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Pacta sunt servanda x rebus sic stantibus.

Uma breve abordagem

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01/05/1999 às 00:00

Resumo:


  • Pacta sunt servanda é um princípio que determina a força obrigatória dos contratos, assegurando que as cláusulas contratuais sejam cumpridas como se fossem lei entre as partes.

  • Rebus sic stantibus é a teoria da imprevisão, que permite a revisão das condições contratuais em casos de mudanças imprevistas e imprevisíveis que tornem a execução do contrato excessivamente onerosa para uma das partes.

  • O Direito brasileiro incorporou a teoria da imprevisão com o Código de Defesa do Consumidor, que prevê a possibilidade de revisão contratual em razão de fatos supervenientes que tornem a prestação onerosa demais.

Resumo criado por JUSTICIA, o assistente de inteligência artificial do Jus.

2. REBUS SIC STANTIBUS

2.1. CONCEITO

Rebus Sic Stantibus pode ser lido como "estando as coisas assim" ou "enquanto as coisas estão assim". Deriva da fórmula contractus qui habent tractum sucessivum et dependentium de futuro rebus sic stantibus intelliguntur.

Esta expressão tem origem no Direito Canônico e é empregada para designar o princípio da imprevisão, segundo o qual a ocorrência de fato imprevisto e imprevisível posterior à celebração do contrato diferido ou de cumprimento sucessivo implica alteração nas condições da sua execução.

A cláusula de mesmo nome seria aquela que garantiria a adoção deste princípio pelos contratantes, o que leva a crer que, havendo esta opção como cláusula, seu emprego constitui exceção; a imutabilidade é a regra geral.

Pode-se dizer que o termo "teoria da imprevisão" é relativo à condição de que, havendo mudança, a execução da obrigação contratual não seja exigível nas mesmas condições pactuadas antes da mudança, o que leva a uma idéia de exigibilidade diversa. A execução da obrigação continua exigível, mas não nas mesmas condições; há necessidade de um ajuste no contrato.

Já a cláusula da imprevisão (rebus sic stantibus) é a instrumentalização deste ajuste. É a estipulação contratual ou a aplicação de um princípio de que, presente a situação imprevista, o contrato deve ser ajustado à nova realidade. Disto se tem a revisão do contrato. 31

Acquaviva 32 define a cláusula rebus sic stantibus como aquela "em que as partes estipulam que o cumprimento do contrato fica subordinado à não modificação, no futuro, dos pressupostos e circunstâncias que ensejaram o pacto."

Já o doutor Ronaldo Caldeira Xavier 33 ensina que "como cláusula contratual, subentende o vínculo da obrigação, desde que, até o termo do contrato, perdurem as condições econômicas existentes no momento da celebração. (...) Previne o caso fortuito e o motivo de força maior."

O professor carioca José Náufel 34, dicionarista jurídico de renome, classifica esta cláusula como "implícita de rescisão do contrato de longa duração e execução sucessiva, sobrevindo circunstâncias tais que, se pudessem ser previstas, o contrato ou não seria celebrado ou somente o seria com diversas cláusulas."

Num dos mais apurados estudos da matéria, o jurista Arnoldo Medeiros da Fonseca aponta quatro principais requisitos necessários à aplicação da teoria da imprevisão 35: a) o diferimento ou a sucessividade na execução do contrato; b) alteração nas condições circunstanciais objetivas em relação ao momento da celebração do contrato; c) excessivas onerosidade para uma parte contratante e vantagem para outra; d) imprevisibilidade daquela alteração circunstancial.

Acrescentamos a estes um quinto, um sexto e um sétimo pressupostos: e) o nexo causal entre a onerosidade e vantagem excessivas e a alteração circunstancial objetiva; f) a inimputabilidade às partes pela mudança circunstancial; g) a imprevisão da alteração circunstancial.

