Psicopatia no sistema prisional brasileiro.

Como são tratados os indivíduos psicopatas?

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19/07/2017 às 11:26
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Resumo: Este trabalho tem como objetivo analisar a punição dada pelo ordenamento jurídico para os indivíduos psicopatas. Para isso é necessário verificar sobre o perfil criminoso do psicopata, além de ser importante examinar sobre a imputabilidade do indivíduo com transtorno psicopático, e então averiguar a eficácia do sistema prisional brasileiro a estes criminosos psicopatas. Conclui-se que o psicopata é semi-imputável, mas necessita de um tratamento diferenciado como exemplo de uma prisão perpétua com tratamento especial, porém é inegável que as medidas de segurança e as penas não alcançam o resultado almejado.

Palavras-chave: Psicopatia. Imputabilidade. Medida de segurança. Penas.


INTRODUÇÃO

A psicopatia não é uma doença mental, e sim, um distúrbio de personalidade que possui como características a frieza, falta de empatia. Os psicopatas sentem prazer em provocar o sofrimento alheio (SILVA, 2015, p. 69). Não é fácil identificar esses indivíduos, justamente, por na maioria dos casos, serem pessoas extremamente doces, longe de qualquer suspeita. Os crimes mais cruéis e que chocam a sociedade são os que envolvem os criminosos portadores da psicopatia. 

Em entrevista à revista ISTOÉ (2008), os neurologistas Jorge Moll e Ricardo Oliveira dizem que existe uma explicação para isto. Há uma deficiência no sistema límbico do cérebro do psicopata, que é responsável pela emoção, logo eles não sentem nenhum tipo de sentimento. O psicopata é capaz de qualquer coisa para conseguir o poder, inclusive de enganar ou manipular as pessoas. Atualmente, 4% da população mundial sofrem deste transtorno e a maioria é do sexo masculino.

O crime, segundo Silva (2010, p.100), é composto por dois elementos, sendo eles: fato típico (fato que está na lei como crime); antijuridicidade e ilicitude (quando o fato típico é contra ao ordenamento jurídico); e tendo como pressuposto a culpabilidade (conduta reprovável socialmente e de grande relevância jurídica).

Existem três elementos da culpabilidade, que são: a imputabilidade; potencial consciência da ilicitude (se o agente conhece ou não a ilicitude da sua conduta); e a exigibilidade de conduta diversa (é a possibilidade de o sujeito ter agido de outras formas na situação).

Segundo Greco (2007, p.448), “para que o agente possa ser responsabilizado pelo fato típico e ilícito por ele cometido é preciso que seja imputável. A imputabilidade é a possibilidade de se atribuir, imputar o fato típico e ilícito ao agente.”.

Nos dias de hoje, no Brasil, em regra, é adotado o critério biopsicológico para examinar a imputabilidade, o que significa dizer que, para verificar a imputabilidade, é necessário investigar, em conjunto, o desenvolvimento mental do agente e a capacidade de entendimento no momento da conduta.

O portador de doença mental, segundo o art. 26 do Código Penal Brasileiro, é inimputável. Então, não pode ser responsabilizado penalmente por seu ato. Ainda no mesmo artigo, em seu parágrafo único, a semi-imputabilidade é causa de diminuição de pena. 

Em regra, no Brasil, para efeitos penais, os psicopatas são considerados semi-imputáveis. O que significa que podem ter sua pena reduzida ou ainda ser internado em hospitais de custódia se punidos com medida de segurança.

O sistema prisional brasileiro se mostra ineficaz em relação aos indivíduos com transtornos psicopaticos, não sendo disposto nenhum tratamento especial para criminosos psicopatas. 

Além disso, apesar de existir um decreto em vigor versando sobre o assunto, o mesmo não especifica assuntos importantes a respeito como exemplo a questão da imputabilidade e até mesmo as sanções que podem ser propostas para os psicopatas de maneira que tenha eficácia, como o caso das prisões especiais com acompanhamento de especialistas, ou até mesmo em alguns casos a castração química.


