A Lei nº 8.666/1993 é a norma responsável pela definição dos princípios gerais de licitação. Como lei federal, determina os parâmetros que serão adotados pela Administração Pública no momento da aquisição de bens e serviços. A Constituição Federal, no art. 22, destaca ser competência privativa de a União legislar sobre normas gerais de licitação.
O § 2º do art. 24 da Constituição, por sua vez, destaca que “a competência da União para legislar sobre normas gerais não exclui a competência suplementar dos Estados”. No caso do Distrito Federal, pode este exercitar a competência legislativa que for reservada aos estados, pois, de acordo com o § 1º do art. 32 da Constituição Federal, esse ente da Federação acumula a competência legislativa destinada aos estados e aos municípios.
Logo, pode legislar supletivamente e, após a lei complementar, referida no parágrafo único do art. 22, concorrentemente, também sobre questões específicas. É importante salientar, porém, que a própria Lei nº 8.666/1993 autoriza a edição de normas de natureza supletiva e a adaptação das normas gerais, como expressamente dispõe o art. 118.
A Lei de Licitações, também em seu art. 115, destaca que “os órgãos da Administração poderão expedir normas relativas aos procedimentos operacionais a serem observados na execução das licitações, no âmbito de sua competência”, sempre de acordo com os preceitos da lei geral.
Um ponto específico, porém, trata da possibilidade de estabelecer condições mais benéficas para alguns concorrentes do procedimento licitatório. Isso ocorre em casos em que determinadas empresas que cumprirem requisitos específicos podem ter preferência no momento da escolha da empresa vencedora.
O Supremo Tribunal Federal – STF, no julgamento de uma Ação Direta de Inconstitucionalidade, manifestou-se sobre o tema. No caso concreto, lei estadual do Mato Grosso do Sul inseriu a Certidão de Violação aos Direitos do Consumidor no rol de documentos exigidos para a habilitação em procedimentos licitatórios. Questionou-se, assim, a constitucionalidade1 da norma local.
Sobre o tema, o STF entendeu que o legislador estadual se arvorou na condição de intérprete primeiro do direito constitucional de acesso a licitações e criou uma presunção legal, de sentido e alcance amplíssimos, conforme a qual a existência de registros desabonadores nos cadastros públicos de proteção do consumidor é motivo suficiente para justificar o impedimento de contratar com a Administração local.
A Corte Suprema lecionou, no julgamento da ação, que a igualdade de condições dos concorrentes em licitações, embora seja enaltecida pela Constituição – art. 37, inc. XXI –, pode ser relativizada por duas vias: pela lei, mediante o estabelecimento de condições de diferenciação exigíveis em abstrato; e pela autoridade responsável pela condução do processo licitatório, que poderá estabelecer elementos de distinção circunstanciais, de qualificação técnica e econômica, sempre vinculados à garantia de cumprimento de obrigações específicas. Assim, fixou:
Somente a lei federal poderá, em âmbito geral, estabelecer desequiparações entre os concorrentes e assim restringir o direito de participar de licitações em condições de igualdade. Ao direito estadual (ou municipal) somente será legítimo inovar neste particular se tiver como objetivo estabelecer condições específicas, nomeadamente quando relacionadas a uma classe de objetos a serem contratados ou a peculiares circunstâncias de interesse local.
Ao final, declarou a lei inconstitucional por entender que a Lei Estadual nº 3.041/05 se dissociou dos termos gerais do ordenamento nacional de licitações e contratos e, com isso, usurpou a competência privativa da União de dispor sobre normas gerais na matéria.
Nota
1 SUPREMO TRIBINAL FEDERAL. Ação Direta de Inconstitucionalidade nº 3.755. Relator: ministro Teori Zavaski. Diário Oficial da União [da] República Federativa do Brasil, Brasília, DF, 14 ago. 2017. Seção 1, p. 02.