O nexo de causalidade porque a só desproporção demasiada entre ônus e bônus das partes, ainda que tenha havido mudança circunstancial, não justificaria a revisão contratual se tal contraste não for decorrente da mudança.

A inimputabilidade da mudança porque se esta for imputável a qualquer dos contratantes este responderá pelas perdas e danos, e não terá direito à revisão. A mudança circunstancial deve ser externa, conjuntural, como as provocadas pela própria natureza ou pelas autoridades, ou ainda pelo comportamento macroeconômico.

A imprevisão em razão de que esta não está compreendida pela imprevisibilidade: mesmo que um fato não seja razoavelmente previsível, pode ter sido previsto. Tendo em conta que "prever" (do latim praevidere: calcular, conjecturar, supor 36.) não implica conhecer 37 o que vai acontecer e sim a conhecer o que pode acontecer, a previsibilidade é a possibilidade de conhecer o que pode acontecer. Assim, há que se distinguir uma e outra.

A previsão é a existência de conhecimento sobre a possibilidade de um acontecimento (eu sei que aquilo pode acontecer). Já a previsibilidade é a possibilidade de que exista o conhecimento sobre a possibilidade de um acontecimento (eu posso saber que aquilo pode acontecer).

Neste sentido, e considerando que a imaginação humana é fértil, e que tal fertilidade é ilimitada, não se pode dizer que alguma coisa não possa ser conhecida, imaginada. Assim, em tese, embora nem tudo seja previsto, tudo é previsível.

Por isto é que é mais apropriado falar em previsibilidade razoável, assim entendida aquela que se limita à conjectura mediana, excluídas as criações fantasiosas ou de probabilidade ínfima.

Destarte, melhor seria dizer que é pressuposto do direito à revisão contratual a imprevisibilidade razoável, ou seja, a impossibilidade de que o fato seja razoavelmente previsto.

Dito isto temos que rebus sic stantibus pode ser definida como a cláusula que permite a revisão das condições do contrato de execução diferida ou sucessiva se ocorrer em relação ao momento da celebração mudança imprevista, razoavelmente imprevisível e inimputável às partes nas circunstâncias em torno da execução do contrato que causem desproporção excessiva na relação das partes, de modo que uma aufira vantagem exagerada em detrimento da desvantagem da outra.

Ocorre que este princípio não pode ser encarado isoladamente, sem que se leve em conta a necessária segurança jurídica e, acima de tudo, o princípio da força obrigatória que vimos no capítulo anterior.

Aliás, pode-se dizer que estes princípios (pacta sunt servanda e rebus sic stantibus), mais que contrapostos, se completam, porque o alcance de um só vai até o do outro.

A teoria da imprevisão, por isto, é aceitável 38 como limitadora da força obrigatória. Permite a alteração do contrato sem ferir a autonomia da vontade, porque só se muda o que não está adstrito à manifestação volitiva (imprevisibilidade).

2.2. SINOPSE HISTÓRICA

Os doutrinadores desenvolveram, ao longo da História, diversas teorias que pudessem justificar a revisão dos contratos, cuja mais antiga e conhecida é a Teoria da Imprevisão. Mas outras idéias surgiram a partir daí, divergindo num ou noutro ponto.

Um dos principais vultos da Escola dos Pandectistas (Alemanha, século passado), Bernard Windscheid, apresentou a Teoria da Pressuposição, segundo a qual o contratante, ao manifestar sua vontade, pressupõe determinada condição, e se tal condição não ocorre o efeito jurídico não corresponderia à vontade, e portanto seria judicialmente anulável.

Tão famosa quanto polêmica, esta teoria foi severamente combatida pela comunidade jurídica que via, aí, um risco à segurança jurídica, mas ainda assim a idéia influenciou bastante a formação da moderna concepção sobre a revisão contratual.

