A responsabilidade civil nas sociedades empresárias

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Resumo:


  • A Teoria "Ultra Vires" origina-se do Direito Inglês e estabelece que atos praticados por administradores de sociedades que excedam os poderes conferidos pelo contrato social são considerados nulos, não vinculando a pessoa jurídica.

  • A Teoria da Aparência protege aqueles que, de boa-fé, realizam negócios jurídicos com alguém que aparenta ter autoridade ou posição para fazê-lo, mesmo que, na realidade, essa pessoa não possua tal autoridade ou posição.

  • O Direito Brasileiro adota uma forma mista da Teoria "Ultra Vires", responsabilizando o administrador por atos que excedam o objeto social, mas a jurisprudência tem aplicado a Teoria da Aparência para proteger terceiros de boa-fé e garantir a segurança das relações jurídicas.

Resumo criado por JUSTICIA, o assistente de inteligência artificial do Jus.

7. AS TEORIAS DA RESPONSABILIDADE EMPRESARIAL

Os administradores da sociedade empresária são quem presentam a sociedade, pois elas em si não possuem vontade, apesar de possuírem personalidade jurídica, é uma personalidade ficta, pois, em realidade é gerida por seus sócios e administradores, que ditam como essa será conduzida.

“Art. 1.022. A sociedade adquire direitos, assume obrigações e procede judicialmente, por meio de administradores  com  poderes  especiais,  ou,  não  os  havendo,  por  intermédio  de qualquer administrador”.

Muito se discute acerca da responsabilidade empresarial, pois, ainda hoje, há divergências sobre como os administradores e sócios são responsabilizados com relação a sua administração, a partir desta celeuma, surgem duas grandes teorias doutrinárias sobre a administração da sociedade, sendo que cada uma delas possui adeptos com argumentos jurídicos que as fundamentam.

No Direito Empresarial, a doutrina majoritária é adepta da ‘Teoria Orgânica’, para este teoria, o administrador não representa a sociedade, mas sim a ‘presenta’, pois em verdade, o administrador é considerado a voz e parte integrante da estrutura da sociedade, portanto, ele a faz presente.

Em contraponto, a doutrina minoritária é adepta da ‘Teoria da Representação’, tal teoria considera que os administradores, são de fato, representantes legais da sociedade, pois são eles que a administram, as representando diante terceiros.

Em razão disso, os administradores não podem ter poder ilimitado para gerir a sociedade, portanto, seus poderes e deveres devem estar preconizados em contrato social, uma vez que, a administração deve ser atribuída a uma pessoa física, já que seria inviável se fosse a uma pessoa jurídica, portanto, poderá ser o sócio ou terceiro o administrador, contanto que seja pessoa física, no mais, há algumas outras restrições e deveres que são preconizados aos sócios, conforme os §§1º e 2° do art. 1.011 do CC/02 preveem:

“Art.1.011. O administrador da sociedade deverá ter, no exercício de suas funções, o cuidado e a diligência que todo homem ativo e probo costuma empregar na administração de seus próprios negócios.

§ 1º Não podem ser administradores, além das pessoas impedidas por lei especial, os condenados a pena que vede, ainda que temporariamente, o acesso a cargos públicos; ou por crime falimentar, de prevaricação, peita ou suborno, concussão, peculato; ou contra a economia popular, contra o sistema financeiro nacional, contra as normas de defesa da concorrência, contra as relações de consumo, a fé pública ou a propriedade, enquanto perdurarem os efeitos da condenação.

§ 2º Aplicam-se à atividade dos administradores, no que couber, as disposições concernentes ao mandato”.

Ao administrador é facultada a delegação em certas ocasiões de algumas atividades, porém, ninguém poderá exercer suas funções, pois, o administrador nessa qualidade agirá sempre em caráter personalíssimo, conforme o art. 1.018 do Código Civil.

“Art.1.018. Ao administrador é vedado fazer-se substituir no exercício de suas funções, sendo-lhe facultado, nos limites de seus poderes, constituir mandatários da sociedade, especificados no instrumento os atos e operações que poderão praticar”.

