Um novo processo de escolha para o cargo de ministro do Supremo Tribunal Federal

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28/08/2017 às 15:36
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Um novo processo de escolha para os ministros do Supremo

Foi visto anteriormente no texto que o problema dos ministros do STF é que eles têm poder demais sem terem legitimidade democrática para isso. Eles podem reinterpretar a Constituição mudando completamente sua aplicação, como já foi feito antes, sem serem escolhidos pelo povo, ou mesmo terem suas decisões reguladas por algum poder cujos membros foram escolhidos pela população brasileira. Não há respeito ao já mencionado preceito segundo o qual a lei emana do povo. Por essa razão, a seguinte proposta terá como objetivo democratizar as nomeações dos ministros do STF, a fim de tornar a tão importante função da Suprema Corte uma função legítima e condizente com os princípios do estado democrático de direito.

Foi escrito no capítulo anterior que um dos maiores problemas do processo atual é a aprovação automática e displicente do Senado com as indicações presidenciais. Isso porque, quando ela ocorre, não há fiscalização do nome indicado pelo presidente, o que anula o mais básico princípio da tripartição dos poderes segundo o qual um poder deve fiscalizar o outro a fim de impedir que uma decisão importante seja tomada somente por um deles. Para impedir, então, que isso continue acontecendo, é necessário dificultar o processo de aprovação de uma indicação. Dificultar o processo de aceitação significa, em primeiro lugar, aumentar o quórum mínimo para a aprovação de um ministro, já que com isso serão necessários mais senadores apoiando a nomeação para validá-la.

Cada senador representa um alto número de eleitores, e por isso é necessário tentar agradar a cada um deles, a fim de agradar, com isso, a parte da população que nele votou. É claro que não se pode exigir unanimidade ou até mesmo algo perto disso para a nomeação de um ministro do Supremo, em razão da falta de funcionalidade disso, mas, quanto maior o quórum mínimo for para realizá-la, maior será atendência de a indicação presidencial ser a correta e representar a vontade geral do país.

Um projeto de lei complementar, por exemplo, deve receber a aprovação da maioria absoluta das duas casas do Congresso antes de ser encaminhado ao presidente.[23] É então coerente que uma pessoa como um ministro do STF, que irá compor uma corte com o poder de anular qualquer dessas leis complementares, passe por um processo de escolha mais complicado do que o de aprovação delas.

Entretanto, está previsto no parágrafo único do artigo 101 da Constituição que uma indicação do presidente deve ser aprovada somente pela maioria absoluta do Senado.[24]Isso dificulta completamente o enfrentamento do Senado com as indicações presidenciais, já que, hoje, 41 senadores podem manterjuntos a prática do Senado de nunca rejeitar um nome ao cargo de ministro do Supremo. Deve-se frisarque só o bloco de apoio ao governo e o bloco do Partido do Movimento Democrático Brasileiro (PMDB) têm juntos 49 senadores ao todo.[25] Eles seriam, portanto, capazes de aprovar qualquer ministro para o Supremo, já que têm mais do que a maioria absoluta do quórum do Senado. Como então realizar algum tipo de fiscalização se os outros 32 senadores tem sua vozes sufocadas diante da base de apoio ao governo unida, que, obviamente, nunca contrariará uma indicação da presidente?

Uma democracia deve ser formada com base no diálogo e no debate, sem que haja monopólio do poder de escolha em algo tão importante como uma nomeação. Por isso cada bloco deve ceder com o objetivo de que seja encontrado um nome com o qual a esmagadora maioria concorde. No cenário atual, entretanto, esses dois blocos nem mesmo precisam se preocupar com o consenso dos outros 32 senadores, por saberem que deles não precisarão.

O ideal para impedir o que está acontecendo é aumentar o mínimo de senadores necessários para a aprovação de uma indicação. É necessário que o quórum mínimo seja maior do que três quintos, já que três quintos é o necessário para se aprovar uma PEC,[26] uma vez que o novo ministro poderá, com seus colegas, mudar a leitura da restiva emenda constitucional, e com isso sua aplicação, por meio da introdução de uma nova interpretação do indeterminado texto normativo. Isso torna sua escolha infinitamente mais importante do que a aprovação de uma emenda à constituição.

Percebe-se, com isso, ser necessária uma mudança do quorum de aprovação senatorial para ministro do Supremo da atual maioria absoluta para dois terços. Isso seria suficiente para evitar que blocos isolados no Senado neutralizem outros, além de permitir que a oposição ao presidente unida consiga derrubar uma indicação que é para ela inadequada. Essa mudança também preservaria a coerência necessária ao ordenamento jurídico, já que a nomeação do ministro deve ter mais apoio do que uma aprovação de uma Proposta de Emenda à Constituição (PEC) ou de uma lei complementar, por ser mais importante que ambas.

Nessa proposta, os dois terços são, evidentemente, um exemplo de mudança, que pode ou não ser respeitada. O que não pode deixar de ser seguida é a proposta de tornar o quórum mínimo para a aprovação da indicação presidencial maior do que o da PEC, tendo em vista que o ministro poderá ter papel fundamental na aplicação dela.

