I – Introdução.
Depois de inúmeras “intervenções brancas” no Estado do Rio de Janeiro, algumas eminentemente políticas e sem o devido amparo constitucional, objetivando dar uma resposta rápida e simplista à população para a grave crise de descontrole da violência e da criminalidade, o Governo Federal decide decretar Intervenção Federal na Segurança Pública, por meio do Decreto nº 9.288, de 16 de fevereiro de 2018.
Creio que se o governo federal decidiu intervir no Rio de Janeiro de forma drástica e excepcional poderia aproveitar a oportunidade para adotar uma Intervenção Federal Total. O Estado do Rio de Janeiro se encontra em situação de caos geral e merecia uma tentativa de implantar melhor gestão geral.
Basta uma análise superficial do atual caos moral, administrativo e financeiro em que se encontram os órgãos públicos, os serviços essenciais e o sistema criminal em geral para obter uma resposta do porque da ineficácia das polícias e sua consequência de estímulo para o aumento da criminalidade e da violência.
A corrupção é sistêmica e acentuada nos três poderes do Estado, no Executivo, no Legislativo e até no Judiciário há suspeitas. Os danos causados pela falência financeira e a gestão desastrosa afetaram toda a estrutura das polícias corroendo sensivelmente o ânimo, a motivação profissional e, pior que isto, estimulando a corrupção no meio policial.
Os maus exemplos vêm da cúpula, dos chefes e isso é extremamente grave! O ex-comandante chefe das polícias, o ex-governador do Estado do Rio de Janeiro, Sérgio Cabral, está preso por prática de vários crimes de corrupção e alguns de seus secretários também.
Suspeitas de corrupção pairam sobre o atual governador do Rio, Pezão. O presidente da Assembleia Legislativa, Jorge Picciane e alguns deputados estaduais estão envolvidos nas falcatruas até o pescoço. A cúpula do Tribunal de Contas foi presa por envolvimento com a corrupção e por aí vai...
No passado recente alguns vereadores foram presos por liderar milícias e associação com criminosos. Esses fatos geram desconfiança sobre o real caráter da Intervenção Federal Parcial, vale dizer, só na segurança pública. Não deveria ser Intervenção Total? A medida drástica será política institucional ou só politicagem sem lastro! Será uma estratégia para não mais votar a reforma da previdência por se saber que não há quórum de votos favoráveis? São essas as desconfianças de boa parte da população e da imprensa. Veremos mais tarde!
Acreditar que só essa medida extrema seja capaz de resolver rapidamente os problemas crônicos estruturais da segurança pública é ingenuidade. O caos vem sendo agravado lentamente, passo a passo, ao olhar desatento e irresponsável dos governantes e das autoridades, ao longo dos anos, sem que se programassem as medidas urgentes, sérias e necessárias para conquistar o nível ideal do controle da criminalidade e da violência naquele estado e também no país.
II – O emprego das Forças Armadas.
Mais uma vez se emprega as Forças Armadas nas questões de segurança pública, sendo que agora todo o sistema de segurança ficará sob a responsabilidade e comando geral do interventor, General de Exército Walter Souza Braga Netto.
Certamente a missão do chefe militar será extremamente árdua e vai expor mais uma vez as Forças Armadas, as quais se sabe não ter a vocação, o preparo e a experiência necessários para atuar na preservação da ordem pública, fato já reconhecido por vários militares da reserva e da ativa e pelo próprio comandante do exército, General Villas Boas.
Todavia, parece não haver outra solução emergencial a não ser a Intervenção Federal com emprego dos militares federais já que a atual situação de insegurança se apresenta gravíssima, em que todos os limites suportáveis foram rompidos pelos criminosos e daí, no desespero, na falta de alternativa melhor, só restou se “socorrer e pedir que a força militar federal ampare e proteja a população do Rio de Janeiro”! É fato não ser a primeira vez que isto ocorre.
