A teoria dos precedentes judiciais e sua eficácia no sistema brasileiro

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12/02/2018 às 13:19
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O sistema de precedentes se mostra como uma resposta eficiente para os problemas atuais do Judiciário.

INTRODUÇÃO

A presente pesquisa teve por objetivo compreender a teoria dos precedentes judiciais e sua eficácia no sistema brasileiro.

No primeiro capítulo, trabalham-se os princípios que podem ser úteis na construção de uma teoria de precedentes, dentre os quais se deu maior ênfase ao acesso à justiça, em seguida apresentou-se a duração razoável do processo e, por fim, a efetividade da tutela jurisdicional numa nova perspectiva constitucional.

No segundo capítulo, abordaram-se as diferenças entre os sistemas jurídicos do civil law e commow law. Em seguida trabalha-se a evolução dos precedentes judiciais no direito brasileiro, fazendo-se a distinção entre a ratio decidendi e a obiter dictum.

Nesse contexto, percebeu-se que o direito processual brasileiro tem atravessado um infindável momento de crises e transformações. É nítido que os institutos de que dispõe o atual sistema mostram-se incapazes de prestar uma tutela efetiva, segura e em duração razoável.

De igual modo, o direito processual brasileiro tem experimento diversas reformas legislativas ao longo dos anos.

O último capítulo volta-se para a análise dos precedentes judiciais no NCPC, abordando-se os aspectos processuais da aplicação e superação dos precedentes e as vantagens e desvantagens do uso de precedentes no direito brasileiro.

O NCPC trouxe diversas mudanças, com o objetivo de melhorar a prestação jurisdicional. Uma das mudanças trazidas foi a valorização da atuação dos precedentes na dinâmica do processo judicial. É inegável que que o NCPC reforça a tendência da introdução dos precedentes obrigatórios no Brasil, promovendo com isso uma ampliação da existência de precedentes obrigatórios.

Ademais, o NCPC fez com que se fosse necessária a realização de estudos para se construir uma teoria de precedentes brasileira. Com isso, doravante a decisão tomada a partir de um caso concreto ganha maior importância, de modo a influenciar os demais casos que forem decididos após.

Outrossim, a mudança jurisprudencial deixa de ser algo de menor importância para tornar-se, em sistemática de precedentes, uma decisão paradigmática que irá influenciar outros casos que serão decididos a partir da ratio decidendi extraída do caso anterior.

O método e a pesquisa utilizados partiram da investigação bibliográfica e na análise de precedentes dos tribunais superiores, de modo a compreender como os tribunais têm contribuído para a criação de um sistema de precedentes.


CAPÍTULO I- PROCESSO E EFETIVIDADE

1.1. Acesso à justiça

Modernamente é possível compreender o conceito de acesso à justiça a partir de concepções diferentes ou, o que a doutrina denomina de ondas reformistas do acesso à justiça, não se limitando apenas ao conceito tradicionalmente conhecido de acesso ao Judiciário.

Cappelletti & Garth dividiram o acesso à justiça em três ondas, a primeira, representada pela assistência judiciária aos pobres; a segunda diz respeito às reformas tendentes a proporcionar representação jurídica para os interesses difusos e a terceira caracteriza-se pelo acesso à representação em juízo e por um novo prisma de acesso à justiça, cuja concepção é mais ampla. (LIMA JUNIOR, 2009)

Sem dúvida, a terceira onda guarda maior relevância para a ordem jurídica nacional por compreender uma série de medidas, partindo-se da reestruturação do próprio Poder Judiciário, passando-se pela simplificação do processo e dos procedimentos, e findando num sistema recursal mais célere. (LIMA JUNIOR, 2009)

A Constituição da República Federativa do Brasil (CRF/88) ao estabelecer o rol dos direitos e garantias individuais, assegurou a garantia da inafastabilidade da tutela jurisdicional, que significa, em linhas gerais, que o Estado tem o dever de impedir e/ou solucionar toda e qualquer lesão ou ameaça de lesão.

