4. Requisitos de habilitação exigíveis de sociedades cooperativas
De acordo com o item 10.2 do Anexo VII-A, da IN nº 5/2017, para a habilitação exigir-se-á dos interessados, exclusivamente, a documentação prevista no art. 27 da Lei nº 8.666/1993, qual seja: (a) habilitação jurídica; (b) qualificação técnica; (c) qualificação econômico-financeira; (d) regularidade fiscal e trabalhista; e (e) cumprimento do disposto no inciso XXXIII, do art. 7º, da Constituição Federal. Na sequência, os artigos 28 a 31 da Lei elencam os documentos atinentes a cada um desses requisitos de habilitação.
O disposto no item 10.2 do Anexo VII-A, da IN nº 5/2017 atende, pois, ao art. 40, inciso VI, da Lei nº 8.666/1993, segundo o qual o edital da licitação deverá prever as condições para participação na licitação, em conformidade com os artigos 27 a 31 da Lei Geral. Ou seja, o dispositivo limita as possíveis exigências de habilitação dos licitantes aos requisitos expressos nesses artigos.
Do advérbio “exclusivamente”, constante do art. 27, caput, da Lei nº 8.666/1993, deduz-se que nada mais poderá ser exigido na licitação além da documentação mencionada nos artigos 27 a 31, excetuada exigência prevista em lei especial, como ressalva o art. 30, inciso IV (“Art. 30. A documentação relativa à qualificação técnica limitar-se-á a: […] IV - prova de atendimento de requisitos previstos em lei especial, quando for o caso”).
Sobre o rol taxativo de requisitos de habilitação previstos nos artigos 27 a 31 da Lei nº 8.666/1993, assentou o Tribunal de Contas da União:
9.3. determinar, com base no art. 250, inciso II, do Regimento Interno do TCU, à […] que, no caso de reedição da licitação: observe, para efeito de habilitação de licitantes, os limites fixados nos arts. 27 a 33 da Lei nº 8.666/1993, de modo a evitar disposições que comprometam a competitividade da licitação […] (Acórdão nº 2.995/2013 - Plenário, Rel. Min. Valmir Campelo, Processo nº 019.848/2013-7);
7. Ocorre que as condições de habilitação estão taxativamente previstas nos arts. 27 a 31 da Lei nº 8.666, de 21 de junho de 1993, de tal modo que o instrumento convocatório extrapolou abusivamente os critérios para habilitação das licitantes (Acórdão nº 7.528/2013-Segunda Câmara, Rel. Min. André Luís de Carvalho, Processo nº 031.132/2013-8);
[…] abstenha-se de incluir nos instrumentos convocatórios exigências, não justificadas, que restrinjam o caráter competitivo das licitações, em observância ao art. 37, inciso XXI, da Constituição Federal e em atendimento aos dispositivos legais que proíbem cláusulas/condições editalícias restritivas da competitividade, em especial o art. 3º, §1º, inciso I, e o art. 30, §1º, inciso I, e §5º, da Lei nº 8.666/93, especialmente com relação à inclusão de condições para a participação dos concorrentes que não estejam amparadas nos arts. 27 a 31 da mencionada norma (Acórdão nº 4.606/2010 – Segunda Câmara, Rel. Min. Augusto Sherman Cavalcanti, Processo nº 015.664/2006-6);
Note-se que o termo exclusivamente, constante do art. 27, caput, da Lei nº 8.666/1993, significa que nada mais poderá ser exigido além da documentação mencionada nos arts. 27 a 31 da Lei nº 8.666/1993 (Acórdão nº 1.265/2010 – Plenário, Processo nº 004.287/2010-0, Rel. Min. Aroldo Cedraz).
Os artigos 27 a 31 da Lei nº 8.666/1993 relacionam e limitam os documentos a serem exigidos em licitações e contratações diretas, sendo também aplicáveis à modalidade pregão (art. 4º, XIII, c/c art. 9º da Lei nº 10.520/2002) e ao regime diferenciado de contratações públicas – RDC (art. 14 da Lei nº 12.462/2011).
