1. INTRODUÇÃO
O meio ambiente teve tratamento especial por parte do legislador Constituinte Originário em 1988. Isso devido à relevância que o mesmo possui para a humanidade, aliada à crescente preocupação da comuniade internacional com a limitação dos recursos naturais. Nesse contexto, o meio ambiente possui um capítulo inteiro e exclusivo dentro do título da ordem social, onde a Carta Magna preocupou-se em trazer diretrizes gerais para a tutela do ambiente ecologicamente equilibrado, impondo obrigações ao poder público e a toda a sociedade.
A importância da proteção ao meio ambiente é tamanha que o parágrafo terceiro do artigo 225 da Constituição traz o que a doutrina convencionou chamar de mandamento constitucional de criminalização: “As condutas e atividades consideradas lesivas ao meio ambiente sujeitarão os infratores, pessoas físicas ou jurídicas, as sanções penais e administrativas, independentemente da obrigação de reparar os danos causados.”
Dessa forma, verifica-se que a lei de crimes ambientais (lei 9.605/98) é o cumprimento de uma disposição constitucional, tutelando o ambiente sob o enfoque mais repressivo do Estado. Mesmo com a proteção das esferas cível e administrativa, a Constituição preferiu proteger ao máximo possível a incolumidade do meio ambiente.
Nesse sentido, registre-se que o direito criminal ambiental possui características que lhe são peculiares, dentre as quais se destacam a prospecção ou caráter preventivo, o que leva à antecipação da tutela penal, vale dizer, à criação de crimes de perigo concreto e, principalmente, de perigo abstrato, de mera conduta, de normas penais em branco, entre outras especificidades.
No âmbito da lei de crimes ambientais, temos o objeto do presente trabalho, que é a análise dos crimes contra a fauna, previstos no mencionado diploma legislativo. O método utilizado na abordagem do tema será o dedutivo, com a consulta a obras doutrinárias, jurisprudência das mais diversas cortes do país e a própria legislação.
Nesse contexto, trataremos dos artigos vinte e nove até o trinta e sete, que estão inseridos na seção um do capítulo cinco, que trata justamente dos crimes ambientais em espécie.
2. CAUSAS EXCLUDENTES DA ILICITUDE NOS CRIMES CONTRA A FAUNA
Antes de iniciar o estudo dos crimes contra a fauna em espécie, faz-se necessário trazer as hipóteses que excluem a ilicitude dos crimes, que são aplicáveis a todos os delitos do artigo 29 a 35 da lei 9.605/98.
Com efeito, o artigo 37 traz as seguintes excludentes:
Art. 37. Não é crime o abate de animal, quando realizado:
I - em estado de necessidade, para saciar a fome do agente ou de sua família; II - para proteger lavouras, pomares e rebanhos da ação predatória ou destruidora de animais, desde que legal e expressamente autorizado pela autoridade competente;
III – (VETADO)
IV - por ser nocivo o animal, desde que assim caracterizado pelo órgão competente.
As três descriminantes acima listadas são caracterizadas como estado de necessidade, já que há o sacrifício de um bem jurídico para salvaguardar outro. Em relação ao inciso I, a doutrina afirma que o mesmo é desnecessário, já que poderia haver a aplicação do estado de necessidade previsto no artigo 24 do Código Penal, pois os requisitos são os mesmos.
O inciso II trata do abate do animal de ação predatória ou destruidora. Para que a conduta seja lícita, o abate deve visar à defesa de lavouras, pomares e rebanhos e o animal abatido deve ser predador ou destruidor. Além disso, há necessidade de que a conduta seja legal e expressamente autorizada pela autoridade competente, consistindo-se em uma verdadeira descriminante penal em branco, pois deve ser complementada pelo poder público. Vale ressaltar que não é necessário que a autorização seja concedida individualmente a cada proprietário de lavouras, pomares ou rebanhos, bastando que haja um ato administrativo normativo geral, como portarias ou instruções normativas, para que a conduta não seja ilícita.
