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Mandado de injunção: aplicação à luz de um pretenso ativismo judicial

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4. POSICIONAMENTO ATUAL DO STF À LUZ DE UM PRETENSO ATIVISMO

Do novo posicionamento do STF acerca as decisões no mandado de injunção, é salutar analisar a estrutura do Estado Democrático de Direito e o princípio da Separação dos Poderes. O principal objetivo do princípio da Separação dos Poderes foi assegurar a liberdade dos indivíduos em detrimento do Poder do Estado.

O sistema brasileiro adota o mecanismo de freios e contrapesos a fim buscar a harmonia entre os três Poderes, possibilitando o controle recíproco e a colaboração entre os mesmos. Entretanto, no Estado Democrático de Direito, não se pode chancelar o chamado ativismo judicial ao se sobrepor ao Legislativo. Contudo, deve-se observar que esse mesmo Legislativo, na realização sua tarefa precípua – a de legislar – se omita na regulamentação de normas que regulamenta situações previstas na Carta Magna, trazendo prejuízos para o exercício do direito àqueles que necessitam.

A omissão do Legislativo é que faz àquele que busca a segurança jurídica e aplicação do direito constitucional previsto no art. 5º, LXXI da CF a interpor Mandado de Injunção.

Assim, em que pese a Constituição reconhecer e assegurar a separação dos Poderes, tal princípio poderá ser atenuado sempre que a sua interpretação inflexível acarrete a violação de direitos e garantias contidos naquele mesmo diploma legal, levando o STF a adotar um posicionamento que garanta a imediata aplicação do remédio constitucional em análise.

Assim, em que pese a independência e harmonia dos Poderes, art. 2º da Constituição Federal, não é admissível o Legislativo se mantenha inerte – fazendo da Constituição uma norma sem eficácia - devendo primar pela viabilidade e fruição dos direitos previstos sem violar o citado princípio, tão caro ao Estado Democrático de Direito.

No Estado Democrático de Direito, não se pode limitar a atuação do Judiciário, devendo este ter papel inovador da ordem jurídica e social, atuando de forma ampla e com intensidade, com fim puramente democrático e a garantia da efetividade da Constituição.

O STF adota uma conduta que busca efetivar as garantias previstas na Constituição, a partir da análise do remédio constitucional injuncional. Portanto, visa atender as demandas da sociedade, permitindo o exercício dos direitos assegurados, ainda que omisso por parte do legislador.

De todo o exposto, conclui-se, portanto, pela aplicabilidade do direito a fim de garantir a efetivação de direitos previstos na Carta Magna em detrimento da omissão legislativa.


CONCLUSÃO

Terminada as suscitações e debates empreendidos acima, vê-se que este artigo preocupou-se com o tema relativo ao mandado de injunção como forma de contribuir para a construção de uma teoria que teve como objetivo a individualização do mencionado instituto de toda e qualquer construção teórica que visasse a sua equiparação a qualquer outro remédio constitucional que guardasse características afins, mas que, nem por isso, dentro de uma hipótese científica, fosse impedimento para fazer subsumir as suas características individuais e os seus princípios próprios.

Preocupou-se, ainda, este artigo, em defender o mandado de injunção como uma garantia para tornar efetivas normas constitucionais que estivessem sem aplicabilidade, devido uma providência legislativa ulterior, sem que houvesse qualquer sanção para o Poder omisso, tendo em vista o não cumprimento de suas obrigações funcionais para o resguardo do direito obstado pela falta de norma regulamentadora.

Foi demonstrado que a construção doutrinária pela máxima efetividade das normas constitucionais está sendo incorporada pelo Supremo Tribunal Federal de forma ainda tímida, mesmo depois de passados quase vinte anos desde a implantação do mandado de injunção no constitucionalismo brasileiro.

Essa construção, como evidenciado, teve como principal empecilho a preocupação com a intervenção do Judiciário no “atuar” dos outros Poderes, sem que se estivesse em mente que o papel do aplicador do Direito é o de figurar como instrumento de sociabilidade do mundo moderno, procurando no Direito todos os meios que contribuam para o alcance da efetividade dos direitos sociais obstaculizados por qualquer entrave burocrático.

Enfim, é o reconhecimento e consolidação da ideia de dar efetividade aos direitos constitucionais, aceitando a nova realidade social surgida com a criação dos direitos sociais que dão ensejo, consequentemente, a direitos subjetivos.

Deu-se especial atenção para as normas programáticas, pois são elas as que mais necessitam de proteção dentro do ordenamento jurídico, por estarem quase sempre à margem da aplicabilidade e efetividade que se fazem necessária para dar executoriedade às normas constitucionais.

Por isso, em face dessa legislação social, que se limita a definir a finalidade e os princípios gerais, e diante de direitos sociais essencialmente dirigidos à gradual transformação do presente e do futuro, os aplicadores do Direito devem assumir a posição de negar o caráter limitado de tais direitos ou normas programáticas. Atuando de forma a interpretar as normas constitucionais para conseguir tirar-lhes o máximo de proveito para a parte lesada com a omissão.

A aceitação dessa realidade visa a transformação da concepção do Direito e da nova função do Estado, mesmo reconhecendo o impulso em sentido contrário proporcionado pelo neoliberalismo, mas que, ante a abismal realidade social, mudanças devem ser assumidas para desconstituir este momento de crise institucional, política e econômica.