As FFAA sempre foram e ainda são o esteio firme, seguro e confiável com que a população pode contar e se escorar. Sou Brasileiro, patriota e continuo otimista por um país melhor! Hoje na reserva da Polícia Militar/MS, tendo mais de 30 anos labutados na área da segurança pública, e, por tal, não poderia deixar de torcer com fervor e com grande esperança para que essa Intervenção consiga amenizar a questão por um grande período de tempo ou até mesmo controlar de maneira aceitável o caos de insegurança que se instalou e reina no Rio de Janeiro, isto é, até que outras medidas macroestruturais para o setor sejam planejadas e rapidamente executadas neste estado e no país.
III – Ceticismo e desconfiança com os planos de governo.
Não poderia deixar de expor certo ceticismo e desconfiança quando se trata de programas de governo para aperfeiçoar e ajustar a gestão da prestação dos serviços de segurança pública/ordem pública no país, pois o que sempre se revelou ao longo de mais de 30 anos não passou de marketing, falácias, sofismas, balelas e nada mais. É fato irrefutável, todos sabem!
Os anos se passaram e infelizmente nada mudou. As mazelas desse setor importantíssimo para a tranquilidade e a melhor qualidade de vida da população aumentaram e muito. O que vimos é um caos e a completa falência do sistema!
Ao longo da carreira policial militar detectei poucas ações de governo sérias, seja do governo federal ou dos estaduais. O que assisti foi uma infinidade de reuniões e de comissões, inúmeros planos de segurança e programas que foram adotados pelas autoridades de governo sempre com a promessa de estruturar e de sanear o sistema de segurança pública para lhes proporcionar a eficácia desejada pela sociedade brasileira.
Nada deu resultados perenes e significativos até o momento! Tudo passou, ficou esquecido e nada teve continuidade! A cada administração de governo se programa novos planos e estratégias pífias, sem resultados. Lamentável!
O interventor, general Braga Neto, vai ter muito trabalho! Ás polícias do estado lhes falta todo o necessário para que elas atuem regularmente. Há carência de efetivo, de material e de equipamentos, de fardamento, de armamento, de viaturas e de combustível, de manutenção, de insumos de tecnologia de informática e de comunicações, de remuneração digna a altura do risco e da importância da profissão etc.
A assistência médica é deficiente; a escala de serviço não permite folga necessária ao bem estar da tropa em face do efetivo insuficiente; a formação técnico-profissional não é adequada por falta de investimentos e da necessidade do serviço; os policiais não contam com o apoio do estado para defesa criminal em razão do serviço policial; não se tem condições de selecionar o melhor do melhor porque a corporação não oferece condições atrativas necessárias aos candidatos ao ingresso na instituição etc. Tudo isso é muito triste e desalentador! Até quando?
Quais os incentivos oferecidos aos integrantes dos órgãos de segurança pública para subir morros e adentrar em áreas completamente dominadas por traficante de drogas; ter alta probabilidade de serem alvejados por armas de guerra, fuzis e metralhadora de última geração; de serem caçados nas ruas quando de folga e também durante o serviço; de serem massacrados pelas ONGS e entidades de direitos humanos que alardeiam sofismas e pregam ideologias irrealistas; de serem criticados por alguns órgãos de imprensa e por parte da sociedade, muitas das vezes sem razão, por que não se investiga em quais circunstâncias se dão os confrontos, as ocorrências; de terem como obstáculo a legislação penal, que, de certa forma, dificulta e desestimula o bom exercício de suas atribuições etc.
Como trabalhar na atividade policial arriscando a vida, se o pagamento minguado não vem, e, quando vem, já está atrasado? Como alimentar a família, cumprir os compromissos financeiros e tudo mais? Às autoridades de governo cabem responder essas indagações e aos leitores refletir e ficar alerta sobre a complexidade da atual situação da segurança pública no Brasil.
IV – A precipitação em divulgar a medida de Intervenção.
Assistimos o ato de assinatura da Intervenção Federal na Segurança Pública do Rio de Janeiro onde o presidente da república discursou e outras autoridades concederam entrevistas. Vimos também várias reportagens e inúmeros comentários sobre o tema.
Impressionante foi a extrema precipitação em divulgar a medida de intervenção, talvez no afinco de estancar as pressões da população do estado por providências, daí oferecer uma solução imediata e simplista, que é especialidade de alguns políticos: “Ora, o governo federal agiu muito rápido e vai resolver a questão em breve!”, vão dizer os governantes!