A terceira hipótese de excludente, prevista no inciso IV, é o abate de animal nocivo, assim definido pelo órgão competente, sendo mais uma descriminante penal em branco. Essa excludente é alvo de críticas por parte da doutrina, porque segundo alguns não existem animais nocivos, já que todos possuem uma função e utilidade no equilíbrio ecológico do sistema ambiental. Não obstante tal fato, a excludente é perfeitamente válida e encontra-se em vigor, razão pela qual qualquer indivíduo pode se beneficiar dela, apenas sendo exigidos os mesmos requisitos em relação ao inciso II, que é a edição de um ato administrativo normativo por parte da autoridade ambiental competente, que na maioria dos casos é o IBAMA.
3. CRIMES CONTRA A FAUNA EM ESPÉCIE
3.1 ARTIGO 29 DA LEI Nº 9.605/98
O caput do artigo 29 da lei de crimes ambientais possui a seguinte redação:
Art. 29. Matar, perseguir, caçar, apanhar, utilizar espécimes da fauna silvestre, nativos ou em rota migratória, sem a devida permissão, licença ou autorização da autoridade competente, ou em desacordo com a obtida:
Pena - detenção de seis meses a um ano, e multa.
Verifica-se que, neste artigo, a proteção é apenas à fauna silvestre, que pode ser conceituada como o conjunto de animais próprios de um país ou de uma região que vive em uma determinada época.
O parágrafo terceiro do artigo 29 afirma que são espécimes da fauna silvestre todos aqueles pertencentes às espécies nativas, migratórias e quaisquer outras, aquáticas ou terrestres, que tenham todo ou parte de seu ciclo de vida ocorrendo dentro dos limites do território brasileiro, ou águas jurisdicionais brasileiras.
Assim, pode-se asseverar que o objeto material do tipo em comento é a fauna silvestre. As espécies nativas são aquelas originárias de determinada região, com seu ciclo de vida onde nascem, e as migratórias são aquelas que, por reprodução, mudanças climáticas, alimento ou outros fatores, migram de uma região para outra.
O artigo 29 é um clássico exemplo de tipo penal de ação múltipla ou plurinuclear, já que possui os seguintes verbos descritos como conduta: Matar – subtração da vida; Perseguir – ir ao encalço; correr atrás; Caçar – perseguir (animais silvestres) para aprisionar ou matar; Apanhar – capturar, recolher, segurar ou tomar posse, com auxílio das mãos ou de objeto; pegar; agarrar, prender; Utilizar – lançar mão de, fazer uso de; usar, empregar, aplicar.
O objeto jurídico tutelado é a fauna silvestre, visando a manutenção do equilíbrio ambiental e a preservação das espécies, o sujeito ativo é qualquer pessoa (crime comum), o passivo é a coletividade, já que se trata de um direito difuso, e não os animais, como poderia se pensar em caso de uma análise mais apressada. O elemento subjetivo é o dolo, não havendo previsão do crime em comento na modalidade culposa. O crime pode ser classificado como material, de dano e plurissubsistente.
O § 1º do art. 29 apresenta as seguintes figuras equiparadas ao caput, com o objetivo de proteger também os abrigos dos animais, seus ninhos, suas crias, bem como evitar o comércio indevido: quem impede a procriação da fauna, sem licença, autorização ou em desacordo com a obtida; quem modifica, danifica ou destrói ninho, abrigo ou criadouro natural; quem vende, expõe à venda, exporta ou adquire, guarda, tem em cativeiro ou depósito, utiliza ou transporta ovos, larvas ou espécimes da fauna silvestre, nativa ou em rota migratória, bem como produtos e objetos dela oriundos, provenientes de criadouros não autorizados ou sem a devida permissão, licença ou autorização da autoridade competente.