Esse princípio é de extrema relevância para o Estado Democrático de Direito, visto tratar-se de direito fundamental reconhecido e disciplinado pela Carta Constitucional (art. 5º, XXXV, CF/88), a exemplo dos diversos institutos jurídicos. O seu surgimento deu-se em virtude de evolução histórica.

É cediço que na antiguidade não cabia ao Estado a atribuição de resolver os conflitos e dizer a quem cabia o direito. As controvérsias existentes eram resolvidas pelas próprias partes por meio da autotutela. (HASSE, 2013)

Dessa forma, os que se envolvessem em qualquer tipo de conflito, deveriam resolvê-lo entre si e encontrar uma solução, de modo que, na maioria das vezes vencia o mais forte.

Em razão da precariedade e incapacidade de proporcionar uma solução justa e eficaz aos conflitos que eram submetidos ao instituto da autotutela, tornou-se necessário a busca de outros mecanismos de solução das controvérsias, surgindo assim o instituto da arbitragem, na qual um terceiro desinteressado e imparcial, era escolhido pelos litigantes para solucionar a controvérsia. (CÂMARA, 2015)

Com o passar dos tempos, esses institutos mostraram-se incapazes de apresentar soluções para todas as controvérsias existentes, de modo que era necessário buscar novas alternativas para regular as relações sociais.

O Estado então reivindicou para si o monopólio da jurisdição, recebendo assim o encargo de ser o detentor de dizer e aplicar o direito ao caso concreto.

Após a intervenção estatal na solução das controvérsias, o Estado passou a ser responsável por proporcionar meios para que as pessoas tivessem acesso à justiça.

Com o objetivo de assegurar ao cidadão um efetivo acesso à justiça, o Estado promoveu diversas alterações legislativas no ordenamento jurídico. Dentre as alterações legislativas realizadas nos últimos anos destaca-se: a criação dos Juizados Especiais Cíveis e Criminais, que tem por finalidade o julgamento e execução de causas cíveis de menor complexidade, bem como as infrações penais de menor potencial ofensivo.

A criação da justiça de paz nas entidades cartorárias com a finalidade de celebrar casamentos, realizar o processo de habilitação dos nubentes e realizar conciliações.

Ainda no que tange às mudanças legislativas é possível dizer que o legislador constituinte inovou ao inserir no texto constitucional a Defensoria Pública como instituição permanente e essencial à função jurisdicional do Estado, conforme disposto no artigo 134 da CRFB/88.

À Defensoria Pública incube realizar orientação jurídica, visando a promoção dos direitos humanos e a defesa, em todos os graus, judicial e extrajudicial, dos direitos individuais e coletivos, de forma integral e gratuita, aos necessitados. 

Assim, é imperioso ressaltar que a Defensoria Pública se mostra imprescindível na consolidação do princípio do acesso à justiça, visto que, ao exercer sua função jurisdicional não apenas está garantindo o acesso justiça, mas, buscando que todos aqueles que não possuem condições de financeiras tenham seu direito fundamental de acesso à justiça resguardado.

Denota-se que a garantia constitucional de acesso à justiça surgiu a partir de gradativa evolução histórica e da necessidade social de resolver os conflitos. Dada a sua importância, foi disciplinada na Constituição Federal, sendo elevada à categoria de direitos e garantias fundamentais.

Essa garantia constitucional está disciplinada no artigo 5º, inciso XXXV, da Constituição Federal, que estabelece que “a lei não excluirá da apreciação do Poder Judiciário lesão ou ameaça a direito”.

O direito de acesso à justiça também é denominado de princípio da inafastabilidade da jurisdição, por meio do qual busca-se assegurar a todos o acesso a ordem jurídica justa.

Apesar de todas essas mudanças legislativas realizadas ao logo do tempo, percebeu-se que nem sempre elas se mostravam efetivas, pois no dia a dia ainda é possível perceber diversas situações que dificultam o acesso à justiça, sobretudo, para aqueles considerados hipossuficientes.

