Capa da publicação Ejaculação em ônibus: arrebatamento sexual de inopino é crime?
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O arrebatamento sexual de inopino no interior de transporte público coletivo com a ejaculação na vítima é crime?

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A ejaculação sobre uma mulher no interior de um ônibus é crime ou contravenção penal? Se crime for, qual seria a adequação típica correta?

I – INTRODUÇÃO

Após o ocorrido em 29.08.17 na cidade São Paulo, em que um homem ejaculou sobre uma mulher no interior de um veículo de transporte público[1], foi inaugurada uma nova discussão sobre tais casos no mundo jurídico. O fato de o ataque sexual de inopino no interior de transporte público com a ejaculação na vítima é tido como crime ou contravenção penal? Se crime for, qual seria a adequação típica correta?

Tais casos têm ocorrido diuturnamente, em todas as regiões do Brasil e, enquanto o legislador não se preocupar quanto a criação de tipo penal específico, caberá ao operador do direito, limitado pelos princípios de Direito Penal e pelos métodos de interpretação, adequar a conduta à infração penal que melhor servir ao caso.

Ao falar deste assunto, não podemos fugir da alteração ocorrida com o advento da Lei nº 12.015/09 no tocante ao título VI do Código Penal, anteriormente intitulado de “crimes contra os costumes”, e hoje de “crimes contra a dignidade sexual”. Neste aspecto o legislador se preocupou em não mais limitar as condutas ali previstas ao sentimento de repulsa social, como acontecia na época de edição do próprio Código Penal, mas sim a efetiva lesão ao bem jurídico em questão, elevado a condição digna de ser humano.

Nesta toada, a

“(…) legislação se preocupou, principalmente, com o respeito à dignidade da pessoa humana, pilar do Estado Democrático de Direito, pois não há dúvidas sobre a intensidade da violação que as vítimas dessa espécie de infração sofrem, observando-se a tentativa de combate às diversas espécies de violência sexual, não reguladas de forma eficaz pela legislação anterior”[2].

A inauguração desta nova ótica dos crimes, agora intitulados de “crimes contra a dignidade sexual”, trouxe a tona a reflexão sobre a conduta prevista no art. 61[3] da Lei de Contravenções Penais, a qual tutela a “polícias de costumes”, conhecida como importunação ofensiva ao pudor. O pudor, nada mais é, que o sentimento de vergonha ou recato sexual, relacionado ao incomodo de pessoa com pedidos repetitivos ou presença física provocadora de maneira ofensiva em local público ou acessível ao público.

Regra geral, nos transportes públicos a contravenção se dá com apalpadelas nas nádegas, ou com as já conhecidas “encoxadas”, podendo o sujeito ativo, tanto quanto o sujeito passivo, ser homem ou mulher, com a ressalva de que o caso concreto é que norteará o operador do Direito. Em tais casos, por ser uma infração penal de menor potencial ofensivo, bem como por tutelar bem jurídico diverso da dignidade sexual, não lhe é cominada pena privativa de liberdade, mas tão somente pena de multa.

Nucci, defende que

“atos ofensivos ao pudor, como passar a mão nas pernas da vítima, devem ser considerados uma contravenção penal, e não um crime. A este é preciso preservar o ato realmente lascivo, que sirva para satisfazer a ânsia sexual do autor (…). Uma breve passada de mãos nos seios da vítima, fugaz e de inopino, não nos parece seja um estupro, mas uma importunação ofensiva ao pudor”[4].

Ocorre que não podemos, respeitadas as críticas, entender que o fato de um homem ejacular em mulher, em qualquer lugar que seja, sem seu consentimento e, até mesmo, sem seu conhecimento da existência do ato, caracterize a contravenção penal em tela. Em tal caso, estamos diante de uma nítida violação à dignidade sexual da pessoa, e não de mero aborrecimento ou vergonha sexual.

Para tanto, pautados na legalidade estrita, princípio basilar do Direito Penal, devemos nos socorrer dos tipos penais previstos na legislação brasileira, dentre eles o art. 213 (estupro); 215 (violação sexual mediante fraude) e 217-A (estupro de vulnerável), bem como de métodos de interpretação, em especial, a interpretação analógica.

Apenas a título de esclarecimento, a interpretação analógica “é o processo de averiguação do sentido da norma jurídica, valendo-se de elementos fornecidos pela própria lei, pelo método de semelhança”[5].


II – DA NÃO OCORRÊNCIA DOS CRIMES DOS ARTIGOS 213 E 215 DO CÓDIGO PENAL

Estabelece o artigo 213 do Código Penal que “constranger alguém, mediante violência ou grave ameaça, a ter conjunção carnal ou a praticar ou permitir que com ele se pratique outro ato libidinoso” caracteriza crime de estupro.