Normalmente, nas sociedades limitadas, a atribuição da administração é conferida aos seus sócios, se tal atribuição estiver firmada em contrato social e os sócios possuírem poderes de administração em igualdade, quando do ingresso de novo sócio, não será a ele automaticamente atribuído poderes de administração, conforme a regra preconizada no art. 1.060, parágrafo único do CC/02.

“Art.1.060. A sociedade limitada é administrada por uma ou mais pessoas designadas no contrato social ou em ato separado.

Parágrafo único. A administração atribuída no contrato a todos os sócios não se estende de pleno direito aos que posteriormente adquiram essa qualidade”.

Os administradores podem ser nomeados no contrato social ou em ato separado, sejam eles sócios ou não da sociedade, sendo que a aprovação de administrador não sócio dependerá da aprovação da unanimidade dos sócios se seu capital social não estiver integralizado, e de 2/3 (dois terços), no mínimo, se estiver integralizado, conforme o art.1061 do CC/02:

“Art.1.061. A designação de administradores não sócios dependerá de aprovação da unanimidade dos sócios, enquanto o capital não estiver integralizado, e de 2/3 (dois terços), no mínimo, após a integralização”.

O contrato social sendo omisso em alguns detalhes sobre a administração, poderá ser suplementado com o art.1013 do CC/02 que é capaz de suprir tais omissões que possam ocorrer quando definidos os poderes e atribuições dos sócios.

“Art.1.013. A administração da sociedade, nada dispondo o contrato social, compete separadamente a cada um dos sócios.

§1º Se a administração competir separadamente a vários administradores, cada um pode impugnar operação pretendida por outro, cabendo a decisão aos sócios, por maioria de votos.

§2º Responde por perdas e danos perante a sociedade o administrador que realizar operações, sabendo ou devendo saber que estava agindo em desacordo com a maioria”.

Uma vez omisso o contrato social acerca dos poderes e deveres dos administradores, ficam estes autorizados a prática de qualquer ato relativo à gestão da sociedade, com exceção da alienação ou oneração de bens imóveis, que só poderão ser realizados se forem o objeto da sociedade.

Com relação aos poderes do administrador, surge a ‘Teoria da Aparência’, que é amplamente aplicada no Direito Empresarial e nas relações jurídicas da sociedade com terceiros, essa teoria preconiza que, em regra, a sociedade empresária deve responder perante terceiros pelos atos práticos pelo administrador inclusive quando praticados com excesso de poderes, com exceção de alguns atos, conforme o previsto nos incisos do parágrafo único do art. 1.015 do Código Civil.

“Art.1.015. No silêncio do contrato, os administradores podem praticar todos os atos pertinentes à gestão da sociedade; não constituindo objeto social, a oneração ou a venda de bens imóveis depende do que a maioria dos sócios decidir.

Parágrafo único. O excesso por parte dos administradores somente pode ser oposto a terceiros se ocorrer pelo menos uma das seguintes hipóteses:

I - se a limitação de poderes estiver inscrita ou averbada no registro próprio da sociedade;

II- provando-se que era conhecida do terceiro;

III- tratando-se de operação evidentemente estranha aos negócios da sociedade”.

Os incisos I e II deste artigo, preconizam situações em que há limitação de poder expressa ao administrador, portanto, por esta estar prevista expressamente no contrato social e devidamente averbada, gera eficácia ‘erga omnes’, não podendo o terceiro alegar desconhecimento.

O inciso III, porém, preconiza situação relativa ao próprio objeto da sociedade, nesse caso, estamos diante da ‘Teoria Ultra Vires’, conforme essa teoria haverá presunção de excesso de poderes praticado pelo administrador quando este assume obrigações que sejam estranhas ao objeto social, ou seja, havendo evidente incompatibilidade entre a obrigação jurídica e o objeto da sociedade, o credor deveria observar tal situação, de forma que ficará afasta a responsabilidade da sociedade ante essa obrigação, uma vez que o credor foi displicente.

O Código Civil de 2002 adota a ‘Teoria Ultra Vires’, porém, tal aplicação é criticada pelos doutrinadores, uma vez que eles entendem que é um anacronismo diante da celeridade com que a relações econômicas nos dias atuais são realizadas que o credor seja obrigado a notar a má-fé do administrador que age contrariamente ao objeto social.

