Da reparação dos danos causados ao trabalhador em virtude de acidente de trabalho ou doença ocupacional

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20/09/2017 às 02:34
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 4 Regramentos infraconstitucionais acerca da proteção ao trabalho em casos de acidente de trabalho

A Constituição da República é a Lei maior do Estado, onde se encontram princípios, normas implícitas e explícitas, além disso, a organização política do país. Diante disso, podem-se classificar esses regramentos infraconstitucionais os que estão abaixo da Carta Magna. Em geral, são as leis complementares, leis ordinárias, decretos, etc.

Atualmente, a principal norma infraconstitucional que tutela o trabalho em casos de acidente laboral é a lei de benefícios da Previdência Social, sob o nº 8.213/91. Ela é a responsável em definir o conceito de acidente de trabalho, além, de estabelecer os benefícios pecuniários que o trabalhador tem direito. O significado etimológico da palavra acidente relaciona-se com a ideia de um acontecimento anormal, de imprevisto e de fatalidade. À vista disso, é possível que infortúnios ocorram no exercício da atividade laborativa, com isso, o legislador buscou resguardar o empregado em ocorrências desse tipo.

O art. 118 do mandamento legal, alhures mencionado, elenca: "O segurado que sofreu acidente de trabalho tem garantida, pelo prazo mínimo de doze meses, a manutenção do seu contrato de trabalho na empresa, após a cessação do auxílio-doença acidentário, independentemente de percepção de auxílio-acidente".

Posto isto, o empregado, sofrendo acidente de trabalho, terá ele a estabilidade provisória de um ano, a partir do término do benefício. Ou seja, o empregador não poderá demitir o obreiro durante esse tempo. É claro que deve o acontecimento ter relação com as atividades exercidas no trabalho (nexo causal), caso contrário, a estabilidade não se configura, ainda que exista o pagamento do provento.

Sobre a garantia de emprego ao trabalhador acidentado, o Tribunal Superior do Trabalho editou a súmula 378:

I - É constitucional o artigo 118 da Lei nº 8.213/1991 que assegura o direito à estabilidade provisória por período de 12 meses após a cessação do auxílio-doença ao empregado acidentado. (ex-OJ nº 105 da SBDI-1 - inserida em 01.10.1997)

II - São pressupostos para a concessão da estabilidade o afastamento superior a 15 dias e a conseqüente percepção do auxílio-doença acidentário, salvo se constatada, após a despedida, doença profissional que guarde relação de causalidade com a execução do contrato de emprego. (primeira parte - ex-OJ nº 230 da SBDI-1 - inserida em 20.06.2001)

III - O empregado submetido a contrato de trabalho por tempo determinado goza da garantia provisória de emprego decorrente de acidente de trabalho prevista no n no art. 118 da Lei nº 8.213/91.

É relevante dizer que cabe às empresas notificar o órgão competente acerca dos comprovados acidentes e doenças de trabalho. Deve-se emitir a Comunicação de Acidente de Trabalho – CAT, a fim de que o INSS identifique e se manifeste sobre o sinistro. Entretanto, muitas vezes os empregadores não cumpriam com essa responsabilidade, causando prejuízos aos trabalhadores, na maioria dos casos, essa inércia acontecia quando a situação era doença ocupacional, semelhante a acidente do trabalho.

Todavia, o art. 22, § 2º da Lei 8.213/91, estabelece que não existindo a comunicação pelo empregador, o próprio empregado acidentado, seus dependentes, a entidade sindical competente, o médico que o assistiu ou qualquer autoridade pública, poderão revelar o imprevisto à Previdência.