O tipo penal em tela parte do pressuposto de que antes, ou durante o ato, o agente, valendo-se de violência, isto é, valendo-se de força física suficientemente capaz de impedir a reação da vítima, pratique conjunção carnal (se mulher), ou outro ato libidinoso contrariando a vontade do subjugado. Por sua vez, na grave ameaça “o agente se vale de violência moral, situação em que a vítima não vê alternativa a não ser ceder ao ato sexual”[6].

O fato de o agente ejacular na vítima, por mais repugnante e atentatório a dignidade humana que o seja, não caracteriza, em hipótese alguma, o crime em tela. Para tanto, não necessitamos nos valer de qualquer malabarismo jurídico, já que em tal ato, tanto antes, ou durante, não há por parte do agente violência ou grave ameaça típicas do constrangimento sexual (muito embora haja, como consequência do ato, uma verdadeira violência psicológica em face da vítima). Logo, ausentes tais elementares, não é possível a subsunção do fato ao tipo do art. 213 do CP.

Discussão tão simples não se dá quando analisado o tipo penal do art. 215 do CP[7], principalmente em sua parte final: “ter conjunção carnal ou praticar outro ato libidinoso com alguém, mediante fraude ou outro meio que impeça ou dificulte a livre manifestação de vontade da vítima”.

O art. 215, do Código Penal Brasileiro preconiza que:

Ter conjunção carnal ou praticar outro ato libidinoso com alguém, mediante fraude ou outro meio que impeça ou dificulte a livre manifestação de vontade da vítima: Pena - reclusão, de 2 (dois) a 6 (seis) anos”.

O crime de violação sexual mediante fraude, mais conhecido como “estelionato sexual”, tem os mesmos objetivos que o tipo penal do art. 213, quais sejam, de alcançar a conjunção carnal ou outro ato libidinoso. O que o difere do tipo penal anterior é que o mecanismo utilizado para tanto não é a violência e nem a grave ameaça, mas sim a fraude ou outro meio que impeça ou dificulte a livre manifestação da vontade da vítima.

Em sua parte final, o legislador utilizou de uma fórmula genérica para que o operador do direito o interpretasse à similitude da primeira parte do tipo, fazendo uso da interpretação analógica, em que o agente utilize de mecanismo qualquer que prejudique a real percepção da realidade pela vítima, ludibriando-a e mantendo com ela relação sexual ou ato libidinoso diverso por estar em nítido erro quanto a percepção da realidade. Um exemplo é a vítima relativamente alcoolizada que pode anuir com a prática do ato sem estar na plenitude de sua consciência.

O primeiro ponto que nos chama atenção nesse tipo sob exame, é que trata-se de um consentimento viciado pela fraude, sem a presença de grave ameaça ou violência. Nesse caso, o agente delituoso atua de modo a viciar a vontade da vítima, mantendo-a em erro a fim de praticar a conjunção carnal. Nesse delito, se não fosse o erro, não haveria qualquer relação sexual entre autor e vítima.

A nosso ver esse primeiro ponto do art. 215, do Código Penal Brasileiro está superado, porquanto o agente que está se masturbando e ejacula de inopino e inesperadamente na vítima, sequer dá a possibilidade daquela em consentir ou não. Logo, parece descartado de pronto nessa situação específica.

O ponto nodal da celeuma está na parte final do art. 215, do Código Penal Brasileiro quando o legislador ordinário fez a opção de prever “outro meio que impeça ou dificulte a livre manifestação de vontade da vítima”.

Masson, ao comentar a parte final tipo penal, ensina que

“[...] o legislador novamente se socorre da interpretação analógica (ou intra legem), pois descreve uma fórmula casuística (“fraude”) seguida de fórmula genérica (“outro meio que impeça ou dificulte a livre manifestação de vontade da vítima”). Destarte, este meio deve ser similar à fraude, apto a enganar alguém e retirar ou diminuir sua liberdade de escolha, a exemplo da causação dolosa de embriaguez incompleta (…). Em síntese, no crime traçado no art. 215 do Código Penal, a fraude limita-se a viciar a vontade da vítima, sem eliminá-la (grifo nosso). Esta é a diferença precípua entre violação sexual mediante fraude e o estupro de vulnerável”[8].

Com isso, não nos parece que a ejaculação de inopino em uma vítima se encaixe à expressão “outro meio que impeça ou dificulte a livre manifestação de vontade da vítima”. A vítima nesse contexto em estudo, não é colocada em posição de aceite do ato. O mesmo se dá com a expressão “dificulte a livre manifestação de vontade da vítima”. Como analisar a ejaculação de inopino como meio que dificulte à manifestação da vítima, sendo que isso não é dado a ela a oportunidade sequer de saber que será alvo da ejaculação?