O §2º traz uma possibilidade de perdão judicial, qual seja, no caso de guarda doméstica de espécie silvestre não considerada ameaçada de extinção.
O § 4º e o 5º trazem causas de aumento de pena, que ocorrem quando o crime é cometido: contra espécie rara ou considerada ameaçada de extinção, ainda que somente no local da infração; em período proibido à caça; durante a noite; com abuso de licença; em unidade de conservação; com emprego de métodos ou instrumentos capazes de provocar destruição em massa; (aumento de metade da pena nestas hipóteses) e, se o crime decorre do exercício de caça profissional, o aumento é de até o triplo.
3.2 ARTIGO 30 DA LEI Nº 9.605/98
Seguindo as disposições sobre os crimes contra a fauna, a lei aqui analisa a conduta do agente que exporta para o exterior peles e couros de anfíbios e répteis em bruto, sem a autorização da autoridade ambiental competente. Tal conduta acarreta uma pena de reclusão, de um a três anos, e multa.
Inicialmente, convém registrar que tal artigo revogou tacitamente o crime do art. 27 c/c o art. 18 da Lei 5.197/67, que igualmente punia a “exportação para o exterior, de peles e couros de anfíbios e répteis, em bruto”. Nesse sentido, registre que a pena antiga era mais severa (reclusão de 2 a 5 anos).
Analisando a infração, MACIEL e GOMES (2015, p.139) esclarecem:
A expressão “exportar para o exterior” soa redundante, já que não é possível exportar para o interior. Exportar significa “mandar para fora de uma região”, “vender algo, remetendo-o para fora do país, estado, município ou região que o produziu”. Em outras palavras é possível ocorrer exportação dentro do próprio país. O legislador, na sua redundância, quis então se referir à exportação para o estrangeiro. O tipo penal pune, portanto, apenas o tráfico internacional de couros e peles de anfíbios, não abarcando o tráfico interno, que, entretanto, pode configurar o delito do art. 29, § 1.º, III, da Lei.
O referido crime possui como principal intuito a preservação e tutela do meio ambiental, protegendo de maneira especial os animais envolvidos (anfíbios e répteis). Como não há previsão de culpa, a conduta só poderá sofrer sanção quando houver dolo. O delito pode ser praticado por qualquer pessoa e o seu sujeito passivo é a coletividade, através da ideia de direitos difusos.
O elemento normativo é justamente a (falta de) autorização da autoridade ambiental competente, sendo que ele se perfaz justamente no momento da exportação exitosa das peles e couros. Assim, admite-se a tentativa, por exemplo, no caso do sujeito tentar embarcar a pele de um animal, mas for impossibilitado pelas autoridades de fiscalização do aeroporto.
Observe que, apesar do legislador não ter incluído neste crime a atitude daquele que importa peles e couros de anfíbios e répteis em bruto, sem a autorização da autoridade ambiental competente, isso não acarreta a atipicidade da conduta, haja vista que tal ação configura o crime previsto no art. 29, 1.º, III, da Lei, nas modalidades de adquirir e vender. Da mesma forma, cumpre registrar que, se o agente exporta produtos ou objetos confeccionados com a pele ou o couro dos anfíbios e répteis, incorre no crime do art. 29, III.
3.3 ARTIGO 31 DA LEI Nº 9.605/98
A conduta descrita neste artigo é a de introduzir espécime animal no país, sem parecer técnico oficial favorável e licença expedida por autoridade competente, cuja pena aplicada varia de três meses a um ano, e multa.
O crime pretende tutelar o equilíbrio ambiental e a incolumidade pública, através da conservação da fauna silvestre, que se viabiliza pela garantia de não introdução de espécies sem o devido controle. Nesse contexto, é proibido, por exemplo, a entrada de um animal exótico que não tenha predador no Brasil, pois poderá haver sua disseminação exagerada, exterminando espécimes aqui existentes.