A seguir tivemos a Teoria da Superveniência, do italiano G. Osti, pela qual, nas palavras do Juiz de Alçada gaúcho Márcio Puggina39, "é cindida a vontade em dois momentos: no ato da conclusão do negócio e durante a execução do contrato. Alterando-se os fatos durante a execução, entende-se ausente a vontade contratual. Essa concepção prescinde da imprevisão, contentando-se com a superveniência de alterações".

Há também a Teoria da Condição Implícita, adotada no direito inglês (implied condition), segundo a qual o contrato depende, para sua eficaz execução, de uma condição implícita, embora não expressa, que é o status quo envolvendo as partes no momento em que firmaram o contrato.

Mais uma teoria alemã, lançada por Lehmann, denominada Eclética, informa que o contrato pode ser rescindido por estar prejudicada a base do negócio, desde que a mudança das circunstâncias provoque flagrante desproporção entre as prestações, que as partes não tenham suposto, nem podido supor, a mudança circunstancial, e que a modificação das circunstâncias tenha tornado impossível de suportar a execução do contrato.

Surgiu ainda a Teoria da Impossibilidade Econômica, em que a impossibilidade econômica e jurídica se equiparam (se o cumprimento da obrigação levasse à ruína o obrigado, este estaria liberado de fazê-lo, pois a impossibilidade econômica conduziria à impossibilidade jurídica), desde que em razão de circunstâncias ulteriores à celebração do contrato.

Outras mais surgiram, como a Teoria do Erro, do italiano Giovene, e a Teoria da Boa-fé, do francês Naquet, mas nenhuma com tanta consagração quanto a Teoria da Base do Negócio Jurídico, proposta nos anos 20 por Paul Oertmann, que se baseou na Teoria da Pressuposição e foi aperfeiçoada por Karl Larenz, vindo a ser a Teoria da Base Objetiva do Negócio Jurídico.

Tal teoria chama de base objetiva do contrato o conjunto de circunstâncias cuja existência é imprescindível ao fim tencionado pelas partes. Mas preferimos persistir adotando a Teoria da Imprevisão como sustentáculo principal da revisão dos contratos, vez que esta, nos termos que aqui a consideramos, é mais completa e adequada40 ao ordenamento jurídico brasileiro.

2.3. A CLÁUSULA COMO PRESSUPOSTO DA REVISÃO

Sendo instrumento de ajuste do equilíbrio contratual, a cláusula rebus sic stantibus se constitui pressuposto da revisão judicial, como que autorizando, para o caso, a readaptação das condições contratadas à nova realidade.

Maria Helena Diniz41 lembra que a revisão judicial é prevista no caso de cumprimento parcial da obrigação, quando "poderá o juiz reduzir proporcionalmente a pena estipulada para o caso de mora, ou de inadimplemento." (artigo 924 do Código Civil).

Limongi França42 assevera que o Judiciário tem por atribuição a interferência no contrato, independentemente de lei correspondente, face a necessidade de harmonizar a execução dos negócios segundo o fim tencionado com o bem da sociedade; tal construção tem lastro no artigo 5º da Lei de Introdução ao Código Civil.

Outros autores43 44 há que apontam esta ou aquela referência legal, além do Código de Defesa do Consumidor, à possibilidade de revisão contratual, mas o tema da revisão judicial dos contratos, apesar de conexo à teoria da imprevisão, não é exatamente o objeto deste estudo.

2.4. A TEORIA DA IMPREVISÃO NA LEI BRASILEIRA

O Direito brasileiro não havia adotado e nem ao menos regulado a teoria da imprevisão até a edição do Código de Defesa do Consumidor. Até aí, tinha-se apenas algumas referências, no Código Civil.

2.4.1. CÓDIGO CIVIL

O Código Civil traz alguns dispositivos que direta ou indiretamente guardam alguma relação com a teoria da imprevisão, todas na Parte Especial.