No caso que se deu em São Paulo, o agente e a vítima não tiveram nenhum contato prévio antes do fato, motivo pelo qual nem mesmo poderia ter havido indução ao erro ou outro meio que impedisse ou dificultasse a livre manifestação de sua vontade.

Um bom exemplo que impede a manifestação de vontade da vítima é a do médico ginecolgista que, ao examinar a paciente, resolver introduzir o dedo em sua vagina a fim de satisfazer seus interesses sexuais.

Em tal caso, estamos diante de um meio em impede a livre manifestação da vontade da vítima, anuindo com tal fato uma vez acreditar que o médico esteja cumprindo com seu mister. De se notar que a vítima cede ao contato, acreditando que o médico esteja realizando um exame. Este é típico caso em que a vítima tem sua livre manifestação de vontade impedida ou dificultada. Haveria, no entanto, a fraude (primeira parte do art. 215 do CP) caso o agente fosse um “falso médico”.

O que queremos deixar claro é que, para a ocorrência do crime previsto no art. 215 do Código Penal é necessário que a vítima consinta na prática do ato, desde que ludibriada pelo agente em razão de uma fraude ou, desde que, em razão da prática de outro meio fraudulento (formula genérica) a vítima esteja impedida ou dificultada de externar sua livre manifestação.

Essas indagações reforçam que a tese mais adequada a essa hipótese em cotejo é do crime do art. 217-A, § 1°, do Código Penal Brasileiro.


III – DA EXISTÊNCIA DO CRIME DO ART. 217-A, § 1°, PARTE FINAL: ESTUPRO DE INOPINO (ESTUPRO SÚBITO, ESTUPRO IMEDIATO, ESTUPRO INESPERADO OU ESTUPRO REPENTINO)

Defendemos a tese de que o caso em tela está muito mais próximo do crime de estupro de vulnerável por impossibilidade de resistência da vítima (art. 217-A, § 1°, parte final, do CPB) [“ou que, por qualquer outra causa, não pode oferecer resistência”], que do crime do art. 215 do Código Penal.

A redação do art. 217-A, § 1º, do Estatuto Penal reza que:

“ter conjunção carnal ou praticar outro ato libidinoso com menor de 14 (catorze) anos: Pena - reclusão, de 8 (oito) a 15 (quinze) anos. § 1Incorre na mesma pena quem pratica as ações descritas no caput com alguém que, por enfermidade ou deficiência mental, não tem o necessário discernimento para a prática do ato, ou que, por qualquer outra causa, não pode oferecer resistência”.

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Ora, diante desse contexto cabe indagarmos: uma vítima que está no interior de um ônibus ou metrô ou outro transporte coletivo, com lotação excedendo sua máxima, tem a possibilidade de evitar tal ato libidinoso, qual seja, a ejaculação de um homem? A resposta, s.m.j, é negativa, ou seja, dificilmente a vítima teria possibilidade de resistir.

Francisco Sanini Neto chega a cogitar a possibilidade da incidência do art. 217-A, §1º, parte final, do Código Penal Brasileiro, embora em arremate ao tema, acaba ficando com a posição intermediária do art. 215, do Código Penal Brasileiro, além de trazer o aresto jurisprudencial em que, num caso concreto, entendeu o “beijo roubado” como estupro:

“A 6ª Turma do STJ, por seu turno, entendeu que a conduta em questão se desenvolveu em um contexto de indiscutível violência sexual contra a vítima. Nas palavras do Min. Relator Rogério Schietti Cruz “(…) deve-se ter em mente que estupro é um ato de violência (e não de sexo).  Busca-se, sim, a satisfação da lascívia por meio de conjunção carnal ou atos diversos, como na espécie, mas com o intuito de subjugar, humilhar, submeter a vítima à força do agente, consciente de sua superioridade física”. […] Note-se que o agente pratica ato libidinoso (masturbação e ejaculação) com a vítima, valendo-se, para tanto, de um meio (surpresa) que inviabiliza a manifestação da sua vontade.  Ora, “meio que impeça ou dificulte” a manifestação da vítima significa que não houve vontade, o que é completamente diferente da “vontade viciada”, exigida na primeira parte do tipo penal.  Nesse contexto, a conduta se assemelha ao crime de “estupro de vulnerável por equiparação”, previsto no artigo 217-A, §1º, do Código Penal, onde a vítima não tem condições de oferecer resistência. [.…] Em conclusão, podemos nos esquecer de que o estupro (art. 213) e o estupro de vulnerável por equiparação (art. 217-A, §1º) são crimes hediondos e, portanto, sujeitos aos maiores rigores do nosso ordenamento jurídico.Com base no princípio da proporcionalidade, observando os seus dois aspectos (proibição de excesso e proibição de proteção insuficiente), parece-nos que o tipo penal do artigo 215, do CP, representa um meio terno entre as condutas descritas no artigo 61, da LCP, e os crimes de estupro, evitando-se o excessivo rótulo de hediondo (e seus consectários), assim como a insuficiência repressiva da contravenção penal” (SANINI NETO, 2017, p. 1).

