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Uma preocupação constitucional sobre os novos rumos do direito penal contemporâneo.

A adoção do direito penal do inimigo em detrimento do direito penal do cidadão

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Resumo:


  • Análise das teorias de expansão do Direito Penal, como o Direito Penal de Três Velocidades de Silva-Sánchez e o Direito Penal do Inimigo de Günther Jakobs, destacando a polêmica sobre a flexibilização das garantias constitucionais.

  • Discussão sobre a legitimidade e as críticas ao Direito Penal do Inimigo, que propõe medidas extremas contra indivíduos considerados como ameaças à ordem pública, enfocando a relativização de direitos e garantias processuais.

  • Exploração das consequências da implementação de um Direito Penal mais severo e punitivo, questionando a eficácia na prevenção da criminalidade e os riscos de violações aos princípios democráticos e de direitos humanos.

Resumo criado por JUSTICIA, o assistente de inteligência artificial do Jus.

4.  CONSIDERAÇÕES FINAIS 

É pura ilusão pensar que o recrudescimento das medidas penais gera uma maior segurança. Beccaria - arquiteto do pensamento criminológico atual - vai de encontro a essa tese, ao aduzir que legislação que penaliza excessivamente não contribui em nada para a ressocialização do preso, conseqüentemente não afeta de modo positivo o controle social (redução dos indicadores de delinqüência).

A pena tem duas funções precípuas: reeducar o apenado e prevenir novas lesões a um determinado bem jurídico através do temor que o cárcere (desdobramento da prática delitiva, na maioria das vezes) inspira nas pessoas. A Criminologia Clássica constata que se deve investir muito mais na primeira função – medidas ressocializadoras inteligentes e bem formuladas, pois a segunda (prevenção do crime pelo aumento da severidade penal) nunca encontrou sucesso nas sociedades ocidentais modernas. Portanto, conclui-se que Direito Penal não deve ser usado “como instrumento de pedagogia social”.

As metodologias penais propostas pelo Direito Penal do Inimigo são recheadas de atos de violência contra a dignidade da pessoa humana em nome da segurança. Parece que os nossos legisladores não lembram daquele jargão que toda mãe ensina aos seus filhos na mais tenra idade, que violência só produz mais violência e, também não sabem que Princípio Constitucional não pode ser transgredido, principalmente o da Dignidade da Pessoa Humana, cerne da nossa Constituição Federal de 1988. Pelo visto, eles não enxergam que essa fórmula política que usa cada vez mais a força repressiva do Estado e que suprime garantias fundamentais do cidadão (outorgadas pela Constituição) não está obtendo êxito algum.

O Poder Legislativo, dentro do moderno contexto dos Estados de Direito, deveria implementar uma fiscalização administrativa mais eficaz, ou então criar projetos de lei que ensejem a previsão de receitas para o incentivo à políticas públicas de conscientização que previnam a prática de condutas humanas que as leis criminais querem tipificar de imediato. O que se observa nas normas penais da atualidade é que as mesmas tem o objetivo de penalizar e não de proibir, visto que a mera proibição não é encarada positivamente pela população/eleitorado, que é quem dita os rumos da política e quem tem a prerrogativa (pelo voto) de manter os parlamentares no poder.

Diante de tudo o que foi exposto no presente trabalho, constata-se a existência de leis penais do inimigo, chamadas de “simbólicas”, pois configuram apenas uma reafirmação simbólica e não concreta dos valores sociais. Leis Penais fortes e efetivas são aquelas que não se limitam ao plano simbólico e sim as que atingem o “nível instrumental” de fortalecimento dos valores e normas sociais.

O Direito Penal precisa ser colocado no seu lugar de subsidiariedade, sendo a ultima ratio a ser utilizada dentro da organização social e política das nações democráticas de hoje, como o Brasil, por exemplo, até porque ele não é o ramo jurídico mais eficiente para aplacar o caos social. O que lhe aumenta o grau de produtividade e eficácia é justamente o trabalho em conjunto com as outras ciências jurídicas; cada uma legislando de modo autônomo e inteligente, estudando e propondo soluções, deixando o Direito Penal Sancionador como ultima ratio a ser chamada para resolver a problemática social.

Uma outra situação intrigante é que as autoridades que possuem legitimidade para suscitar o Controle de Constitucionalidade via abstrata aceitam a legislação penal ordinária e não tomam nenhuma providência no sentido de tirarem tais leis, que afrontam os princípios e garantias constitucionais básicas. Isso também nos remete à baderna instalada na Justiça Criminal, com as infinitas ações que discutem a constitucionalidade via concreta dessas leis penais de exceção. Constata-se, pois, que os modernos arcabouços legislativos penais já alcançaram a tal “terceira velocidade”.

Quem tem poder para colocar em risco os princípios fundamentais da Carta Política é o próprio Poder Legislativo, que a constituiu, e ele já está fazendo isso ao legislar normas penais de “terceira velocidade”, colocando em perigo a própria estabilidade política – que, no Brasil, foi conquistada após um período de trevas na Democracia (ditadura militar).