No Livro I (Direito de Família), Título V (Relações de Parentesco), Capítulo VII (Alimentos), está o artigo 401, segundo o qual "se, fixados os alimentos, sobrevier mudança na fortuna de quem os supre, ou na de quem os recebe, poderá o interessado reclamar do juiz, conforme as circunstâncias, exoneração, redução, ou agravação do encargo."

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No Livro III (Direito das Obrigações) estão a maioria das referências. O Título II (Efeitos das Obrigações) tem no Capítulo II (Pagamento), Seção V (Tempo do Pagamento), o artigo 954, que dispõe: "Ao credor assistirá o direito de cobrar a dívida antes de vencido o prazo estipulado no contrato (...): (...) III - se cessarem, ou se tornarem insuficientes as garantias do débito, fidejussórias, ou reais, e o devedor, intimado, se negar a reforçá-las."

Ainda neste Título está o Capítulo XIII (Conseqüências da Inexecução das Obrigações) cujo artigo 1.058 diz que "o devedor não responde pelos prejuízos resultantes de caso fortuito ou força maior, se expressamente não se houver por eles responsabilizado..." O Título IV (Contratos) tem no Capítulo II (Contratos Bilaterais) o artigo 1.092, preceituando na segunda parte que "se, depois de concluído o contrato, sobrevier a uma das partes contratantes diminuição em seu patrimônio, capaz de comprometer ou tornar duvidosa a prestação pela qual se obrigou, pode a parte, a quem incumbe fazer prestação em primeiro lugar, recusar-se a esta, até que a outra satisfaça a que lhe compete ou dê garantia bastante de satisfazê-la."

E o Título V (Várias Espécies de Contrato) tem no Capítulo I (Compra e Venda), Seção I (Disposições Gerais) o artigo 1.131 dispõe: "Não obstante o prazo ajustado para o pagamento, se antes da tradição o comprador cair em insolvência, poderá o vendedor sobrestar na entrega da coisa, até que o comprador lhe dê caução de pagar no tempo ajustado."

No Capítulo IV (Locação), Seção I (Locação de Coisas), Disposições Gerais, está o artigo 1.190: "Se, durante a locação, se deteriorar a coisa alugada, sem culpa do locatário, a este caberá pedir redução proporcional do aluguer, ou rescindir o contrato, caso já não sirva a coisa para o fim a que se destinava."

Na Seção III (Empreitada) deste mesmo Capítulo, o artigo 1.246 tem este teor: "O arquiteto, ou construtor, que, por empreitada, se incumbir de executar uma obra segundo plano aceito por quem a encomenda, não terá direito a exigir acréscimo no preço, ainda que o dos salários, ou o do material, encareça, nem ainda que se altere ou aumente, em relação à planta, a obra ajustada, salvo se se aumentou, ou alterou, por instruções escritas do outro contratante e exibidas pelo empreiteiro" (Esta disposição legal encontra paralelo no artigo 233 do Código Comercial, segundo o qual o empreiteiro pode requerer reajuste no preço "se o locatário alterar o plano antes ou depois de começada a obra").

Por fim, no Livro IV (Direito das Sucessões), Título III (Sucessão Testamentária), Capítulo XVI (Revogação dos Testamentos), o artigo 1.750 está assim: "Sobrevindo descendente sucessível ao testador, que não o tinha, ou não o conhecia, quando testou, rompe-se o testamento em todas as suas disposições, se esse descendente sobreviver ao testador."

Todos estes dispositivos têm algum ponto em comum com a rebus sic stantibus, mas nenhum deles se adequa à teoria da imprevisão.

Uns porque não são situações contratuais, mas de arbítrio judicial ou declaração unilateral de vontade. Outros porque não se referem à imprevisão ou imprevisibilidade. Outros ainda porque não condicionam a alteração à desproporção obrigacional e também há os que não se referem ao nexo de causalidade entre a mudança circunstancial e a desproporção. Os pontos comuns são apenas a existência da execução diferida ou sucessiva e a possibilidade de alteração na execução do contrato.