O objeto material é a espécime animal. Portanto, a introdução de um único ser é capaz de perfazer o delito, o que se justifica, haja vista existir possibilidade de um animal infectado causar danos imensuráveis a saúde de várias pessoas. Nas precisas lições de CONTE e FIORILLO (2012, p. 114) os elementos normativos do delito são:
Parecer técnico oficial (manifestação opinativa emitida por órgão competente) e licença expedida pela autoridade competente (conforme a Resolução n. 237/97 do CONAMA: art. 1º, II – Licença Ambiental: é o ato administrativo pelo qual o órgão ambiental competente estabelece as condições, restrições e medidas de controle ambiental que deverão ser obedecidas pelo empreendedor, pessoa física ou jurídica, para localizar, instalar, ampliar e operar empreendimentos ou atividades utilizadoras dos recursos ambientais consideradas efetiva ou potencialmente poluidoras ou aquelas que, sob qualquer forma, possam causar degradação ambiental) Tal crime também só será punido a título de dolo e terá como sujeito ativo e passivo, respectivamente, qualquer pessoa e a coletividade. A consumação ocorre no exato momento em que o animal (ou animais) ingressa em território nacional. Assim, constata- se que a lei não exige a ocorrência de dano efetivo para a consumação do delito, mas pune o perigo causado pela atitude de introduzir o animal de forma ilícita.
Assevere-se que o crime é de competência da Justiça Federal, pois há o interesse direto da União, tendo em vista o risco nacional que corre a fauna silvestre em razão da introdução irregular.
Finalmente, registre-se que este art. 31 revogou tacitamente o art. 27, § 1.º, c/c o art. 4.º da Lei 5.197/67, que punia a mesma conduta. A pena cominada era mais severa: 1 a 3 anos de reclusão.
3.4 ARTIGO 32 DA LEI Nº 9.605/98
O artigo analisado comina sanção para aquele que comete abuso, maus-tratos, fere ou mutila animais silvestres, domésticos ou domesticados, nativos ou exóticos. A pena prevista vai de três meses a um ano de detenção, e multa.
Em verdade, o artigo 32 prescreve um crime doloso, comum, material, de dano, não transeunte, unissubjetivo, plurissubsistente e de ação múltipla, que objetiva tutelar a incolumidade dos animais. Normalmente será instantâneo, mas se a conduta se protrair no tempo, é possível que seja permanente.
Também será, em regra, comissivo, conduto admite-se a sua consumação pela omissão impropria, a exemplo do proprietário de um cão que o deixa sem alimentação visando maltratá ló.
O objeto material é o animal silvestre, doméstico ou domesticado, nativo ou exótico, objeto de abusos, maus-tratos, ferimentos ou mutilações; alvo de experiência dolorosa ou cruel, ainda que para fins didáticos ou científicos.
Nesse cenário, MARCAO (2015, p. 83) nos ensina:
Há que se destacar na hipótese em comento que o legislador não se referiu aos animais domésticos ou domesticados, nativos ou exóticos, como simples espécies do gênero animais silvestres. Há um sentido maior, e a interpretação a ser empregada para melhor compreensão do tipo objetivo deve buscar a harmonia do sistema punitivo. Adotar pensamento contrário ao que sustentamos, na aplicação prática do sistema legal vigente, acarretaria odiosa e inaceitável diversidade de tratamento entre as diversas classificações por gênero, espécie ou subespécie.
Nos termos do seu §1º, incorre nas mesmas penas quem realiza experiência dolorosa ou cruel em animal vivo, ainda que para fins didáticos ou científicos, quando existirem recursos alternativos. Ou seja, a execução de experimentos no intuito de difundir e/ou aprimorar o conhecimento humano, ou científico, como os empregados nas pesquisas sobre novos medicamentos, não justifica a realização de procedimento que resulte dor ou sofrimento excessivo e desnecessário ao espécime, caso exista outra forma de se buscar os mesmos resultados.