Dentre as principais situações que dificultam o acesso à justiça é possível perceber o elevado custo de se manejar um processo judicial, além da demora excessiva. Outrossim, apesar da preocupação do constituinte em criar a Defensoria Pública, que é de fundamental importância no Estado Democrático de Direito, é preciso levar em consideração o estado em que se encontram as defensorias públicas estaduais, que muitas vezes, contam com baixo número de defensores e servidores e estrutura física inadequada.

Ademais, outra causa a ser considerada que inviabiliza o efetivo acesso à justiça é a situação do Poder Judiciário que se encontra sobrecarregado com a quantidade de processos, de modo que não consegue solucionar satisfatoriamente os conflitos que lhe são apresentados.  

Nesse contexto, surge como forma de desafogar o Judiciário e fornecer soluções mais ágeis aos jurisdicionados os meios alternativos de resolução de conflitos.

No entanto, a utilização dos referidos meios alternativos de resolução de conflitos requer uma mudança de mentalidade, de modo a diminuir os formalismos jurídicos, tornando a resolução das controvérsias algo mais simplificado.

Impende então dizer, de início, que o Novo Código de Processo Civil de 2015 (NCPC) – Lei nº 13.105/2015 cuidou de ocupar-se com os meios alternativos de resolução de conflitos, dos quais são exemplos a arbitragem, a conciliação e a mediação, estabelecendo expressamente no artigo 3º, § 3º, que todos que atuam no processo devem estimular a resolução consensual das controvérsias.

Dos meios alternativos de resolução de conflitos, a arbitragem é a que possui maior tempo, sendo regulamentada no ordenamento jurídico no ano de 1996 com o advento da Lei 9307/1996. Na arbitragem as partes elegem um terceiro desinteressado e imparcial (arbitro), conferindo-lhe poderes para solucionar a controvérsia.

O árbitro escolhido pelas partes deve possuir conhecimento técnico do objeto da avença entre as partes, de modo que, possa ofertar uma decisão justa ao eventual conflito, visto que a decisão por ele prolatada possuirá força judicial, não admitindo recurso. 

Existe como meio alternativo de resolução de conflitos ainda a conciliação, está por sua vez será realizada por um conciliador, que também deve manter-se equidistante das partes, podendo apenas sugerir meios, propor acordos para que as partes cheguem a um acordo.

A conciliação normalmente é utilizada em situações em que não há um vínculo anterior entres as partes, apenas surgiu em razão da controvérsia. Normalmente a conciliação é utilizada em disputas materiais em que se busca com maior celeridade um acordo.

Por fim, há ainda a mediação como meio alternativo de resolução de conflitos. Diferentemente da conciliação, na mediação há entres as partes um vínculo estabelecido antes da controvérsia, aqui o mediador apenas tem a função de intermediar a comunicação entre as partes, sendo-lhe em regra, vedado fazer sugestões ou propor acordos.  

Importante ainda frisar que o Novo Código de Processo Civil de 2015 (NCPC) – Lei nº 13.105/2015, tratou de replicar essas garantias constitucionais na parte reservada as normas fundamentais, nos seguintes termos:

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Art. 3o Não se excluirá da apreciação jurisdicional ameaça ou lesão a direito.

§ 1o É permitida a arbitragem, na forma da lei.

§ 2o O Estado promoverá, sempre que possível, a solução consensual dos conflitos.

§ 3o A conciliação, a mediação e outros métodos de solução consensual de conflitos deverão ser estimulados por juízes, advogados, defensores públicos e membros do Ministério Público, inclusive no curso do processo judicial.

É preciso, porém, observar que a garantia constitucional de acesso à justiça ganha contornos distintos no Estado Democrático de Direito. Para que se possa pensar em acesso à justiça não basta apenas que o indivíduo seja ouvido por algum órgão jurisdicional, não obstante é necessário que haja uma tutela justa e efetiva.

O NCPC tem como finalidade precípua, reduzir os obstáculos de ordem temporal, econômicos e social que dificultam o acesso à justiça, através da abstenção de formalismos, suprimindo-se procedimentos, bem como através da implantação de novos princípios, tais como o princípio da cooperação, do princípio da igualdade e da paridade de armas. 