Os doutrinadores entendem de forma majoritária que o correto seria a aplicação da ‘Teoria da Aparência’ pois está dá maior segurança jurídica nas relações empresariais, uma vez que tal teoria preconiza que as sociedades devem sim se obrigar perante terceiros com relação aos atos praticados por seus sócios.

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Tal entendimento também vem sendo adotado no âmbito jurisprudencial, inclusive com decisões pelo Superior Tribunal de Justiça.

“DIREITO COMERCIAL. SOCIEDADE POR QUOTAS DE RESPONSABILIDADE LIMITADA. GARANTIA ASSINADA POR SÓCIO A EMPRESAS DO MESMO GRUPO ECONÔMICO. EXCESSO DE PODER. RESPONSABILIDADE DA SOCIEDADE. TEORIA DOS ATOS ULTRA VIRES. INAPLICABILIDADE. RELEVÂNCIA DA BOA-FÉ E DA APARÊNCIA. ATO NEGOCIAL QUE RETORNOU EM BENEFÍCIO DA SOCIEDADE GARANTIDORA [...]

3. A partir do Código Civil de 2002, o direito brasileiro, no que concerne às sociedades limitadas, por força dos arts. 1.015, § único e 1.053, adotou expressamente a ultra vires doctrine.

4. Contudo, na vigência do antigo Diploma (Decreto n.º 3.708/19, art.10), pelos atos ultra vires, ou seja, os praticados para além das forças contratualmente conferidas ao sócio, ainda que extravasassem o objeto social, deveria responder a sociedade.

5. No caso em julgamento, o acórdão recorrido emprestou, corretamente, relevância à boa-fé do banco credor, bem como à aparência de quem se apresentava como sócio contratualmente habilitado à prática do negócio jurídico.

6. Não se pode invocar a restrição do contrato social quando as garantias prestadas pelo sócio, muito embora extravasando os limites de gestão previstos contratualmente, retornaram, direta ou indiretamente, em proveito dos demais sócios da sociedade fiadora, não podendo estes, em absoluta afronta à boa-fé, reivindicar a ineficácia dos atos outrora praticados pelo gerente.

7. Recurso especial improvido”.

“Art. 1.016. Os administradores respondem solidariamente perante a sociedade e os terceiros prejudicados, por culpa no desempenho de suas funções”.

Portanto, uma vez que o administrador aja com culpa, este será responsabilizado pela sociedade e também perante terceiros.

O terceiro nessa situação poderá exigir pessoalmente do administrador o cumprimento da obrigação, que terá o dever de arcar com ele, porém, se o terceiro cobrar a sociedade, está terá direito de regresso contra o administrador, em clássico exemplo de responsabilidade solidária.

 O art.1017 do CC/02 também preconiza algumas formas de responsabilidade pessoal do administrador, vejamos:

“Art. 1.017. O administrador que, sem consentimento escrito dos sócios, aplicar créditos ou bens sociais em proveito próprio ou de terceiros, terá de restituí-los à sociedade, ou pagar o equivalente, com todos os lucros resultantes, e, se houver prejuízo, por ele também responderá.

Parágrafo único. Fica sujeito às sanções o administrador que, tendo em qualquer operação interesse contrário ao da sociedade, tome parte na correspondente deliberação”.

Portanto, conforme esses artigos, o administrador será responsabilizado se agir contrariamente a sociedade, se beneficiando ou beneficiando terceiros em razão de sua posição.

O artigo 1.020 do Código Civil preconiza obrigações aos administradores da sociedade.

“Art. 1.020. Os administradores são obrigados a prestar aos sócios contas justificadas de sua administração, e apresentar-lhes o inventário anualmente, bem como o balanço patrimonial e o de resultado econômico”.

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Sobre a autora
Daniela Lugia Brigagão de Carvalho

Pós-graduada em Direito Civil e Empresarial na Faculdade de Direito Damásio de Jesus – concluída em fevereiro de 2018. Graduação em Direito – concluída em dezembro de 2015. Bacharel em Direito pela Universidade Presbiteriana Mackenzie.

Informações sobre o texto

Este texto foi publicado diretamente pelos autores. Sua divulgação não depende de prévia aprovação pelo conselho editorial do site. Quando selecionados, os textos são divulgados na Revista Jus Navigandi

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