Por sua vez, o §2º esclarece que a pena é aumentada de um sexto a um terço, se ocorre morte do animal. Não obstante, ressalte-se que, se o agente causa maus-tratos a um animal silvestre e, posteriormente o mata, com desígnios autônomos, haverá concurso material entre este tipo e o artigo 29 desta Lei.
Por fim, cumpre registar que, quando o crime deixar vestígios, a prova pericial será imprescindível para a demonstração da materialidade delitiva, nos termos do art. 158 do CPP, c/c o art. 79 da Lei n. 9.605/98
3.5 ARTIGO 33 DA LEI Nº 9.605/98
O artigo 33 da Lei de crimes ambientais estabelece como delito o ato de: provocar, pela emissão de efluentes ou carreamento de materiais, o perecimento de espécimes da fauna aquática existentes em rios, lagos, açudes, lagoas, baías ou águas jurisdicionais brasileiras. Para tal infração, determinou-se pena de detenção, de um a três anos, ou multa, ou ambas cumulativamente.
Analisado tecnicamente o crime, conclui-se que se trata de crime doloso, comum, material, de dano, não transeunte, unissubjetivo, plurissubsistente e de ação única. O seu objetivo maior é a preservação da incolumidade da fauna aquática, composta por animais que habitam o meio aquático, de água doce ou marinha. O delito ainda pode possuir natureza de crime instantâneo, mas é possível que se estenda no tempo (delito permanente).
Todas as águas brasileiras estão abarcadas pelo núcleo do tipo, uma vez que a expressão “águas jurisdicionais brasileiras” abarca as águas internas (continentais, aquém da linha da base territorial) e o mar territorial (doze milhas náuticas após a linha da base territorial), ressaltando que as ilhas brasileiras têm o seu próprio mar territorial, a exemplo de Fernando de Noronha.
AMADO (2014, p. 633) traz o seguinte ensinamento sobre o tema:
Em verdade, o tipo se realiza pela emissão de efluentes – que são águas poluídas – ou pelo carreamento de materiais – elementos corpóreos naturais– que trazem o perecimento de espécimes da fauna aquática, ou seja, seu esgotamento ou destruição. Estaria melhor localizado este tipo na Seção III do Capítulo V da Lei nº 9.605, que é específica para a poluição. Registre-se que, consoante o parágrafo único do artigo, comete o delito quem causa degradação em viveiros, açudes ou estações de aquicultura de domínio público; quem explora campos naturais de invertebrados aquáticos e algas, sem licença, permissão ou autorização da autoridade competente; quem fundeia embarcações ou lança detritos de qualquer natureza sobre bancos de moluscos ou corais, devidamente demarcados em carta náutica.
3.6 ARTIGO 34 DA LEI Nº 9.605/98
A partir deste artigo, a Lei dos crimes ambientais passa a tipificar os delitos contra a fauna aquática, que é formada pelos animais que habitam a água, tais como peixes, crustáceos, moluscos, bem como pelos vegetais hidróbios, que são as algas e cogumelos aquáticos (GIEHL, 2008).
A fauna aquática é subdividida em dois grandes grupos: A fauna marinha, formada em geral pelos animais que conseguem povoar águas com alto nível de salinidade, e a fauna de água doce, que corresponde aos animais que habitam rios, lagos e riachos (GIEHL, 2008).
Tais formas de vida são tuteladas a despeito de possuírem ou não valor econômico, tendo em vista sua importância para o equilíbrio dos diversos ecossistemas que integram.
Uma vez esclarecido o conceito de fauna aquática, temos que o artigo 34 da citada Lei, tipifica a conduta de pescar em período no qual a atividade seja proibida, como o período de reprodução, ou em local interditado pelo órgão ambiental competente. Tais condutas são punidas com pena de detenção de um a três anos, ou multa, ou ainda ambas as penas cumulativamente.