Modernamente, fala-se que o princípio de acesso à justiça deve ser compreendido em sentido amplo, ou seja, em conformidade com os demais princípios basilares que regem o Estado Democrático de Direito, impedindo, assim, que de algum modo sejam obstados e limitados o acesso a ordem jurídica, e consequentemente o direito de receber do Poder Judiciário resposta aos questionamentos que lhe são submetidos.

Ademais, impende ressaltar que a garantia de acesso à justiça guarda intima relação com os demais princípios constitucionais, tais como, o princípio da igualdade, previsto no artigo 5º, caput, CRFB/88, haja vista não está adstrito a nenhuma característica especial do indivíduo o acesso a jurisdição. (RIBEIRO, 2015)

É possível perceber ainda que o referido princípio guarda estreita relação com o princípio do devido processo legal, estampado no art. 5º, LIV, da CRFB/88, pois o Judiciário deverá observar as garantias previstas na legislação inerentes ao Estado Democrático de Direito, de modo a assegurar a cada um o que é seu por meio de um processo devido. (CÂMARA, 2015)

Outrossim, o princípio do acesso à justiça é corolário do princípio do contraditório, em razão da dupla finalidade desse princípio de cientificar os réus, acusados e interessados acerca da existência do processo e facultar-lhes participar do processo afim de que possam influenciar no convencimento do juiz, alcançando-se resultado justo.

Dada a relevância, o direito de acesso à justiça possui previsão expressa no art. 8º da Convenção Interamericana sobre Direitos Humanos (Pacto de São José da Costa Rica), ratificado pelo Brasil mediante Decreto nº 678, de 06 de novembro de 1992, in verbis:

Art. 8º. Toda pessoa tem direito de ser ouvida, com as garantias e dentro de um prazo razoável, por um juiz ou tribunal competente, independente e imparcial, estabelecido anteriormente por lei, na apuração de qualquer acusação penal contra ela, ou para que se determinem seus direitos ou obrigações de natureza civil, trabalhista, fiscal ou de qualquer natureza.

Logo, percebe-se que o direito de acesso à justiça excede uma garantia constitucional, tratando-se de prerrogativa de direitos humanos, inerente a toda e qualquer pessoa.

Mostra-se incontestável que a garantia constitucional de acesso à justiça representa uma garantia fundamental de todas as pessoas, incumbindo ao Estado disponibilizar mecanismos efetivos para que se possa reclamar tutela para toda lesão ou ameaça a direito.

Destarte, ao Estado não basta pura e simplesmente prestar a tutela jurisdicional, é necessário viabilizar e facilitar o acesso à justiça.

1.2. Razoável duração do processo

O princípio da razoável duração do processo surgiu no ordenamento jurídico brasileiro em meados de 2004 com o advento da Emenda Constitucional nº 45/2004, denominada “Reforma do Judiciário”.

Todavia, cumpre ressaltar que alguns expoentes da doutrina processualista, como a Professora Ada Pelegrini Grinover, durante algum tempo sustentou que o referido princípio não ostentava a qualidade de novidade, visto que, o Pacto de San José da Costa Rica, de 1969, já o mencionava, tendo a legislação pátria apenas ratificado. Em sentido contrário, Didier Junior sustenta que esse princípio nasceu como sendo corolário do princípio do devido processo legal. (DIDIER JR, 2015, p. 18)    

Fato é que durante muito tempo tem-se discutido na seara do direito, bem como entre os jurisdicionados, sobre o princípio da duração razoável do processo e acerca da morosidade da justiça no Brasil, e nos efeitos que uma má e tardia prestação jurisdicional pode causar.

Em virtude dessa preocupação e com o objetivo de solucionar os problemas que ocasionam a morosidade do Judiciário e buscar novamente a confiança dos jurisdicionados, foram realizadas diversas reformas legislativas.

Dentre as principais mudanças realizadas destaca-se a Emenda Constitucional nº 45/2004, que inseriu no ordenamento jurídico diversos institutos tais como, a súmula vinculante, o instituto da repercussão geral e dos recursos repetitivos.