Ademais, a Lei 11.340/06 trouxe significativas alterações na legislação, acrescentando na Lei de Previdência Social o art. 21-A, in verbis:

A perícia médica do INSS considerará caracterizada a natureza acidentária da incapacidade quando constatar ocorrência de nexo técnico epidemiológico entre o trabalho e o agravo, decorrente da relação entre a atividade da empresa e a entidade mórbida motivadora da incapacidade elencada na Classificação Internacional de Doenças - CID, em conformidade com o que dispuser o regulamento. § 1º A perícia médica do INSS deixará de aplicar o disposto neste artigo quando demonstrada a inexistência do nexo de que trata o caput deste artigo. § 2º A empresa poderá requerer a não aplicação do nexo técnico epidemiológico, de cuja decisão caberá recurso com efeito suspensivo, da empresa ou do segurado, ao Conselho de Recursos da Previdência Social.

O referido regramento infraconstitucional fez nascer o "Nexo Técnico Epidemiológico", conhecido como NTEP, concretizando a probabilidade de caracterizar a incapacidade por doença ocupacional como acidente do trabalho, sem a necessidade do lançamento do CAT pelo empregador.

Sendo assim, encetou o fenômeno da inversão do ônus da prova, vez que anteriormente era o empregado que comprovava a sua debilitação, ao revés, hoje, é a empresa que tem a obrigação de evidenciar que não provocou ou ampliou a patologia obtida pelo operário.


 5 Os pressupostos da responsabilidade civil

A palavra responsabilidade é oriunda do latim, respondere, ou seja, responder por algo que deu causa. Por conseguinte, a responsabilidade civil transmite a concepção de reparação do dano, do dever de indenizar, quando manifestadamente ocorra a violação de direitos, causando prejuízos a outrem.

Conforme preleciona o Ilustre Professor José Affonso Dallegrave Neto (2009, p. 80):

A responsabilidade civil, vista como instituto jurídico, não contém definição legal, contudo, doutrinariamente, pode ser concebida como a sistematização de regras e princípios que objetivam a reparação do dano patrimonial e a compreensão do dano extrapatrimonial causados diretamente por agente, ou por fato de coisas ou pessoas que dele dependam que agiu de forma ilícita ou assumiu o risco da atividade causadora da lesão.

Ademais, Fernando José Cunha Belfort (2010, p. 14), entende que:

A noção de responsabilidade, no campo jurídico, amolda-se ao conceito genérico de obrigação, o direito de que é titular o redor em relação ao devedor, tendo por objeto determinada prestação. No caso assume a vítima de um ato ilícito a posição de credora, podendo, exigir do autor determinada prestação, cujo conteúdo consiste na reparação dos danos causados.

O Código Civil de 2002, como regra geral, prevê a responsabilidade civil nos arts. 186, 187 e 927, vejamos:

Art. 186. Aquele que, por ação ou omissão voluntária, negligência ou imprudência, violar direito e causar dano a outrem, ainda que exclusivamente moral, comete ato ilícito.

Art. 187. Também comete ato ilícito o titular de um direito que, ao exercê-lo, excede manifestamente os limites impostos pelo seu fim econômico ou social, pela boa-fé ou pelos bons costumes.

Art. 927. Aquele que, por ato ilícito (arts. 186 e 187), causar dano a outrem, fica obrigado a repará-lo.

Parágrafo único. Haverá obrigação de reparar o dano, independentemente de culpa, nos casos especificados em lei, ou quando a atividade normalmente desenvolvida pelo autor do dano implicar, por sua natureza, risco para os direitos de outrem.

Igualmente, a Constituição da República elenca no seu art. 7º, inciso XXVIII, o direito de indenização que os trabalhadores possuem em caso de acidente de trabalho, in verbis: "XXVIII – seguro contra acidentes de trabalho, a cargo do empregador, sem excluir a indenização a que este está obrigado, quando incorrer em dolo ou culpa";

 Vale dizer que a responsabilidade civil está totalmente caracterizada a partir da existência de seus elementos basilares, logo, deve os seus pressupostos emergir no mundo jurídico para se cogitar o dever de reparação. Quais sejam: a) ato ilícito; b) dano; c) nexo causal; d) culpa.

