5- Conclusão
A Constituição brasileira de 1988 estabelece, como princípios da República, o respeito à pessoalização dos tributos (art. 145, §1º), à vedação ao confisco (art. 150, IV) e à capacidade contributiva (art. 145, §1º).
Ao dizer, em seu art. 145, §1º, que "sempre que possível, os impostos terão caráter pessoal e serão graduados segundo a capacidade econômica do contribuinte", a Constituição está dando um mandamento que deve ser seguido em toda a extensão do Direito Tributário. Os impostos devem ser pessoalizados e devem respeitar a capacidade contributiva. Isso quer dizer, voltando ao brocardo do começo do texto, que "quanto mais se ganha, mais se paga"[25].
O aspecto quantitativo do imposto - o quantum que será pago - é definido por dois fatores: uma alíquota e uma base de cálculo. Esta consiste no bem de consumo, ou na renda, ou no patrimônio sobre o qual incide o imposto. Indiscutível é que essas três coisas são manifestações de riqueza: quão mais valioso o bem consumido, ou o patrimônio, ou a renda, mais rico é o contribuinte.
O mandamento de pessoalizar o tributo e respeitar a capacidade contributiva de cada um exige que as riquezas do contribuinte sejam mensuradas antes que se determine quanto, exatamente, será a alíquota de um imposto.
Avaliar a riqueza significa olhar para a base de cálculo do imposto: ao bem consumido, ou à renda, ou ao patrimônio sobre o qual o patrimônio incide. Nesse sentido, dizer que a alíquota deve variar com relação ao tamanho da riqueza tributada - para que quem tem mais pague mais e quem tem menos pague menos -, é dizer que a alíquota deve variar de acordo com a base de cálculo.
Como vimos na primeira seção deste trabalho, essa é, precisamente, a definição de progressividade tributária: "é progressivo o imposto cuja alíquota é maior na medida em que aumenta a base tributável."[26]
Conclui-se, então, que o art. 145, §1º exige expressamente a pessoalização do tributo, para que quem tem mais, pague mais. A manifestação de riqueza está justamente na base tributada - a base de cálculo. Nesse sentido, para que a alíquota seja pessoalizada, respeite a capacidade econômica e seja maior para quem tem mais, ela deve variar de acordo com a riqueza manifestada pelo contribuinte por meio da base tributada.
Em outras palavras, a alíquota deve variar de acordo com a base de cálculo, para respeitar os princípios constitucionais do art. 145. Ou, resumindo, para respeitar os princípios constitucionais ela deve ser progressiva.
Com isso em mente, a jurisprudência do Supremo, ao adotar, em alguns momentos, a posição de que tributos reais não podem ser progressivos, está errada e viola o art. 145 da Constituição. Este em nenhum momento diz que a pessoalização e o respeito à capacidade econômica não se aplicarão aos impostos reais. Enquanto submetido à Constituição, conclui-se, portanto, que o Supremo não deveria ter feito a diferenciação que fez entre impostos reais e outros. O melhor a se fazer seria ter estendido também ao ITBI e ao IPTU antes da Emenda 29 - dois dos três impostos aqui estudados - a progressividade.
De toda forma, felizmente, a jurisprudência já caminha no sentido de aceitar a aplicação ilimitada do art. 145, §1º, incluindo para impostos reais e sem exigir previsão expressa para a progressividade. Isso foi exatamente o que ocorreu na decisão do ITCMD rio-grandense, sendo que, quando comparada com as decisões do STF acerca da progressividade do ITBI, ela está em maior sintonia com os princípios constitucionais da igualdade material tributária, da justiça tributária e da capacidade contributiva; ou seja, ela está em maior sintonia com a Constituição.
Bibliografia
ALEXANDRINO, Marcelo; PAULO, Vicente. Direito Tributário na Constituição e no STF: teoria e jurisprudência. 7ª edição. p. 208.
ATALIBA, Geraldo, "Progressividade e Capacidade Contributiva", Separata da RDT, 1991, p. 49.
MACHADO, Hugo de Brito, "Progressividade e Socialismo”, Jornal Zero Hora do dia 18 de agosto, 1998, p. 15.
MACHADO, Hugo de Brito. Curso de direito tributário. 29ª edição. São Paulo: Malheiros, pp. 298 e 300.
