante em Gestão Empresarial e Tributária. reestruturação de empresas, planejamento sucessório, gestão de passivos e contratos empresariais nacionais e internacionais. Em especial, ao contencioso tributário e desenvolvimento de teses.

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

BISHOP, Isabella Perseguim. A imunidade tributária dos templos de qualquer culto sob a interpretação constitucional do Supremo Tribunal Federal. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 22, n. 5052, 1 mai. 2017. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/57120. Acesso em: 27 dez. 2024.

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