O citado crime só é punível havendo dolo do agente, tendo em vista, nos termos do parágrafo único do art. 18 do Código Penal, a inexistência de previsão do crime na modalidade culposa.
Nos termos do parágrafo único do art. 34, incide também nas mesmas penas quem:
I – pescar espécies que devam ser preservadas ou espécimes com tamanhos inferiores aos permitidos;
II – pesca quantidades superiores às permitidas, ou mediante a utilização de aparelhos, petrechos, técnicas e métodos não permitidos;
III – transporta, comercializa, beneficia ou industrializa espécimes provenientes da coleta, apanha e pesca proibidas.
Cabe ressaltar que é atribuição do IBAMA, por meio de portarias estabelecer os períodos em que é vedada a atividade de pesca, os locais interditados, as espécies que devem ser preservadas ou com tamanhos inferiores ou superiores aos permitidos, assim como os aparelhos, petrechos, técnicas e métodos não tolerados.
Por fim é necessário esclarecer que a pesca de baleias e golfinhos é proibida nas águas brasileiras. Tais crimes são tipificados ao teor da Lei 7643/87, que estabelece as penas para tais condutas.
3.7 ARTIGO 35 DA LEI 9.605/98
O artigo 35, por sua vez, tipifica a conduta de quem pesca se utilizando de explosivos ou substâncias que, em contato com a água, produzam efeito semelhante, bem como de substâncias tóxicas, ou outro meio proibido pela autoridade competente.
Neste delito, a pena cominada é maior em razão da maior lesividade da conduta, que atinge um número determinado de animais das mais diversas espécies, alcançando de um a cinco anos de reclusão.
Quanto à conduta típica, CONTE e FIORILLO (2012, p. 249) esclarecem que:
A conduta típica é pescar (ato tendente a retirar, extrair, coletar, apanhar, apreender ou capturar espécimes da fauna aquática) com o emprego de:
a) explosivos (produto que, quando detonado, através de uma reação química, produz calor) ou substâncias que, em contato com a água, produzam efeito semelhante; b) substâncias tóxicas (capaz de causar envenenamento), ou outro meio proibido pela autoridade competente.
Como no delito antecedente, a conduta só é punível a título de dolo, não sendo punível ante a existência apenas de culpa. O fato se consuma quando da prática do ato delituoso, não sendo admissível a tentativa, tendo em vista ser o crime formal e unissubsistente. Vale ressaltar que o artigo em análise revogou o art. 27, § 3.º, da Lei 5.197/67 tacitamente. Tal dispositivo legal cominava pena de reclusão de 1 a 3 anos a quem praticasse pesca predatória com instrumento proibido, explosivo, erva ou substância química de qualquer natureza (MACIEL e GOMES, 2015).
Além do artigo supracitado, o art. 35 da Lei 9.605/98 também revogou o art. 8.º da Lei 7.679/88, que cominava pena de reclusão de 3 meses a 1 ano a quem realizasse pesca mediante a utilização de explosivos ou de substâncias que, em contato com a água, produzam efeito semelhante ou com substâncias tóxicas (MACIEL e GOMES, 2015).
3.8 ARTIGO 36 DA LEI 9.605/98
O artigo 36 da lei em análise, ao contrário dos artigos antecedentes, não tipifica condutas agressivas à fauna aquática nem tampouco comina penas. Trata-se de dispositivo penal explicativo, que traz interpretação legislativa, ou autêntica, acerca do conceito de pesca para os fins da lei em comento.
Estabelece o referido artigo que: “considera-se pesca todo ato tendente a retirar, extrair, coletar, apanhar, apreender ou capturar espécimes dos grupos dos peixes, crustáceos, moluscos e vegetais hidróbios, suscetíveis ou não de aproveitamento econômico, ressalvadas as espécies ameaçadas de extinção, constantes nas listas oficiais da fauna e da flora.”