MARTINS, Ives Gandra da Silva; BARRETO; Aires, "A Inconstitucionalidade da progressividade prevista na EC nº 29/2000 - IPTU, Aspectos jurídicos relevantes", Quartier Latin, 2002, p. 80-81.
MELO, José Eduardo Soares de; PAULSEN, Leandro. Impostos Federais, Estaduais e Municipais. 10ª edição. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2016, p. 376.
PAULSEN, Leandro; MELO, José Eduardo Soares de. Impostos Federais, Estaduais e Municipais. 10ª edição. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2016, p. 71.
PAULSEN, Leandro. Direito Tributário: Constituição e Código Tributário à luz da doutrina e da jurisprudência. 7ª edição, p. 389.
SABBAG, Eduardo. Manual de Direito Tributário. 8ª edição. São Paulo: Saraiva, 2016, p. 453.
Notas
[1] Matrícula nº 14/0154809, disciplina "PAD - Tributação e Distribuição de Renda", Professor Valcir Gassen.
[2] MACHADO, Hugo de Brito. Curso de direito tributário. 29ª edição. São Paulo: Malheiros, pp. 298 e 300.
[3] PAULSEN, Leandro; MELO, José Eduardo Soares de. Impostos Federais, Estaduais e Municipais. 10ª edição. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2016, p. 71.
[4] MELO, José Eduardo Soares de; PAULSEN, Leandro. Impostos Federais, Estaduais e Municipais. 10ª edição. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2016, p. 374.
[5] SABBAG, Eduardo. Manual de Direito Tributário. 8ª edição. São Paulo: Saraiva, 2016, p. 453.
[6] ATALIBA, Geraldo, "Progressividade e Capacidade Contributiva", Separata da RDT, 1991, p. 49.
[7] SABBAG, Eduardo. Manual de Direito Tributário. 8ª edição. São Paulo: Saraiva, 2016, p. 453.
[8] Op. Cit., p. 453.
[9] RE nº 590.360 - AgR/ES - rel. Min. Celso de Mello, julgamento em 31.5.11.
[10] SABBAG, Eduardo. Manual de Direito Tributário. 8ª edição. São Paulo: Saraiva, 2016, p. 453.
[11] MACHADO, Hugo de Brito, "Progressividade e Socialismo”, Jornal Zero Hora do dia 18 de agosto, 1998, p. 15.
[12] SABBAG, Eduardo. Manual de Direito Tributário. 8ª edição. São Paulo: Saraiva, 2016, p. 1134.
[13] MARTINS, Ives Gandra da Silva; BARRETO; Aires, "A Inconstitucionalidade da progressividade prevista na EC nº 29/2000 - IPTU, Aspectos jurídicos relevantes", Quartier Latin, 2002, p. 80-81.
[14] MELO, José Eduardo Soares de; PAULSEN, Leandro. Impostos Federais, Estaduais e Municipais. 10ª edição. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2016, p. 376.
[15] Op. Cit., p. 376.
[16] Op. Cit., p. 379.
[17] SABBAG, Eduardo. Manual de Direito Tributário. 8ª edição. São Paulo: Saraiva, 2016, p. 1188.
[18] ALEXANDRINO, Marcelo; PAULO, Vicente. Direito Tributário na Constituição e no STF: teoria e jurisprudência. 7ª edição. p. 208.
[19] MELO, José Eduardo Soares de; PAULSEN, Leandro. Impostos Federais, Estaduais e Municipais. 10ª edição. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2016, p. 386.
[20] SABBAG, Eduardo. Manual de Direito Tributário. 8ª edição. São Paulo: Saraiva, 2016, p. 1188.
[21] MELO, José Eduardo Soares de; PAULSEN, Leandro. Impostos Federais, Estaduais e Municipais. 10ª edição. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2016, p. 374.
[22] ATALIBA, Geraldo, "Progressividade e Capacidade Contributiva", Separata da RDT, 1991, p. 49.
[23] SABBAG, Eduardo. Manual de Direito Tributário. 8ª edição. São Paulo: Saraiva, 2016, p. 1188.
[24] PAULSEN, Leandro. Direito Tributário: Constituição e Código Tributário à luz da doutrina e da jurisprudência. 7ª edição, p. 389.
[25] SABBAG, Eduardo. Manual de Direito Tributário. 8ª edição. São Paulo: Saraiva, 2016, p. 453.
[26] MACHADO, Hugo de Brito, "Progressividade e Socialismo”, Jornal Zero Hora do dia 18 de agosto, 1998, p. 15.