A referida reforma do Judiciário trouxe mudanças paradigmáticas, criando institutos e instrumentos que teriam o condão de alterar a atual conjuntura do Poder Judiciário, no que diz respeito ao tempo e qualidade da prestação jurisdicional. (DIDIER JR, 2015, p. 16)

Ademais, foi inserido no artigo 5º, o inciso LXXVIII que assegura a todos, no âmbito judicial e administrativo, são assegurados a razoável duração do processo e os meios que garantam a celeridade de sua tramitação. Esse inciso consagrou a garantia fundamental a razoável duração do processo.

É cediço que, durante muito tempo, a principal preocupação do legislador no que tange ao Judiciário, referia-se a morosidade e a demora no julgamento dos processos. (DIDIER JR, 2015) 

Dentre as principais causas que são apontadas como causadoras da morosidade da justiça, estão conforme aponta o Professor Alexandre Freitas Câmara, problemas relacionados com uma legislação ultrapassada, falta de servidores para atuar nos cartórios, demora excessiva para a juntada de petições, excesso de processos a serem examinados para cada magistrado e, por fim, advogados que se utilizam de recursos meramente protelatórios.

Nesse sentido, Alexandre Freitas Câmara ensina:

É certo que alguns dos problemas relacionados à morosidade processual com que se convive no Brasil resultam da legislação. Nem todos, porém, têm esta origem. Eu até arriscaria dizer que a morosidade resulta principalmente de fatores que não tem qualquer vinculação com a lei. Falta de servidores para atuar nos cartórios; demora excessiva para a juntada de petições (não é incomum ouvir reclamações no sentido de que em algumas serventias a juntada de uma simples petição pode demorar entre nove meses e um ano); excesso de processos para serem examinados para cada magistrado (no ano de  2010, por exemplo, segundo o relatório Justiça em Números do CNJ, havia em média seis mil processos para cada Juiz Estadual em primeira instância no Brasil); são muitos os fatores que contribuem para a lentidão do processo, e que não têm qualquer ligação com a legislação processual”. (CÂMARA, 2015)

A respeito do tema, a professora Maria Tereza Sadek se manifesta nos seguintes termos:

A situação da Justiça brasileira é dramática. Seus tempos superam os limites da razoabilidade. Segundo dados do Conselho Nacional de Justiça (CNJ), 60% dos casos não são analisados no ano em que são protocolados. A movimentação processual é extraordinária. O volume de processos em todos os ramos e instâncias é notável, assinalando altos índices de litigiosidade. As taxas de congestionamento são significativas, apesar do expressivo número de decisões, indicando que a Justiça não tem conseguido responder às demandas da sociedade. (CRISTO, 2009)

Ainda sobre o tema, Marcelo Ribeiro vai dizer que:

Por muitos e longos anos a estrutura rudimentar dos poderes constituídos vedou o acesso da população carente. Custas elevadas, a falta de procedimentos mais céleres e informais, assim como desvalorização da Defensoria são alguns dos exemplos de uma realidade defasada e superada pela atual conjuntura da ciência processual. No entanto, mudar este anacrônico quadro de desigualdades para garantir e efetivação do acesso à ordem jurídica justa e o correlato exercício da cidadania trouxe desafios contemporâneos para o ordenamento jurídico.  (RIBEIRO, 2015)

Muito se discute sobre quais seriam as causas que inviabilizam uma maior celeridade processual, dificultando a duração razoável dos processos. Atualmente, atribui-se essa morosidade a fatores como, comportamento das partes, inúmeros recursos enviados aos tribunais, complexidade da causa, ao Estado que é considerado atualmente o principal litigante, falta de aparelhamento estatal, entre outros.

Não obstante, é possível perceber que boa parte das alterações legislativas concernentes a legislação processual, nos últimos anos, tem como finalidade buscar soluções mais rápidas para os litígios, de modo que, os processos tenham tramitação mais céleres.

É possível inferir, a partir da leitura do artigo 5º, inciso LXXVIII, da CRFB/88, que se deve buscar com a maior economia possível de tempo e despesas, os melhores resultados possíveis.

