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Responsabilização penal da pessoa jurídica por crime ambiental: a necessária quebra de um paradigma

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12/01/2018 às 10:00
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3. Conclusão.

O presente julgado, conforme se verifica, difere da jurisprudência pacificada até então no STJ, podendo vir a ser um novo paradigma para a matéria a partir de agora. De qualquer forma, se a questão inerente à da responsabilização penal da pessoa jurídica já era controvertida no seio doutrinário, mais combustível haverá ante o que restou decidido pela Corte Suprema no bojo do Recurso Extraordinário nº 548.181/PR.

O aporte jurisprudencial trazido à reflexão exprime o entendimento de uma das Turmas do Supremo Tribunal Federal sobre a questão inerente à responsabilidade penal da pessoa jurídica (art. 225, § 3º, da CRFB). De tudo que foi dito, não há como negar que a Constituição Federal de 1988 efetivamente previu, no art. 225, § 3º, a responsabilização penal de uma pessoa jurídica por crime contra o meio ambiente, cuja regulamentação veio à lume a partir da Lei nº 9.605/98, não estando esta, por absoluta coerência lógica, condicionada à simultânea responsabilização da pessoa física dirigente daquela.

Tendo em vista a importância conferida ao bem ambiental pela Carta atual, cremos que a efetiva responsabilização penal do ente moral demanda uma nova arquitetura jurídico-penal, esta voltada especificamente para a responsabilização penal da pessoa jurídica, tudo independente daquela pertinente à pessoa física, razão pela qual a teoria da dupla imputação, até o momento adotada pelo STJ (e posta em destaque pelo STF), merece ser revista, posto que não se encontra albergada pela mens constitucional.   


4. Referências.

ALVES, Elizabete Lanzoni. Direito ambiental na sociedade de risco: a hora e a vez da ecopedagogia. In Revista direito ambiental e sociedade/Universidade de Caxias do Sul. Vol. 1, n. 1 (jan./jun. 2011). Caxias do Sul: Educs, 2011.

ANTUNES, Paulo de Bessa. Meio ambiente geral e meio ambiente do trabalho: uma visão sistêmica. São Paulo: LTr, 2009.

BOSCHI, José Antonio Paganella. Das penas e seus critérios de aplicação. Porto Alegra: Livraria do Advogado Editora, 2006.

BRASIL. Supremo Tribunal Federal. Acórdão proferido no Recurso Extraordinário nº 548.181/PR. Disponível em http://www.stf.jus.br//arquivo/informativo/documento/informativo714.htm. Acesso em: 16 abr. 2014.

______. Superior Tribunal de Justiça. Acórdão proferido no Recurso Ordinário em Mandado de Segurança nº 16.696/PR. Disponível em https://ww2.stj.jus.br/revistaeletronica/Abre_Documento.asp?sLink=ATC&sSeq=2237356&sReg=200301136144&sData=20060313&sTipo=5&formato=PDF. Acesso em: 21 abr. 2014.

DIAS, Jorge de Figueiredo. Temas básicos da doutrina penal. Coimbra: Editora Coimbra, 2001.

DOTTI, René Ariel. Incapacidade criminal da pessoa jurídica (uma perspectiva do direito brasileiro). In: PRADO, Luiz Regis (coord.). Responsabilidade penal da pessoa jurídica. São Paulo: RT, 2001.

KISS, Alexandre. Os direitos e interesses das gerações futuras e o princípio da precaução. In VARELLA, Marcelo Dias Varella; PLATIAU, Ana Flávia Barros. Princípio da Precaução. Belo Horizonte: Del Rey, 2004.

MILARÉ, Edis. A importância dos estudos de impacto ambiental. In MILARÉ, Edis; MACHADO, Paulo Affonso Leme. Organizadores. Coleção doutrinas essenciais, Direito ambiental. São Paulo: RT, 2011. v. 4.

MUKAI, Toshio. Direito ambiental sistematizado. 4. ed. Rio de Janeiro: Forense Universitária, 2002.

ONU. Declaração do Rio de Janeiro sobre Meio Ambiente e Desenvolvimento, aprovada pela Conferência das Nações Unidas sobre Meio Ambiente e Desenvolvimento, em 1992. Disponível em http://www.onu.org.br/rio20/img/2012/01/rio92.pdf. Acesso em: 21 abr. 2014.

SILVA, José Afonso da. Direito ambiental constitucional. 5. ed. São Paulo: Malheiros, 2004.