CONCEITO E BREVE CONTEXTO DA PSICOPATIA

A palavra psicopatia tem origem grega e significa psyché, alma e pathos, doença, ou seja, doença da alma.

 Porém na medicina, a psicopatia não é uma doença e sim um transtorno psicológico. No Manual chamado DSM-TR (Manual Diagnóstico e Estatístico de Transtornos Mentais), este tem a função de listar e caracterizar os transtornos mentais, neste a psicopatia ou transtorno de personalidade anti-social é caracterizado como um transtorno de personalidade que é caracterizado pelo desrespeito as moral e a princípios alheios, além de ser totalmente marcado pela agressividade e falta de remorso entre outras características que serão aqui estudadas.

Ao longo dos anos foram muitas as discussões a cerca da psicopatia, essa discussão começou no ano de 1809 quando Philippe Pinel, um psiquiatra francês, começou a perceber em seus pacientes que alguns tinham a capacidade de raciocínio, porém não tinha consciência do certo e errado, para estes ele nomeou de mania sem delírio. A primeira escola a trazer o termo psicopata foi à escola alemã, através de Kosh em 1888.

Após, Kraepelin (1904), defendeu a personalidade psicopatica que seriam pessoas com características imorais que muitas vezes levavam a praticar crimes. Em 1923, Schneider trouxe a psicopatia não como uma doença, mas sim como um transtorno de personalidade e discorreu também algumas características de pessoas com a personalidade psicopaticas.

Em 1991, Hare, criou uma lista como escala Hare ou PCL-R psycopathy Checklist Revised, que é um teste que hoje é usado mundialmente, por ser considerado o mais eficaz, este tem a função de medir o grau da psicopatia através de uma pontuação. Esta escala só foi traduzida no Brasil no ano de 2000.

Na medicina o primeiro Manual Diagnóstico e Estatístico de Transtornos Mentais foi publicado em 1952, foi adotado o termo sociopatia para indivíduos com características psicopaticas, a segunda alteração que teve em relação ao termo foi no terceiro DSM em 1980, a ultima e a atualmente utilizada é à DSM IV de 2002 onde são usado os termos transtorno de personalidade anti-social, psicopatia, sociopatia ou perturbação dissocial da personalidade. 

1. O psicopata

Os psicopatas são seres humanos incapazes de sentir emoção, ou se importar com as pessoas, e por um conjunto de características que justificam o desvio de personalidade e tornam estes indivíduos seres perversos e frios. Existem indivíduos psicopatas de qualquer raça, sexo, classe econômica.

Uma das principais características do individuo psicopata é a ausência de culpa, o individuo psicopata é capaz de destruir a vida de uma pessoa e não sente dor, culpa, remorso, e ainda pode transferir a culpa para a vitima, responsabilizando esta pelo ato que ele cometeu. 

Outra característica é a falta de empatia, para entender esta, é importante a principio definir o que é empatia. A empatia é a capacidade que o ser humano tem de se colocar no lugar do outro, ou seja, o que leva a pessoas a se ajudarem. O psicopata não tem essa capacidade, o que pode desencadear em suas atitudes perversas.

O individuo portador da psicopatia tem um grande poder do convencimento, da manipulação, o que explica o fato que eles são muito doces, longe de qualquer suspeita. Estes têm um encanto superficial que usam para dominar a pessoa, convencendo sempre a fazer o que querem e alcançando seus objetivos dessa forma. Normalmente costumam ser extrovertidos, contam várias histórias, inclusive induzindo a ter piedade dele.

É sabido que todos mentem, não importa se uma “mentirinha” ou se um pouco mais, faz parte do ser humano, até mesmo em alguns casos para proteger uma pessoa que gosta. Mas para o psicopata a mentira é algo habitual, e algo que eles tem uma habilidade a qual é possível enganar até detectores de mentiras, inclusive a mentira é um dos elementos que causam prazer no psicopata.

O psicopata tende a ser impulsivo, eles procuram o seu prazer imediato, pensando sempre no momento presente, sem se preocupar com sanções futuras, ou se irá ser descoberto, e faz isso sem nenhum arrependimento ou remorso. Eles também gostam da adrenalina, o portador do transtorno não suporta o tédio, procurando sempre uma situação para se excitar.