Diante disso, é chegada a hora de darmos a nossa contribuição na tentativa de tornar efetivos tais programas, contribuindo, assim, para fornecer conteúdo concreto àquelas finalidades e princípios. O que podemos fazer controlando e exigindo o cumprimento do dever do Estado de intervir ativamente na esfera social, um dever que, por ser prescrito legislativamente, cabe exatamente aos aplicadores fazer respeitar.

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De qualquer maneira, essa intervenção dos aplicadores do Direito não tira a necessidade de se prosseguir com as lutas sociais para se objetivar a conquista do bem-estar almejado e consignado pela Constituição.

Dentro desse contexto, o não cumprimento dos fins e objetivos da Constituição é inconstitucional, e a sua concretização depende de instrumentos para tornar viáveis os direitos, liberdades e prerrogativas que estejam obstados pela desobediência aos programas nela determinado.

É exigência, em um Estado Democrático de Direito, a necessidade de um sistema de proteção jurídica que controle quaisquer atos dos Poderes Públicos que não estejam em consonância com a Constituição, abrangendo, também, as omissões.

Para isso é que foi criado o mandado de injunção, como garantia deferida àquele que teve seu direito, liberdade ou prerrogativas inerentes à nacionalidade, à soberania e à cidadania, lesado pela norma regulamentadora faltante.

Estes problemas foram colocados no presente trabalho, e optou-se por dar a sentença do mandado de injunção caráter constitutivo do direito do impetrante, como forma de garantir todas as possibilidades de suprimento das omissões inconstitucionais que lhes são apresentadas, quando o prejudicado com esse estado de coisas procura o Judiciário com o objetivo definido de ter assegurado seu direito obstaculizado por uma inércia a que não deu causa.

Por fim, essas foram as questões debatidas em torno do tema e o que se tentou construir para a consecução da máxima efetividade da Constituição, abarcando, também, as normas programáticas por entendermos que as suas disposições precisam ser legitimadas pela via do mandado de injunção, e por não considerarmos que a sua adoção pela Constituição possa configurar crise do Direito Constitucional na atualidade.


REFERÊNCIAS

BACHA, Sergio Reginaldo. Mandado de injunção. Belo Horizonte: Del Rey. 1998.

BARROSO, Luis Roberto. O direito constitucional e a efetividade de suas normas - limites e possibilidades da constituição brasileira. 7º ed. Rio de Janeiro: Renovar. 2003.

BONAVIDES, Paulo. Do estado social ao estado liberal. 6º ed. São Paulo: Malheiros. 1996.

DIDIER Jr, Fredie. Ações Constitucionais. 5ª ed. Salvador: Juspodivm. 2011.

MONTESQUIEU, Charles de Secondat, Baron de. O Espírito das Leis. Trad. Cristina Murachco. São Paulo: Martins Fontes. 1993.

NEVES, Daniel Amorim Assumpção. Ações Constitucionais. Rio de Janeiro: Fonseca. São Paulo: Método, 2011.

OLIVEIRA, Francisco Antônio. Mandado de injunção (da inconstitucionalidade por omissão) – enfoques trabalhistas – jurisprudência. São Paulo: Revista dos Tribunais. 1993.

QUARESMA, Regina. O mandado de injunção e a inconstitucionalidade por omissão: teoria e prática. 3º ed. Rio de Janeiro: Forense. 1999.

SILVA, José Afonso da. Aplicabilidade das normas constitucionais. 6º ed. 2º tiragem. São Paulo: Malheiros. 2003.

___________________. Curso de direito constitucional positivo. 24º ed. São Paulo: Malheiros. 2005.

SILVA, Volney Zamenhof de Oliveira. Lineamentos do mandado de injunção. São Paulo: Revista dos Tribunais. 1993.

SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL. DJU 21.990, p. 9782, MI (QO) 107-DF, Rel. Min. Moreira Alves.

____________________________. DJ de 27-3-92, MI 232, Rel. Min. Moreira Alves, julgamento em 2-8-91.

____________________________. DJ de 14-11-91, MI 283, Rel. Min. Sepúlveda Pertence, julgamento em 20-03-1991.

____________________________. DJ de 26-6-92, MI 284, Rel. p/ o ac. Min. Celso de Mello, julgamento em 22-11-91.

____________________________. DJ de 17-6-94, MI 361, Rel. p/ o ac. Min. Sepúlveda Pertence, julgamento em 8-4-94.

____________________________. DJ de 25-10-07, MI 708, Rel. Min. Gilmar Mendes, julgamento em 31-10-08.


Notas

[1] SILVA, Volney Zamenhof de Oliveira. Lineamentos do mandado de injunção. São Paulo. 2003. Revista dos Tribunais.

[2] QUARESMA, Regina. O mandado de injunção e a inconstitucionalidade por omissão: teoria e prática. 3º ed. Rio de Janeiro.1999. Forense.

[3] SILVA, Volney Zamenhof de Oliveira. Ob. cit.

[4] BACHA, Sergio Reginaldo. Mandado de injunção. Belo Horizonte.1999. Del Rey.

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Sobre o autor
Leonardo Moreira Castro Chaves

Advogado. Procurador Jurídico da Prefeitura Municipal de Itaju do Colônia (BA) e das Câmaras Municipais de Jussiape (BA) e Rio de Contas (BA). Pós-graduado com especialização em Direito Processual Civil pela Universidade Católica do Salvador. Pós-graduado com especialização em Direito Eleitoral pela Faculdades Integradas Ipitanga.

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

CHAVES, Leonardo Moreira Castro. Mandado de injunção: aplicação à luz de um pretenso ativismo judicial. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 23, n. 5432, 16 mai. 2018. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/64721. Acesso em: 20 abr. 2024.

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