Este era o quadro legal brasileiro 45 a respeito da matéria, até a edição do Código de Defesa do Consumidor, em 1990.

2.4.2. CÓDIGO DO CONSUMIDOR

A partir do Código Consumerista a teoria da imprevisão estreou na legislação pátria e se consolidou como princípio jurídico no Brasil.

A Lei 8.078/90 traz no artigo 6º, inciso V, um dos direitos básicos do consumidor:

"Art. 6º - São direitos básicos do consumidor:

(...)

V – a modificação de cláusulas contratuais que estabeleçam prestações desproporcionais ou sua revisão em razão de fatos supervenientes que as tornem excessivamente onerosas;"

(grifo nosso)

Com esta disposição o Código adota expressamente o princípio rebus sic stantibus, e ainda que esta legislação seja aplicável somente às relações de consumo, o princípio vige no ordenamento jurídico brasileiro como mais uma base de sustentação às relações de direito.

O texto legal ainda tem outra passagem (artigo 51, § 1º, III) que tangencia a teoria da imprevisão, quando estabelece como um dos critérios para onerosidade excessiva, além da natureza e conteúdo do contrato, "outras circunstâncias peculiares ao caso", o que também pode ser subentendido como mudança circunstancial. Ou seja, o dispositivo leva a crer que as circunstâncias (e sua mudança) podem gerar onerosidade excessiva, que conduz ao conceito de vantagem exagerada presumida.

Assim, o Código de Defesa do Consumidor claramente adotou a teria da imprevisão, e no dizer de Alberto do Amaral Júnior 46 47 "o controle das cláusulas contratuais abusivas, tal como instituído pelo Código de Defesa do Consumidor, em absoluto se choca com o princípio da liberdade contratual, pela simples razão de que este princípio não pode ser invocado pela parte que se encontra em condições de exercer o monopólio de produção das cláusulas contratuais, a ponto de tornar difícil ou mesmo impossível a liberdade contratual do aderente."

2.5. A TEORIA DA IMPREVISÃO NA JURISPRUDÊNCIA

A jurisprudência brasileira tem se posicionado pela aplicação da teoria da imprevisão, desde que respeitados os pressupostos mínimos 48 49 :

"ARRENDAMENTO RURAL - Aplicabilidade da Teoria da Imprevisão, operando-se a revisão judicial do contrato, vez que celebrado em 1986, no início do Plano Cruzado."

(TARS; https://www.rt.com.br/cgi/acordao.cgi?file=9B193 )

"LOCAÇÃO - Revisional de aluguel - Requisito temporal não preenchido - Ação proposta com fundamento na teoria da imprevisão - Admissibilidade em tese - Indispensabilidade da existência de pressupostos autorizadores da aplicação da cláusula rebus sic stantibus - Recessão que não pode ser considerada como circunstância imprevisível em nosso País."

(TACivSP; https://www.rt.com.br/cgi/acordao.kgi?file=93125 )

"LOCAÇÃO - Revisional de aluguel Reajuste voluntário no interregno do qüinqüênio - Aumento acima dos índices oficiais que apenas contemporizou situação efêmera, logo dissipada pela inflação - Fato que não configura elevação do locativo a preço do mercado - Aplicação da teoria da imprevisão consubstanciada na cláusula rebus sic stantibus."

(TACivSP; https://www.rt.com.br/cgi/acordao.cgi?file=73125 )

"CONTRATO - Teoria da imprevisão - Aplicabilidade - Venda a futuro de produto destinado ao consumo humano - Ajuste não aleatório - Excessiva oneração de uma das partes em razão de o preço contratado se ter tornado inferior ao mínimo oficial por força da inflação e da aplicação da tabela deflatora cruzeiro/cruzado - Revisão judicial da condição ‘preço’, ao invés de resolução ou anulação da avença, elevando-o à igualdade com o preço mínimo de garantia, por se tratar de regra de ordem pública."