A primeira impressão foi de espanto e apreensão por ter inferido, salvo engano, que o governo federal não tinha plano algum para colocar imediatamente em execução essa intervenção. Certamente a pressa da medida de afogadilho, sem antes haver o macroplanejamento estratégico, proporcionará grande vantagens aos criminosos. Na verdade, parece que serviu de alerta aos "bandidos de todas as especialidades" para que programassem suas estratégias de rotas de fuga e de migração a outros estados! Torço para que eu não tenha razão.
Primeiro se alardeou a intervenção, para depois se iniciar o planejamento? Quais estratégias vão adotar? O que haverá de novo nas operações das FFAA que ainda não assistimos? É bom lembrar que ações operacionais de garantia da lei e da ordem (GLO) ainda estão vigentes e ainda não deu resultado esperado! Ficou claro que o interventor, general Braga Neto e seus oficiais, salvo engano, foram pegos de surpresa com sua nomeação para essa importante missão. Que Deus o ajude e proteja!
V – O êxito da Intervenção Federal.
Ao investigar os problemas da segurança pública no Brasil e, particularmente no Rio de Janeiro, conclui-se não bastar destinar aos policiais estaduais, materiais, equipamentos, armas e munições etc. É preciso muito mais!
Crê-se que o êxito dessa Intervenção federal estará condicionado à adoção de medidas sérias e amplo emprego de estratégias no âmbito do Estado do Rio e no país como um todo. Ao revés, a medida extrema estará fadada ao fracasso e provavelmente acarretará algum descrédito às Forças Armadas, como ocorreu com as outras investidas delas até agora, as quais tiveram resultado pífio, sem eficácia, conseguindo simplesmente oferecer temporariamente "sensação de segurança" à população e amedrontar, inibir e dispersar os criminosos para outras localidades, constatando-se mais tarde que a violência e a criminalidade voltou aflorar nos níveis anteriores.
Enquanto continuar a chegar ao Rio de Janeiro e em outras capitais do país quantidade farta de drogas, de armas, de munições e de explosivos, o clima de insegurança tende a perdurar e aumentar ainda mais. Sabe-se que o problema da violência e da criminalidade é geral e o desafio maior é controlar e fiscalizar com eficácia essa situação.
O que o governo federal tem feito para guarnecer nossas fronteiras secas, os rios, o mar, as marinas, os portos, os aeroportos regulares, as pistas de pouso de fazendas pelo Brasil, as principais rodovias federais que ligam os estados conhecidas como rotas do tráfico de armas, de munições, de drogas e do contrabando? Qual a qualidade e a eficácia do controle e da fiscalização de explosivos? Acredito que seja quase nada em face da real necessidade!
Tem-se conhecimento da grande deficiência de recursos financeiros e humanos para as Polícias, Federal e Rodoviária Federal, então, isso precisa ser resolvido com urgência! Acredita-se ter passado a hora de se analisar e efetivar a instituição de uma Força Policial Militar Federal, uma espécie da Guarda Nacional, para policiar, controlar e fiscalizar permanentemente os pontos sensíveis para a segurança pública nas áreas de responsabilidade exclusivas do governo federal.
VI – Conclusão
Enquanto o governo federal não assumir integralmente suas atribuições de fiscalização e de controle permanente das áreas críticas para a segurança pública, empregando todos os órgãos do setor de segurança com aporte substancial de recursos financeiros e humanos, de meios, de materiais, de equipamentos e armamentos, e ainda propor medidas legislativas com urgência para o Código Penal e para a Lei de Execução Penal, objetivando dar maior eficácia e adequar essa legislação à atual e à real necessidade, também, programar plano “macro” de segurança pública para o país a título de Objetivo Nacional Permanente - Políticas Permanentes de Estado que devem traduzir os anseios e as aspirações da nação em relação à segurança etc., infelizmente a intervenção vai ser mais uma cartada sem lastro e o real controle da violência e da criminalidade no Brasil ainda estará longe de ocorrer.