Os órgãos legiferantes necessitam de um pouco mais de racionalidade na elaboração das leis penais. Lei nenhuma pode insultar os princípios da Carta Magna – estruturadora máxima da paz e do bem coletivo. Já a sociedade de massa precisa desconstruir a ideia de que normas penais drásticas resolvem a desordem social, e a partir daí, exercer um Controle Constitucional, através dos seus representantes no Parlamento, sobre essas tais normas.

Pode-se vislumbrar, por fim, que o excesso de preocupação com a segurança vai paulatinamente tirando a nossa liberdade. Talvez seja por isso que as leis penais sancionadas atualmente estejam mitigando a nossa liberdade com a diminuição ou supressão de direito humanos essenciais, elevados pela Constituição à categoria de PRINCÍPIOS. O próprio Estado “garantista” vai acabar sendo o verdadeiro INIMIGO dos cidadãos, na medida em que colocará em extinção os direitos e garantias fundamentais do homem.


5.  REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

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Notas

[1] Pacheco (2005, p. 64) conceitua macrocriminalidade como sendo a criminalidade organizada internacional, [...] uma criminalidade difusa que se caracteriza pela ausência de vítimas individuais, pela pouca visibilidade dos danos causados, bem como por um novo modus operandi (profissionalismo, divisão de tarefas, participação de gente insuspeita, técnicas sofisticadas etc.).

[2] Maestri e Ribeiro (2008, p. 01) referem-se à escola de Frankfurt como uma academia de teoria social interdisciplinar neo-marxista, particularmente associada com o Instituto para Pesquisa Social da Universidade de Frankfurt. A escola de Frankfurt, defende “o Direito Penal Clássico, tece algumas críticas à sociedade de risco, em especial aos crimes de perigo abstrato, pois estes seriam uma afronta aos princípios do Direito Penal mínimo e da subsidiariedade”.

[3] Maestri e Ribeiro (2008, p. 01) traz o conceito de Welfare State, Estado Social ou Estado providência, inferido dos ensinamentos da escola de Frankfurt, como sendo um tipo de organização política e econômica que coloca o Estado (nação) como agente da promoção (protetor e defensor) social e organizador da economia. Nesta orientação, cabe ao Estado do bem-estar social garantir serviços públicos e proteção à população.

[4] Em nota de rodapé, Binato Júnior coloca que “esta politização do Direito Penal não vem senão corroborar a opinião de Ulrick Beck, quando dizia este que a gestão dos riscos é erigida a uma posição socio-política chave e que havia uma tendência de politização de esferas apolíticas, notadamente as que maior proximidade tinham com a gestão dos riscos. Ora, conforme estamos vendo, sendo o Direito Penal o principal meio estatal de combate aos riscos, nada mais lógico que ocorrer uma politização crescente de seus institutos.”

[5] PINHO, Ana Cláudia Bastos de. Apud: BOSCHI, Marcus Vinicius. As reformas penais e a sua “eficácia” frente à sociedade do risco: Um breve ensaio. In: Ensaios penais em homenagem ao Professor Alberto Rufino Rodrigues de Souza. Porto Alegre: Ricardo Lenz Editor, 2003. p. 571).

[6] FIGUEIREDO DIAS, Jorge de. Algumas reflexões sobre o Direito Penal e a Sociedade de Risco. In: Seminário Internacional de Direito Penal da Universidade Lusíada. Lisboa, março de 2000. p. 5-6.

[7] DENNINGER, Erhard: “Segurança, diversidade e solidariedade” ao invés de “liberdade, igualdade e fraternidade”. In Revista Brasileira de Estudos Políticos da Universidade Federal de Minas Gerais, nº 88, dez. 2003.

[8] HOBBES, Thomas. Do cidadão. São Paulo : Martin Claret, 2004.

[9] KANT, Emmanuel. A paz perpétua. São Paulo: Brasil, 1936.

[10] Bastos (2007, p. 06) diz que a denominação punitivismo refere-se ao endurecimento desregrado das sanções penais cominadas às normas penais efetivas.

[11] Bonho (2006, p. 08) utiliza a doutrina de Silva Sánchez para falar que neutralização consiste no processo, no qual é “possível identificar-se um número pequeno de delinqüentes que são responsáveis por um grande número de delitos e que tendem a continuar delinqüindo, partindo-se para tanto de critérios estatísticos. Dessa forma, neutralizando-se os delinqüentes – mantendo-os na prisão pelo máximo de tempo possível – ter-se-ia uma radical redução do número de delitos, importante benefício a baixo custo. A neutralização tem-se manifestado de várias formas, como por exemplo, na adoção de medidas de segurança tais como, privação da liberdade e liberdade vigida, que visam manter o individuo sob controle do Estado mesmo após cumprida a pena de acordo com a sua culpabilidade, além da adoção de medidas prévias à condenação em excesso”.

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Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

NETO, Honorato Gomes Gouveia. Uma preocupação constitucional sobre os novos rumos do direito penal contemporâneo.: A adoção do direito penal do inimigo em detrimento do direito penal do cidadão. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 22, n. 5293, 28 dez. 2017. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/63076. Acesso em: 22 dez. 2024.

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