De maneira especialíssima, ocorreu-me algo muito especial: dia 27 de novembro de 2017 (meu aniversário) foi aprovada legislação, na Câmara Municipal de Aracati-CE, que obriga o ensino de Direitos Humanos em toda a rede municipal de ensino.
O projeto de lei é meu. Algo dormitava na Constituição Federal de 1988. Vim tomar posse em conhecimento com a professora Maria Victoria Benevides, na Faculdade de Educação da USP, como seu orientando de doutorado. A inspiração que tive guardou origem na Escola de Governo (art. art. 39, §2º, da CF88) e que também tenho projeto de lei organizado, à espera dos legisladores interessados.
Desde aquele momento, muito li e escrevi algo sobre a grandeza de ensinarmos o Direito para crianças. Quis o destino que este projeto fosse aprovado no dia do meu aniversário: 27.11. Porém, obrigar o Poder Público a ensinar direitos humanos para crianças não é um presente para mim. Por óbvio, é meu singelo presente para aquelas crianças. Lembrando, ainda, que crianças modificam adultos – profundamente.
Pode haver algo mais sublime, mas desconheço, do que “tomar posse do conhecimento do direito”. O “fazer a política” nos faz humanos, a educação traz o que há de melhor e de pior em todos nós, a consciência abre o universo de ações a seguir (certas e erradas). Sem dúvida, isso fala por nós; mas, se a linguagem é mãe de tudo, a primeira expressão foi Direito. Aliás, só falamos quando há o “direito à fala”: isegoria.
Assim, desde a história mais longínqua dos povos, o que somos a não ser a contabilidade da luta pelo direito? Pode-se dizer que apenas a consciência política leva à luta pelo direito. No entanto, o que é o direito se não a própria racionalidade?
Liberdade, igualdade, fraternidade – desde 1789 –, o que somos sem isto? Poderia ser mais? É óbvio que sim. Poderia ser menos? Por óbvio. Olhemos para a miséria humana que cresce à mesma proporção em que se aniquilam os direitos fundamentais demandados na Constituição Federal de 1988.
Mas, se há maré fascista a rebordo, por que ensinar crianças sobre seus direitos fundamentais? (Aqui não faço a distinção conceitual entre as nomenclaturas: direitos humanos – direitos fundamentais). A resposta é simples: Porque sem direitos não há nem mesmo a condição política de lutar contra a “perda de direitos”. Uma criança – qualquer pessoa na verdade – educada em direitos humanos ou fundamentais (por isso trato como Direitos Humanos Fundamentais) sequer daria atenção à pergunta. Considerada ridícula de partida. Está aqui a diferença de quem se educa pelo direito, desde criança, e de quem toma o direito para si (privilégio: “privi legem” = direito privado). Uma criança educada em direitos não cede às pretensões do poder.
A vida é uma roda, gira sem parar (jamais imaginei este presente), e, por seus giros não terem “eterno retorno”, em espiral, voltei ao tempo de muitos anos. Agradeço porque fui a mão que rodou a “roda da fortuna” em sentido contrário, a fim de que ao menos algumas crianças não sejam jogadas à própria sorte, e sim lançadas no futuro que a Casa das Leis lhes proporciona. Sinto-me um peão da sorte! Parabéns a todas às criança do Aracati/CE – os “bons ventos” que conheci há 16 anos –, parabéns aos vereadores e a todas, todos que contribuíram para que este sonho fosse realidade.
2017, ao contrário dos diagnósticos, foi um ano de dezenas de realizações para mim – para narrar isso demandaria vários artigos –; esta Lei de Direitos Humanos, porém, foi a cereja do bolo. Projeto embutido na minha história de vida, foi a saideira do dia. E se foge a modéstia, penso que é pioneiro no país. Já era em tempos de paz – quanto mais no reino do fascismo.
O projeto original – que pode/deve ser replicado – você encontra aqui: https://jus.com.br/pareceres/61691/lei-municipal-de-educacao-em-direitos-humanos-fundamentais. Podem copiar e colar à vontade, pelo futuro das crianças e do país.
Vinício Carrilho Martinez (Pós-Doutor em Ciência Política)
Professor Associado da Universidade Federal de São Carlos – UFSCar
Departamento de Educação- Ded/CECH
Meu presente para as crianças - no meu aniversário
Pós-Doutor em Ciência Política e em Direito. Coordenador do Curso de Licenciatura em Pedagogia, da UFSCar. Professor Associado II da Universidade Federal de São Carlos – UFSCar. Departamento de Educação- Ded/CECH. Programa de Pós-Graduação em Ciência, Tecnologia e Sociedade/PPGCTS/UFSCar Head of BRaS Research Group – Constitucional Studies and BRaS Academic Committee Member. Advogado (OAB/108390).
Este texto foi publicado diretamente pelos autores. Sua divulgação não depende de prévia aprovação pelo conselho editorial do site. Quando selecionados, os textos são divulgados na Revista Jus Navigandi
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