Extrai-se, contudo, do item 10.5 do Anexo VII-A, da IN nº 5/2017 que, sendo permitida a participação de cooperativas, o ato convocatório deve exigir, na fase de habilitação (para efeito de qualificação), os seguintes documentos:
a) a relação dos cooperados que atendem aos requisitos técnicos exigidos para a contratação e que executarão o contrato, com as respectivas atas de inscrição e a comprovação de que estão domiciliados na localidade da sede da cooperativa, respeitado o disposto no inciso XI do art. 4°, inciso I do art. 21 e §§ 2º a 6º do art. 42 da Lei nº 5.764/1971;
b) a declaração de regularidade de situação do contribuinte individual (DRSCI) de cada um dos cooperados relacionados;
c) a comprovação do capital social proporcional ao número de cooperados necessários à prestação do serviço;
d) o registro previsto no art. 107 da Lei nº 5.764/1971;
e) a comprovação de integração das respectivas quotas-partes por parte dos cooperados que executarão o contrato;
f) comprovação do envio do Balanço Geral e o Relatório do exercício social ao órgão de controle, conforme dispõe o art. 112 da Lei nº 5.764/1971; e
g) os seguintes documentos para a comprovação da regularidade jurídica da cooperativa:
g.1. ata de fundação;
g.2. estatuto social com a ata da assembleia que o aprovou;
g.3. regimento dos fundos instituídos pelos cooperados, com a ata da assembleia que os aprovou;
g.4. editais de convocação das três últimas assembleias gerais extraordinárias;
g.5. três registros de presença dos cooperados que executarão o contrato em assembleias gerais ou nas reuniões seccionais; e
g.6. ata da sessão que os cooperados autorizaram a cooperativa a contratar o objeto da licitação.
A apresentação de documento contendo a relação dos cooperados que satisfaçam aos requisitos técnicos exigidos para a contratação e que executarão o contrato, constante no item 10.5, “a”, do Anexo VII-A da IN nº 5/2017, constitui requisito de qualificação técnica previsto no art. 30, §6º, da Lei nº 8.666/1993, podendo ser atendido mediante a apresentação de relação identificadora dos profissionais e da declaração formal de sua disponibilidade. No tocante à comprovação de que os cooperados encontram-se domiciliados na localidade da sede da cooperativa, configura circunstância impertinente para o específico objeto do contrato e restritiva à competição, consoante disposto no art. 3º, §1º, I, da Lei nº 8.666/1993. Nada obsta que um cooperado, residente em município vizinho ao da sede da cooperativa ou, ainda, não residente no município da sede da sociedade cooperativa, mas residente no município da sede do órgão ou entidade pública licitante, execute o serviço contratado. Ademais, tal exigência configura interferência indevida da administração pública nas atividades exercidas por sociedades cooperativas, motivo pela qual deve ser evitada.
As comprovações de envio do balanço geral, de relatório do exercício social ao órgão de controle e de capital social proporcional ao número de cooperados necessários à prestação do serviço, previstas no item 10.5, “c” e “f”, do Anexo VII-A da IN nº 5/2017, constituem requisitos tendentes a comprovar a idoneidade financeira da sociedade cooperativa, traduzindo-se em requisitos de qualificação econômico-financeira com previsão no art. 31, I e §§2º e 3º, da Lei nº 8.666/1993.
É dever jurídico de toda cooperativa registrar-se na Organização das Cooperativas Brasileiras ou na entidade estadual, se houver, mediante apresentação do estatuto social e suas alterações posteriores. Tal exigência, prevista no item 10.5, “d”, do Anexo VII-A da IN nº 5/2017, constitui requisito de habilitação jurídica previsto no art. 28, V, da Lei nº 8.666/1993 [Art. 28. A documentação relativa à habilitação jurídica, conforme o caso, consistirá em: (…) V - decreto de autorização, em se tratando de empresa ou sociedade estrangeira em funcionamento no País, e ato de registro ou autorização para funcionamento expedido pelo órgão competente, quando a atividade assim o exigir].
A ata de fundação, de estatuto social com a ata da assembleia que o aprovou e de regimento dos fundos instituídos pelos cooperados, com a ata da assembleia que os aprovou, almejam comprovar a possibilidade de aquisição de direitos e de contração de obrigações por parte da sociedade cooperativa, configurando requisito de habilitação jurídica previsto no art. 28 da Lei nº 8.666/1993.
No tocante aos demais requisitos elencados no item 10.5 do Anexo VII-A da IN nº 5/2017, notadamente nos subitens “b” (declaração de regularidade de situação do contribuinte individual – DRSCI, de cada um dos cooperados relacionados), “e” (comprovação de integração das respectivas quotas-partes por parte dos cooperados que executarão o contrato), “g.4” (editais de convocação das três últimas assembleias gerais extraordinárias), “g.5” (três registros de presença dos cooperados que executarão o contrato em assembleias gerais ou nas reuniões seccionais) e “g.6” (ata da sessão que os cooperados autorizaram a cooperativa a contratar o objeto da licitação), por não figurarem no taxativo elenco de documentos previstos nos artigos 27 a 31 da Lei nº 8.666/1993, não devem ser exigidos como requisitos de habilitação, entretanto, nada obsta que ditas comprovações sejam exigidas no termo de contrato, como obrigação da sociedade cooperativa que vencer a disputa.