Entre as possíveis soluções para diminuir a morosidade do Judiciário, pode-se sugerir uma preparação dos profissionais do direito, de modo que estes passem a comportar-se como conciliadores, já que é preciso a mudança cultural. Deve-se incentivar que as partes recorram aos meios alternativos de solução de controvérsias, tais como a conciliação, a mediação e a arbitragem.

Ademais, pode-se buscar a criação de Câmaras Especializadas nos julgamentos de conflitos e por fim um maior investimento no aparelhamento Estatal, certamente essas medidas, teriam o condão de contribuir significativamente para uma maior solução do grave problema da morosidade do Judiciário brasileiro (RIBEIRO, 2015).

É inegável que o NCPC, promoveu inúmeras mudanças que buscam garantir uma maior celeridade processual. A primeira e principal mudança trazida pelo novel dispositivo foi a extinção da divisão que havia entre os procedimentos comum e ordinário no CPC/73, o NCPC nos termos do artigo 318 disciplinou apenas o procedimento comum (CÂMARA, 2015).

Ademais, é possível perceber outra mudança nas formalidades processuais, a exemplo do que consta no artigo 319 em que se exigir que o autor indique na petição inicial informação do correio eletrônico (e-mail) em que poderá ser usado para futuras intimações, o que sem dúvida contribuirá sobremaneira para celeridade processual.

Ainda no que tange às mudanças trazidas pelo NCPC é possível notar uma maior importância aos meios consensuais de resolução de conflitos, isso porque o legislador asseverou no artigo 3° que todos os participantes da relação processual têm o dever de privilegiar a solução consensual, devendo ser incentivado pelos advogados, juízes e demais serventuários.

Por fim, existem outros mecanismos que denotam que o NCPC buscou ir de encontro aos problemas enfrentados e que obstam que se tenha uma razoável duração do processo, por exemplo, o princípio da cooperação previsto no artigo 6° do NCPC, que estatui que as partes devem cooperar mutuamente de modo que se obtenha uma decisão mais célere e mais efetiva.

O artigo 321 trouxe a obrigatoriedade de que os magistrados indiquem especificamente o que deve ser corrigido nas manifestações iniciais das partes.

Além disso, pode-se ainda citar a observância de um sistema de vinculação a precedentes, notadamente o julgamento de causa repetitivas, mecanismos de antecipação de tutela de urgência e evidência, a melhoria do sistema recursal, certamente essas mudanças contribuíram para a duração mais razoável do processo. (CÂMARA, 2015)

Vale destacar, porém, que a garantia fundamental da razoável duração do processo não implica em uma busca desenfreada por celeridade processual a qualquer preço. É importante resguardar o direito de que todos tenham um processo que dure apenas e tão o tempo suficiente para formar o convencimento do julgador, de modo que este possa ao final entregar uma tutela jurisdicional justa e efetiva, mas sem se descuidar das garantias processuais constitucionalmente asseguradas, tais como o contraditório e ampla defesa (MACÊDO, 2016) .

Em outros termos, o sistema que é comprometido com o princípio da duração razoável do processo, não é aquele que não existe nenhuma demora, ao contrário o processo que respeita o devido processo legal e as garantias fundamentais é, por sua natureza, um processo que demora algum tempo.

Com arrimo na previsão do artigo 5º, inciso LXVIII da CF/88, o NCPC inseriu no capitulo destinado às normas fundamentais, no art. 4º, o princípio da razoável duração do processo, in verbis: as partes têm o direito de obter em prazo razoável a solução integral do mérito, incluída a atividade satisfativa. 

O NCPC além de reforçar o princípio da razoável duração do processo, preconiza que não basta obter uma sentença em tempo razoável, mas que essa resposta jurisdicional deve ser tempestiva e capaz de proporcionar a solução integral do mérito. De acordo com Alexandre Freitas Câmara, a garantia de duração razoável do processo deve ser compreendida, então, de forma panorâmica, pensando-se na duração total do processo, e não só no tempo necessário para se produzir a sentença do processo de conhecimento. (CÂMARA, 2015)

De mais a mais, é necessário reconhecer o esforço do legislador em criar instrumentos com a finalidade de buscar um processo mais célere e justo. O NCPC foi estruturado com esse escopo.

