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A pessoa com deficiência e o direito à acessibilidade

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21/06/2017 às 11:20
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7 A acessibilidade nos transportes: transporte coletivo rodoviário

Além das acessibilidades urbanísticas e arquitetônicas, a acessibilidade nos transportes configura-se como instrumental para o pleno exercício de direitos por parte das pessoas com deficiência, pois é através destes meios que várias pessoas se locomovem para os mais variados destinos, seja para o trabalho, para o lazer, para questões de saúde, dentre outros.

Por tais razões, o direito ao transporte se mostra de suma importância para a integração social das pessoas com deficiência. Segundo as palavras de Sonia Maria Demeda Groisman Piardi (2007, p.326):

O direito ao transporte permite a realização do direito à integração social das pessoas com deficiência, pois ele não é somente usado para o deslocamento ao trabalho e para a escola, mas, também, para o lazer, obtenção de assistência médica, hospitalar, para habilitação profissional e para reabilitação, por exemplo.

Após a entrada em vigor da Constituição Federal de 1988, a primeira Lei a tratar da acessibilidade nos meios de transporte foi a Lei nº 7.853/89, a qual em seu art. 2º, V, “a”, traz o dever dos órgãos e entidades da administração direta e indireta de tratarem prioritária e adequadamente a adoção e a efetiva execução de normas que visem o acesso das pessoas com deficiência aos meios de transporte.

O Decreto nº 3.298/99, o qual regulamentou a lei supracitada, expôs de forma genérica o direito ao transporte.

Todavia, é através da Lei nº 10.048/2000 que observa-se um tratamento mais específico ao tema, traçando, inclusive, prazos para a implantação de acessibilidade nos transportes coletivos.

O art. 5º da referida Lei afirma que os veículos de transporte coletivo a serem produzidos após doze meses a contar da data de publicação desta mesma Lei deveriam ser planejados de forma a garantir a acessibilidade. Tal observação na produção de tais veículos, portanto, iniciou-se na data de 09 de novembro de 2001.

No § 2º do citado artigo é previsto o prazo de 180 dias, a contar da regulamentação desta Lei, para que os proprietários de veículos de transporte coletivo em utilização procedessem às adaptações necessárias com o objetivo de tornar estes veículos acessíveis. Tendo em vista que o decreto que regulamenta esta Lei é o Decreto nº 5.296/04, referido prazo para adaptações terminou em 03 de junho de 2005.

A não observância de tais regras acarretaria às empresas concessionárias de serviços públicos multa de R$ 500,00 a R$ 2.500, por veículo sem as condições previstas, conforme art. 6º da mesma Lei em comento.

O Decreto nº 5.296/04, regulamentando a matéria de acessibilidade em transportes coletivos, modificou alguns prazos previstos na Lei regulamentada.

O art. 38, caput, do referido decreto, estabelece o prazo de 2 anos a contar da data da edição de normas técnicas para que os veículos de transporte coletivo rodoviário comecem a ser fabricados acessíveis e estejam disponíveis para integrar a frota operante.

Tais normas técnicas para a fabricação de veículos acessíveis, segundo o § 1º do art. 38, deveriam ser elaboradas no prazo de 1 ano a contar da publicação do decreto.

Por fim, o § 3º do mesmo artigo prevê o prazo máximo de 10 anos a contar da data de publicação do decreto para a acessibilidade total dos veículos e da infra-estrutura do sistema de transporte. Este prazo encerrou-se em 03 de dezembro de 2014.

Entretanto, observa-se, na prática, a não observância de tais prazos, sendo facilmente encontrados vários veículos de transporte coletivo rodoviário, principalmente os de característica intermunicipal e interestadual, sem a acessibilidade esperada pelas normas.

No que se refere aos veículos de transporte coletivo rodoviário de característica intermunicipal ou interestadual, a NBR nº 15320:2005 estabelece as normas técnicas para a promoção de acessibilidade em tais veículos.