Ademais, a indicação e a limitação dos documentos que podem ser exigidos dos licitantes, na fase de habilitação, devem estar previstas em lei geral de edição privativa da União (art. 22, XXVII, CR/88), pois visam conferir segurança jurídica à administração e aos interessados em participar dos certames competitivos.
5. Declaração de elaboração independente de proposta
Dispõe o item 4.5 do Anexo VII-A da IN nº 5/2017 que deve constar dos atos convocatórios a obrigatoriedade de o licitante apresentar declaração de que sua proposta foi elaborada de maneira independente, de acordo com o estabelecido na Instrução Normativa/SLTI nº 2, de 16 de setembro de 2009, cujo art. 1º estabelece:
Art. 1º Tornar obrigatória a apresentação da Declaração de Elaboração Independente de Proposta, constante no Anexo I desta Instrução Normativa, em procedimentos licitatórios, no âmbito dos órgãos e entidades integrantes do Sistema de Serviços Gerais – SISG.
§1º Deverá constar dos instrumentos convocatórios das modalidades licitatórias tradicionais e do Pregão, em sua forma presencial, a obrigatoriedade de o licitante apresentar a Declaração de Elaboração Independente de Proposta, no momento de abertura da sessão pública.
§2º Deverá constar do instrumento convocatório da modalidade licitatória Pregão, em sua forma eletrônica, a obrigatoriedade de o licitante apresentar a Declaração de Elaboração Independente de Proposta, no momento da habilitação, enquanto o sistema informatizado não disponibilizar a referida declaração aos licitantes, no momento da abertura da sessão pública.
A finalidade da declaração é a de prevenir a prática de infração contra a ordem econômica, sobretudo mediante atos cujo alvo seja: (a) limitar, falsear ou de qualquer forma prejudicar a livre concorrência ou a livre iniciativa; (b) o domínio do mercado do objeto da licitação; (c) aumento arbitrário dos lucros; ou (d) exercício abusivo de posição dominante, assim considerado, segundo a Lei nº 8.884/1994, quando empresa ou grupo de empresas controla parcela substancial de mercado relevante, como fornecedor de produto, serviço ou tecnologia a ele relativa.
A obrigatoriedade de entregar declaração de elaboração independente de proposta, no momento da abertura da sessão pública, como condição para participação na licitação, não conhece precedente legal.
Vero é que o art. 115 da Lei nº 8.666/1993 estabelece que órgãos da administração podem expedir normas relativas a procedimentos operacionais a serem observados na execução das licitações, no âmbito de sua competência, desde que observadas as disposições da lei. Atos administrativos não podem inovar a ordem jurídica, criando obrigações ou proibições aos licitantes sem prévio assento em lei.
Louvável a intenção do Ministério do Planejamento, Orçamento e Gestão (atual Ministério do Planejamento, Desenvolvimento e Gestão), ao editar a IN SLTI/MPOG nº 02, de 2009, na tentativa de dissuadir a prática de infração contra a ordem econômica pelos licitantes. Todavia, a obrigatoriedade da apresentação de qualquer documento na licitação, como condição de participação, somente pode decorrer de lei, não de norma de inferior hierarquia, no caso, instrução normativa, que se deve conter no plano da regulamentação de norma legal preexistente.
A Constituição estabelece a competência privativa da União para “legislar” sobre normas gerais de licitação e contratação, em todas as modalidades, ou seja, somente lei em sentido formal (proveniente do Poder Legislativo) pode definir obrigações e proibições na seara das licitações e contratações administrativas. Instrução normativa ou outra norma inferior à lei só pode cunhar regras destinadas a disciplinar, de forma secundária, os procedimentos da licitação e da contratação direta, sob pena de violar o princípio da reserva legal com que a Carta Maior define a competência para a produção legislativa na matéria. Por conseguinte, a presença dessa exigência em edital pode acarretar impugnação a este, que haveria de ser acolhida por conter exigência ilegal.
Quanto às exigências previstas no item 4.6 (declaração de que a empresa licitante não possui, em sua cadeia produtiva, empregados executando trabalho degradante ou forçado) e no item 4.7 (declaração informando se os serviços são produzidos ou prestados por empresas que comprovem cumprimento de reserva de cargos, prevista em lei, para pessoa com deficiência ou para reabilitado da Previdência Social, e que atendam às regras de acessibilidade previstas na legislação) do Anexo VII-A da IN nº 5/2017, encontram respaldo legal, respectivamente, nos incisos III e IV do art. 1º e no inciso III do art. 5º da Constituição Federal e no art. 93 da Lei nº 8.213/91, que dispõe sobre os planos de benefícios da Previdência Social.