Estes também não conseguem viver em sociedade, por ser egoísta, egocêntrico sempre procurando o que te traz prazer, não importando se irá causar sofrimento em alguém em razão das suas atitudes. Para eles o mundo gira em torno dele, logo não tem interesse com as normas da sociedade, e sim com as próprias regras. Em muitos dos casos os psicopatas estão em cargos com muito poder, como políticos por exemplo. 

Segundo Manual Diagnóstico e Estatístico de Transtornos Mentais (2002) para ser diagnosticado com o transtorno de personalidade anti social deve ter pelo menos três destas características:

(1)fracasso em conformar-se às normas sociais com relação a comportamentos legais, indicado pela execução repetida de atos que constituem motivo de detenção

(2) propensão para enganar, indicada por mentir repetidamente, usar nomes falsos ou ludibriar os outros para obter vantagens pessoais ou prazer

(3) impulsividade ou fracasso em fazer planos para o futuro

(4) irritabilidade e agressividade, indicadas por repetidas lutas corporais ou agressões físicas 

(5) desrespeito irresponsável pela segurança própria ou alheia

(6) irresponsabilidade consistente, indicada por um repetido fracasso em manter um comportamento laboral consistente ou honrar obrigações financeiras 

(7) ausência de remorso, indicada por indiferença ou racionalização por ter ferido, maltratado ou roubado outra pessoa.

O individuo não pode ser diagnosticado como portador da psicopatia antes dos 18 anos, embora já possa ser identificado desde os 15 anos como tal segundo as suas características. A pessoa desde a infância já apresenta características do transtorno, porém pode ser contornado a depender do ambiente onde a criança vive da sua educação, a psicopatia não tem cura, mas tem modos de atenuar os efeitos quando tratada ainda quando criança.

A parte mais complicada do tratamento é que em doentes mentais, na maioria dos casos, a pessoa reconhece que está doente e que precisa de tratamento, mas os portadores de transtorno de personalidade se consideram normais, e como pessoa normal não tem a necessidade de um tratamento, logo não havendo esse reconhecimento dificulta o procedimento para que atenue os efeitos do transtorno, segundo Ilana Casoy (2014) só existem dois tipos de cura para o psicopata, a prisão e a morte.

Conclui-se que o psicopata pensa mais do que sente, eles são racionais, por isso uma das características da personalidade anti social é o QI alto, os psicopatas são em sua maioria muito inteligentes.

Perfil do criminoso psicopata

O psicopata não sente culpa e sempre procura transferir essa culpa para o outro. Este sabe que o que faz é errado e reprovável pela sociedade em geral, mas para ele não importa o que a sociedade pensa, e sim, as próprias definições de certo ou errado. Isso explica as reincidências dos indivíduos psicopatas.

Os psicopatas em geral são indivíduos frios, calculistas, inescrupulosos, dissimulados, mentirosos, sedutores e que visam apenas o próprio benefício. São incapazes de estabelecer vínculos afetivos ou de se colocar no lugar do outro. São desprovidos de culpa ou remorso e, muitas vezes, revelam-se agressivos e violentos. Em maior ou menor nível de gravidade e com formas diferentes de manifestarem os seus atos transgressores, os psicopatas são verdadeiros "predadores sociais", em cujas veias e artérias correm um sangue gélido. (SILVA, 2015, p. 39)

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O psicólogo canadense Robert Hare montou um questionário titulado de escala Hare, o qual é um instrumento muito importante para o estudo e diagnóstico da psicopatia. Em entrevista a Veja, Hare (2009, p. 20) relata:

A consciência, o processo de avaliar se algo deve ser feito ou não, envolve não somente o conhecimento intelectual, mas também o aspecto emocional. Do ponto de vista intelectual, o psicopata pode até saber que determinada conduta é condenável, mas, em seu âmago, ele não percebe quão errado é quebrar aquela regra. Ele também entende que os outros podem pensar que ele é diferente e que isso é um problema, mas não se importa. O psicopata faz o que deseja, sem que isso passe por um filtro emocional.