Nesse contexto, se a escolha de ministro continuar sendo responsabilidade quase que única do presidente, haverá a chance considerável de as nomeações serem inadequadas, guiadas pelo interesse pessoal do presidente em nomear ministros que defenderão suas opiniões na Suprema Corte. Entretanto, se o quórum mínimo de fato aumentar, a oposição terá força para exigir boas nomeações ao tribunal. Nomeações que seguirão as exigências do presidente e do Congresso, ou seja, dos representantes do povo brasileiro.

Entre 2014 e 2018, por exemplo,o presidente nomeará cinco ministros à Suprema Corte, ou seja, quase metade dela, em menos de quatro anos.[27]Se esses cinco novos ministros forem vinculados ao novo presidente de alguma forma, eles tomarão sempre decisões semelhantes e condizentes com a vontade presidencial. Isso significaria que o presidente teria, em todos os julgamentos, cinco ministros do seu lado, o que daria a ele uma ampla vantagem nas decisões do STF, que são, como foi exposto, importantíssimas. Como então não fiscalizar suas indicações, a fim de impedir que ele nomeie companheiros políticos e ideológicos que votarão todos juntos para a aprovação das posições dele próprio? Hoje, essa pergunta é ignorada e posta de lado, uma vez que, como foi escrito, os blocos de apoio ao governo aprovam sem maiores problemas a indicação presidencial de um ministro, o que dá ao presidente o controle da mais alta corte do Poder Judiciário brasileiro.

Outra mudança imprescindível é a inclusão da Câmara dos Deputados no processo de aprovação da indicação presidencial. Todas as leis promulgadas no país passam, necessariamente, pela votação da Câmara, e por isso é de imensurável importância que a indicação dos juízestambémo faça, até porque o Parlamento brasileiro é formado com a Câmara ao lado do Senado, e não separada e abaixo dele.[28]

Não batasse, sabe-se que, no bicameralismo federativo brasileiro, a Câmara dos Deputados é composta pelos represenantes do povo, enquanto o Senado Federal representa os Estados-Membros e o Distrito Federal.[29]-[30] Note-se, então, que a presença da Câmara dos Deputados no processo de escolha dos ministros do STF fará com que a vontade do povo esteja presente na nomeação. Excluir a Câmara do processo de aceitação da indicação de ministro é também uma escolha que, além de ser incoerente, reduz o número de representantes democraticamente eleitos pelo povo responsáveis pela aprovação da indicação presidencial, o que torna o processo, logicamente, menos participativo e menos democrático.

O quórum mínimo para a Câmara poderia ser também de dois terços já que, em geral, os quóruns das duas casas são os mesmos. Além disso, usando o mesmo raciocínio do Senado para a Câmara, dois terços também seriam um quórum mínimo satisfatório para a aprovação de um ministro. Isso tomando como base a quantidade de deputados necessária para a aprovação de uma PEC.

Essa maior participação do Congresso na nomeação é necessária para dificultar a entrada de qualquer um no Supremo, além de aumentar o debate em torno dos nomes propostos, o que enriqueceria o processo de aprovação e diminuiria as chances de uma escolha equivocada.

Dessa forma, impõe-se observar que as mudanças no processo de escolha dos ministros são mudanças estruturais, por modificarem a forma segundo a qual um ministro é escolhido. Essas mudanças têm como objetivo, como foi anteriormente escrito, a legitimação democrática da função exercida pelo STF. Com elas, os ministros terão a aprovação declarada de uma extensa parte do Congresso e do presidente brasileiro, podendo portanto atuar com a legitimidade que o estado democrático exige para existir.


Considerações Finais

Ante o exposto, não se pode ignorar tudo o que foi mostrado nos capítulos anteriores do texto. O processo de escolha atual dos ministros do Supremo é falho e arriscado, por dar espaço para o abuso de poder do presidente, que nomeia hoje os ministros quase que sozinho.  É válida a visão de que o STF tem legitimidade para decidir, porém esse poder de decisão não é condizente como estado brasileiro que preza, em primeiro lugar, pelo poder do povo no governo do Estado. É incoerente impor que o legislador seja eleito se o ministro da Suprema Corte pode ser nomeado sem nenhuma dificuldade pelo presidente e sua base de apoio no Senado. Ministro esse que terá uma posição na legislação do país tão ou mais importante que a do próprio legislador, por definir a interpretação do texto constitucional e poder, com isso,afastar do ordenamento jurídico leis ou atos normativos considerados inconstitucionais, assim como mudar a aplicação deles em defesa da Constituição Federal.

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O poder não emana do povo no momento em que as normas do estado brasileiro são postas de acordo com a visão de ministros escolhidos por um processo quase que banalizado de tão simples. Essa é uma falha do sistema brasileiro, que deve ser revista e consertada imediatamente. Foi essa, na verdade, a abordagem do presente artigo: reparar uma incongruência do ordenamento pretensamente completo do estado brasileiro.

Este trabalho foi escrito há um ano. Seu autor já mudou de posição, com relação ao melhor processo de escolha de ministros para o STF.


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