(TJRS; https://www.rt.com.br/cgi/acordao.cgi?file=50176 )

"LOCAÇÃO. Revisional de aluguel. Aplicação da teoria da imprevisão, consubstanciada na cláusula rebus sic stantibus."

(TARS; https://www.rt.com.br/cgi/acordao.cgi?file=46204 )

"À aplicação da teoria da imprevisão exigem-se requisitos mínimos: imprevisibilidade, existência de lesão, inimputabilidade, inocorrência de mora."

(TACivSP; Ap.480094, rel Juiz Artur Marques, j. 26.5.1997.)

"LOCAÇÃO. Revisional de aluguel. Aplicação da teoria da imprevisão, consubstanciada na cláusula rebus sic stantibus."

(TACivSP; https://www.rt.com.br/cgi/acordao.cgi?file=85127 )

Quando, entretanto, não subsistem os requisitos necessários, naturalmente não será a Justiça arbitrária a ponto de substituir a vontade das partes sem que tenha havido alteração circunstancial nos termos da teoria da imprevisão.

Assim é que o Supremo Tribunal Federal há muito se pronunciou sobre a aplicação da rebus sic stantibus no caso da famigerada inflação, com a qual convivemos até pouco tempo atrás:

"o fenômeno inflacionário já era uma infeliz realidade (para os contratantes), não podendo dizer-se, portanto, ter ele surpreendido o vendedor"

(STF; RE 80575-3-RJ, rel Min Neri da Silveira, 20.9.83, RT 593/252) 50

Não foi assim, contudo, que interpretaram os juristas argentinos, segundo nos informa o professor Ricardo Lorenzetti, da Universidad de Santa Fe:

"La primera luz de advertencia, en el derecho argentino, la dio el fenómeno inflacionario, que motivo una trabajosa elaboración en vistas a admitir un reajuste permanente del precio pactado en una moneda sujeta a alteraciones en su valor intrinseco. De ello surgió la conocida aplicación de numerosos institutos destinados a preservar la relación de equivalencia, alterada por circunstancias ajenas a las partes." 51

Não se pode restringir a discussão da teoria da imprevisão aos fenômenos inflacionários ou, mais genericamente, aos econômicos, vez que estes são apenas parte das possibilidades.

Contudo é oportuno o debate hoje, quando atravessamos momentos de instabilidade econômica mundial, da qual o Brasil não está livre.

Some-se isto à globalização e teremos novidade no campo das "imprevisibilidades". Será que o contrato entre um brasileiro e um estrangeiro, cujas circunstâncias fossem afetadas pela crise econômica, poderia ser revisado com base na rebus sic stantibus, por conta da imprevisibilidade? Seria imprevisível a crise asiática ou o colapso na economia russa? Imprevisível para quem? Para o brasileiro, para o estrangeiro ou para ambos?

Certamente há que se aprofundar o estudo acerca da teoria da imprevisão no âmbito internacional, porque as dimensões são outras, seja por conta da globalização, que une as partes, seja em face da diversidade de sistemas jurídicos, que põe em xeque a igualdade e o equilíbrio contratual.

Por enquanto, internamente, a questão é mais clara. A teoria da imprevisão, se ainda não está plenamente consolidada no Direito pátrio, encontra cada vez menos resistência, seja na doutrina, na jurisprudência ou na lei.

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Sobre o autor
Nelson Zunino Neto

Advogado, pós-graduado em Direito Eleitoral e em Direito Ambiental, atuante principalmente em Direito Eleitoral, Empresarial, Administrativo e Civil. Autor do livro Tempo mínimo de propaganda eleitoral em rádio e tv, 2020.

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

ZUNINO NETO, Nelson. Pacta sunt servanda x rebus sic stantibus.: Uma breve abordagem. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 4, n. -1523, 1 mai. 1999. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/641. Acesso em: 22 dez. 2024.

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