Para os indivíduos psicopatas, as outras pessoas são mero objeto. Isso significa que estes não amam ninguém, mas tratam as pessoas como coisas. Importante ressaltar que muitos destes indivíduos não matam, mas de certa forma destroem a vida daqueles que vivem com ele.

Sim, os psicopatas têm um número significativo na sociedade, embora seja difícil para algumas pessoas imaginar que eles existem, mas vemos muitas vezes em noticiários serial killer, estupradores, pedófilos, ladrões entre outros, obvio nem todos que praticam estes crimes são psicopatas, mas uma grande parte destes são.

Como já citado acima, nem todos os psicopatas são assassinos, mas é inegável que a maior parte comete crimes, como estelionatos, roubos entre outros, com o único intuito de alcançar os seus objetivos, e para isso, não se preocupam com o que precisam fazer para alcançá-los.

O psicopata não tem medo ou receio de uma sanção e por esse motivo que o índice de reincidência criminal com indivíduos psicopatas é muito grande, chegando a ser duas vezes maior que a dos criminosos comuns e três vezes maior em crimes relacionados com violência.

Causas dos transtornos de personalidade

Mas será que o psicopata já nasce psicopata? Não, a pessoa nasce com tendências a ser psicopata, e os fatores sociais que ajudam no desenvolvimento ou não das características, causa pela qual não é possível diagnosticar o transtorno antes dos 18 anos, pois é a idade, segundo os especialistas que estão sendo formada a personalidade. 

Porém, foi comprovado por meio de testes realizados por neurologistas brasileiros Jorge Moll e Ricardo Oliveira, em entrevista divulgada pela revista ISTOÉ, que os psicopatas têm um distúrbio no sistema límbico, que é a parte do cérebro responsável pelas emoções. Este teste é realizado através de ressonância magnética e foi nomeado por Bateria de Emoções Morais (BEM) o cérebro entre outros, é composto pelo lobo pré frontal, onde uma parte é responsável pela razão e outra parte responsável pela emoção, esta recebe influencia do sistema límbico, a ligação entre essas duas partes que nos direciona á um comportamento adequado socialmente, no cérebro do psicopata não há essa relação, a conseqüência disso é que eles pensam mais e sentem menos, pois o racional sempre sobrepõe ao emocional. Exames feitos através de ressonância magnética entre psicopatas e pessoas normais mostram que nas pessoas normais há alterações no sistema límbico quando vêem imagens de terrorismo e de uma flor, mas no cérebro do psicopata não há esta alteração, o que demonstra sua indiferença para emoções.

Para Silva (2015, p.162) desde a infância a pessoa já apresenta características da psicopatia como, por exemplo, maltratar animais, dificuldade em respeitar os pais, e é nessa fase em que tem que iniciar a intervenção social, através dos pais ou no meio onde vive, para buscar que o individuo sinta um pouco a empatia, essas intervenções são importantes, mas nem sempre tem o resultado esperado.

Há também outro fator que causa a psicopatia, são as lesões, a pessoa que sofre um acidente e o cérebro é afetado no sistema límbico, pode apresentar transtornos em razão da lesão.

A psicopatia apresenta dois elementos causais fundamentais: uma disfunção neurobiológica e o conjunto de influencias sociais e educativas que o psicopata recebe ao longo da vida. [...] A predisposição genética ou a vulnerabilidade biológica se concretiza em uma criança que apresente o déficit emocional. [...] Quando o ambiente não é capaz de fazer frente a tal bagagem, o resultado será um individuo psicopata sem nenhum limite. (SILVA, 2015, p.183)

Então, a combinação de fatores genéticos e sociais é decisiva na infância para quando na fase adulta o individuo torne indivíduos psicopatas.

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Sobre a autora
Talita Batista

Advogada, pós graduanda em Direito Público pela UNIFACS - Salvador.

Informações sobre o texto

Este texto foi publicado diretamente pelos autores. Sua divulgação não depende de prévia aprovação pelo conselho editorial do site. Quando selecionados, os textos são divulgados na Revista Jus Navigandi

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