É muito comum que pais ou parentes que possuem patrimônio façam doação de imóveis para menores. Inclusive de forma recorrente ocorre a chamada doação com reserva de usufruto, situação em que a nua-propriedade passa a ser do menor e o usufruto se mantém reservado ao doador. Mas, após realizada esta doação ao menor de idade, caso futuramente um dos pais deste menor queira vender o imóvel, seja para utilizar o dinheiro para pagar dívidas ou mesmo adquirir outro imóvel, isso será possível?
E para responder a esta questão é preciso se atentar ao art. 1.691 do Código Civil Brasileiro, cuja transcrição segue abaixo:
Art. 1.691. Não podem os pais alienar, ou gravar de ônus real os imóveis dos filhos, nem contrair, em nome deles, obrigações que ultrapassem os limites da simples administração, salvo por necessidade ou evidente interesse da prole, mediante prévia autorização do juiz.
Observe que a regra criada pela lei é que os pais não podem alienar, gravar de ônus real, nem contrair em nome dos filhos obrigações que ultrapassem os limites da simples administração. Ou seja, os pais em regra não podem vender o imóveis de seus filhos menores.
No entanto, como toda regra tem sua exceção, notadamente no Direito, é possível fazê-lo por necessidade ou evidente interesse da prole, mediante prévia autorização do juiz. Mas afinal, o que seria essa necessidade ou esse evidente interesse da prole?
A venda por necessidade seria, por exemplo, para os filhos subsistirem, para comprarem alimentos ou para o atendimento de despesas médicas e hospitalares. Já o interesse da prole seria, por exemplo, para adquirir outro bem ou investir o dinheiro em negócio mais seguro e rentável.
É evidente que aqui a lei pretendeu proteger o interesse dos filhos menores, de forma que só se poderia vender ou gravar seu imóvel de ônus reais, caso não restassem prejuízos ao menor.
Ademais, antes da alienação do imóvel do filho, é necessário que os pais recorram ao poder judiciário, pois a lei só o permite após prévia autorização do juiz.
Portanto, caso haja interesse dos genitores na venda de imóvel de propriedade do filho menor, é imperativo que se recorra ao judiciário justificando os motivos da venda. De modo que o juiz não autorizará a venda deste imóvel sem um motivo que atenda aos interesses do menor.
Aliás, os próprios julgados são neste sentido. Veja-se julgado do Tribunal de Justiça de Minas Gerais:
ALVARÁ - AUTORIZAÇÃO PARA VENDA DE IMÓVEL DOADO AOS FILHOS - IMPOSSIBILIDADE - NÃO DEMONSTRAÇÃO DA NECESSIDADE E UTILIDADE - ART. 1.691, DO CC.Não há que se falar em pedido de alvará para alienação do imóvel, se este já foi objeto de doação à prole.Para que se autorize a venda de bens de menor sob o pátrio poder, como expresso no art. 1691 do Código Civil é indispensável a prova da necessidade ou de evidente interesse da prole. (TJMG - Apelação Cível 1.0261.09.073906-9/001, Relator(a): Des.(a) Silas Vieira , 3ª CÂMARA CÍVEL, julgamento em 11/03/2010, publicação da súmula em 30/03/2010)
Assim, se observa que caso não seja comprovada efetivamente a necessidade e utilidade, nos termos do art. 1.691 do Código Civil, a justiça não permite a venda do imóvel.
Lado outro, caso se demonstre que a venda de imóvel será benéfica para o menor, a justiça tem permitido a venda:
ALVARÁ JUDICIAL - IMÓVEL PERTENCENTE A MENOR IMPÚBERE - APLICAÇÃO DO PRODUTO DA VENDA NA AQUISIÇÃO DE IMÓVEL VALORIZADO COMERCIALMENTE - ADMISSIBILIDADE - UTILIDADE PRESENTE. 1. Os pais devem zelar pela preservação do patrimônio de seus filhos menores, não podendo sem autorização judicial praticar atos que impliquem em alienação direta ou indireta de seus bens, ou dos quais possa resultar uma diminuição patrimonial, mesmo em caso de necessidade evidente ou utilidade da prole. 2. O produto da venda de imóveis de filhos menores impúberes, aplicado na aquisição de outro imóvel mais valorizado, quando mais que concorrem os genitores com parte do preço total, evidentemente lhes beneficia, o que demonstra real vantagem econômica e a intenção dos pais em proteger o patrimônio dos menores.V.V. (TJMG - Apelação Cível 1.0707.02.050660-6/001, Relator(a): Des.(a) Edgard Penna Amorim , Relator(a) para o acórdão: Des.(a) Duarte de Paula , 8ª CÂMARA CÍVEL, julgamento em 05/08/2004, publicação da súmula em 16/12/2004)
Ultrapassada a questão acima, é preciso salientar que, caso um dos pais não concorde, o juiz resolverá a divergência, nos termos do art. 1.690, parágrafo único.
Por fim, se houver a venda do imóvel do filho menor sem a prévia autorização judicial, é possível que os filhos, os herdeiros ou o representante legal do menor pleiteiem a declaração de nulidade do negócio na justiça, conforme o parágrafo único do art. 1.691 do Código Civil.
De toda forma, não obstante a regra da impossibilidade da venda, para que a autorização judicial tenha êxito, é preciso que haja motivo justo e seja tudo comprovado em juízo, pois a análise vai depender da sensibilidade de cada julgador. Afinal, cada caso é um caso.