5.1 Ato ilícito

Nos ensinamentos da digna Maria Helena Diniz (2005, p. 43):

A ação, elemento constitutivo da responsabilidade, vem a ser o ato humano, comissivo ou omissivo, ilícito ou licito, voluntario e objetivamente imputável do próprio agente ou de terceiro, ou o fato de animal ou coisa inanimada, que cause dano a outrem, gerando o dever de satisfazer os direitos do lesado. 

Portanto, pode-se dizer que o ato ilícito é toda ação ou omissão que não se coaduna com o ordenamento jurídico pátrio, gerando, então, sequelas jurídicas. Dessa forma, o ser humano manifesta uma conduta opcional que além de descumprir os preceitos legais, violenta direitos juridicamente tutelados de outrem.

Por fim, corrobora José Affonso Dallegrave Neto (2009, p.135): "Ato ilícito é a antijuridicidade oriunda de ação voluntária com culpa do agente. A ação voluntária do homem, em sentido amplo, decorre da manifestação de sua vontade em fazer ou deixar de fazer alguma coisa".

5.2 Dano

O dano é oriundo do latim damnum, sinônimo de lesão, ofensa, prejuízo. Ele é o pé direito da responsabilidade civil, haja vista que não se pode falar nela, sem a existência de um prejuízo concretizado. Conforme dito anteriormente, a responsabilidade civil aparece a partir do momento em que um indivíduo diante de sua conduta provoca estrago patrimonial ou extrapatrimonial a outra pessoa. Em uma simples analogia chula, o dano e a responsabilidade civil seriam como a "camisa e o botão", o que nos remete a impossível separação dos institutos.

A lesão patrimonial atinge diretamente os bens da vítima, têm caráter pecuniário, é conhecido também como dano material. Nos termos do art. 402 do Código Civil, essa espécie possui duas facetas: O que foi perdido, e o que deixou de ganhar. No viés de Sebastião  Geraldo Oliveira (2011, p. 221), em casos de acidente de trabalho "é correto prever que o acidentado continuaria no emprego, recebendo seus salários normais com as devidas correções alcançadas pela categoria profissional".

A ofensa extrapatrimonial, trata-se de um direito juridicamente protegido incorpóreo, o agente tem sua honra, intimidade ou dignidade violada. O famoso dano moral. A despeito desse tipo de dano na ótica de acidente de trabalho, Sebastião Geraldo Oliveira (2011, p. 226) esclarece:

No estudo do dano moral decorrente do acidente do trabalho, não se pode perder de vista que a República Federativa do Brasil constitui-se em Estado Democrático de Direito e tem como fundamentos, dentre outros, a dignidade da pessoa humana e o valor social do trabalho. Além disso, a ordem econômica deve ser apoiada na valorização do trabalho (art.170), a ordem social terá como base o primado do trabalho (art.193) e constitui objetivo fundamental da República construir uma sociedade livre, justa e solidária (art.3º,I). O princípio constitucional de que a saúde é direito de todos e dever do Estado (art. 196), adaptado para o campo do Direito do Trabalho, indica que a saúde é direito e dever do empregador.

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5.3 Nexo causal

O nexo causal é outro pressuposto indispensável da responsabilidade civil. Consiste na relação de causalidade entre o dano e a conduta do agressor. Em linhas gerais, a ação ou omissão de um, deve ser o cordão umbilical da ofensa sofrida pelo outro. Portanto, é necessário exteriorizar uma ligação pura de causa e efeito.

O Ínclito Desembargador e Doutrinador Sebastião Geraldo Oliveira (2013, p. 151 e 152) ratifica:

A necessidade de estabelecer o liame causal como requisito da indenização funda-se na conclusão lógica de que ninguém deve responder por dano a que não tenha dado causa. "Se houve o dano, mas sua causa não está relacionada com o comportamento do lesante, inexiste relação de causalidade e também a obrigação de indenizar."(1) Aliás, de forma semelhante prevê o Código Penal no art. 13: "O resultado, de que depende a existência do crime, somente é imputável a quem lhe deu causa". Considera-se causa a ação ou omissão sem a qual o resultado não teria ocorrido. Assim, uma vez constatado que o empregado foi vítima de algum acidente ou doença cabe verificar em seguida o pressuposto do nexo causal, isto é, se há uma relação de causa e efeito ou liame de causalidade entre tal evento e a execução do contrato de trabalho. Se o vínculo causal for identificado, então estaremos diante de um acidente do trabalho conforme previsto na legislação; no entanto, se não for constatado, torna-se inviável discutir qualquer indenização. Nesse sentido o art. 19 da Lei n. 8.213/1991 menciona que "acidente do trabalho é o que ocorre pelo exercício do trabalho a serviço da empresa".

 5.4 Culpa

É indiscutível que a culpa deva irromper para que o ato ilícito se torne positivo. Fazse ponderoso aludir que a conduta humana pode ser a demonstração de uma vontade ou o desejar fito. À vista disso, surgem os institutos dolo e culpa espécies da chamada "culpa lato sensu".

Segundo José Affonso Dallegrave Neto (2009, p. 135):

No dolo há uma tríplice coincidência entre vontade manifestada, intenção desejada e resultado obtido; na culpa o agente decide pela conduta praticada, sem desejar o resultado maléfico, o qual é, todavia, previsível devido à negligência, imprudência e imperícia praticadas.

Em suma, a negligência relaciona-se com a atuação despreocupada do indivíduo. Por outro lado, a imprudência avança os limites, então, consiste na petulância de operar, inexistindo qualquer precaução. Já a imperícia denota a insuficiência de maestria na execução de algum mister.

Com a finalidade de exemplificar, o exímio José Affonso Dallegrave Neto (2009, p. 135) assevera:

O empregador é negligente quando deixa de instruir, de forma eficaz, sobre o uso adequado de EPI. Ele é imprudente quando expõe o seu empregado a um perigo iminente, exigindo-lhe serviços superiores a sua força. Já na imperícia, o empregado que, na função de motorista, causa dano ao patrimônio da empresa por falta de habilidade na condução do veiculo da empresa.

Resta claro que ao contrário do dolo, quando a atitude tem o escopo de produzir o resultado, a culpa em nenhuma hipótese acima narrada, tem o agente,a intenção de gerar o corolário antijurídico. Todavia, devido a sua conduta que não atentou ao dever de cuidado, o caso fático se torna imputável.

É oportuno relatar que o instituto culpa em alguns casos não tem relevância para a imputação de a responsabilidade civil. Trata-se da responsabilidade civil objetiva, prevista no art. 927 do Código Civil. Porém, em outros feitos é indispensável, consistindo na responsabilidade civil subjetiva, consagrada no art. 7º, inciso XXVIII da Constituição Federal.

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Sobre o autor
Henrique Costa

Advogado. Orador. Autor de artigos e textos jurídicos. Especialista em Licitações Públicas e Contratos Administrativos. Atua como Treinador, Consultor e Assessor Jurídico. Participante do Projeto Implantação da Nova Lei de Licitações com ênfase nos Órgãos e Entidades Públicas. Participante do Curso Desmistificando as Obras e Serviços de Engenharia - Os Novos Desafios da Lei 14.133/21 e as Velhas Questões; Congressista no VI Congresso Brasileiro de Licitações e Contratos. Congressista no I Congresso do Instituto Nacional de Contratações Públicas (INCP). Congressista no III Congresso Jurídico Internacional da Fundação Pres. Antônio Carlos. Participante da XXIV Conferência Nacional da Advocacia Brasileira. Pós-graduado em Direito Constitucional e Administrativo. Pós-Graduado em Direito Trabalhista e Previdenciário. Pós-Graduado em Direito e Processo Civil. Pós-graduado em Ciências Penais e Segurança Pública.

Informações sobre o texto

Este texto foi publicado diretamente pelos autores. Sua divulgação não depende de prévia aprovação pelo conselho editorial do site. Quando selecionados, os textos são divulgados na Revista Jus Navigandi

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