É certo que as inovações trazidas pelo NCPC não se mostram capazes de sozinhas eliminar todos os problemas do Judiciário, já que os problemas são de variadas ordens. Todavia, é inegável que contribuirão para diminuir a morosidade e melhorar significativamente a prestação jurisdicional.

1.3. Efetividade da tutela jurisdicional – uma nova perspectiva constitucional

A nova concepção do direito processual, com o advento da Emenda Constitucional 45/2004, conforme mencionado alhures, trouxe mudanças paradigmáticas aos diversos institutos do processo.

Ocorre que, na verdade, essas transformações deram-se em razão de um fenômeno denominado de neoconstitucionalismo, que em apertada síntese, trata-se de um fenômeno e ou movimento que surgiu nos idos do século XX , após o positivismo, proclamando a superioridade e a imperatividade do texto constitucional. Nessa perspectiva, a constituição ocupa o ápice do ordenamento jurídico, servindo de paradigma de interpretação para todas as demais normas inferiores, de modo que, todas as normas hierarquicamente inferiores devem ser concebidas à luz da Constituição.

Sobre o tema, Leandro Vilela Brabilla afirma que:

Neoconstitucionalismo trata-se de um movimento teórico de revalorização do direito constitucional, de uma nova abordagem do papel da constituição no sistema jurídico, movimento este que surgiu a partir da segunda metade do século XX.

O neoconstitucionalismo visa refundar o direito constitucional com base em novas premissas como a difusão e o desenvolvimento da teoria dos direitos fundamentais e a força normativa da constituição, objetivando a transformação de um estado legal em estado constitucional. (BRABILLA, 2009)

Sob as influências desse movimento contemporâneo, o direito processual civil, sobretudo com o advento do NCPC, promoveu significativas mudanças em seus institutos, fenômeno esse denominado de neoprocessualismo.

Acerca da evolução histórica do direito processual civil, Didier Jr. leciona que esta pode ser sintetizada em três fases, a saber: (DIDIER JR, 2015)

  1. Praxismo ou sincretismo: Nessa fase não havia distinção entre o processo e o direito material. O processo era estudado apenas como um instrumento prático.
  2. Processualismo: Nesta inicia-se a separação entre o direito processual e o direito material, de modo que o direito processual passaria a ser vista e estudada doravante como ciência.
  3. Instrumentalismo­: Nesta fase o direito processual passa a ser compreendido como instrumento de efetivação do direito material, de modo, que torna - se necessário o estudo do direito processual com ciência autônoma.

No entanto, parece adequado, segundo as lições de Didier Junior, afirmar que se está diante de uma quarta fase, haja vista a conservação dos institutos do processualismo e do instrumentalismo. Todavia, é inegável o avanço da ciência processual, passando-se a estudar e aplicar o direito processual a partir do marco estabelecido pela Constituição.

Ainda sobre o tema, Alexandre Freitas Câmara leciona que

o processo civil brasileiro é construído a partir de um modelo estabelecido pela Constituição da República. É o chamado modelo constitucional de processo civil, expressão que designa o conjunto de princípios constitucionais destinados a disciplinar o processo civil (e não só o civil, mas todo e qualquer tipo de processo) que se desenvolve no Brasil. (CÂMARA, 2015)

Além disso, o primeiro artigo do NCPC deixa claro essa nova perspectiva, in verbis:

Art. 1o O processo civil será ordenado, disciplinado e interpretado conforme os valores e as normas fundamentais estabelecidos na Constituição da República Federativa do Brasil, observando-se as disposições deste Código.

Em arremate a essas alterações postas por esses movimentos, o legislador atento percebeu que a tutela jurisdicional prestada pelo Estado deve ser efetiva e eficaz. Essa percepção surge a partir da compreensão do princípio do devido processo legal, construção do direito inglês, que prevê no art. 5º, inciso LIV, CRFB/88 que “ninguém será privado da liberdade ou de seus bens sem o devido processo legal”.