5. Notas.

[1] A respeito do tema, dispõe o artigo 121-2 do Código Penal francês, "Les personnes morales, à l'exclusion de l'Etat, sont responsables pénalement, selon les distinctions des articles 121-4 à 121-7, des infractions commises, pour leur compte, par leurs organes ou représentants. Toutefois, les collectivités territoriales et leurs groupements ne sont responsables pénalement que des infractions commises dans l'exercice d'activités susceptibles de faire l'objet de conventions de délégation de service public. La responsabilité pénale des personnes morales n'exclut pas celle des personnes physiques auteurs ou complices des mêmes faits, sous réserve des dispositions du quatrième alinéa de l'article 121-3". Disponível em http://www.legifrance.gouv.fr/affichCode.do;jsessionid=106ED46689A8C8221BFEA30FE75C94B9.tpdjo11v_1?idSectionTA=LEGISCTA000006149817&cidTexte=LEGITEXT000006070719&dateTexte=20140513. Acesso em 13 mai. 2014.

[2] À guisa de exemplo, cite-se, por todos, a posição de Bitencourt (2011, p. 274-276), contrária à responsabilidade penal da pessoa jurídica: "No Brasil, a obscura previsão do art. 225, § 3°, da Constituição Federal, relativamente ao meio ambiente, tem levado alguns penalistas a sustentarem, equivocadamente, que a Carta Magna consagrou a responsabilidade penal da pessoa jurídica. No entanto, a responsabilidade penal ainda se encontra limitada à responsabilidade subjetiva e individual".

[3] Art. 21. As penas aplicáveis isoladas, cumulativa ou alternativamente às pessoas jurídicas, de acordo com o disposto no art. 3º, são:

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I - multa;

II - restritivas de direitos;

III - prestação de serviços à comunidade.

Art. 22. As penas restritivas de direitos da pessoa jurídica são:

I - suspensão parcial ou total de atividades;

II - interdição temporária de estabelecimento, obra ou atividade;

III - proibição de contratar com o Poder Público, bem como dele obter subsídios, subvenções ou doações.

§ 1º A suspensão de atividades será aplicada quando estas não estiverem obedecendo às disposições legais ou regulamentares, relativas à proteção do meio ambiente.

§ 2º A interdição será aplicada quando o estabelecimento, obra ou atividade estiver funcionando sem a devida autorização, ou em desacordo com a concedida, ou com violação de disposição legal ou regulamentar.

§ 3º A proibição de contratar com o Poder Público e dele obter subsídios, subvenções ou doações não poderá exceder o prazo de dez anos.

Art. 23. A prestação de serviços à comunidade pela pessoa jurídica consistirá em:

I - custeio de programas e de projetos ambientais;

II - execução de obras de recuperação de áreas degradadas;

III - manutenção de espaços públicos;

IV - contribuições a entidades ambientais ou culturais públicas.

[4] Inteiro teor do julgado disponível em https://ww2.stj.jus.br/revistaeletronica/Abre_Documento.asp?sLink=ATC&sSeq=1791281&sReg=200302100870&sData=20051219&sTipo=51&formato=PDF. Acesso em: 21 abr. 2014.

[5] Vide Informativo nº 714, disponível em http://www.stf.jus.br//arquivo/informativo/documento/informativo714.htm. Acesso em: 16 abr. 2014.

[6] Disponível em https://ww2.stj.jus.br/revistaeletronica/Abre_Documento.asp?sLink=ATC&sSeq=2237356&sReg=200301136144&sData=20060313&sTipo=5&formato=PDF. Acesso em: 21 abr. 2014.

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Sobre o autor
Reis Friede

Desembargador Federal, Presidente do Tribunal Regional Federal da 2ª Região (biênio 2019/21), Mestre e Doutor em Direito e Professor Adjunto da Universidade Federal do Estado do Rio de Janeiro (UNIRIO). Graduação em Engenharia pela Universidade Santa Úrsula (1991), graduação em Ciências Econômicas pela Universidade Federal do Rio de Janeiro (1985), graduação em Administração - Faculdades Integradas Cândido Mendes - Ipanema (1991), graduação em Direito pela Faculdade de Direito Cândido Mendes - Ipanema (1982), graduação em Arquitetura pela Universidade Santa Úrsula (1982), mestrado em Direito Político pela Universidade Federal do Rio de Janeiro (1988), mestrado em Direito pela Universidade Gama Filho (1989) e doutorado em Direito Político pela Universidade Federal do Rio de Janeiro (1991). Atualmente é professor permanente do Programa de Mestrado em Desenvolvimento Local - MDL do Centro Universitário Augusto Motta - UNISUAM, professor conferencista da Escola da Magistratura do Estado do Rio de Janeiro, professor emérito da Escola de Comando e Estado Maior do Exército. Diretor do Centro Cultural da Justiça Federal (CCJF). Desembargador Federal do Tribunal Regional Federal da 2ª Região -, atuando principalmente nos seguintes temas: estado, soberania, defesa, CT&I, processo e meio ambiente.

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

FRIEDE, Reis. Responsabilização penal da pessoa jurídica por crime ambiental: a necessária quebra de um paradigma. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 23, n. 5308, 12 jan. 2018. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/62738. Acesso em: 26 dez. 2024.

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