Pedindo vênia ao autor acima pensamos, guardadas as proporções do caso concreto do “beijo roubado” e de uma ejaculação inesperada (inopino) sobre a vítima, ser muito mais grave uma ejaculação sobre uma vítima, que um “beijo roubado”, conquanto as duas condutas sejam deploráveis e cause repulsa ao meio social, reclamando, com maior rigor, que a conduta aqui estudada seja subsumida ao art. 217-A, §1º, parte final, do Código Penal Brasileiro.

Continuando nessa toada argumentativa, num caso de mera contemplação[9] de um adulto diante de um vulnerável (ausência de contato físico), o Superior Tribunal de Justiça entendeu pela configuração do crime de estupro de vulnerável, em que pese a decisão ter causado celeuma no âmbito jurídico. De qualquer forma e por isso, é nossa defesa pelo art. 217-A, §1º, parte final, do Código Penal Brasileiro.

Entendemos que o caso da ejaculação em meandros de veículo de transporte público possuem ingredientes maiores do que nas situações analisadas.

De outro giro, embora não seja nosso foco defender o art. 213, do Código Penal Brasileiro no caso em testilha, a violência não pode ser vista apenas sobre o aspecto físico, mas do aspecto psicológico. Tanto é assim, que fazendo um paralelo com a Lei Maria da Penha (que prevê expressamente a violência psicológica como meio de violência de gênero contra a mulher), já se vem admitindo em sede doutrinária e jurisprudencial tal como modalidade de violência (ao lado da violência física).

O ser humano tem em seu feixe individual, a integridade física e psíquica, e a norma penal não tutela apenas a integridade física, mas a psicológica que pode ter efeitos nocivos e indeléveis muito maiores na memória de uma vítima dessa situação de violência sexual - do que uma violência física - mormente em sede de violência contra a dignidade sexual que interfere sobremaneira na parte emotiva e psicológica “ad aeternum” naquele que passou por tal momento. O problema dessa argumentação seria no viés de subsunção, já que a violência seria pós (resultado do ato) e não meio, destacando que a violência reclamada no art. 213, do CP é como meio para o estupro e não como consequência.

Reduzir um caso dessa envergadura com fatos gravíssimos, não parece ser proporcional a defesa da incidência do art. 61 da Lei de Contravenções Penais e, por critérios interpretativos do art. 215 do Código Penal.

Com a “datíssima máxima vênia” não podemos concordar pelos argumentos já expendidos outrora, pois é um ato gravíssimo e que desperta repulsa e revolta instantânea na vítima. O espermatozoide, inclusive, pode ser transmissor do vírus “HIV”.

Adiante, as inquietações e indagações prosseguirão: mas nesses casos de transmitir dolosamente o vírus “HIV,” o Supremo Tribunal Federal entende que seria apenas crime de transmissão perigo de contágio de moléstia grave[10] e, diante desse quadro, como sustentar o crime de estupro de vulnerável na situação ora estudada?

Devemos nos valer da proibição da proteção ineficiente ou deficiente, mormente nos crimes contra a dignidade sexual, pois a conduta de praticar atos libidinosos abarca tanto o ato sexual, tendo a vítima um comportamento passivo (permitindo que com ela se pratiquem os atos) ou ativo (praticando os atos de libidinagem no agente), implicando, interpretação diversa, numa verdadeira proteção deficiente do Estado – que não pode ser concebida.

Assim, se o ato de um agente ejacular numa mulher indefesa não for um ato de subjugar, humilhar, submeter à vítima à força do agente (diante da sua impossibilidade imediata ou qualquer outra causa, que a vítima não possa oferecer resistência), consciente de sua superioridade física e do seu agir de inopino frente a uma sociedade machista, com todo respeito, não saberemos mais a abrangência da semântica referente dos verbos mencionados para configurar tais singularidades.