Tal dispositivo legal, portanto, apresenta aos intérpretes do direito o conceito de pesca adotado pelo legislador quando da edição da lei, de forma a facilitar sua aplicação ao caso concreto. Isso ocorre para evitar a existência de dúvida acerca de quais atividades seriam consideradas como pesca para os fins da lei penal.
Com efeito, tais incertezas não são compatíveis com a lei penal, que deve sempre estrita e certa. Observamos que o conceito empregado pela lei é mais abrangente que o conceito comum de pesca, tendo em vista que buscou o legislador dar ampla proteção às diversas formas de vida aquática.
Maciel e Gomes (2015, p. 150) fizeram brilhante análise de todas as condutas que caracterizam pesca na lei:
Pesca, repita-se, é todo ato tendente(que visa um determinado fim) a retirar, extrair, coletar, apanhar, apreender ou capturar espécimes (mais de uma) de peixes (animal vertebrado, aquático, com os membros transformados em barbatanas e com respiração branquial); crustáceos(artrópodes de respiração branquial, quase sempre aquáticos, como por exemplo, lagostas, camarões, caranguejos, cracas e pulgas-d’água); moluscos (animais invertebrados, não segmentados, de corpo mole, compreendendo três regiões distintas, cefálica, visceral e muscular, e geralmente protegidos por uma concha calcária, de duas valvas – ostras ou univalve. ex. Caramujo); vegetais hidróbios (que vivem na água), suscetíveis ou não de aproveitamento econômico.
4 CONSIDERAÇÕES FINAIS
É notória a preocupação do ordenamento jurídico brasileiro com o meio ambiente, desde a promulgação da Constituição Federal da República de 1988, que foi a primeira de nosso país a conter um título exclusivo para o meio ambiente.
Nesse sentido, a edição da Lei de Crimes ambientais foi de grande importância para a tutela do meio ambiente, punindo, com rigidez, as ações lesivas ao meio ambiente e aos seres vivos de nossa biodiversidade, entre os quais estão os animais.
Realmente, a mencionada legislação deu força à proteção das diversas espécies de animais existentes, protegendo, desde espécies ameaçadas de extinção, como a onça-pintada, até animais domésticos, que constantemente são vítimas de maus-tratos. Contudo, em que pese as inovações elencadas pela lei, ainda existe muito o que melhorar na questão.
Assim, torna-se indispensável o estabelecimento de uma nova relação entre o homem e os animais, baseada no mútuo respeito e na mútua dependência, com a predominância do interesse coletivo sobre o individual, induzindo uma nova postura da sociedade para com o meio ambiente e requerendo um novo enfoque dos problemas existentes, além uma adequação da ordem jurídica para as suas soluções.
Portanto, cabe ainda ao Estado promover campanhas educadoras e implantar noções de meio ambiente nas escolas. Dessa forma, certamente todos teremos uma condição social de vida mais digna e equânime (FRAGIOLLI, 2013).
5. REFERÊNCIAS:
AMADO, Frederico. Direito Ambiental Esquematizado. 5ª ed. Salvador: GEN, 2014.
CONTE, Christiany Pegorari; FIORILLO, Celso Antônio Pacheco. Crimes Ambientais. São Paulo: Saraiva, 2012.
FRAGIOLLI, William Lopes. Crimes contra a fauna: breves apontamentos acerca da lei de crimes ambientais. Disponível em: <http://fragiolli.jusbrasil.com.br/artigos>. Acesso em: 31/05/2016.
GIEHL, Germano. O direito ambiental e a água no século XXI. In: Âmbito Jurídico, Rio Grande, XI, n. 51, mar 2008. Disponível em: <http://www.ambito-juridico.com.br/site/index.php?n_link=revista_artigos_leitura&artigo_id=4933>. Acesso em maio 2016.
MACIEL, Silvio; GOMES, Flávio Luiz. Lei de Crimes Ambientais. 2ª ed. São Paulo: Forense, 2015.
MARCÃO, RENATO. Crimes Ambientais. 3ª ed.