Demais disso, é possível perceber que o princípio da efetividade emana da cláusula geral do devido processo legal, pois só é possível afirmar que a tutela foi efetiva se houver um processo devido, produzindo resultados no plano fático, o que se traduz evidentemente em efetividade da tutela jurisdicional. 

Os estudiosos da ciência do direito processual se utilizam de teorias distintas para explicar o princípio da efetividade da tutela jurisdicional.

O professor Cândido Dinamarco filia-se à teoria da relação jurídica e apresenta a efetividade no viés do Estado Social. Este realiza o estudo da efetividade relacionando-a com o “acesso à justiça.” Afirma que o “acesso à justiça” é mais do que o ingresso no processo e aos meios que ele oferece, é antes, o único modo de se alcançar um bem da vida que por outro caminho não poderia ser obtido. (CRISTO, 2009)

No mesmo sentido Humberto Teodoro Junior:

filia-se à teoria do processo como relação jurídica e desenvolve o estudo da efetividade numa vertente do Estado Social do Direito, ligando o termo efetividade à celeridade do procedimento.

Afirma que a primeira grande conquista do Estado Democrático de Direito foi a de oferecer a todos uma “justiça” confiável, independente e imparcial, assumindo a função de um dos poderes soberanos do Estado. (HASSE, 2013)  

Por sua vez Calmon de Passos, trabalha a efetividade do processo relacionando-o com a cidadania, afirma que ambas as expressões em nossos dias são dotadas de intensa energia mobilizadora e forte carga simbólica. (HASSE, 2013)

Neste contexto, discute-se se o princípio da efetividade da tutela jurisdicional estaria vinculado a adequação do provimento, ou seja, se o provimento elegido mostra-se adequado para alcançar a satisfação do direito. (RIBEIRO, 2015)

Outrossim, fala-se que a efetividade da tutela jurisdicional pressupõe um contraditório efetivo, de modo que se garanta igualdade de oportunidades a todos os participantes da relação processual.

Em síntese, para que haja efetividade da tutela jurisdicional, não basta apenas que oferecer as partes acesso à justiça, é preciso, porém, que as decisões e os julgamentos oriundos da análise meritória sejam úteis e aptos a produzir os efeitos esperados. (CÂMARA, 2015)

No plano infraconstitucional também é possível perceber a preocupação do legislador em elencar o princípio da efetividade da tutela jurisdicional como norma fundamental. Todavia o NCPC, no art. 4º[1], disciplinou o princípio da efetividade da tutela jurisdicional como direito à atividade satisfativa, logo, o novel código preconiza que a tutela jurisdicional só pode ser considerada efetiva se esta compreender a tutela satisfativa e executiva.

Novamente, invocando as lições de Didier Junior apud Kazuo Watanabe, tem-se que processo efetivo

“[...] deve ser entendido não como garantia formal, uma garantia de pura e simplesmente bater as portas do Poder Judiciário, mas, sim, como uma garantia de acesso à ordem jurídica justa, consubstanciada em uma prestação jurisdicional tempestiva, adequada, eficiente e efetiva. O direito à sentença deve ser visto como direito ao provimento e aos meios executivos capazes de dar efetividade ao direito substancial, o que significa o direito à efetividade em sentido estrito”. (DIDIER JR, 2015)

Por todo exposto, é possível concluir que a nova concepção do direito processual se mostra muito além da garantia do acesso a ordem jurídica. Busca-se na verdade garantir o direito fundamental de acesso a uma tutela jurisdicional efetiva, justa e em prazo razoável. Com isso não significa dizer que o acesso à justiça ocupe menor importância no ordenamento jurídico, ao contrário, ela é de fundamental importância, pois de nada adianta se esta é ineficaz.

Está-se a dizer, porém, que a eficácia e a efetividade da tutela jurisdicional são as principais responsáveis pela satisfação e produção dos efeitos almejados.  

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