Tal hipótese de vulnerabilidade é residual e tenta abarcar os demais casos em que a vítima não está em condições de consentir acerca da relação sexual, do ato libidinoso ou nos casos em que o consentimento for inexistente. A par disso, Gustavo Octaviano Diniz Junqueira, leciona que:

“É indiferente, como lembra Pierangeli, que a vítima tenha sido colocada na situação que a não permite resistir ou se simplesmente o agente se aproveita de condições preexistentes. A diferença entre a incapacidade de resistência e a inibição da livre manifestação de vontade deve ser analisada no confronto entre o presente tipo e a violação sexual mediante fraude”[11].

Acrescentamos, ainda, que no caso ora estudado, a vítima sequer possuía conhecimento do ato ilícito, o que retira, por si só, sua capacidade de resistir ao ato libidinoso. Destacamos, no entanto, que a vulnerabilidade da vítima não pode ser vista de forma absoluta, devendo ser analisada a cada caso concreto.

É importante, para não restar dúvidas sobre nossas conclusões, enfrentarmos as diferenças entre o tipo penal do art. 215 do Código Penal Brasileiro e art. 217-A, § 1º, parte final, do mesmo diploma.

A diferença essencial entre violência sexual mediante fraude (art. 215 do Código Penal Brasileiro) e o estupro de vulnerável (art. 217-A, § 1º, parte final, do mesmo diploma) reside no fato de que a violação sexual mediante fraude, o agente atua de modo a fraudar a vontade da vítima, todavia sem reduzir ou diminuir a sua capacidade de discernimento e sem praticar violência ou qualquer ameaça. Nesse caso, não há qualquer abuso à vulnerabilidade da vítima. Citemos o exemplo do agente que pratica o ato sexual com prostituta sob o pretexto de pagá-la ao final e não cumpre com o que fora acordado.

Já no delito de estupro de vulnerável, o agente se aproveita de uma condição de vulnerabilidade da vítima ou atua de forma a reduzir a sua capacidade resistência ou que, por qualquer outra causa, a vítima não pode oferecer resistência. Citemos aqui o “boa noite cinderela” e até mesmo o estupro de inopino; estupro súbito; estupro imediato; estupro inesperado; estupro repentino.

Talvez outra solução fosse reforma legislativa para trazer um tipo que mais específico para o caso, tal como uma forma privilegiada de estupro. Porém, as críticas também viriam por haver mais normas penais em nosso ordenamento jurídico, tipificando uma conduta que já pode ser subsumida a um tipo penal existente.

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Sobre os autores
Raphael Zanon Silva

Possui graduação em Direito pela Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (2009), pós-graduação em Direito Público pela Faculdade de Direito Damásio de Jesus (2011) e pós-graduação em Direito Penal pela Escola Paulista de Magistratura-SP (2014). Também é pós-graduado em Direito Processual Penal pela Escola Paulista de Magistratura-SP (2016). Aprovado no exame 140º da OAB, é ex Delegado de Polícia do Estado do Espírito Santo e atualmente é Delegado de Polícia Civil do Estado de São Paulo. Na área acadêmica atuou como Professor de Direito Penal junto à Anhanguera Educacional, e como professor convidado do Curso Complexo Andreucci de Ensino. É professor concursado da Academia da Polícia Civil do Estado de São Paulo.

Joaquim Leitão Júnior

Delegado de Polícia no Estado de Mato Grosso. Atualmente lotado no Grupo de Atuação Especial Contra o Crime Organizado (GAECO). Mentor da KDJ Mentoria para Concursos Públicos. Professor de cursos preparatórios para concursos públicos. Ex-Diretor Adjunto da Academia da Polícia Judiciária Civil do Estado de Mato Grosso. Ex-Assessor Institucional da Polícia Civil de Mato Grosso. Ex-assessor do Tribunal de Justiça de Mato Grosso. Palestrante. Pós-graduado em Ciências Penais pela rede de ensino Luiz Flávio Gomes (LFG) em parceria com Universidade de Santa Catarina (UNISUL). Pós-graduado em Gestão Municipal pela Universidade do Estado de Mato Grosso – UNEMAT e pela Universidade Aberta do Brasil. Curso de Extensão pela Universidade de São Paulo (USP) de Integração de Competências no Desempenho da Atividade Judiciária com Usuários e Dependentes de Drogas. Colunista do site Justiça e Polícia, coautor de obras jurídicas e autor de artigos jurídicos.

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

SILVA, Raphael Zanon ; LEITÃO JÚNIOR, Joaquim. O arrebatamento sexual de inopino no interior de transporte público coletivo com a ejaculação na vítima é crime?. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 22, n. 5178, 4 set. 2017. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/60267. Acesso em: 15 nov. 2024.

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