Tratando dos equipamentos de embarque e desembarque no terminal, a NBR no tópico 5.2.1 estabelece os seguintes meios:

5.2.1 Para o embarque e desembarque da pessoa com deficiência, deve-se usar uma ou mais das seguintes possibilidades:

a) passagem em nível da plataforma de embarque/desembarque do terminal (ou ponto de parada) para o salão de passageiros;

b) dispositivo de acesso instalado no veículo, interligando este com a plataforma;

c) dispositivo de acesso instalado na plataforma de embarque, interligando esta ao veículo;

d) rampa móvel colocada entre o veículo e a plataforma;

e) plataforma elevatória;

f) cadeira de transbordo.

Na prática, é possível observar que estes veículos não possuem plataforma elevatória, ficando a cadeira de transbordo como sendo o principal meio de embarque e desembarque de pessoas com deficiência física.

Neste ponto, a norma técnica expõe que todo o terminal e ponto de parada devem dispor de cadeira de transbordo. (NBR 15320:2005, 5.4.2)

Nos casos de inoperância dos meios citados no tópico 5.2.1, a empresa de transporte deve dispor de forma alternativa de acessibilidade, devendo haver procedimento e pessoal treinado para tanto, conforme o tópico 5.5.1.

Segundo a Portaria nº 294/2016 do Inmetro, a partir de julho de 2017 ficará proibida a utilização da cadeira de transbordo para o embarque e desembarque de pessoas com deficiência dos veículos em comento. A partir desta mesma data, os referidos veículos deverão ser fabricados e disponíveis com plataforma elevatória como sendo o único meio de embarque e desembarque.


8 CONSIDERAÇÕES FINAIS 

Conforme o exposto no presente artigo, pode-se dizer que o Brasil possui uma das melhores legislações voltadas à garantia da inclusão social das pessoas com algum tipo de deficiência. Entretanto, é nítida a falta de verdadeira aplicação destas normas tanto por parte do Poder Público, quanto da própria sociedade.

Cumpre salientar que as barreiras existentes nos dias atuais, sejam elas quais forem, devem ser eliminadas com a implementação de medidas que garantam a acessibilidade das pessoas com deficiência. Uma dessas medidas, conforme analisado, é o desenho universal.

Por fim, como visto, a acessibilidade se reveste como um direito instrumental, capaz de facilitar o pleno exercício das pessoas com deficiência aos demais direitos a elas inerentes. Como exemplos desse direito instrumental pode-se citar a acessibilidade nas calçadas, nos estabelecimentos comercias e nos veículos de transporte coletivo rodoviário.


REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS 

ASSOCIAÇÃO BRASILEIRA DE NORMAS TÉCNICAS. NBR 15320: Acessibilidade à pessoa com deficiência no transporte rodoviário. Rio de Janeiro: ABNT, 2005.

ASSOCIAÇÃO BRASILEIRA DE NORMAS TÉCNICAS. NBR 9050: Acessibilidade a edificações, mobiliário, espaços e equipamentos urbanos. Rio de Janeiro: ABNT, 2015.

BARCELLOS, Ana Paula de.; CAMPANTE, Renata Ramos. A acessibilidade como instrumento de promoção de direitos fundamentais. In: FERRAZ, Carolina Valença; LEITE, George Salomão; LEITE, Glauber Salomão; LEITE, Glaco Salomão (Coord.). Manual dos direitos da pessoa com deficiência. São Paulo: Ed. Saraiva, 2012.

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BRASIL. Instituto Nacional de Metrologia, Qualidade e Tecnologia - INMETRO. Portaria nº 294, de 28 de junho de 2016. Determina que, a partir de 01.07.2016, ficará proibida a utilização da cadeira de transbordo... Disponível em: <https://www.legisweb.com.br/legislacao/?id=325383>. Acesso em: 16 out. 2016.

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Sobre o autor
Adonis Alexandre Laquale

Advogado atuante na cidade de Taguaí - SP.

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

LAQUALE, Adonis Alexandre. A pessoa com deficiência e o direito à acessibilidade. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 22, n. 5103, 21 jun. 2017. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/58520. Acesso em: 20 abr. 2024.

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